Soropositivos com mais de 60 anos recebem atenção especial em SP
Ambulatório de Aids do Idoso do Hospital Emílio Ribas é pioneiro no mundo no atendimento exclusivo para esses portadores da doença
Por sugestão de amigas, uma viúva decidiu freqüentar um baile da saudade. Lá, conheceu um senhor e começaram a namorar. A mulher era tão tímida que somente depois de dois meses permitiu que o namorado pegasse em suas mãos. Depois de algum tempo, após a terceira relação sexual, o homem faleceu de pneumonia. Passaram-se vários anos e ela doou sangue a um parente. No exame, um resultado inesperado. Foi impedida de fazer a boa ação porque é portadora de HIV. “O risco de contaminação está por toda a parte. Quem vê idade não vê aids. Os mais velhos também se relacionam sem preservativo e podem contrair a doença”, alerta o infectologista Jean Gorinchteyn, responsável pelo Ambulatório de Aids do Idoso do Instituto de Infectologia Emílio Ribas.
O crescente número de casos de aids entre as pessoas com mais de 60 anos preocupa tanto a rede pública de saúde que no início de 2004 foi criado o Ambulatório de Aids do Idoso. Naquele ano, a unidade atendia 20 pacientes por mês. Agora, passados mais de três anos, auxilia cem doentes mensalmente. Isso representa 400% de aumento do trabalho.
Para ser atendido no ambulatório é necessário ter 60 anos ou mais, ser encaminhado por Unidade Básica de Saúde (UBS) ou por internação no Emílio Ribas. Nesse atendimento especializado, o paciente encontra médicos infectologistas, equipe de enfermagem, assistência social e apoio psicológico, faz exames e recebe os medicamentos necessários para o tratamento.
Doença de jovens – “O nosso ambulatório é o único no mundo, específico para tratar idosos acometidos de aids”, informa o infectologista, que participa anualmente de congressos mundiais na Austrália e na Espanha. E somente nos últimos dois anos os eventos começaram a tratar o tema aids, idoso e envelhecimento.
Dos pacientes atendidos na unidade, 80% são homens. Desse total, os casados representam a maioria (75%). O médico diz que a pessoa do sexo masculino procura relacionamentos extraconjugais porque a mulher geralmente está na menopausa – fase caracterizada pela diminuição dos hormônios, da libido, menos lubrificação vaginal e dor no ato sexual. Ela vivencia mais as funções de mãe, avó e dona-de-casa.
“O cônjuge, com a ebulição hormonal, procura relações sexuais fora do casamento, normalmente com prostitutas, mulheres mais novas e casos fortuitos”, informa Jean. Ele afirma que os idosos sabem os riscos da doença, mas acreditam que são imunes ao contágio: “Os mais velhos acham que aids é doença de jovens”.
De acordo com dados do Ministério da Saúde, em 2007 foram notificados 13.069 ocorrências de aids no País. Desse total, 467 (3,57%) são pessoas com idade igual ou superior a 60 anos. O médico diz que a tendência é essa estatística ficar maior nos próximos anos, por causa do aumento da expectativa de vida dos mais velhos.
25 anos de aids
Como aconteceu em todo o mundo, a aids começou a aparecer no País em 1982. “Muitos que contraíram o vírus naquela época estão vivos até hoje”, diz o médico. Ele acredita que, no futuro, a incidência entre os idosos deverá aumentar também por causa da ingestão de remédios que melhoram a disfunção erétil. Atualmente, os idosos têm mais relações sexuais que antigamente.
O médico Jean explica que algumas drogas para tratamento da aids provocam alteração das taxas de colesterol, triglicérides e metabolismo da glicose, podendo ocasionar diabetes. “Como é comum os mais velhos já terem esses problemas, a escolha dos medicamentos é diferenciada”.
Luta pela sobrevivência
Quando o médico comunica à família que o idoso é portador de aids, a reação imediata é o desapontamento, pois os parentes têm a visão de que o idoso “é um bom velhinho e assexuado”. Pelas experiências no ambulatório, o infectologista diz que depois de dada a notícia, o que prevalece é o apoio familiar. Até a mulher, possivelmente traída, entende o parceiro, conforta-o e lhe oferece carinho.
Outra característica marcante é que o doente idoso segue com rigor as orientações médicas. Respeita os horários de sono, medica-se nos horários indicados, evita bebidas alcoólicas e alimenta-se bem. “Pelo medo da morte, ele reavalia sua qualidade de vida e luta para sobreviver”, informa. Os cuidados diminuem as internações. Menos de 5% dos atendidos por ano no ambulatório são internados.
Para conter o aumento dos casos de aids, o médico defende que as campanhas educativas e de prevenção incluam esse público, que ainda se sente à margem do risco de contágio.
Viviane Gomes
Da Agência Imprensa Oficial
(L.F.)
12/30/2007
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