Alvaro Dias pede fiscalização rigorosa em obras para a Copa de 2014



Foram anunciadas no mês passado as doze cidades que sediarão os jogos da Copa do Mundo de 2014. Passada a euforia, autoridades municipais e estaduais correm contra o tempo para viabilizar recursos privados para a construção dos estádios, uma vez que o governo federal anunciou que o dinheiro público só será utilizado em obras de infraestrutura. Presidente da CPI que esmiuçou os meandros do futebol, em 2001, o senador Alvaro Dias (PSDB-PR) acha difícil que a garantia se concretize. Ele teme um estouro no orçamento do evento, como ocorreu na realização dos Jogos Pan-Americanos de 2007. "É preciso fiscalização, porque abusos podem ocorrer", afirmou. A seguir, a íntegra da entrevista com o senador à Agência Senado.  

Faltam cinco anos para a Copa do Mundo do Brasil, qual as suas perspectivas com relação ao êxito do evento? O Brasil estará devidamente preparado? 

A paixão que há no Brasil em relação ao futebol assegura o êxito. Temos o cenário ideal, mas devemos assumir a responsabilidade de fiscalizar a execução do projeto. Temos vários anos pela frente, mas a verdade é que as obras estão paradas, especialmente nas áreas de infraestrutura de transporte e de segurança pública. Os aeroportos estão com obras totalmente paralisadas, até em virtude de denúncias do TCU [Tribunal de Contas da União]. É preciso prudência e que se convoquem à responsabilidade as autoridades ligadas a esse projeto. 

O governo federal já afirmou que não colocará recursos do Orçamento na Copa, a não ser em infraestrutura. O senhor acredita nisso?  

A declaração do governo não nos oferece nenhum segurança. Tomemos como o exemplo o Pan-2007, para o qual o governo forçou inclusive certas questões legais para que empréstimos fossem feitos pela Caixa Econômica Federal e pelo BNDES. No Pan, o orçamento inicial estourou em mais de 1000%, ou seja, houve um superfaturamento olímpico. Temos um exemplo importante e os dirigentes do esporte no Brasil não passaram por este teste. Isso nos autoriza a manter a desconfiança. Nesse projeto da Copa 2014 abusos podem ocorrer. É preciso fiscalização, o Ministério dos Esportes deve ser responsável por isso, se utilizando das comissões específicas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

Em cidades com menos recursos haverá capacidade de amealhar recursos da iniciativa privada? A Copa se sustentará só com dinheiro privado? 

Com a crise, não acredito que seja fácil [conseguir financiamentos privados]. Dou como exemplo o Corinthians, que é uma nação do futebol, e até hoje não conseguiu construir o seu estádio. Então, não irão me convencer agora que só por causa de dois ou três jogos, a iniciativa privada vai se apresentar com recursos suficientes. Eu estou vendo os governos atuando, já há o uso de dinheiro público, como ocorreu para a construção de estádio em Brasília [o novo Bezerrão, no Gama, cidade do Distrito Federal]. Vai chegar o momento em que ou o governo investe ou o nosso país vai passar vergonha. Não dá para ser ingênuo. Cuiabá, Manaus, Recife, Brasília - sem desmerecer nenhuma dessas cidades - não conseguirão. Eu acho uma temeridade e continuo insistindo para que haja fiscalização.

O senhor considera que o processo de escolha das sedes foi o adequado? 

Houve muito lobby, mas me parece que foi a Fifa que deu a palavra final. Não conheço a realidade das capitais escolhidas e não sei se seria possível realizar em menos capitais, o que seria mais econômico. Se nós conseguirmos uma organização favorável, uma estruturação suficiente, teremos benefícios. Curitiba, por exemplo, já tem condições de receber a Copa, mas precisa de investimentos também, como a construção do metro. O estádio [Arena da Baixada] está quase pronto, com dinheiro do Atlético Paranaense. A cidade poderá ganhar muito com os investimentos que virão, também no comércio e, principalmente, com a publicidade, que tem um valor que não se dimensiona. Há resultados favoráveis, mas receio que não ocorra fiscalização conveniente e a Copa possa significar desperdício de dinheiro público.

Há previsão de mudanças legislativas para atender a exigências da Fifa, como por exemplo, a aprovação de normas tributárias e alfandegárias, além da liberação da venda de bebidas alcoólicas em estádios. O que senhor pensa disso? Não seria uma usurpação do Poder Legislativo?  

Isso é assumir um compromisso em nome de terceiros. O governo está muito seguro em relação ao seu poder no Legislativo. Ele tem maioria, mas não podemos aprovar absurdos em nome de uma competição. Liberar bebida alcoólica em estádios é uma decisão temerária. A violência tem derrotado a administração e bebida é um componente que estimula a violência. O que argumentarão a favor [da liberação], que a segurança será exemplar? A vigilância perfeita?

A CPI do Futebol, da qual o senhor foi presidente, detectou uma série de irregularidades envolvendo o presidente da CBF, Ricardo Teixeira. Ele hoje parece livre delas e vai comandar um dos maiores eventos da história do Brasil. O que o senhor pensa a respeito? 

Ele foi privilegiado com a conquista da Copa de 2002, exatamente no ano da conclusão da CPI. Se perdesse, talvez não conseguisse entrar no país, já que as denúncias estavam em todas as manchetes. Pelo contrário, ao ganhar subiu a rampa [do Palácio do Planalto] para ser homenageado. A lentidão da Justiça adiou uma decisão, e hoje temos a necessidade de concluir o processo administrativo que corre na Receita Federal, para tratar dos outros, que estão no Judiciário, que foram paralisados, sem prejuízo da prescrição. Evidentemente, ele está autorizado a exercer a função de presidente da CBF, mas os precedentes exigem o cuidado da fiscalização rigorosa.

O senhor pede cautela em relação à organização da Copa, um evento que certamente mobilizará o país. O senhor teme passar por estraga-prazeres? 

Procuro ser sincero, sem medir as consequências. Se não fosse assim, eu não poderia criticar o presidente Lula, que tem 80% de popularidade. Minha função é combater o que considero equivocado. No futebol é a mesma coisa. Inclusive, o futebol é mais popular do que o Lula, mas eu não estou batendo na seleção e o torcedor é inteligente e sabe disso. Sempre defendi a realização da Copa no Brasil, mas acho que o futebol será melhor, como atividade lúdica e geradora de riquezas, se nós tivermos dirigentes mais honestos e respeitadores do torcedor.



19/06/2009

Agência Senado


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