Moléculas inteligentes melhoram efeitos dos remédios



Trata-se da nanoestruturação dos medicamentos, a construção de estruturas muito pequenas

Uma linha de pesquisa recente da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP estuda o desenvolvimento de medicações mais eficientes e com menores efeitos colaterais. Trata-se da nanoestruturação dos medicamentos, que é a construção de estruturas muito pequenas, capazes de melhorar a eficácia das moléculas dos compostos, fazendo-as atuar de forma “inteligente”. Recebe a denominação nano devido ao tamanho das estruturas trabalhadas, medido em nanômetros (a milionésima parte de um milímetro).

A responsável pelas pesquisas nessa área é a professora Nádia Araci Bou-Chacra, a primeira pesquisadora da FCF a trabalhar com nanotecnologia. “É responsabilidade dos novos pesquisadores entender as últimas tecnologias e passá-las aos alunos”, defende Nádia, cujo trabalho com colírios acabou levando-a a se envolver com a nanotecnologia.  “A nanoestruturação de colírios pode melhorar muito o tratamento de pacientes de glaucoma, cujo uso da medicação é ininterrupto”.

Nádia explica que sua pesquisa é incremental, ou seja, não desenvolve novos princípios ativos. Em vez disso, busca melhorar a eficácia de moléculas já existentes, dando a elas um meio de transporte, ou “veículo inteligente”. O colírio com nanotecnologia, por exemplo, é adaptado para as dificuldades encontradas em medicar o olho humano, uma estrutura bastante protegida de elementos externos, incluindo-se aí os medicamentos.

Nanocapsulas

“Boa parte do colírio escorre dos olhos já na aplicação, e mesmo a parte restante possui pouca biodisponibilidade. Isso faz com que o colírio tenha de ser aplicado várias vezes ao dia”, explica a professora. “No caso de doentes crônicos, cujo tratamento não pode ser interrompido, é um grande incômodo”. Para resolver estes problemas, são desenvolvidas nanocápsulas, que possuem afinidade com o olho. Elas transportam o princípio ativo da fórmula e o mantém em contato com o olho do paciente por mais tempo.

“Sabe-se que a mucosa do olho possui potencial elétrico negativo, então montamos cápsulas com potencial positivo para o remédio permanecer mais tempo nessa região”, explica Nádia. Além de permanecerem na mucosa, as cápsulas também liberam as moléculas do medicamento de forma gradual, possibilitando contato com o olho por maior período. “Em vez de aplicar o colírio três ou quatro vezes ao dia, a aplicação pode ser feita uma vez por semana, já que o remédio estará lá, agindo”.

A professora Nádia esclarece que, dependendo da necessidade de cada tratamento, há a possibilidade de parte do princípio ativo não ser encapsulado, permitindo contato imediato com o órgão. De modo geral, a “inteligência” dada ao produto, além de propiciar melhores resultados com menos aplicações, poderá ainda reduzir a parcela de princípio ativo presente no medicamento, já que este será aplicado de forma mais eficiente. Isso diminui a possibilidade de efeitos tóxicos do remédio.

Colírio Em setembro de 2007, Nádia, com o apoio de empresas de uma associação da qual é membro, montou uma simulação perfeita da produção de um antiinflamatório de uso ocular. A simulação foi realizada numa feira internacional de tecnologia para tratamento do ar, e contou com a participação de todos os alunos de graduação da professora.

A fabricação do colírio é feita por um método chamado precipitação do polímero pré-formado. O polímero (poli epsilon caprolactona) é misturado à substância ativa do colírio (neste caso, o acetato de dexametasona). Para encapsular o princípio ativo é incluída acetona na mistura. A acetona é responsável por solubilizar o ativo e o polímero, possibilitando a construção das nanocápsulas. Estas ainda são revestidas com quitosana, biopolímero presente na casca de camarões e outros artrópodes.

Depois do processo pronto é necessária a retirada da acetona por meio de um método que não danifique as cápsulas. Sobre uma futura fabricação em escala industrial, a professora Nádia chama a atenção para a dificuldade desta fase: “Por isso a nanotecnologia é uma área multidisciplinar envolvendo, neste caso, além da farmácia, a química e a engenharia. Cabe ao engenheiro, depois de desenvolvido o método, torná-lo praticável em larga escala”.

Outras pesquisas Enquanto Nádia espera a definição do processo de patente do colírio, já pedida por intermédio da USP, ela está se envolvendo em uma nova área da nanotecnologia: o tratamento de câncer. “A aplicação da nanoestruturação de medicamentos quimioterápicos é uma forma de concentrar os efeitos apenas nas células doentes, diminuindo os efeitos colaterais pesados do tratamento de câncer”. A linha de pesquisa em nanotecnologia já possui pelo menos outros três projetos, orientados por Nádia. A professora busca agora verbas junto à Fapesp, para a montagem de um laboratório especialmente destinado aos experimentos nanotecnológicos.
 
Da Agência USP de Notícias


04/03/2008


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