FH espera transição tranqüila









FH espera transição tranqüila
Presidente afirma que candidatos falaram o que governo queria ouvir

BRASÍLIA - A série de encontros inéditos do presidente da República com os quatro principais candidatos ao Planalto foi protocolar. Todas as partes seguiram o roteiro previsto, dentro da cautela que o momento exigia. Nenhuma das partes deixou a reunião sem adequar-se ao próprio figurino, explicitados nos discursos, entrevistas e notas lidas. Cada uma, convenientemente diferenciada. “Isso é da eleição. O encontro foi muito positivo”, opinou o anfitrião Fernando Henrique, classificando o fato de “prova de maturidade”. O líder das pesquisas, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), não fez críticas duras ao acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que julgou inevitável diante da crise atual. O segundo colocado, Ciro Gomes (PPS), também não condenou no acordo, embora também guarde reservas. José Serra repetiu os elogios que já havia expressado. Apenas Anthony Garotinho (PSB) adotou retórica radical contra o FMI. O presidente reconheceu a importância do ato na história democrática do país.

O discurso na saída foi de acordo com as conveniências eleitorais, com propostas pontuais feitas por Lula e Serra para manter a economia estável até o final do ano. Na conversa com o presidente, os quatro candidatos disseram o que o governo queria ouvir.

Eles prometem cumprir as metas de austeridade fiscal, se ganharem a eleição de 6 de outubro. E estão de acordo com os termos dos contratos firmados pelo atual governo. ''O acordo permite uma transição tranqüila, seja quem for o novo presidente'', disse o presidente, após quase cinco horas de conversas no Planalto.

O presidente lembrou que é ele, de fato, o fiador dos termos dos acordos. ''Quem tem que dar apoio explícito (ao acordo) sou eu. O que eles tem que dizer é: feito um contrato, vão honrar? Todos disseram que vão'', lembrou. Fernando Henrique declarou que os termos das negociações com o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial (Bird) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) foram explicados aos quatro presidenciáveis.

As três instituições garantirão os US$ 37 bilhões para o Brasil honrar os compromissos financeiros neste e nos próximos anos. ''Disse aos ministros que não poupassem detalhes. E os memorandos dos acordos serão encaminhados a todos'', declarou.

O presidente reiterou a disposição do governo. ''Mostramos que fizemos um acordo nas melhores condições possíveis. A situação financeira está sob controle'', completou. O presidente estava acompanhado dos ministros Pedro Malan (Fazenda), Euclides Scalco (Secretaria Geral da Presidência) e do presidente do Banco Central, Armínio Fraga.

Fernando Henrique citou textualmente declarações feitas por Lula e Ciro de que não iriam negar-se a dar continuidade aos termos do acordo. ''O grande desembolso dos recursos será no ano que vem e não há nenhum outro compromisso a não ser o superávit primário de 3,75%'', comentou. ''E essa meta já foi aprovada pelo Congresso Nacional''.

Os pedidos feitos por Lula e Serra, para que o governo abra linhas de crédito de olho no comércio exterior antes das eleições, como forma de minimizar os efeitos da crise, foram assumidos pelo presidente. ''O Banco Central anunciou hoje (ontem) que terá US$ 2 bilhões de linha de crédito. E o BNDES pode fazer o mesmo'', disse. Ele disse que Malan vai estudar outras medidas, como os efeitos dos aumentos do preço do pão, apontadas por Serra.


Cúpula do FMI ignora encontro
A vice-gerente-geral do Fundo, Anne Krueger, disse que caso brasileiro ''já foi resolvido''

WASHINGTON, EUA - A cúpula do Fundo Monetário Internacional (FMI) não acompanhou os encontros do presidente Fernando Henrique Cardoso, ontem, com os candidatos ao Palácio do Planalto. Diretores da instituição estão em férias, gozando o tradicional recesso de verão.

O FMI só volta a funcionar integralmente no dia 26 de agosto e deverá agendar para o começo de setembro a reunião para oficializar o pacote de US$ 30 bilhões ao Brasil. Única diretora da instituição que se encontra em Washington, a vice-gerente-geral do Fundo, Anne Krueger, dedicou-se hoje a outras finalidades.

Um de seus assessores comentou que o caso brasileiro ''já foi resolvido'' com o anúncio do pacote e que Krueger não pediu relatórios sobre os encontros em Brasília. O FMI teria ficado satisfeito com a explicação da equipe negociadora brasileira de que o pacote tem apoio dos candidatos à Presidência.

A única preocupação do Fundo Monetário Internacional é de outra natureza: a reação fria dos mercados ao anúncio do novo empréstimo. Apesar de a aprovação do acordo ser virtualmente certa, a chefia do Fundo teme que diretores-executivos da instituição questionem por que os anúncio dos US$ 30 bilhões não estimularam os mercados a retomarem investimentos ao Brasil.


Ciro ameniza críticas
Candidato se encontra com FH e diz que vai analisar termos do acordo com FMI

BRASÍLIA - O candidato da Frente Trabalhista, Ciro Gomes, saiu satisfeito do encontro com o presidente Fernando Henrique para discutir o acordo com o FMI. ''Foi uma ótima reunião de trabalho'', afirmou. O candidato conseguiu cumprir à risca a estratégia que tinha elaborado com sua assessoria. O pronunciamento que fez ao fim da reunião havia sido esboçado na véspera.

Apesar da agenda cheia de compromissos políticos, Ciro e seus assessores conseguiram manter suspense sobre o encontro no Planalto. ''Tudo que eu tinha para dizer estava no meu pronunciamento. Minhas palavras não têm sido muito bem recebidas, até mesmo por desonestidade dos adversários'', disse Ciro.

No Salão Leste do Planalto, Ciro disse que lamentava o acordo com o FMI, apesar de saber que ele era inevitável. Mas o candidato afirmou que só tomará uma posição definitiva sobre o empréstimo depois de conhecer todos os termos do acordo.

''Divulgarei uma nota depois de analisar os documentos oficiais'', afirmou. Ciro garantiu que a reunião selou seu compromisso com a austeridade fiscal e com o superávit primário determinado na Lei das Diretrizes Orçamentárias, de 3,75%. O discurso de Ciro foi ameno.

''A crise deve-se em parte a um modelo econômico no qual bato há sete anos'', disse Ciro. O candidato da Frente Trabalhista estava acompanhado por seus dois assessores econômicos: Mangabeira Unger e Mauro Benevides Filho.

No meio da tarde, o coordenador econômico do programa de Ciro, Luiz Rabi, ligou para os assessores que acompanhavam o candidato. Contou que o dólar estava caindo e que a bolsa de valores de São Paulo mantinha-se estável. ''Vou falar agora para Ciro. Demos nossa contribuição para acalmar o mercado'', comemorou um assessor.

Depois da reunião com o presidente Fernando Henrique, Ciro se encontrou com os presidentes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Rubens Approbato, e do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello. O candidato considera ''fundamental'' que fique bem claro o ''respeito'' que tem pela Justiça''.


Garotinho: reunião foi inútil
Na saída, ex-governador afirma que o encontro com FH não acrescentou nada Folha Imagem

BRASÍLIA - Crítico do acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), o candidato do PSB, o ex-governador do Rio Anthony Garotinho preferiu sair do Palácio do Planalto antes de comentar o encontro de ontem com o presidente Fernando Henrique Cardoso.

Não é por menos. Garotinho ouviu uma explicação sobre os termos do acordo e a avaliação do presidente e da equipe econômica de que o período eleitoral está favorecendo a especulação contra o país. Ainda assim, entregou a Fernando Henrique uma carta recheada de ad jetivos, classificando de ''fracassada'' a política econômica do governo, de ''medíocre'' o crescimento e de ''humilhante'' crise energética que levou o país ao racionamento.

O texto traz também algumas sugestões genéricas, como a necessidade da reforma tributária, da redução dos juros e do aumento de créditos para exportações. ''O encontro não acrescentou nada'', afirmou Garotinho. Ele explicou que preferiu sair do Palácio antes de atender os jornalistas ''porque não queria ser desagradável ou mal educado na casa do presidente''.

O ex-governador do Rio limitou-se a distribuir uma nota logo à imprensa depois da reunião com Fernando Henrique. Nela, lamenta ''a trágica necessidade do empréstimo'' e afirma que ''nenhum acordo firmado pela atual administração, em decorrência de sua desastrosa política econômica, pode comprometer o futuro governo''.

No entanto, garante que se as exigências do FMI se limitam à manutenção do superávit primário de 3,75% do PIB, não vê problemas para cumprir o acertado.

Apesar das críticas, Garotinho diz que o encontro foi agradável. O tom ácido dos documentos não fez parte da conversa, na qual Garotinho e seus acompanhantes fizeram basicamente duas ponderações: o risco de queda nas reservas internacionais e a ''politização'' da crise econômica.

''A responsabilidade pela grave crise é clara, inequívoca e intransferível'', afirmou Garotinho, referindo-se à política econômica do governo. ''Não aceitamos a prerrogativa de que o processo eleitoral é que está criando problemas'', disse aos jornalistas o vice-presidente do PSB e integrante da coordenação da campanha de Garotinho, Roberto Amaral.


Serra discute alta do dólar com FH
Candidato tucano aproveita encontro com presidente para pedir pacote de medidas populares

BRASÍLIA - O tucano José Serra já conhecia bem o acordo com o FMI. O presidente Fernando Henrique abriu a reunião elogiando o desempenho do candidato na disputa pelo Palácio do Planalto. ''Estou gostando da sua performance na campanha'', disse. Em seguida, Malan e o presidente do Banco Central, Armínio Fraga, fizeram exposição do acordo com o Fundo Monetário Internacional. Embora conhecesse os pontos, o presidenciável fez anotações em fichas.

Serra aproveitou a reunião com o presidente Fernando Henrique para pedir um pacote de medidas populares, que possam alavancar sua posição nas pesquisas. A primeira é evitar o repasse automático dos aumentos do dólar para o pão de 50 gramas. Serra pediu ao governo para contrabalançar a alta do dólar nos preços do trigo ''para não refletir no preço do pãozinho''. O ministro da Fazenda, Pedro Malan, prometeu estudar uma medida para evitar o impacto.

O candidato tucano sugeriu, ainda, que os produtos essenciais afetados pela moeda americana sejam protegidos da desvalorização cambial. Malan prometeu encontrar ''uma saída antes das eleições'', principalmente para o trigo importado.

A segunda proposta é a aprovação do Projeto de Lei que retira a ''cumulatividade'' na cobrança do PIS. O presidente alegou que vai esperar o próximo esforço concentrado do Congresso, mas Serra apoiou a possibilidade da minirreforma tributária ser baixada por Medida Provisória.

No terceiro ponto, o presidenciável solicitou a inclusão de 80 mil pequenas e médias empresas nos benefícios do Programa de Refinanciamento com o Fisco (Refis). O quarto ponto foi a abertura de uma linha de crédito à exportação e reabertura das linhas de financiamento aos exportadores.

O ponto mais comemorado foi a taxa de juros do empréstimo. A média é de 5,27% ao ano. ''É acordo de mãe para filho'', disse Malan na reunião. ''Não tenho dúvida'', respondeu Serra. ''O acordo é bastante positivo. Não implica sacrifício adicional para a economia e aumenta a segurança econômica em relação ao nosso futuro'', complementou o candidato, após o encontro, na entrevista coletiva. Na pesquisa DataFolha, o candidato tucano aparece tecnicamente empatado com Anthony Garotinho (PSB), com 13% e 12%, respectivamente.


Jorge Roberto sai em busca de votos petistas
Para candidato do PDT, eleitor do PT não vota em Rosinha

Candidato da Frente Trabalhista ao governo do Estado, Jorge Roberto Silveira vai intensificar, nos próximos dias, os seus contatos com os líderes petistas na expectativa de obter apoio caso chegue ao segundo turno. O ex-prefeito de Niterói trabalha com a informação de que ''expressivos setores do PT não votarão em Rosinha Garotinho em nenhuma circunstância, ainda que este voto seja o mais interessante para a eleição presidencial, pois Lula quer o apoio de Garotinho''.

Para o ex-prefeito de Niterói, o candidato petista à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, receberá o voto do candidato do PSB, Anthony Garotinho. Em contrapartida, deverá pedir que militantes do Rio apóiem Rosinha no Estado, caso Benedita da Silva, candidata à reeleição, não esteja presente no segundo turno.

''Rosinha atingiu o teto de na preferência do eleitorado e ainda não começou a sofrer as conseqüências de tudo de ruim que aconteceu no governo do marido dela. Este desgaste ainda está na conta da Benedita'', analisa Jorge Roberto. Sua afirmação é apoiada na pesquisa Datafolha, divulgada ontem. Ela mostra a ex-primeira-dama do Estado com 44 pontos percentuais nas intenções de voto do eleitorado fluminense. Nesta mesma aferição, Jorge Roberto aparece com 19%. Com 10%, o nível de rejeição ao seu nome, no entanto, é o menor entre os quatro principais concorrentes ao Palácio Guanabara. Já 18% dos eleitores afirmam não votar ''de jeito nenhum'' na candidata do PSB.

''No primeiro turno, o cidadão escolhe o candidato de sua preferência. Mas no segundo, vota pela exclusão, para derrotar quem não quer ver no governo de forma alguma. Além do mais, o PT tem uma relação excepcional comigo, a ponto de o meu vice-prefeito, atual prefeito de Niterói, ser um dos principais líderes do PT'', completou Jorge Roberto, que vê nesta equação a possibilidade da sua vitória sobre a adversária do PSB.


Solange conta com TV para reviravolta
A candidata ao governo pela Frente Todos Pelo Rio (PFL-PMDB-PSDB), Solange Amaral, começa amanhã a apostar suas últimas fichas na tentativa de reverter os baixos índices de sua candidatura nas pesquisas. Pesquisa DataFolha, divulgada ontem, aponta a pefelista em quarto lugar, com 6% das intenções de voto.

Aparentando confiança, Solange disse que os oito minutos de aparição na TV serão suficientes para apresentar seu plano de governo. Para reforçar a canidatura, um depoimento do presidente Fernando Henrique Cardoso será exibido logo no primeiro programa. ''O destaque será sempre o programa de governo, focalizando segurança, emprego e jovens. Não há ataque aos adversários'', afirma o produtor Marcelo Maia.
A candidata fez ontem um corpo-a-corpo, que reuniu centenas de pessoas, na Zona Oeste da capital. ''A partir de amanhã, vamos ter condições de conversar com milhões de pessoas através da TV. Tenho a certeza de que as pessoas, nos conhecendo, vão nos dar um voto de confiança'', disse ela.


Artigos

Estamos salvos
Jarbas Passarinho

Os candidatos viáveis à Presidência da República deixam entrever o que seria cada um deles no poder, se cumprissem suas propostas. São todos de centro-esquerda, ou, segundo Mangabeira Unger, ''dada uma imensa confusão ideológica, todos fingem ser''. Discrepâncias à parte, cresce a nossa euforia ao ler o que propõem generosamente. Confiantes, imitamos o salmista. Nas mãos deles depositaremos nosso destino.

Em todas as pesquisas dos institutos de sondagem os entrevistados apontam o desemprego entre as principais chagas da nossa sociedade. Não será mais assim. Lula ga rante criar 10 milhões de empregos. Como sabe que isso depende visceralmente do crescimento do PIB, argumenta com o passado em que o nosso crescimento gerou pleno emprego. Se tivesse continuado - afirma - o Brasil teria hoje a renda per capita igual à da Espanha. Para não comprometer-se com o período militar - mancha de que se arrepende Ciro - dilui o crescimento entre 1950 e 1980. No período do ''milagre'', os investimentos geraram o crescimento que gerava empregos. Logo, é só repetir a receita. ''Elementar, meu caro Watson''... Infelizmente, ele sabe o que o espera, a julgar por 2003, quando pouco sobrará no Orçamento para investimento. Por que, porém, toldar a radiosa promessa com lembranças inconvenientes? É confiar, pois Lula disse: ''Eu sei o que quero para o país e sei o que o país quer''. Não basta emprego. Vai, também, desonerar a exportação, baixar os juros e combater os especuladores, o que prova a visita à Bolsa de Valores, onde se ganha dinheiro com o abundante suor do rosto dos portadores de títulos cambiais. Duro crítico da globalização, obrigará os países ricos a abrirem seus mercados para nós, sem taxar nossos produtos, o que inviabiliza nossas exportações. Ótimo! Forçará a concordância do presidente Bush, do Senado americano e dos governos europeus, o que FHC não terá feito por tibieza.

Serra, um pouco mais modesto, reduz de 10 milhões para 8 milhões a promessa de novos empregos. Economista competente, corrigirá a política econômica e fará crescer o PIB, acima da média modesta de 2,5% do reinado tucano. Elogia o tempo do ''milagre''. Reconhece que ''nos anos 70, tivemos um aumento do PIB superior a 100%, o maior crescimento da historia''. Viva o Delfim! Ademais, construirá milhões de casas para os sem-teto, sem risco do fracasso do BNH.

Os trabalhadores aposentados (mais de 13 milhões na Previdência Social) ganham um salário mínimo, depois de 35 anos de contribuição. Não tiveram a sorte de Lula, cuja aposentadoria passa de 2 mil reais/mês. Garotinho, o socialista (!), prometeu fazer chegar o salário mínimo a 400 reais. Ciro Gomes, mais contido, vai igualá-lo a 100 dólares. Aumentará o rombo da Previdência, mas tem solução. Verá acabar-se o seu drama de mais de 40 bilhões de reais de déficit. Principalmente na Presidência de Ciro Gomes, que assegura realizar o ambicioso resultado ''mudando o foco do financiamento de fora para dentro, condição número um do êxito civilizatório''. Fácil de entender, não é? Guarda para si o como fazer essa mudança, que passa por uma economia de escala, mas confiamos em sua inteligência.

Os pobres terão sua vez, afinal. Lula acena com a garantia de acabar com a fome de 30 milhões de excluídos. Uma bela promessa, que começa por assegurar três refeições, no mínimo, por dia, para as crianças nas escolas públicas.

Como se vê, estamos salvos! Os juros serão baixos, a fome dos indigentes acabará, nossa renda per capita será européia, os ricos serão chamados à fala em nome da globalização simétrica, a Previdência será superavitária, as casas abrigarão milhões de pobres que não as têm, os aposentados farão poupança e o FMI mudará, pois será ele que virá pedir emprestado a nós, ao alcançarmos o ''êxito civilizatório''...


Colunistas

COISAS DA POLÍTICA – Dora Kramer

O condutor e os passageiros
Ganhando ou perdendo o voto que dará como cidadão no dia 6 de outubro, ontem ficou mais uma vez reiterada a condição que se impôs o presidente Fernando Henrique Cardoso de condutor da própria sucessão.
Continua levando a termo a intenção de não se deixar engolir pelo processo eleitoral nem viver seus últimos meses de governo como mero coadjuvante dos postulantes ao posto que ocupou durante oito anos.

Se do encontro com os candidatos à Presidência da República resultou ganho político para alguém, foi justamente para FH. Pelo simples fato de que cumpriu seu objetivo principal: obter dos candidatos que mais dúvidas despertam no mundo financeiro o compromisso explícito com a manutenção da estabilidade, o controle dos gastos públicos e o respeito aos contratos internos e externos em andamento.

Ciro Gomes e Luiz Inácio Lula da Silva fizeram, ao final das respectivas conversas, pronunciamentos em que o fundamental foi o estabelecimento de seus compromissos com aqueles pontos. Sempre se poderá dizer que não falaram nada de muito diferente daquilo que vêm dizendo.

Mas não resta dúvida de que, dito dentro do Palácio do Planalto, logo após encontros com o presidente da República e todo o oficialismo que cerca o gesto, os discursos têm peso de credibilidade muito maior. E era exatamente isso o que o atual governo precisava para amenizar os efeitos das turbulências econômicas resultantes dos nervosismos eleitorais.

Anthony Garotinho distribuiu uma nota sem referência alguma àqueles itens, limitando-se a um palavrório contra o acordo com o FMI, o que, no que tange à objetividade dos fatos, tem conseqüência zero. Não é com ele que o chamado mercado está preocupado.

Quanto a José Serra, também não conferiu destaque ao seu apoio à estabilidade, aos gastos públicos ou aos contratos. Pela evidência de que não há dúvida sobre suas posições relativas a esses pontos. Candidato do governo, comportou-se como porta-voz da defesa dos termos do acordo com o FMI.

Mas não deixou também de aproveitar a oportunidade para apresentar-se numa condição propositiva ao elencar quatro pontos, na visão dele, de solução urgente: o preço do trigo para evitar o aumento do pão e antecipadamente não deixar que se repita o desastre eleitoral da elevação do preço do gás de cozinha; a aprovação de uma minirreforma tributária; a extensão dos prazos e amplitude para adesão das pequenas e médias empresas ao refinanciamento de dívidas tributárias; o aumento de créditos à exportação.

Nesse aspecto, revelou-se bastante mais objetivo que Lula, que leu um documento de propostas excessivamente detalhadas e de execução de longo prazo. Falava a respeito do próprio programa de governo, que não estava em jogo ali.

Dele e de Ciro o que se pretendia era o compromisso com a agenda mínima dos pressupostos básicos, em vigor no resto do mundo. Se, respeitados esses pré-requisitos, cada um deles pretende, se eleito, implementar políticas com variáveis diferentes, tudo certo. Pelo menos para a contramão do universo garantiram que não vão conduzir o Brasil.

Nesse sentido foi que fizeram o que se esperava que fizessem, sem a necessidade de mostrarem-se como avalistas das políticas em curso, respeitando as próprias identidades como candidatos. Ninguém curvou-se a ninguém, mas também não foram agredidos os fatos nem desrespeitadas as instituições.

Ao evitarem responder a perguntas, optando por pronunciamentos formais, os candidatos abstiveram-se também de incorrer no risco de, por algum deslize verbal, atacar o presidente da República dentro do Palácio do Planalto. Dito assim parece pouco, mas não é.

Quando pretendentes ao posto de chefe da nação respeitam desde os símbolos da República - e a sede do governo é um deles - até a figura daquele que foi eleito pelo voto popular, cuja delegação termina apenas no fim de dezembro, francamente, mostram-se no mínimo à altura dos votos que receberão.

É claro que Serra contou com a vantagem de, pelo fato de apresentar-se em campo amigo e conhecido, transmitir a impressão de que cenário e personagem estavam em perfeita consonância de forma e conteúdo.
Mas o episódio em si não terá o poder de somar nem subtrair votos de ninguém. Por isso mesmo é que, sem medo de errar, pode-se afirmar que não houve perdas nem ganhos imediatos.

Para razões de biografia e manejo de assuntos governamentais, saiu-se bem o anfitrião, que convidou, soube receber e, se não está com o mandato em jogo, tem a difícil tarefa de não se arriscar, no meio do maremoto, a perder o controle da embarcação.

Nem que para isso, por vezes, se mostre mais empenhado em descer bem a rampa do Planalto do que em garantir que no trajeto de subida José Serra cruze com ele no caminho.


Editorial

AURA HISTÓRICA

O primeiro passo para a transição de governo foi dado ontem no Palácio do Planalto: o presidente da República recebeu os quatro candidatos mais bem situados nas pesquisas sobre a eleição de 6 de outubro. A iniciativa cercou-se de uma aura histórica por ser a primeira no gênero e pelo significado explícito: extingue-se o costume que fazia da contestação da vitória pelo derrotado pretexto para questionar a voz das urnas e semear crises políticas e institucionais. A cultura do golpismo retardava o exercício do poder pelo novo governo.

A iniciativa do presidente Fernando Henrique, ao avistar-se pessoalmente com os principais candidatos, passa a ser a comprovação de que a democracia brasileira não se restringe ao crescente número de eleitores mas à qualidade e à maturidade da vida política.

A vontade dos cidadãos expressa nas urnas paira acima das divergências de programas e idéias, e se torna sagrada. O presidente levou ao conhecimento dos candidatos os termos da negociação com o FMI para proteger o Brasil de ataques especulativos no início do próximo governo, preservando a continuidade administrativa. A proposta de organizar a transição abrevia a desaceleração do governo que termina e adianta tempo para o governo que entra. O maior efeito do encontro se fez sentir antecipadamente na opinião pública, pela responsabilidade cívica com que os candidatos atenderam ao convite presidencial.

Com Ciro Gomes, Luiz Inácio Lula da Silva, Anthony Garotinho e José Serra o Brasil pisa num novo patamar cívico.


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08/20/2002


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