Banco do Povo faz 10 anos e premia pequenos empreendedores



Programa de microcrédito do banco já realizou 168 mil empréstimos

Mais de 1,3 mil pessoas estiveram presentes à cerimônia de comemoração dos dez anos do Banco do Povo Paulista, organizada pela Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho (Sert) do Estado de São Paulo em parceria com o Centro de Estudos e Pesquisas da Administração Municipal (Cepam), nesta segunda-feira. Ao longo de uma década, o programa de microcrédito oferecido pelo governo estadual em parceria com as prefeituras só tem a comemorar. Realizou 168 mil empréstimos a pequenos empreendedores, como doceiras, sapateiros, jardineiros, sacoleiras, chaveiros, distribuídos por 435 municípios paulistas, num valor total de R$ 498 milhões. Para os próximos cinco anos, a meta é que esse volume atinja R$ 1 bilhão.

O evento reuniu autoridades estaduais e municipais, gestores, agentes de crédito e empreendedores de vários municípios paulistas, bem como membros dos comitês de crédito e instituições do terceiro setor. Houve palestra do economista bengalês Muhammad Yunus, ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 2006, e premiação de empreendedores, agentes de crédito e unidades do Banco com melhor desempenho.

Onde os pobres têm prioridade – Muhammad Yunus, idealizador do sistema de microcrédito, parabenizou o Banco do Povo Paulista e lembrou que em dez anos atinge-se um estágio que já permite a decolagem. Nascido em Bangladesh, recebeu o prêmio pela criação do Banco Grameen, voltado à concessão de microcrédito à população de baixa renda. A iniciativa teve grande sucesso nas aldeias de Bangladesh, país marcado pela superpopulação, desemprego, pobreza e acidentes naturais. “Vivemos num mundo onde tudo é feito com dinheiro, mas negamos a uma parte da população o acesso a ele. Erguemos um muro, deixando essas pessoas do outro lado, sozinhas. Se para abrir um negócio você precisa de um dólar, e não tem esse dólar inicial, então você está perdido”.

Yunus diz que iniciou as atividades do Grameen emprestando dinheiro do próprio bolso a pessoas que não tinham acesso aos empréstimos bancários, cobrando juros ínfimos. Em 25 anos, o banco já emprestou mais de um U$ 1 bilhão e tornou-se auto-suficiente. Suas filiais vivem dos depósitos dos próprios tomadores, que representam 67% do volume total de dinheiro, além de poupanças e seguros de saúde familiar de baixíssimo custo. “Isso mostra como um banco pode ser propriedade do povo e ainda ser sustentável”.

“Fazemos questão de que os nossos clientes sejam muito, muito pobres”, explicou. “Se você tem móveis na sua casa e vai ao Grameen, eu peço: ‘Espere um pouco, deixa vir aquele que não tem nenhum móvel’; se você tem dois quartos em sua casa, eu peço: ‘deixa vir primeiro aquele que não tem onde morar’”.

O banco também incentiva as famílias a colocarem seus filhos na escola, oferecendo bolsas de estudos e concedendo empréstimo estudantil universitário. Muitos filhos de clientes de Yunus conseguiram se formar e obter título de doutorado. Pertencem a uma nova geração, formada por pessoas que conseguiram quebrar o ciclo da pobreza ao conquistarem melhores oportunidades que seus pais e avós.

Mudança de vida

Em Pirangi, Silvana Aparecida Minicelli Graciano vive dos biscoitos e pães que fabrica em sua própria casa. Para comprar um forno maior e matéria prima, tomou o primeiro empréstimo do Banco do Povo em 2006. Em abril de 2007, retornou ao banco para obter ajuda na compra de um cilindro para misturar a massa. Hoje, diz que as encomendas aumentaram muito e já tem dois clientes fixos, o que a desobriga de vender seus produtos na rua, como fez por quase dez anos. Com o lucro, já conseguiu trocar o carro utilizado pelo marido para a entrega dos salgados. E sonha continuar crescendo.

O chaveiro Walter Amadeu, de São José do Rio Preto, tomou em 2002 seu primeiro empréstimo. Atento às mudanças em sua área de atuação, notou que precisava comprar um equipamento específico para fabricar chaves com sistema de bloqueador de injeção eletrônica. “Essa máquina foi imprescindível, porque os carros modernos usam esse tipo de chave”. O investimento, segundo ele, compensou e os lucros aumentaram 60%. Apaixonado pela profissão, Walter diz que se sente “um pouco herói” sempre que parte em socorro de alguém que ficou preso no banheiro ou simplesmente perdeu a chave do carro.

Mário Rosa Filho sempre ganhou a vida como professor, em Santa Fé do Sul. Para complementar o salário, começou a produzir cachaça na década de 70. Quando o Banco do Povo Paulista chegou à cidade, em 2002, tomou o primeiro empréstimo, de R$ 5 mil, para comprar tonéis. O negócio foi crescendo e ele recorreu ao Banco do Povo outras três vezes para comprar mais material e ampliar a produção.

No ano passado, Mário se aposentou e passou a se dedicar exclusivamente ao seu próprio negócio. Naquele mesmo ano, a bebida produzida por ele venceu pela primeira vez o concurso de Melhor Cachaça Envelhecida do Estado. Agora, acabou de ganhar o título pela segunda vez. Como a procura não para de crescer, Mário está de volta ao Banco do Povo. Desta vez, em busca de financiamento para comprar um pequeno trator. “O Banco do Povo me deu um empurrão e espero que me dê muitos outros empurrões porque vou precisar aumentar o negócio”, afirma.

Outra história de sucesso é a de Danilo Zanon, de Campo Limpo Paulista, na Grande São Paulo. Ele já trabalhava, informalmente, há 14 anos com limpeza de piscina e conserto de bomba, quando decidiu formalizar seu negócio e abrir uma loja, em 2002. Procurou o Banco do Povo e a orientação da agente de crédito que o atendeu foi essencial . “Ela sugeriu que eu pegasse uma parte do dinheiro para capital de giro e outra para investimento fixo. Comprei produtos, um computador, mesa e cadeira e abri a loja. Sabia que precisaria vender para ter dinheiro para pagar o empréstimo. Mas deu certo: com o dinheiro das vendas, paguei as parcelas e com o do capital, reinvesti em mais produtos para dar giro na loja”, conta.

Danilo recorreu ao Banco do Povo outras três vezes. Segundo ele, apenas um dos quatro computadores que possui atualmente não foi comprado com financiamento do programa. Até o balcão de atendimento chegou a trocar com os empréstimos.

Hoje, Danilo emprega mais três pessoas e já não pode mais usar o Banco do Povo porque o faturamento da sua empresa é superior ao permitido pelas regras do programa. Antes, ganhava entre R$ 1,5 mil e R$ 2 mil por mês, ou seja, não mais do que 24 mil anuais. Atualmente seu faturamento está próximo a R$ 120 mil brutos ao ano.

“Com a abertura da loja, consegui entrar no ramo de construção de piscinas, que envolve muito material e mão-de-obra, com custos muito mais altos que os da limpeza e manutenção”, explica.

O outro lado

Responsabilidade, respeito, facilidade de comunicação, discrição. Muitas são as características exigidas de quem está na outra ponta, aqueles que são o elo entre dinheiro e quem dele precisa: os agentes de crédito do Banco do Povo. Em sua maioria alocados pelas prefeituras, recebem treinamento intensivo para aprenderem a identificar as necessidades de seus clientes e orientá-los para o sucesso de seus negócios.

Para Elisângela Maria de Souza, agente de crédito de Pirangi, “é preciso dar um tratamento mais humano ao cliente, ligar para saber como vão os negócios, interessar-se pela vida deles”. A estudante de Administração de Empresas de 26 anos diz que sabe entender o outro lado porque trabalhou informalmente por muitos anos, na lavoura e como empregada doméstica. Neusa de Lima Alves, agente de crédito de Sertãozinho, afirma que discrição é fundamental. “A pessoa que vem pedir dinheiro já se encontra numa posição desconfortável, então precisamos mostrar compreensão e solidariedade e, se possível, falar baixinho com ela”.

História

O Banco do Povo Paulista foi implantado em 1998, com o objetivo de oferecer microcrédito a empreendedores de baixa renda qu e não tenham acesso ao sistema financeiro tradicional. Está presente em 435 municípios paulistas, onde moram aproximadamente 89% da população do Estado. Só em 2007 foram realizadas 21,3 mil operações de crédito, com R$ 72 milhões em empréstimos. É coordenado pela SERT em parceria com as prefeituras.

Para ter direito ao empréstimo, é necessário exercer atividade produtiva formal ou informal no município há mais de seis meses, residir ou ter negócio no município há mais de dois anos e não possuir restrições cadastrais, como nome no SCPC/Serasa. Os financiamentos destinam-se a compra de máquinas, equipamentos, veículos e ferramentas, ou capital de giro, para compra de matérias-primas ou conserto de máquinas.

Roseane Barreiros, da Agência Imprensa Oficial

(M.C.)



08/27/2008


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