Gravação devolve eixo às investigações







Gravação devolve eixo às investigações
Deputados identificam na conversa de Diógenes com Tubino ligação do governo com jogo do bicho

A 20 dias do prazo para a conclusão dos trabalhos, a CPI da Segurança Pública se encaminha para aprovar um relatório vinculando o governo do Estado ao jogo do bicho.

A suspeita foi levantada na CPI em 17 de maio e vinha perdendo força com a confirmação de empresários de que, mesmo sem saber, contribuíram para o pagamento do prédio cedido ao PT pelo Clube de Seguros da Cidadania.

Na sexta-feira, a CPI exibiu a primeira prova de que houve um pedido de não reprimir o jogo do bicho para não prejudicar as relações dos contraventores com o PT. O pedido foi feito no início de 1999 ao delegado Luiz Fernando Tubino, à época chefe de Polícia, pelo presidente do Clube de Seguros da Cidadania, Diógenes de Oliveira, secretário dos Transportes na administração de Olívio Dutra na prefeitura de Porto Alegre, de 1989 a 1992. Diógenes dizia falar em nome do governador Olívio Dutra.

A suposta ligação com o jogo do bicho não figurava entre os 12 itens alinhados no requerimento de criação da CPI, instalada em 18 de abril. O tema só surgiu um mês depois, em 17 de maio, mas esbarrou na falta de provas. A CPI tangenciou diversos assuntos, como a crise no Instituto-Geral de Perícias, irregularidades na compra de material de limpeza para escolas, duplo emprego de policiais em empresas de segurança privada e o financiamento da campanha do PT.

Em junho, a CPI foi sacudida por um pedido de inclusão do ex-tesoureiro do PT Jairo Carneiro dos Santos no programa de proteção a testemunhas. Santos havia procurado jornalistas do Diário Gaúcho para dizer que o jogo do bicho financiara o pagamento da sede do PT, prédio comprado pelo Clube de Seguros da Cidadania. Convocado a depor, Santos negou tudo. Disse que mentira para se vingar do PT que o expulsou sob acusação de desvio de recursos.

Apesar do desmentido, os deputados decidiram seguir a trilha aberta por Jairo e pediram a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico do Clube da Cidadania, de seus dirigentes e de empresas vinculadas. A tentativa de impedir a quebra de sigilos na Justiça fracassou, mas somente uma parte dos documentos chegou à CPI até agora.

Depois do recesso, a CPI voltou a esquentar com os depoimentos dos doadores do Clube da Cidadania listados por Diógenes num relatório encaminhado ao Ministério Público. A maioria confirmou as doações, mas alguns disseram não saber que o dinheiro seria usado no pagamento da sede do PT. A bancada petista identificou na confirmação das doações a prova de que as denúncias de envolvimento com o jogo do bicho eram falsas.

A apresentação da fita, cuja existência era cogitada mas nunca confirmada, obrigou o Palácio Piratini a mudar, inclusive, sua estratégia de reação às denúncias da oposição. Em vez de escalar um secretário para a defesa, o próprio governador entrou em campo pela primeira vez para tentar apagar o incêndio. Disse que colocaria as duas mãos no fogo pelo PT, por seus integrantes, pela direção e pela sua conduta.

A onda de embasar denúncias em gravações, clandestinas ou não, que já custou o mandato de senadores e ministros, chegou ao Rio Grande do Sul. E atingiu o partido que mais valoriza gravações em denúncias contra seus adversários.

DEZ PERGUNTAS AINDA A RESPONDER
1) Por que o ex-tesoureiro do PT Jairo Carneiro disse ao Diário Gaúcho que a sede do partido, na Avenida Farrapos, havia sido comprada com dinheiro do jogo do bicho?
2) Por que o ex-tesoureiro do PT, depois de pedir sua inclusão no programa de proteção a testemunhas, disse que havia mentido nas conversas que manteve com os jornalistas do Diário Gaúcho?
3) Por que o ex-tesoureiro disse que mentira aos jornalistas três horas depois de seu celular receber uma ligação originada na sede do PT?
4) Como o Clube de Seguros da Cidadania quitou o prédio do PT em 1998 sem ter recursos para tanto?
5) Por que o pagamento pela sede foi feito em dinheiro vivo?
6) Por que a quitação foi antecipada?
7) Por que Diógenes Oliveira procuraria o chefe de Polícia para dizer que o governo tinha boa relação com o jogo do bicho e que a atividade não deveria ser reprimida?
8) Por que dinheiro doado ao PT, segundo empresários, foi usado na prestação de contas do Clube da Cidadania?
9) Por que empresários fariam doações para a campanha do PT depois da eleição?
10) O que significa “relação muito boa, muito estreita com esse pessoal do Carnaval e do jogo do bicho”, segundo definição de Diógenes?

A CRONOLOGIA DA CPI
25 de março de 1999
O deputado Frederico Antunes (PPB) pede a instalação de uma CPI para apurar denúncias de perseguições dentro da Brigada Militar. Em maio do mesmo ano, o PPB apresenta proposta uma proposta para ampliar o pedido e instalar uma comissão que investigue os problemas na área da segurança pública.
15 de março de 2000
AAssembléia Legislativa instala a CPI do Crime Organizado, não aceitando a proposta dos partidos de oposição que a investigação abranja também a segurança pública.
6 de setembro de 2000
Orelatório da CPI do Crime Organizado, aprovado pelo plenário da Assembléia, propõe a criação de uma CPI para investigar a política de segurança pública no Estado. O motivo apresentado foi o alto grau de comprometimento, no crime organizado, de integrantes do aparato da segurança pública. A CPI coletou 222 denúncias contra agentes policiais, e 31, contra delegados. Dos investigados, foram afastados para novas apurações um delegado e 35 agentes da Polícia Civil. Vários policiais integram a lista de 53 presos em função das revelações da CPI.
5 de abril de 2001
Depois de várias tentativas frustradas de deputados da oposição, a Procuradororia-Geral da Assembléia deu parecer favorável à instalação de uma CPI para investigar a área da segurança pública no Estado.
18 de abril de 2001
A CPI da Segurança Pública é formalmente instalada na Assembléia tendo o deputado Valdir Andres (PPB) como presidente e o deputado Vieira da Cunha (PDT) como relator.
11 de maio de 2001
Ojornal Diário Gaúcho revela a existência de inquérito que investiga pelo menos cinco deputados estaduais por suposto recebimento de doações de bicheiros para a campanha ao governo do Estado de 1998.
14 de maio
A CPI da Segurança Pública convoca quatro delegados da Polícia Civil para falar sobre o inquérito.
17 de maio
Os delegados Farnei Araújo Goulart e Nelson Soares de Oliveira prestam depoimento à CPI da Segurança revelando uma suposta ligação de bicheiros com o governo estadual.
17 de maio
O ex-tesoureiro do PT Jairo Carneiro dos Santos, expulso da sigla por desvio de dinheiro, em telefonema para a Redação do jornal Diário Gaúcho diz que tinha mais informações sobre o assunto.
18 de maio
Entre uma série de acusações, Jairo afirma a jornalistas do Diário Gaúcho que o Clube de Seguros da Cidadania teria recebido dinheiro do jogo do bicho para comprar um prédio, cedido depois em regime de comodato (empréstimo gratuito) para o PT. O depoimento foi gravado.
Maio de 2001
Conforme certidão 31.373 do 10º Tabelionato de Porto Alegre, no dia 8 de julho de 1998, o Clube de Seguros da Cidadania adquiriu o prédio. O valor foi R$ 310 mil, que deveriam ser parcelados, mas em dezembro de 1998 a compra foi quitada.
Junho de 2001
Para comprovar a compra do prédio por R$ 310 mil, o presidente do Clube de Seguros, Diógenes de Oliveira, apresenta uma lista de doadores, na qual constava que as doações feitas em 1999 pagaram o prédio, quitado em 1998. Depois, Diógenes substitui essa lista por outra e faz nova declaração à Rec eita Federal. As duas listas mostrariam que o Clube de Seguros pagou com doações legais o valor de R$ 310 mil pelo prédio. Em nenhuma das listas havia dinheiro suficiente para liquidar o valor do prédio na data em que foi adquirido.
18 de junho
Diante de alegadas ameaças de morte que Jairo dizia estar sofrendo, cópia do conteúdo da fita foi apresentada aos promotores Mauro Renner e Carlos Araújo.
18 de junho
Nesse mesmo dia, a cópia do conteúdo da fita foi entregue ao relator da CPI, deputado Vieira da Cunha (PDT). Se obtivesse proteção especial, Jairo se dispunha a depor oficialmente na CPI da Segurança.
25 de junho
O presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Jair Krischke, depõe na CPI. Krishcke apresentou denúncia de uma suposta ligação do governo gaúcho com a máfia internacional de exploração de jogos eletrônicos e videoloterias.
26 de junho
Já sob proteção do programa de testemunhas federal, Jairo concorda em prestar depoimento na CPI. À tarde, Jairo diz em depoimento na CPI da Segurança que havia mentido aos jornalistas do Diário Gaúcho. Disse ter feito isso para se “vingar” do PT por causa de sua expulsão.
18 de outubro
Jairo Carneiro dos Santos depõe pela segunda vez na CPI da Segurança Pública e reafirma ter inventado as declarações aos jornalistas. Mas não explica ligações recebidas de telefones do PT no dia do seu primeiro depoimento na CPI. Jairo recebeu em seu celular duas ligações: uma da sede do PT e outra do celular do atual tesoureiro do PT, Marcel Frison.
22 de outubro
O representante da empresa Marcopolo SA, Carlos Zignani, em depoimento à CPI da Segurança, nega que a empresa tenha feito qualquer doação ao Clube de Seguros da Cidadania, mas sim à campanha do PT. Os recibos, porém, são assinados por Diógenes de Oliveira e Janice Foschiera, trabalhadora voluntária do Clube de Seguros.
26 de outubro
A CPI da Segurança ouve o ex-chefe de Polícia do governo Olívio Dutra Luiz Fernando Tubino, que reconhece conversa gravada com Diógenes de Oliveira. No diálogo, Diógenes faz referência a ligações do governo com o jogo do bicho.


Um governo refém de fitas misteriosas
Possíveis gravações sempre fomentaram especulações



No meio da tarde de sexta-feira, o delegado Luiz Fernando Tubino, ex-chefe da Polícia Civil do governo de Olívio Dutra, recebeu um recado na sala anexa ao plenarinho da Assembléia Legislativa.

Tubino já estava no local há cerca de cinco horas. A sessão da CPI da Segurança Pública, que havia começado às 10h, estava interrompida. O delegado aguardava para ser acareado com quatro colegas.

– O Palácio ligou. Pediram para tu pegares leve – disse um interlocutor.

Tubino riu e respondeu:

– Eu não tenho nada para falar sobre isso. Não quero conversa com esse pessoal.

Poucos minutos depois do meio-dia, Tubino havia almoçado um sanduíche e um suco de laranja na companhia dos dois advogados que o acompanharam na sessão da CPI, César Peres e José Francisco de Oliveira Freitas. O assunto da refeição improvisada na sala foi um só: um CD que havia sido entregue ao relator da CPI, deputado Vieira da Cunha (PDT), na noite anterior.

O portador da encomenda foi o ex-deputado e ex-delegado Wilson Müller. Pelas informações preliminares divulgadas por Vieira no momento em que pediu a suspensão da sessão, o CD continha uma gravação que iria interferir na acareação entre Tubino e os quatro delegados. Por isso, precisava ser degravado antes do confronto.

Os quatro delegados disseram, em sessões anteriores da CPI, terem ouvido do ex-chefe a informação de que o dinheiro do bicho estava indo para obras assistenciais do governo. Como Tubino negava ter feito as declarações, foi providenciada a acareação para ver quem estava mentindo.

A existência do CD foi uma novidade para todos os presentes na sessão, menos para Tubino. Desde a terça-feira da semana passada (três dias antes da sessão de acareação), Tubino estava recebendo recados telefônicos: uma fita apareceria na CPI e o comprometeria. A todos os interlocutores, Tubino repetia a mesma frase:

– Não tem problema, podem tocar qualquer fita.

Desde que Tubino deixou o principal gabinete da Polícia Civil, em 3 de janeiro de 2000, a citação de seu nome foi constantemente acompanhada de histórias envolvendo fitas misteriosas. Muitos jornalistas e, principalmente, policiais e integrantes do governo asseguravam que o ex-chefe de Polícia havia gravado conversas entre ele e integrantes da cúpula governista. O teor dos diálogos seria sempre o mesmo: Tubino receberia ordens para não reprimir o jogo do bicho, já que a jogatina estaria sustentando obras sociais do governo petista.

A cada crise que surgia envolvendo a segurança pública (e não foram poucas nos últimos meses), a história da existência das fitas aparecia com mais força. E sempre que era indagado sobre o assunto, Tubino não confirmava. Também não negava. Apenas sorria.

Na quinta-feira à noite, quando Vieira recebeu a fita e mobilizou assessores e técnicos da Rádio Bandeirantes para melhorar a qualidade da gravação que seria apresentada na manhã seguinte, um sinal vermelho acendeu no Palácio Piratini. As famosas fitas de Tubino, consideradas quase como uma lenda, enfim, eram verdadeiras. E pelo menos uma delas revelaria em menos de 24 horas um diálogo entre Tubino e um dos coordenadores da campanha de Olívio, Diógenes de Oliveira. Na conversa, dizendo falar em nome do próprio governador, Diógenes relatou a Tubino as ligações perigosas dos caixas das campanhas petistas com o dinheiro do bicho.

Na sala com os advogados, antes de confirmar para os deputados que sim, era dele a voz no CD, dar detalhes do encontro com Diógenes e negar veementemente que tenha gravado a conversa, Tubino ouviu uma brincadeira:

– Com estas fitas tu podes pedir qualquer coisa do governo, até mesmo para comandar a Brigada Militar...

Rapidamente, Tubino respondeu:

– Nada disso, eu só quero paz.


Diógenes acompanhou carreira de Olívio
Presidente do Clube da Cidadania foi o articulador financeiro da campanha eleitoral do governador



Oficialmente, o tesoureiro de campanha do governador Olívio Dutra foi David Stival, futuro presidente estadual do PT. Na prática, porém, o papel de principal articulador financeiro da campanha coube ao presidente do Clube da Cidadania, Diógenes de Oliveira.

– Ele foi a peça-chave na arrecadação de recursos. Nada era feito sem a autorização do Diógenes. Ele ia pessoalmente visitar os empresários – conta um político do PT que acompanhou de perto a candidatura do governador em 1998.

Na gravação divulgada na sexta-feira, Diógenes diz ao delegado Luiz Fernando Tubino que está assessorando o governador Olívio Dutra “na área das relações empresariais”. A um amigo com quem conversou quando surgiram as primeiras denúncias contra o Clube da Cidadania, Diógenes disse que pedia dinheiro para a campanha aos empresários porque outras pessoas no PT tinham preconceito contra a ajuda “do capitalismo”. Nessa ocasião contou ter pedido dinheiro para quitar a sede do PT, comprada em prestações, porque a venda de seguros não deslanchou e de outra forma não teria como pagar a dívida.

A relação com Olívio vem de longa data. Dez anos antes da disputa pelo Palácio Piratini, Diógenes acompanhou o líder petista na campanha pela prefeitura da Capital. Uma das primeiras medidas do governo Olívio na prefeitura foi decretar a intervenção nas empresas de ônibus. Diógenes foi nomeado interventor da empresa Trevo. Pouco mais de 10 meses depois, foi promovido a secretário dos Transportes, sucedendo a Antônio Hohlfeldt (hoje vereador pelo PSDB), que não resistiu à crise da intervenção nas empresas de ônibus.

O novo titular assumiu a pasta num momento difícil para o setor, convulsionado pela intervenção. O transporte coletivo da cidade também enfrentava a carência de 596 novos ônibus para recompor a frota. A instituição do plus tarifário, ainda no governo Olívio, permitiu a renovação da frota.

Na posse de Diógenes, o auditório da secretaria ficou pequeno para o público. Conduzidos em um ônibus e num fusca, funcionários da empresa Transportes Coletivos Trevo Ltda compareceram para cumprimentar o ex-interventor. No auditório, abriram uma faixa onde se podia ler “Os funcionários da Trevo agradecem a colaboração dispensada”.

Além de parceiro político do governador, Diógenes manteve com Olívio também uma relação de amizade. Na campanha eleitoral de 1998, por exemplo, durante um almoço no Mercado Público, Olívio foi saudado pelo articulador financeiro com um poema declamado em tom emocionado. O filho do governador, Espártaco, foi levado por Diógenes para trabalhar no Clube da Cidadania.

O estremecimento da relação teria início no ano seguinte à eleição, com a composição do secretariado. Diógenes foi cotado para a pasta dos Transportes, que terminou ficando com Beto Albuquerque (PSB). O assessor foi nomeado vice-presidente da Agência de Desenvolvimento, mas terminou se afastando.

Alguns petistas avaliam que Diógenes “era o todo-poderoso” durante a campanha, mas que, alijado do primeiro escalão e com a perda de espaço político, passou a transitar por áreas obscuras da administração. Outra teoria para explicar a suposta autoridade para falar em nome do governador, como Diógenes se apresenta ao ex-chefe de Polícia Luiz Fernando Tubino na gravação divulgada pela CPI, seria a de que sofre seqüelas de tortura.

Depois do golpe militar de 1964, Diógenes militou pela Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e saiu dos cárceres em 1970, trocado pelo cônsul do Japão em São Paulo, Nobuo Okushi, seqüestrado naquele ano.

No exílio, passou por México e Angola. Retornou ao país em 1984. Graduado em Economia na Universidade de Louvain, na Bélgica, foi secretário-geral do Ministério do Planejamento de Guiné-Bissau, na África, de 1976 a 1982. Ao voltar do exílio, foi assessor do deputado Valneri Antunes (PDT), já falecido.

Em 2000, Diógenes, empresário do ramo do turismo (é um dos proprietários da Turismo Pangea) ressurge ligado à administração pública. Desta vez, com um programa que pretende explorar o potencial turístico dos assentamentos do Estado. O projeto recebeu recursos do Banco Mundial (Bird) e do Tesouro. Os pacotes de viagem oferecidos, com duração de um dia, incluíam transporte e alimentação e custavam em torno de R$ 40.


Reacesa polêmica sobre Direito Alternativo
Decisão de juiz de Passo Fundo recoloca em evidência movimento de magistrados gaúchos por justiça social



Ao invocar a função social da terra em uma decisão que favoreceu o Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no dia 17 deste mês, o juiz Luís Christiano Enger Aires, da 1ª Vara Cível de Passo Fundo, reacendeu discussões sobre o papel do Judiciário na aplicação da lei.

Confirmada pelo desembargador Carlos Rafael dos Santos Júnior, da 19ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado (TJE), a decisão divide a opinião pública e coloca em evidência premissas do Direito Alternativo, corrente do pensamento jurídico criada por juízes gaúchos há mais de 10 anos.

Inspirado no exemplo de magistrados italianos, no início da década de 90, um grupo de juízes passou a defender abertamente o “uso alternativo do Direito” para favorecer as classes dominadas, em contraposição aos interesses das classes que implantaram o sistema jurídico. Um dos integrantes pioneiros do grupo original, o desembargador Marco Antônio Bandeira Scapini, da 14ª Câmara Cível do TJE, então juiz, justificava com irreverência o não-cumprimento de uma medida provisória que autorizava a fixação de aluguel provisório antes de o locatário tomar conhecimento da existência da ação judicial. Com o argumento de que medidas provisórias cabem apenas em situações de relevância e urgência, Scapini perguntava nos autos:

– Por que é urgente aumentar o aluguel e não é urgente aumentar o salário de quem paga o aluguel?

Fiel ao conjunto de idéias que defendia há mais de 10 anos, Scapini é dos poucos desembargadores que assumem o rótulo de “alternativo”, ao lado de Amilcar Bueno de Carvalho, da 5ª Câmara Criminal, e Rui Portanova, da 8ª Câmara Cível. Para ele, nem toda lei é justa.

– Em todo lugar, a lei é feita para manter determinada classe no poder, e isso não é privilégio do sistema capitalista. As leis do apartheid na África do Sul contrariavam princípios fundamentais e direitos que são conquistas da humanidade – diz Scapini, um dos cotados para ocupar a Secretaria Estadual da Segurança no início do governo Olívio Dutra.

Para não ferir a Lei Orgânica da Magistratura Nacional, os desembargadores que têm restrições aos “alternativos” não querem falar no assunto. Qualquer opinião nesse momento poderia ser interpretada como uma crítica ao juiz de Passo Fundo. Embora tenha aplicado premissas do Direito Alternativo em sua decisão, Enger Aires não é reconhecido por colegas como “alternativo”. O desembargador Carlos Rafael, tampouco.

Os desembargadores apontados como conservadores não consideram novidade o exercício de fazer Justiça com a aplicação de um conjunto de leis que às vezes não prevê o caso concreto. Todos têm histórias interessantes sobre o uso de criatividade na solução de casos complicados. Alguns confessam ter atropelado a lei para fazer Justiça, hipótese comum em teses produzidas por defensores do Direito Alternativo. Outros reconhecem avanços na jurisprudência provocados pelos “alternativos”, principalmente na área do Direito de Família.

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Flávio Dino de Castro e Costa, diz que o debate sobre o assunto esfriou na esfera da Justiça Federal. Ele reconhece, porém, o saldo positivo do movimento:

– Encontrar no texto do Direito Positivo suporte legal para uma decisão mais justa reafirma nosso compromisso com o valor justiça.

O juiz cita premissas de Direito Alternativo em decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ao optar por ignorar contratos indexados em dólar na fixação do valor de dívidas de leasing, o STJ se baseou no código do consumidor para defender pessoas e empresas prejudicadas pela desvalorização do real.

As decisões dos “alternativos” são fundamentadas na lei. A maioria delas se respalda na Constituição Federal, valorizando um artigo em detrimento de outro, caso da função social da propriedade em relação ao direito de propriedade.


Juristas alegam que idéia pode gerar insegurança
Quando abordados sobre o assunto, em um primeiro momento, eles não quiseram comentar. Com um pouco de insistência, o ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Octavio Gallotti, e o ex-presidente do STF ministro Aldir Guimarães Passarinho aceitaram revelar suas interpretações sobre o Direito Alternativo.

Antes, porém, em tom de brincadeira, avisaram que são um pouco conservadores. Eles alegam que a idéia, na prática, pode gerar insegurança.

Gallotti prefere deixar claro desde o princípio que não é favorável ao Direito Alternativo. Para esse ministro, que se aposentou no ano passado depois de 16 anos n o STF, o juiz não é uma figura eleita pelo povo para poder legislar.

– Essa é uma discussão antiga e cíclica, que eu considero de idéias totalitárias – alerta.

O ex-presidente do STF não fica longe dessa idéia.

– Aquilo que um juiz acha que é justo não é necessariamente bom. As leis existem para serem cumpridas. É um risco que a lei possa ser variável de um juiz para outro – confirma Passarinho.

Ao saber que o assunto voltou à discussão no Rio Grande do Sul, Passarinho comentou que o Estado é mesmo pioneiro na matéria. No entanto, fez questão de enfatizar.

– No geral, a Justiça do Rio Grande do Sul é muito centrada – comenta.

Gallotti também afirma que geralmente os tribunais dos Estados do Sul do país são os melhores. Na sua opinião, o Direito Alternativo não está difundido, mas insinuado, principalmente pela divulgação de decisões polêmicas.

O advogado gaúcho e ex-promotor de Justiça Eduardo Ferrão destaca que o Direito Alternativo envolve situações muito delicadas e perigosas, que trazem incertezas sobre o funcionamento da engrenagem da Justiça.

– Em tese, pode estabelecer uma insegurança naquilo que é corriqueiro. Porque a subjetividade que leva o julgador a arredar a aplicação da lei é sem limites – diz.

De seu escritório em Brasília, Ferrão atua no direito público, em especial nos tribunais superiores, e considera um perigo quando uma das facetas do Estado (Executivo, Legislativo ou Judiciário) começa a desenvolver uma atividade que é da outra.

– A hora em que o Judiciário começa a deixar de aplicar a lei sobre a alegação de que ela é injusta ele está, em princípio, usurpando uma função que é do Poder Legislativo – alerta.


“Não há meio termo”
Entrevista: Rui Portanova, desembargador do Tribunal de Justiça

Aos 54 anos, Rui Portanova é dos poucos desembargadores gaúchos que se assumem praticantes do Direito Alternativo. Quando essa corrente do pensamento jurídico foi batizada, há pouco mais de 10 anos, Portanova fazia parte do grupo de juízes que se reunia nas tardes de sábado para trocar experiências na sede da Ajuris, em Porto Alegre. Em 1995, ao ingressar no Tribunal de Alçada, Portanova transportou para o 2º grau da Justiça a prática de conciliar o legal e o justo que havia aplicado à frente das comarcas de São Luiz Gonzaga, São Vicente do Sul, Santo Augusto, Nova Prata, Novo Hamburgo e Porto Alegre. De Natal, na sexta-feira, durante o Congresso Brasileiro de Magistrados, o desembargador falou por telefone com Zero Hora.

Zero Hora – O que é Direito Alternativo?
Rui Portanova – O fundamental no Direito Alternativo é o reconhecimento de que não existe neutralidade. Não estou falando da imparcialidade, que é necessária na relação do juiz com a parte. Estou falando da neutralidade do juiz em relação à questão posta em juízo. Todas as coisas que o juiz diz têm algo de seu. Estamos no campo da ideologia. Não há meio termo. Ou tu estás de um lado, à esquerda, ou tu estás de outro lado, à direita.

ZH – Não existe juiz neutro?
Portanova – Questões complexas da sociedade, como racismo, as relações entre patrão e empregado e entre capital e trabalho, e a luta pela terra, vêm para dentro do Judiciário. Não tem como ficar neutro nisso. Cada um de nós tem na vida uma posição. O Direito Alternativo opta por uma das categorias que estão em luta: o pobre em relação ao rico, o oprimido em relação ao opressor e o trabalho em relação ao capital. Quem diz ser neutro assume a ideologia da dominação. Na visão do Direito Alternativo, não existe neutralidade e o compromisso é com a perspectiva mais à esquerda, socialista e democrática.

ZH – O senhor já julgou contra a lei para fazer justiça?
Portanova – Jamais precisei fazer isso. Nesse rolo todo sobre propriedade, por exemplo, posso aplicar duas leis: uma à esquerda e outra à direita. E as duas são constitucionais. Para falar de propriedade, posso partir do inciso 22 (“é garantido o direito de propriedade”) ou do inciso 23 (“a propriedade atenderá a sua função social”) do artigo 5º da Constituição Federal. Não preciso desrespeitar a lei.

ZH – Então não há novidade alguma no Direito Alternativo?
Portanova – O novo é a opção pela esquerda, pelo social, pelo justo. Os juízes que dão as liminares para os fazendeiros não falam da função social, mas da proteção sagrada da propriedade. Há outros juízes, não precisam ser alternativo, que consideram a função social. Nem sei se o Christiano (juiz Luís Christiano Enger Aires, de Passo Fundo, que negou a reintegração de posse de três hectares da Fazenda Rio Bonito, em Pontão) é alternativo ou não. Ele apenas disse que a visão social da propriedade é uma lei em vigor e que tem de ser considerada.

ZH – Na sua área de atuação, o Direito de Família, o que seria um exemplo de aplicação de direito alternativo?
Portanova – A lei proíbe o reconhecimento de relações homossexuais. Eu reconheço as relações homossexuais, mas não passo em cima da lei. Aplico a Constituição, que garante serem todos iguais perante a lei, e faço o companheiro homossexual herdar no lugar do cônjuge.

ZH – O julgador não corre o risco de assumir o papel de legislador?
Portanova – Todo juiz cria, todo juiz expressa uma ideologia, seja de esquerda ou seja de direita. Não tem saída. A lei é feita de palavras, e as palavras – a lingüística explica isso – têm diversas significações. A atividade do juiz é a interpretação, e toda interpretação é criativa. É da vida.


“A virtude está no meio”
Entrevista: Aristides Junqueira, ex-procurador-geral da República

O ex-procurador-geral da República Aristides Junqueira Alvarenga não hesita em emitir sua opinião sobre um tema que aflora no Rio Grande do Sul: o Direito Alternativo. Ao contrário de outros colegas que alegam não querer entrar na polêmica , Junqueira critica e justifica, e não poupa nem o Legislativo.

O mineiro, de 59 anos e que há 34 vive os altos e baixos do Direito, responsável pela abertura dos inquéritos que investigaram a corrupção no governo de Fernando Collor de Mello, chegou a ser conhecido como bombeiro-mor de conflitos entre os poderes no governo Itamar Franco. A seguir, trechos da entrevista a Zero Hora.

Zero Hora – A decisão do Tribunal de Justiça gaúcho de negar a reintegração de posse de uma área invadida pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra levantou novamente a discussão sobre o Direito Alternativo. Atualmente, esse é um tipo de decisão que surpreende o senhor?
Aristides Junqueira – Surpreende um pouco. Se a lei protege o direito de propriedade, os problemas sociais podem ser resolvidos de outra forma, e não com a negação da lei. Tenho medo de sair dos trilhos do que está escrito na lei. Se saio hoje com o meu critério de Justiça, e isso pode ser disseminado para todos os juízes, e cada um tiver um critério de Justiça diferente, sem ter um parâmetro, começo a ter uma insegurança jurídica.

ZH – E quanto à interpretação da lei?
Junqueira – Eu me apego, e tenho aqui em mãos, três artigos de código ( ele tira do bolso do paletó um papel com os itens escritos à mão) que me orientam na interpretação da lei: o artigo 4º da lei de introdução ao Código Civil diz: “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do Direito”. O artigo seguinte, que é o 5º, diz: “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”. Já o Código do Processo Civil, no artigo 126, diz: “o juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei, o julgamento da litis caber-lhe-a aplicar as normas legais”.

ZH – Como funciona essa interpretação?
Junqueira – Se o caminho da minha interpretação exige a conduta de outros órgãos, que não o do Judiciário, que assim se faça. Vamos pegar o caso específico no Rio Grande do Sul: se a terra é improdutiva, deixaria suspensa a sentença até que o órgão administrativo federal fizesse uma vistoria para chegar à conclusão de produtividade ou improdutividade. Com o resultado, daria a sentença. Mas há uma legislação que não permite que se desaproprie área invadida, exatamente para evitar invasão e garantir direito de propriedade. Prefiro resolver de acordo com a lei.

ZH – Como o senhor avalia o Direito Alternativo?
Junqueira – Se não tenho como interpretar a lei usando esses artigos, vou batalhar para mudar a lei pelo poder competente, o Legislativo. O juiz se apropriar da função legislativa faz com que eu viva em uma confusão terrível e a repartição de poderes vai deixar de existir. Se Direito Alternativo é decidir contra a lei em nome da Justiça, sou contra.

ZH – O senhor acredita que essa é uma tendência?
Junqueira – O Direito Alternativo, não é de hoje, que é uma prática da Justiça gaúcha. Mas não vejo como uma tendência.

ZH – Qual seria a situação ideal?
Junqueira – A virtude está no meio. Gostaria que as nossas leis fossem feitas de tal forma que as dúvidas quase insolúveis da lei e do magistrado desaparecessem. E, para isso, preciso de bons legisladores. Mas legisladores no Congresso, que se interessassem pelo bem comum. É preciso encontrar uma forma de coadunar a Justiça com a lei. A segurança está na lei.


Artigos

A caminho do crescimento
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Ninguém agüenta mais a crise econômica e esse clima de incertezas e falta de perspectivas que estão atormentando a vida da grande maioria dos brasileiros nestes últimos anos. É isso que não me canso de ouvir nas minhas freqüentes conversas com lideranças de trabalhadores, movimentos sociais, ONGs, empresários e outros segmentos da sociedade.

E o presidente FH, depois de sete anos no governo, fica tentando tirar o corpo fora, jogando a responsabilidade nas costas dos outros. Este governo empurrou o nosso país para a crise e não sabe como fazer para sair dessa situação. É por isso que fica tentando cobrar respostas da oposição, como se nós já fôssemos governo. Ou procurando esconder a sua incompetência nas chamadas “causas externas”.

A verdade é que mais uma vez o Comitê de Política Econômica (Copom) do Banco Central resolveu manter os juros em 19%, frustrando as expectativas de quem apostava numa recuperação, mesmo que modesta, da economia brasileira, ainda este ano. Hoje em dia muita gente já sabe que uma taxa de juros básica desse tamanho significa custos de 39% para capital de giro, 160% para quem utiliza cheque especial e 75% para empréstimos a pessoa física.

Quem é que vai investir ou consumir com esse custo todo? Não é para menos que o crescimento da indústria em agosto foi zero e assim deve continuar até o fim do ano, conforme dados do IBGE. É também por isso que o desemprego continua alto, na faixa dos 7%, mesmo nas cifras mais modestas do IBGE, que medem apenas o desemprego aberto.

A indústria e o comércio estão cortando os programas de compras do final do ano porque as vendas diminuíram nestes últimos meses e estão com os estoques elevados. A previsão, infelizmente, é de mais um Natal magro, certamente pior que o de 2000. Tudo isso reduz a previsão de crescimento do PIB de 2001 para modestos 1,5%, o que significa que a renda per capita continua na mesma, diante de um crescimento de 1,39% da população.

É preciso deixar claro que essa não é uma estimativa de economistas do PT, mas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que pertence ao Ministério do Planejamento, e prevê que a indústria sofrerá uma queda de produção de 1,4% neste segundo semestre.

Ninguém acredita que tudo isso seja responsabilidade da nova conjuntura pós-atentados, embora vá ocorrer uma redução do crescimento da economia mundial em cerca de 1% em 2001. Isso equivale a uma perda de US$ 300 bilhões, o que certamente traz conseqüências negativas para o mundo todo.

O problema é que os principais responsáveis pela vulnerabilidade da nossa economia estão aqui dentro mesmo, alojados no Palácio do Planalto e na Esplanada dos Ministérios. Foram eles que destruíram a capacidade da economia brasileira de resistir às intempéries da economia mundial. São personagens conhecidos dos leitores, que costumam se escudar nas crises internacionais para justificar o fraco desempenho da economia brasileira. Foram eles que praticaram – e praticam – juros estratosféricos anos a fio, fizeram a dívida pública crescer como uma bola de neve e nos colocaram a mercê da ciranda financeira internacional e dos burocratas do FMI. São eles os responsáveis pela posição submissa em que se encontra o nosso país hoje.

Por tudo isso, o Brasil é hoje um país pouco competitivo, com baixas taxas de crescimento e graves problemas sociais. O Relatório de Competitividade Mundial 2001 do Fórum Econômico Mundial, divulgado na semana passada, classifica o Brasil no 44º posto, atrás de países como Lituânia, Eslováquia e das pequenas ilhas de Trinidad Tobago e Ilha Maurício. Só faltou ficarmos pior que a Ilha de Jersey, que pelo visto trabalha também com dinheiro brasileiro.

Mesmo com esse panorama nebuloso, que pode se repetir no ano que vem, observo um fato novo que é muito relevante. Os brasileiros estão cada vez mais conscientes de que é preciso mudar de rumo e encontrar o mais rapidamente possível o caminho do desenvolvimento econômico e social.

Não dá mais para ficar tentando enganar o povo com ajustes recessivos ou impondo remédios amargos que mais debilitam do que melhoram a saúde do paciente. Está tomando corpo na sociedade a proposta da oposição, em especial do PT, de que o crescimento sustentado – juntamente com o enfrentamento da questão social – é a chave para o futuro do país. É isso que queremos e vamos conseguir para o Brasil e para o nosso povo.


Colunistas

JOSÉ BARRIONUEVO – PÁGINA 10

Diógenes carrega os segredos do clube

Diógenes de Oliveira foi, na prática, o tesoureiro do PT nas últimas campanhas eleitorais. Desenvolveu com fidelidade e dedicação tarefas que foram exercidas pelo ex-vereador e ex-secretário de governo Élio Corbellini nas primeiras campanhas do PT em Porto Alegre. Mais do que ninguém, Diógenes conhece hoje os segredos mais bem guardados do PT, envolvendo doações de empresários, lobbies, facilidades, troca de favores, parcerias. A ponto de falar com desenvoltura ao delegado Tubino sobre as relações do PT com o jogo do bicho, dinheiro da corrupção, da contravenção. Foi ungido pelo PT e por Olívio Dutra para exercer essas tarefas.
Quem ousará no governo colocar Diógenes de Oliveira à execração pública ou a um processo de expurgo? Não pode ser embretado, como foi Jairo Carneiro, que dividia com ele as tarefas de tesoureiro porém mais voltado para pequenas e abnegadas contribuições de filiados.

Homem da confiança de Olívio e do PT
Ex-exilado político, Diógenes de Oliveira tem uma vida inteira de lutas que o credencia do ponto de vista político. A quebra do sigilo bancário deverá mostrar que levava uma vida modes ta, atuando como agente de viagens. Nunca foi dado a excessos. Desfrutava de uma amizade muito grande com o governador, que lhe confiou uma das missões mais delicadas.
Crime – Zülke joga com o decurso de prazo para escapar da perda do mandato por crime eleitoral. Restam poucos dias para sair ileso.
Memória – Na CPI da Propina, o irmão de Neuza Canabarro foi colocado no Presídio Central. Por 2,5 gramas de cocaína encontrados numa escrivaninha. Flávio Koutzii não deu trégua.
Cocaína – Um saco com pó branco entregue no Piratini chegou a ser identificado na CPI da Propina como cocaína. Virou piada. Não passava de um novo leite em pó desenvolvido pela Corlac para crianças subnutridas. Entregue por Erasmo Chiapetta, então presidente da estatal.
Personagens – Alguém lembra da atuação do surfista Reginaldo e de Renilda, principais depoentes na CPI da Propina?
Olívio aqui – Acendeu uma luz vermelha no comitê de Lula-lá. E não é a estrela do PT.
Ocaso – Amorna o café servido no Piratini.
Defensiva – Pela primeira vez o PT está na defensiva, encolhido, constrangido. Só Ronaldo Zülke teve alguns rompantes, característicos de sua personalidade. É bom de briga.

Inferno astral de Olívio
Olívio Dutra chega ao final do terceiro ano de governo em meio a uma crise institucional, com a badernas das invasões e o caos na segurança pública; uma crise política, com escasso respaldo na Assembléia, que se torna mais cruel ao apagar das luzes; uma crise financeira, com os cofres raspados, sem poder cumprir a maioria das promessas de campanha; e, pior, uma crise ética, com as denúncias envolvendo o Clube da Cidadania, a lavagem de dinheiro da contravenção e doações que do ponto de vista legal ou político não poderiam ser de conhecimento público.

Vantagem para Tarso
Com a crise, o PT perde, todos perdem no partido. O governador, porém, perde mais. Ninguém apostaria hoje na viabilidade de sua candidatura à reeleição. A ponto de o grupo de Tarso Genro e o próprio prefeito, num movimento tático, exagerarem até nas manifestações em defesa da integridade de Olívio. Todos proclamam a honradez do governador. Fácil de entender. Se Olívio afundar, naufraga o PT e aquele que representar o partido na próxima eleição. Seja quem for.

Roteiro da CPI
Nas investigações, a CPI segue roteiro traçado pelo ex-tesoureiro do PT Jairo Carneiro para tentar identificar prováveis doações da contravenção para o Clube da Cidadania. A fita divulgada sexta-feira mostra que o ex-tesoureiro do PT foi sincero ou, pelo menos, mais convincente, quando disse ter mentido, numa primeira gravação. Será novamente convocado para depor na CPI. Sob juramento.

Acefalia da Agergs
Depois de colocar a Agência de Regulação das Concessões (Agergs) a pão e água por três quartos do mandato, o governador Olívio encaminha na próxima semana os nomes dos novos conselheiros. São eles: Luiz Miranda, Denise Zaions – que já se encontram na Assembléia –, Edmundo Fernandes da Silva, Clóvis Ilgenfritz e Eduardo Krause.

Só Patrícia não viu
Com tantos roteiros pelo Brasil, retomados todos os dias às 5h da manhã, pode estar passando despercebida aos olhos de Patrícia Pillar a calvície progressiva de seu namorado, o presidenciável Ciro Gomes.
• Depois de visitar 43 municípios gaúchos, o ex-governador do Ceará adquiriu o hábito do chimarrão.

Disputa no PDT
A eleição do presidente metropolitano movimenta a bancada do PDT na Câmara de Porto Alegre. Os vereadores Nereu D’Ávila e Isaac Ainhorn são candidatos à convenção marcada para a primeira quinzena de dezembro. Um ex-vereador, Mario Fraga, também concorre ao cargo hoje ocupado pelo deputado Vieira da Cunha. Poderá haver um rodízio na presidência entre Nereu e Ainhorn, um ano para cada vereador. Fraga integraria a executiva.
Neste domingo, os filiados do PDT escolhem os diretórios das zonais.

Livro sobre o fascínio da esquerda
Dois ex-petistas, fundadores do partido, que asseguraram o maior número de mandatos populares (cada um foi vitorioso em cinco eleições), Antônio Hohlfeldt (PSDB) e José Fortunati (PDT), são autores do livro que deve provocar polêmica durante a Feira do Livro. Hohlfeldt, que é jornalista, entrevista Fortunati e também faz comentários sobre a trajetória do partido, sua importância no cenário nacional e estadual e suas contradições. O nome do livro: O fascínio da esquerda – trajetória e contradições do PT.
Autógrafos na feira às 19h do dia 2.
Em tempo: a parte picante é apenas um detalhe. Conta o esforço feito por Fortunati e Clóvis Ilgenfritz para comprar todos os exemplares do jornal Tchê, com uma desastrada entrevista de Olívio em 1981.

Um jovem na Federasul
Foi dada a largada no processo de sucessão presidencial na Federasul. A primeira candidatura oficializada é de Paulo Afonso Feijó, 43 anos, atual vice-presidente e diretor nas quatro últimas gestões da entidade maior das associações comerciais.
Paulo Afonso Feijó é presidente do Portal Mercador.com e já presidiu entidades como o Instituto de Estudos Empresariais (IEE), Associação Gaúcha de Supermercados (Agas) e a Asssociação Brasileira de Supermercados (Abras).
Comandou a Abras em duas gestões.


Editorial

A Justiça subjetiva

O recente episódio da invasão da Fazenda Rio Bonito, em Pontão, deu visibilidade e amplitude a uma polêmica jurídica até então praticamente restrita aos tribunais e aos meios acadêmicos: o uso alternativo do Direito. Ao negar a reintegração de posse pedida pelos proprietários do imóvel ocupado pelo MST, sob a alegação de que deveriam antes comprovar a função social da terra, o juiz de Passo Fundo deixou de lado o chamado formalismo jurídico e buscou na Constituição os argumentos para o exercício do Direito de acordo com a visão dos juristas alternativos – com interpretações restritivas das leis que, no entendimento deles, contemplam as classes mais favorecidas e com o favorecimento das normas que beneficiam os menos privilegiados.

Não se trata, apenas, de um posicionamento ideológico coincidente com o pensamento da esquerda brasileira, que rejeita o modelo econômico vigente (apelidado pejorativamente de neoliberal) e busca a justiça social por caminhos de duvidosa eficácia, dentre os quais a luta de classes. Na verdade, os juristas alternativos consideram parcial o Direito tradicional e vêem no dogmatismo jurídico uma maneira disfarçada de encobrir a perversidade de uma legislação feita para proteger os poderosos. Por isso, não hesitam em aplicar a lei mais pela ótica subjetiva do fato e menos pelas regras materiais e processuais consagradas.

Os alternativos transitam num limite estreito entre o engajamento
social saudável e a deformação

Embora rejeitem o rótulo do voluntarismo jurídico, tendo o cuidado de não se contrapor completamente ao direito positivo, os alternativos (categoria que congrega magistrados, promotores, advogados, professores e estudantes) transitam num limite estreito entre o engajamento social saudável e a deformação do estamento democrático. Sabe-se que a lei não é a única fonte do Direito, que também resulta dos costumes, da jurisprudência, da doutrina e de princípios gerais do texto constitucional. Porém, quando despreza o texto legal, o julgador assume a condição de legislador e extrapola de sua atribuição precípua. Se os juízes, que já gozam de garantias constitucionais especiais em função do cargo que exercem, passarem a ignorar também a legislação, a justificada independência de que desfrutam tenderá a se transformar em onipotência. Numa democracia, é a socied ade que detém controle sobre os poderes constituídos e não estes sobre os cidadãos.

Cabe reconhecer que a prática do Direito Alternativo já trouxe alguns benefícios concretos para o país nestas últimas duas décadas em que se disseminou nos tribunais, sendo o mais notável o avanço na área do Direito de Família, em que julgamentos baseados apenas na Constituição acabaram precedendo e pautando a legislação específica. Mas suas raízes, não convém esquecer, estão fincadas no período autoritário, quando as leis eram impostas. Agora, nossos legisladores são eleitos livremente e o país dispõe de mecanismos eficientes para a fiscalização da atividade parlamentar, ao contrário do que ocorre em relação aos integrantes do Poder Judiciário. Quem poderá impedir que alguns julgadores, entre tantos bem-intencionados, façam uso desta prerrogativa autoconcedida para impor à sociedade suas idéias, seus conceitos morais e suas posições políticas?


Topo da página



10/28/2001


Artigos Relacionados


Dilma: A educação é o eixo do Brasil que queremos

EXPEDIENTE NORMAL, MAS COM EIXO MONUMENTAL INTERDITADO

SP adota padrão internacional de eixo suspenso em caminhão

Randolfe Rodrigues defende Circuito Fora do Eixo

Inovação tecnológica será principal eixo de nova política industrial

Começa debate sobre Coletivo Fora do Eixo e Mídia Ninja