Mostra na Casa das Rosas homenageia dois mestres da literatura brasileira



Exposição destaca arte contemporânea para comemorar Guimarães Rosa e Machado de Assis

João Guimarães Rosa nasceu no dia 27 de junho de 1908, na cidade de Cordisburgo, em Minas Gerais. Três meses e dois dias depois, em 29 de setembro, no Rio de Janeiro, faleceu Joaquim Maria Machado de Assis. A Casa das Rosas homenageia o centenário de nascimento e morte desses dois símbolos da Língua Portuguesa com a exposição Cem Com Cem Sem (1908-2008). A mostra gratuita estará aberta ao público até o dia 18 de março. A Casa das Rosas fica na Avenida Paulista, 37, ao lado da estação Brigadeiro do Metrô.

Quinze artistas do grupo Contempoarte foram convidadas a produzir arte contemporânea sobre as publicações de Machado e Guimarães. Com a supervisão do diretor do estabelecimento, Frederico Barbosa, e do curador da equipe, Waldo Bravo, elas começaram a se preparar em agosto do ano passado.

Durante seis meses, a equipe de artistas se reuniu regularmente para discussões e reflexões sobre essa literatura e associá-la à arte contemporânea.

Cada uma delas escolheu contos e romances para a abordagem de temas dos mais diversos: vida, morte libertadora, loucura, mistiscismo, bem e mal, entre outras.

O rei está nu

A produção dos quinze trabalhos interativos mesclou produtos diversos, do luxo ao lixo. Calculadora, celular, retalho de tecidos, espelho, fios, caixas de madeira e tinta são alguns dos ingredientes. “Não temos preconceito quanto ao material utilizado e aparência final. Não importa se é feio ou bonito, nosso compromisso é traduzir o intelecto e o interior do escritor”, afirma a artista plástica Bia Black, ao lado das colegas Vicencia Gonsales e Nina Arbex.

“Para quem não conhece ainda Machado ou Rosa, esta exposição seguramente há de aguçar o desejo de enveredar pelas obras instigantes de ambos”, escreve o diretor da Casa das Rosas no folder de divulgação da mostra.

Para aqueles que já conhecem os títulos, Barbosa acredita que será um passeio divertido na busca das relações entre o visto e o lido. A iniciativa pretende popularizar e estimular a leitura desses prosadores.

Bia baseou-se nos contos O Espelho, de Machado de Assis e coincidentemente, de Guimarães Rosa, para criar O rei está nu.

A história de Machado de Assis trata de um rapaz humilde, que vive no interior e serve o Exército. Retorna à sua cidade com o cargo de alferes, ganha um espelho e o coloca em seu quarto. “Certo dia, o homem não está paramentado e se olha no espelho. Não vê nada e busca sua identidade”, relata Bia.

Ela diz que Guimarães é mais profundo. O personagem passa por um espelho de banheiro público e enxerga em sua imagem um monstro. “Quem sou eu? Ele foge do espelho e procura sua identidade”, comenta.

Metáforas

O rei está nu apresenta uma série de caixinhas de madeira de tamanhos variados, vazadas e pintadas. Uma se encaixa na outra. “A idéia da metáfora é retirar todas as camadas de aparência do ser humano até conquistar sua essência”, explica Bia. 

Cada objeto tem uma transcrição, por exemplo, “nem tudo que reluz é ouro” e “dentro de todo armário tem um esqueleto”. Ela defende que as pessoas desnudem mentiras, hipocrisias, falsidades, segredos e encontrem sua essência, representada por um cristal inserido na última camada de caixinhas.

Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, e Sagarana, de Guimarães Rosa, deram vida a Miríade, instalação de parede de Vicencia Gonsales.

Machado cria um narrador-defunto. Por isso aborda o comportamento das pessoas na sociedade de forma desvelada. “Como ele está morto, não teme empecilhos e fala a verdade. Usamos máscaras a cada instante”, conclui Vicencia.

A artista plástica questiona quem somos e se existe uma verdade. Ela sustenta que a cada dia o ser humano muda e, por esse motivo, a única verdade absoluta é a morte.

No texto de Guimarães Rosa, a artista destaca a religiosidade, o bem, o mal e a metamorfose. A instalação apresenta uma série de borboletinhas de papel sulfite. “Associo as borboletas brancas com a metamorfose. Como nós, elas se transformam a cada dia”, explica.  

Denso e suave

Engano é o título da técnica mista sobre tecido da artista plástica Nina Arbex. Seu trabalho parte do diálogo com Igreja do Diabo, de Machado de Assis, Grande Sertão: Veredas e A Menina de Lá – Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa.

Nina utiliza diversos retalhos de tecidos para representar os comportamentos humanos: “Às vezes somos mais ásperos, densos, suaves e até impenetráveis. É uma metáfora com os temas de Machado e Guimarães”.

Participam da mostra: Amaryllis Norcia, Bia Black, Eliane Gallo, Fernanda Naman, Glenn Hamilthon, Jaqueline Comazzi, M. Fátima Moraes, Nina Arbex, Rossanna Jardim, Suzana Garcia, Vera Pamplona, Vicencia Gonsales, Vivian Marin, Yeda Sandoval e Zuleika Bisacchi

“Valeu o dia de hoje”

 Acompanhada da filha Thais, a professora aposentada Sônia Castro diz que a exposição melhorou seu astral. Elas saíram da Penha, zona leste, e foram à Paulista, zona sul, para consulta com nutricionista. Chateadas com o adiamento da assistência sem aviso prévio, elas decidiram passar na Casa das Rosas: “Estou para vir aqui faz tempo. Amei a exposição! Como professora de português, a palavra chama muito minha atenção. A concepção artística está muito interessante. Valeu o dia de hoje”.

SERVIÇO

Exposição Cem Com Cem Sem (1908 – 2008)

Visitação: até 18 de março, de terça-feira a sexta-feira, das 10 às 20 horas, e sábados e domingos, das 10 às 18 horas

Entrada franca

Local: Casa das Rosas – Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura - Avenida Paulista, 37 –Bela Vista.  (Estação Brigadeiro do Metrô).

Informações: Casa da Rosas: (11)3285-6986

Contempoarte: (11)3742-1036

 

Viviane Gomes

Da Agência Imprensa Oficial

(I.P.)

 



03/06/2008


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