Estudo analisa comportamento da brasileira frente à Aids



Para 6 de cada 10 mulheres brasileiras, o contato com o HIV pode ocorrer, exclusivamente, por meio de um parceiro estável. Os dados são da pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo e pelo Sesc, publicados no livro Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado, lançado em agosto. Para o estudo, foram entrevistadas 2.365 mulheres e 1.181 homens maiores de 15 anos, de áreas urbanas e rurais de 25 unidades da Federação. A coordenadora do Núcleo de Apoio a Gestão de Projetos da Fiocruz Brasília (NUGP), Dulce Ferraz, em parceria com o pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) Alexandre Grangeiro, foram convidados para fazer a análise de dados da pesquisa na identificação dos aspectos que podem expor as mulheres à infecção pelo HIV e sua contribuição para a dinâmica da epidemia no país. O resultado da análise está disponível no livro e se insere no tema mulheres brasileiras: sexualidade e prevenção.

De acordo com a pesquisa, 91% das mulheres brasileiras a partir de 15 anos já iniciaram a vida sexual, que em geral se caracteriza por parcerias afetivas estáveis. Os resultados apontam mudanças na maneira como este grupo tem experimentado a vida afetiva e sexual ao longo dos anos. Segundo a análise, as novas gerações iniciaram a vida sexual cerca de dois anos mais cedo que suas mães e avós, o que indica parte da mudança do papel da mulher na sociedade e da sua própria autonomia frente à sua vida sexual.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a epidemia de Aids no Brasil é concentrada. A classificação é feita levando em consideração as epidemias que, na população geral, o percentual de pessoas infectadas é inferior a 1%, e que em alguns grupos da população extrapola 5%. É o caso do Brasil, onde na população geral a prevalência é de 0,6% e chega a 10% entre os homossexuais, grupo com maior incidência, e 5% entre os profissionais do sexo e usuários de drogas. Tanto o aumento de casos entre mulheres jovens como a concentração da epidemia em grupos estigmatizados e discriminados refletem a intensa relação entre a aids e as desigualdades sociais.

A maioria dos casos de mulheres infectadas com o HIV no Brasil (80%) acontece por meio de relações sexuais heterossexuais. A maior vulnerabilidade ocorre na faixa etária de 13 a 19 anos. Para Dulce, a negociação sobre como se proteger é complicada. ”Camisinha, em maioria, é usada pelo homem, afinal, o preservativo feminino é pouco disponível no País, explica. Ela acrescenta que a distribuição do preservativo feminino é feita para segmentos específicos de mulheres. Isto torna a proteção da mulher dependente da negociação com o homem. A capacidade ou a habilidade que cada mulher tem de fazer isso depende muito do contexto de vida dela. Isso é crucial para o avanço na prevenção", completa.

Os resultados também apontam que, na última relação sexual deste grupo, o uso do preservativo foi de 28%. A maior frequência do não uso foi observada entre mulheres de 45 anos ou mais (82%), mulheres com escolaridade até o Ensino Fundamental (81%), com renda familiar de até um salário (80%), casadas (86%), com filhos (79%), que tiveram a última relação com parceiro estável (78%), e que usaram outro método contraceptivo (64%). A pesquisa encontrou ainda associação entre não uso do preservativo e o tipo de vínculo com o parceiro, escolha contraceptiva, avaliação da inserção da mulher na sociedade, exposição à violência e prática religiosa.

Dulce destaca que a política de enfrentamento da Aids entre mulheres e entre outros grupos tem se pautado pela ação intersetorial. "Qualquer ação que vise reduzir a aids entre mulheres tem que pensar no contexto em que as infecções ocorrem. As campanhas precisam ser orientadas pela realidade das relações sexuais e afetivas da maioria das brasileiras e as abordagens nos serviços de saúde devem buscar conhecer como essas realidades se expressam na singularidade da vida de cada mulher”, afirma. Para ela, o assunto precisa ser conversado publicamente e mais informações precisam ser disseminadas, para que as pessoas possam tomar decisões de como se prevenir conhecendo cada método de acordo com a necessidade da sua vida.

Do ponto de vista das políticas públicas, outra questão destacada pela coordenadora é a necessidade de se trabalhar a associação entre a prevenção da Aids e a contracepção. ”O uso do preservativo é fortemente determinado pela escolha que as mulheres fazem do método contraceptivo. Por exemplo, incentivar o uso da camisinha como método contraceptivo, assegurando acesso à contracepção de emergência nos casos de falha do preservativo”.

Violência

A pesquisa analisada por Dulce identificou, que a cada 10 mulheres, 4 narram ter sido vítimas de violência praticada por um homem. O principal agressor é um parceiro afetivo - marido, ex-marido, namorado ou ex-namorado-, responsáveis por 93% das agressões de cerceamento, ou seja, que limitam a autonomia da mulher de alguma maneira, 89% da violência física e 81% do assédio. “Ter sofrido violência psíquica e verbal levou ao aumento da chance de as mulheres não usarem o preservativo”, explica.

Lançamento

O livro "Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado", que traz a análise da pesquisa, tem 26 capítulos escritos por 36 autores. A publicação teve dois pré-lançamentos em setembro do ano passado, no Seminário Fazendo Gênero em Florianópolis, e no 37º Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs) em Águas de Lindoia, São Paulo. A publicação está disponível em livrarias e há dados da pesquisa disponíveis no site da Fundação Perseu Abramo.

Fonte:

Fundação Oswaldo Cruz




08/01/2014 15:21


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