Catadores de papel fazem decoração natalina para o Conjunto Nacional



Cooperativa reúne 32 trabalhadores do Jardim Pantanal, por meio de projeto idealizado pela CDHU

Nova Esperança. O nome escolhido por um grupo de catadores de papel do Jardim Pantanal, para a cooperativa por meio da qual utilizariam material reciclável na produção de enfeites natalinos, traduz o sentimento da maioria deles. Idealizada a partir do Projeto Pantanal – trabalho de urbanização gerido pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU) –, a Cooperativa Nova Esperança abriu para 32 catadores do bairro da zona leste da capital a possibilidade de emprego e renda. Os trabalhos integrarão a decoração de Natal do Conjunto Nacional, na Avenida Paulista.

Até o dia 15 de novembro, data prevista para os arranjos serem mostrados ao público, eles terão muito trabalho pela frente. “E emoção também”, garante a pernambucana Selma Maria Silva, 50 anos, três filhos. “Só de pensar nas pessoas reunidas, admirando a nossa arte alternativa em plena avenida...”

Um pouco dessa emoção Selma já sentiu quando representou os catadores na reunião de fechamento do projeto, com membros da Cooperativa de Arte Alternativa e Coleta (Cooperaacs) e da CDHU. Moradora de rua por 34 anos, perambulou e dormiu diversas vezes na região, sem nunca ter prestado atenção ao Conjunto Nacional. “Nem acreditava que eu estava ali, com a Comissão, em volta da mesa, acertando os detalhes do projeto e depois, almoçando num restaurante chique. Ali, percebi que minha vida havia mudado”. Para ela, voltar ao mesmo local, agora na condição de artista, tem significado especial. 

Mudança que faz bem – A vida desses catadores começou a mudar em abril, quando a CDHU incentivou-os na organização da Nova Esperança, depois de selecioná-los entre mais de cem nomes cadastrados. O curso de capacitação durou cinco meses – período em que receberam orientações sobre consciência ambiental, ética e cidadania, além de aprenderem a reconhecer e separar os diferentes materiais que compõem um produto e sua forma de reciclagem. Também receberam noções de cooperativismo, liderança, tolerância e trabalho em equipe. O treinamento foi elaborado e ministrado por agentes sociais da CDHU e pela Ong GEA – Ética e Meio Ambiente e ocorreu nas dependências da Escola Estadual União de Vila Nova.

A confecção dos enfeites se dá num galpão provisório construído no bairro, onde os catadores, numa espécie de linha de montagem, dividem-se nas diversas tarefas da produção. Trabalham das 8 às 17 horas, com intervalo de uma hora para almoço. A vigilância é feita pelos próprios cooperados, que, a cada noite, revezam-se dormindo em duplas no local. “Em 2008, teremos um espaço maior e definitivo”, informa Sheila Duarte, que divide com Isabel Frontana, a supervisão da cooperativa.

No bairro, área de várzea, precária e de ocupação irregular, vivem aproximadamente oito mil famílias. A CDHU atua há anos no local, tendo construído um conjunto habitacional para os moradores, e até hoje realiza obras de melhoria para a população. Antes, os catadores guardavam o material em suas casas ou na beira de córregos que atravessam o bairro e vão desaguar no Rio Tietê, às margens da Rodovia Ayrton Senna.

De acordo com Sheila, ao longo desses seis meses, foram visíveis as mudanças na auto-estima dos trabalhadores, muitos deles alcoólatras e usuários de drogas. “Alguns até pararam de beber depois que passaram a integrar o Projeto Nova Esperança”, observa. Outros vêem o trabalho na cooperativa como forma de recuperar parte da dignidade perdida por algum infortúnio no passado.

Carlos Alberto Albino, 56 anos, diz que o curso de capacitação permitiu a ele receber seu sexto diploma. Há oito anos abandonou o 2.º ano do curso de engenharia na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, “porque precisava trabalhar”. Antes, no final da década de 1960, havia se formado em publicidade pelo Senai. Trabalhou como cartazista e letrista em diversos estabelecimentos, como Eletroradiobrás, Casas Pernambucanas, Zogbi e Dominó Móveis. Mas, não sabe como, foi perdendo oportunidades. Hoje, diz que aplica os conhecimentos que obteve na perfuração precisa de garrafas plásticas.

Davi Almeida Barreto, o tesoureiro da Nova Esperança, chegou a ter dois bares na década de 1980 – um na Vila Maria e outro no Jardim Japão, ambos na zona norte da cidade. Diz que perdeu tudo por ocasião do Plano Collor, quando viu os cheques que recebia começarem a cair sem fundos. Trabalhou, então, como vendedor ambulante e, mais recentemente, recolhendo materiais recicláveis no Mercado Municipal. 

Flocos de neve – Para os enfeites do Conjunto Nacional estão sendo utilizados fundos de garrafas PET de 500 ml, brancas e com cinco gomos. Doze fundos, unidos um a um, formam uma espécie de esfera, chamada de “floco de neve”. Serão necessárias 160 mil garrafas para a decoração completa do prédio. A Cooperaacs idealizou o floco de neve, ensinou sua montagem e é quem envia os fundos de garrafa já cortados e lavados.

O grupo ganha por hora trabalhada – a meta diária é de 30 flocos por pessoa. Todo o trabalho é realizado em equipe e, no final, o volume será dividido pelas horas trabalhadas. A remuneração deve variar entre R$ 300 e R$ 400. Esta é a primeira vez que os trabalhadores da cooperativa serão pagos para realizar um trabalho artesanal. Sheila destaca a necessidade de parcerias e patrocínio, inclusive para os carrinhos de coleta. O grupo tenta edstabelecer parceria com a Limpurb, para o fornecimento de itens importantes, como prensa, mesa de triagem, esteira e balança. 

Roseane Barreiros

Da Agência Imprensa Oficial