Pesquisadores da Poli estudam simulador de negociações



Sistema permite que se verifique os caminhos do raciocínio dos negociadores

Qualquer negociação é, por definição, um ambiente tenso. Desde a simples conversa de um filho que quer pedir o carro emprestado ao pai até a disputa entre diferentes grupos políticos que vêem de maneiras distintas determinada questão.

Mas a aparente imprevisibilidade do momento negocial pode, em muitos casos, ser traduzida por modelos matemático-computacionais. As atitudes dos debatedores costumam seguir comportamentos que poder ser modelados formalmente – e, portanto, serem reproduzidas por computadores. Essa linha de pesquisa utiliza a combinação de técnicas de simulação baseada em multiagentes (MABS) e jogos de papéis (RPG) e, na USP, é estudada pelo Laboratório de Técnicas Inteligentes (LTI) da Escola Politécnica (Poli).

Negowat

A atuação do LTI na área tem como marco o projeto internacional Negowat, que na USP contou também com a participação do Instituto de Estudos Avançados (IEA) e outras unidades. A iniciativa, realizada entre 2003 e 2006, uniu universidades e centros de pesquisa de diferentes países para discutir métodos de ação na negociação de conflitos sobre águas em zonas urbanas periféricas.

Em São Paulo, por exemplo, as casas em áreas de mananciais na Represa de Guarapiranga (na Zona Sul da Capital) foram o tema do estudo. Há uma série de questões envolvidas nesse debate – o Estado deseja a aplicação irrestrita da lei; os moradores não querem deixar suas casas; o grande proprietário teme as invasões irregulares; os invasores vêem no momento uma chance única para obterem terra; e assim segue-se uma lista significativa de diferentes atores sociais – chamados computacionalmente de agentes -, cada um com uma intenção específica, mas todos aguardando uma convergência.

Para a pesquisa de doutorado da aluna Diana Francisca Adamatti, o LTI analisou as discussões envolvendo esses atores e, com base nas percepções coletadas, desenvolveu um sistema que simula as diferentes estratégias utilizadas pelos “personagens” durante uma negociação. O professor Jaime Simão Sichman, um dos responsáveis pelo laboratório, destaca os procedimentos do sistema desenvolvido. “Os dados que obtivemos nos permitiam a criação de agentes que representassem os atores da negociação. Assim, poderíamos simular como eles reagiriam em algumas situações que nós, intencionalmente, forneceríamos ao sistema”, comenta.

Para Sichman, sistemas semelhantes seriam excelentes ferramentas de treinamento – ou de antecipação de ocorrências – para os envolvidos em negociação. “Claro que o contato pessoal nunca será substituído. Mascombase no sistema um negociador pode por exemplo entender melhor o ponto de vista do outro. Pode compreender o porquê do seu antagonista tomar determinadas decisões durante a negociação”, comenta o professor.

De fato, o sistema permite que se verifique os caminhos do raciocínio dos negociadores. As informações e os questionamentos mentais são traduzidos em equações matemáticas que, com uma análise, transformam-se em verdadeiros mapas que indicam o rumo tomado pelo debate.

A metodologia de construção de agentes inteligentes segue uma linha que os pesquisadores da área BDI. BDI é uma sigla formada pelas iniciais das palavras em inglês beliefs, desires e intentions, que em português significam crenças, desejos e intenções. No Negowat, foi utilizada também uma ferramenta computacional denominada Jason, criada por Jomi Fred Hübner, ex-aluno do LTI. A Jason, utilizada internacionalmente, permite a programação de agentes inteligentes segundo o modelo BDI.

Aplicações

Jaime Sichman vê como inúmeras as potenciais aplicações dos sistemas multiagentes – que, segundo o docente, ainda estão em fase inicial, pelo menos no Brasil.

No mercado financeiro, por exemplo. O universo especulativo das altas e baixas, índices e cotações inúmeras demanda ações ao mesmo tempo rápidas e precisas. Apostar nos sistemas de multiagentes é uma saída interessante para quem atua no setor. Um aluno do LTI, o doutorando Paulo André Lima de Castro, estuda o assunto.

 RPG

Há também a área de jogos, com os RPGs, que podem ser jogados no “analógico” sistema de cartas, dados e fichas. “Em algumas ocasiões, os jogos de RPG demandam a presença de 10, 12 jogadores. Com um auxílio de agentes inteligentes, a presença física de um determinado jogador pode ser dispensada, e suas ações ficam a cargo de um agente que o representasse no computador”, resume o professor.

Sichman aponta que o mercado para os profissionais da área vem crescendo bastante. Mas ressalta que o centro produtor do conhecimento no ramo continua sendo a academia. “Estamos gerando muita massa crítica envolvida no setor, o que é fundamental”, conclui.

Da USP Online



10/02/2007


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