Programa de Microbacias atende quase 970 unidades na 1ª fase



Iniciativa direcionada ao meio rural está programada para abranger 1,5 mil microbacias na segunda etapa

Desde o início do ano, o sítio de Narciso Domingues do Nascimento passa por transformações importantes. Localizados no pequeno município de Ribeirão Grande, os 7 hectares da propriedade herdada por ele da família não apresentam nem de longe sinais de prosperidade. Mas há indícios de melhoras, que enchem de esperança o humilde produtor de 55 anos.

A principal delas é fruto de um mecanismo simples, uma roda d’água, que permite irrigar a lavoura de feijão e evita a dificuldade de buscar a água com balde para o consumo da família no Ribeirão dos Taquarianos, que corta o sítio. Como este corre na parte baixa do terreno acidentado, a tarefa era bastante sacrificada.

Outras novidades são o conhecimento adquirido pelo agricultor de que a mata nativa no entorno do riacho é importante para manter a qualidade de sua água, as mudas recentemente plantadas ali para repor o que tinha sido capinado, a cerca de proteção para que seu pouco gado não as estrague, o novo sistema para o manejo dos animais e uma roçadeira mecânica. “Agora estou animado. Graças a Deus as coisas estão melhorando”, comenta Nascimento.

Ele atribui à orientação e ao apoio oriundos do Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas a mudança na rotina do Sítio Monjolo, onde mora com a mulher e três filhos. Para dispor dos benefícios, o agricultor teve de se organizar, reunir outros interessados e aderir a práticas ecologicamente sustentáveis. Diz que tanto ele como os dois companheiros que integraram a empreitada estão confiantes com as perspectivas abertas por ela. “Já trouxe um benefício bastante grande, porque eu não tinha água para lavoura”, explica. “Tudo isso foi um empurrão para a gente”.  

Desenvolvimento sustentável – O Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas é uma iniciativa resultante de parceria entre o governo do Estado e o Banco Mundial (Bird), executada pela Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati). Criado em 1987, passou a ter o formato atual dez anos depois. Segundo o gerente de Planejamento, José Luiz Fontes, desde 1997 o objetivo de atender às necessidades dos pequenos agricultores abrange quesitos como o incentivo à organização dos beneficiários, às práticas sustentáveis e a educação ambiental. “Na época, o programa teve seu foco deslocado do produto para o agricultor e sua família”, esclarece.

Na primeira década de existência, a iniciativa tinha uma proposta mais simples, de incentivar e financiar ações de manejo e conservação do solo, apenas. Com a reformulação, incluiu-se na iniciativa o estímulo ao desenvolvimento sustentável. No novo projeto, o programa foi desenhado em duas fases e ganhou financiamento do Bird. O traçado da primeira etapa, agora em fase final, passou a abranger então estratégias agropecuárias que garantissem ao público-alvo boa condição socioeconômica e ambiental. O intuito principal se tornou o desenvolvimento das populações rurais e sua organização. “Há uma relação muito próxima entre urbanização e melhor qualidade de vida. A taxa de analfabetismo do Estado é um dos indicadores importantes: nas áreas urbanas é de 4% a 5%, nas rurais, de 12%. Um índice altíssimo para São Paulo”, avalia Fontes.

“Isso determina que a gente tenha uma política para promover o desenvolvimento rural. É preciso que esses agricultores, moradores, trabalhadores da zona rural tenham as mesmas condições dos cidadãos das áreas urbanas. É a finalidade do nosso trabalho”, afirma. Segundo ele, a prioridade de atendimento da medida está nas regiões com maiores problemas de degradação ambiental e pobreza rural, de acordo com dados como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), a ocorrência de erosão, a falta de saneamento, a importância da agricultura familiar para a economia do município e a existência de fragmentos florestais nativos (para que sejam conectados), entre outros.

O atendimento já chegou a 968 microbacias, pertencentes a 514 municípios. O investimento total é de US$ 102 milhões, com financiamento de US$ 45 milhões do Bird e US$ 57 milhões em recursos do Estado. Os municípios interessados devem atender a dois pré-requisitos básicos para participar: formar um Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural (CMDR), para representar a agropecuária municipal e atender às exigências do programa, e formalizar convênio com o Estado para contemplar as ações no município. A partir daí, a atuação se dá em três fases específicas.

Buscando soluções – Como uma das premissas do programa é o protagonismo do produtor, em primeiro lugar ocorre orientação para sua organização. Ele participa da identificação dos problemas e da busca das soluções, conceito batizado de Nova Extensão Rural. É também o momento de apresentação das propostas a ele e da elaboração, pelo Conselho Municipal, de um diagnóstico da microbacia e do plano de ação. Segue-se a conscientização ambiental dos integrantes. Foram treinados mais de 750 agentes para o Microbacias, que esclarecem sobre a importância das práticas conservacionistas, da recomposição das matas ciliares, da diminuição da poluição e do assoreamento e a necessidade de ações integradas para garantir a proteção das nascentes. Ao mesmo tempo, o Projeto Aprendendo com a Natureza é o braço da educação ambiental levado para as escolas. Atendeu até hoje a 366 mil estudantes.

A liberação de recursos é vinculada à aquisição de implementos agrícolas, construção de abastecedouros comunitários, instalação de cercas de proteção de mananciais e terraços, escavação de fossas, entre outros benefícios. Há ainda a doação de mudas para reflorestamento (3,5 milhões até hoje) e de sementes para adubação verde. Os subsídios são recebidos na terceira etapa do processo, em conta bancária aberta pelos próprios agricultores, que devem assumir uma pequena contrapartida dos recursos obtidos. O porcentual é determinado conforme a melhoria a ser realizada e o pagamento é programado para ser feito em parcelas compatíveis com as condições dos beneficiários.  

Exclusão e êxodo – Há incentivos para abastecedouros de água comunitários (812 já foram construídos), distribuidores de calcário, roçadeiras por tração ou costal (implemento usado na limpeza de pastos, destruição dos restos de algumas lavouras) e poda das soqueiras (emaranhado de raízes de cana-de-açúcar), plasticultura (cultivo em estufas), semeadoras, adubação verde, fossas sépticas, controle de erosão, calcário agrícola, cercas para proteção de mananciais, etc.

As práticas incentivadas prevêem principalmente os sistemas de plantio direto na palha e o terraceamento, ambos procedimentos indicados para a conservação do solo, a recuperação da mata ciliar, o manejo do pasto para aumento de produção, o controle da erosão, a adequação de estradas de terra (1,6 mil quilômetros), o saneamento básico, o abastecimento de água e a adoção do Cati Leite – técnica de manejo para desenvolvimento sustentável da pecuária leiteira. Fontes informam que essas tecnologias garantem a conservação dos recursos naturais, melhoram a produtividade, aumentam a renda, geram empregos, reduzem os custos dos produtores, incrementam a arrecadação dos municípios, barram a exclusão social e o êxodo rural. 

Empreendedorismo – Para a segunda fase do programa, com execução prevista para começar ainda este ano e prosseguir até 2012, a idéia é abranger 1,5 mil microbacias (incluídas as que já fazem parte) e 90 mil famílias. Terá foco no apoio ao desenvolvimento de empreendimentos que gerem emprego e renda. O investimento programado para tal é de US$ 130 milhões, com financiamento do Bird de US$ 78 milhões e contrapartida do Estado. “Ela ainda está em fase de planejamento, mas a gente já sabe o que pretende”, adianta o gerente.

Diz que uma questão fundamental para os agricultores é diversificar as atividades. “Não só com explorações agrícolas, mas também com turismo, artesanato, etc.” As possibilidades serão determinadas de acordo com o perfil da microbacia, onde ela está localizada e suas condições naturais, por exemplo. Outra questão considerada importante para a nova etapa é a inclusão das mulheres e dos jovens nos processos produtivos. “A intenção é ter empreendimentos que incluam esse público. Por exemplo, as estufas são o tipo de coisa pelas quais o jovem se interessa. Dificilmente você vai ver um rapaz querendo trabalhar na agricultura tradicional, esperando uma safra para ter renda. Muitos deles foram para a cidade, estudaram, viveram lá por algum período, e vão se interessar por empreendimentos que possibilitem renda mensal”, considera Fontes.

Para as mulheres, está previsto o apoio ao trabalho de artesanato e produtos alimentares artesanais, atividades com as quais têm mais afinidade. Outra proposta é a obtenção de maior qualidade no processo de produção e de diferenciais, para conseguir a certificação e aumentar a competitividade. Os incentivos abrangerão orientação técnica e financiamentos para isso. A questão social também fará parte do processo, com destaque para o apoio à melhoria das condições de saneamento (inclusive das instalações animais) e de moradia. A previsão é de que haja liberação de recursos para reformas, por exemplo.

Outra frente de trabalho da segunda fase prevê a criação de um fundo de pagamento por benefícios ambientais. Atualmente, em duas microbacias (uma em Joanópolis e outra em Nazaré Paulista) estão sendo realizadas iniciativas-piloto dessa proposta, ambas em parceria com o Comitê de Bacias dos Rios Piracibaba, Capivari e Jundiaí e a participação da Agência Nacional de Águas, além da Cati e do Projeto de Recuperação de Mata Ciliar da Secretaria de Estado do Meio Ambiente. O agente financeiro é a Caixa Econômica Federal. Nesse caso, o agricultor que faz um trabalho importante de conservação de solo e água é recompensado financeiramente. 

Ribeirão Grande

Ribeirão Grande, na região sudoeste do Estado, pertence à Regional de Itapetininga da Cati, ao lado de mais 13 municípios. É um dos mais carentes e possui 70% dos cerca de 7,3 mil habitantes na área rural. Tem as microbacias Mato Dentro e Taquarianos priorizadas no programa da Cati.

Lá, os pequenos produtores, como Nascimento, muitas vezes precisam trabalhar na roça alheia, distante quilômetros, para sobreviver. Ele, por exemplo, é diarista na colheita de tomate a 8 quilômetros de seu sítio. Mas os problemas no município vão além dessa dificuldade. A falta de saneamento faz com que boa parte da população consuma água contaminada. Por isso, as benfeitorias resultantes do Microbacias são principalmente fossas sépticas e abastecedouros de água. Em contrapartida, os pequenos produtores passaram a recuperar a mata no entorno dos cursos d’água e a experimentar novas técnicas para melhorar a produção.

Seu Nascimento diz ter plantado 700 mudas em 30 metros de área do entorno do Ribeirão. Também instalou no terreno 155 metros de cerca, para proteger o que foi plantado e dividir o pasto em piquetes. Isso porque aderiu ao Cati Leite, programa desenvolvido para obter maior produção na pecuária leiteira. Ele propõe o manejo das vacas em menos espaço para conseguir o objetivo. Segundo a previsão dos técnicos, dessa forma ele poderá elevar a sua produção dos atuais 10 litros diários para 100 em pouco tempo. O produtor tem, no momento, três vacas em atividade, de um total de nove. “Espero logo-logo só precisar trabalhar no meu sítio”, planeja.

A agrônoma contratada pela prefeitura para dar respaldo ao Microbacias, Raquel Regina Sadeller Silva, acompanha com atenção o processo e ajuda os pequenos produtores a se organizarem. Segundo o diretor da Regional da Cati, José Manoel Vasconcelos, o êxito do programa depende das parcerias com as prefeituras e do envolvimento dos próprios beneficiários. “Em primeiro lugar, o município tem de se estruturar para dar andamento à iniciativa. Depois, é preciso que o produtor se interesse e, para isso, são essenciais os primeiros resultados. Aí sim o pessoal se mobiliza”, conta.

A agrônoma confirma e ressalta que as melhorias ainda causam outros impactos positivos, como, por exemplo, a chegada da rede elétrica no bairro do Mato Dentro. Segundo ela, a companhia responsável só teve interesse em estendê-la até lá depois que soube da instalação do poço artesiano e do abastecedouro comunitário conquistado pelo Programa de Microbacias. O equipamento, recém-inaugurado, vai atender a 26 famílias inicialmente (a capacidade é para mais de 50), que até então consumiam água barrenta. “Agora, sim, vamos beber água de qualidade”, comemora Sandro Aparecido Ferreira, um dos beneficiários. 

Simone de Marco

Da Agência Imprensa Oficial



05/07/2008


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