Entrevista do governador Mário Covas após Conferência Nacional da Indústria da Construção



Parte II

Febem Repórter: Não está faltando nada lá, como material? Covas: Material? Talvez sim. Repórter: Mas, então, governador. Se não falta nada, como o senhor diz, o que fazer para evitar rebelião, enquanto o processo de descentralização da Febem não está concluído? Covas: Não, nós estamos fazendo diariamente. Estamos selecionando os maiores, colocando-os em lugares onde a segurança é maior. Eu acho que vocês ainda não compreenderam que a ordem que eu tenho da Justiça é para privar esses adolescentes da liberdade. E isso não se faz pondo eles em um lugar aberto. Como é que eu os privo da liberdade? O Júlio (Lancelotti) me perguntou o que eu acho que devo fazer. A Justiça me determinou que privasse esses adolescentes da liberdade. Não dá para privá-los da liberdade se não tiver porta com tranca, se não tivermos grades nas janelas. Como é que faz? Não tem jeito. O compromisso público que nós fizemos, depois de duas audiências públicas, em que todo mundo que é interessado na questão participou, foi o compromisso de fazer novas instalações, algumas delas estão prontas, outras estão sendo feitas, outras vamos fazer. Agora é fácil, o ABC por exemplo é uma região do Estado, que tem um alto poder reivindicatório, com justa razão. Mas na hora de pôr uma instalação da Febem lá, nenhum deles quer. Repórter: Agora, se os menores vão para uma instalação-modelo, como é o caso de Franco da Rocha, e continuam se rebelando, é sinal de que tem alguma coisa errada, o senhor não acha? Covas: Bem, mas por que você quer atribuir essa coisa errada para o Estado? Repórter: Estou querendo atribuir alguma deficiência que o Estado pode estar cometendo. Covas: Eu não sei. Esse problema não foi o primeiro. O primeiro já ocorreu quando eles foram condenados a ficar em privação de liberdade. Esse foi o primeiro problema, não foi a relação deles com o Estado. Quem daqui sabe a solução, melhor do que nós, está convidado para ir lá ajudar a resolver. Quaisquer dessas instituições ou entidades. Agora, ir lá em Parelheiros e dizer que aquilo é uma instalação ruim... Lá tem dois módulos de 192 crianças cada um. Tem duas piscinas, uma para cada um. Tem dois campos de futebol, tem duas quadras poliesportivas, uma para cada módulo, sem que eles entrem em contato. Os meninos que ficam na parte de cima são os mais novos. Eles são separados dos que ficam na faixa de baixo. São quartos de seis ou oito crianças com banheiro, alguns deles já estão com a roupa lá. Eu cheguei a ler no jornal que eles tinham um sabonete por tempo mesmo? Seis meses? Então vocês acham que nós iríamos “fazer coisa” com sabonete. Nós gastamos uma fortuna com a Febem, aliás, uma fortuna não, gastamos mais com outras coisas. Mas nós gastamos um valor bastante alto com a Febem. Portanto, não falta dinheiro. E então nós iríamos economizar no sabonete? Para receber críticas? Repórter: Isso não está acontecendo, então. É mentira dos promotores que visitam a Febem constantemente? Covas: Não sei se é mentira ou é verdade. Estou te dizendo o que é. Agora, se alguém mentir em torno disso não é meu problema, não é... Repórter: Essa informação foi dada pelos promotores que visitam... Covas: Então, você vai ter de escolher em quem você acredita. Se quiser acreditar nos promotores vai continuar dizendo isso, mas eu posso te mostrar. Posso mostrar um alojamento que já está até com as coisas dos meninos lá dentro. Tudo que cada um deles têm, roupas, moletom que usam, mais sabonete, xampu, estão lá. Repórter: Tudo que o senhor podia fazer pela Febem o senhor afirma que já pôde fazer. O senhor se sente frustrado, governador, de fazer transferência... Covas: Nem tudo eu pude fazer. Gostaria que esse problema já estivesse superado, mas não está, não. Não está e ainda vai dar muito trabalho. Algum desse trabalho é até compreensivo, se tem, a gente enfrenta, o que vai se fazer? Mas não dá para imaginar que é só a gente querer fazer assim e as coisas acontecerem. Não acontece mesmo!. Vocês já entraram nas celas com os meninos? Não entraram? Pois eu aconselho que entrem. Eu até indico para vocês. Repórter: Eles não permitem que a imprensa tenha acesso... Covas: Eles me permitiram! Mas que acesso? Não se identifique e pronto, ninguém vai saber que você é da imprensa. Vai lá dentro, eu fui lá. Aliás, eu vou em todas. Eu entrei numa cela... Repórter: Mas o Governo não permite que a gente entre... Covas: O Governo permite sim. Eu já até dei entrevista para vocês lá dentro. Repórter: Mas só quando o senhor vai... Covas: Conversa! Aquilo não pode ser mesmo um lugar onde, cada pessoa que chegue lá, entre pela porta adentro. Aquilo é uma instituição onde tem gente privada da liberdade. Não pode ser um lugar que se entre e saia à vontade.

05/08/2000


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