Cirurgia bariátrica pode diminuir incidência de câncer em obesos mórbidos
Operação aumenta a atividade de células relacionadas à prevenção do câncer e inflamações
A cirurgia de redução de estômago já provou ser eficaz contra vários problemas originados pela obesidade mórbida. A novidade é que ela também pode ajudar a diminuir o índice de tumores relacionados à doença, como câncer de endométrio, mama, próstata, estômago, cólon, vesícula e laringe. A inovação foi premiada no XII Congresso Brasileiro de Obesidade e Síndrome Metabólica, que aconteceu em agosto, e compõe a tese de doutorado da médica Cristiane Moulin, que será defendida na Faculdade de Medicina (FMUSP) da USP no começo de 2008.
“Medi a atividade das células natural killer antes e depois de seis meses da operação, em 28 pacientes, de 23 a 58 anos e obesidade grau III”, explica Cristiane. Segundo a pesquisadora, as células natural killer (NK) exercem importante papel na proteção contra infecções, particularmente virais, e na eliminação de células tumorais. Quanto maior sua atividade, mais forte está o organismo para lutar contra doenças desse gênero.
Imunidade
As NK e os linfócitos B e T são algumas das armas do nosso corpo contra doenças. As primeiras fazem parte da imunidade natural, sendo a primeira linha de defesa do nosso corpo, com respostas quase que instantâneas contra organismos estranhos. Os segundos, da imunidade adquirida, respondem de quatro a sete dias após o contato com tais organismos. No entanto, as células natural killer secretam substâncias que influenciam diretamente a imunidade adquirida. Caso estejam com atividade baixa, podem comprometer, também, a competência dos linfócitos na produção de citocinas (proteínas) que auxiliam na resposta imune.
“Os estudos analisando a atividade de células NK em pacientes obesos e os efeitos da perda de peso sobre este parâmetro da imunidade são limitados”, justifica Cristiane, quanto ao tema abordado no trabalho. Já existem comprovações científicas de que a obesidade está associada à incidência de certas infecções e alguns tipos de cânceres. Estes, por sua vez, estão em parte relacionados à deteriorização da imunidade: baixa atividade das células NK e menor produção de certas citocinas. Uma vez que a cirurgia de redução de estômago ajuda a melhorar o desempenho destas células, as chances de o paciente desenvolver câncer podem diminuir.
O estudo de Cristiane mediu a citotoxidade das NK, ou seja, sua capacidade de matar células-alvo, em três momentos: antes da cirurgia, um mês, e meio ano depois. Na primeira medição, a citotoxidade era baixíssima. Um mês depois, não houve muita diferença estatística, mas alguns pacientes apresentaram um início de curva ascendente. “No sexto mês, a citotoxidade aumentou de forma significativa em quase 86% dos pacientes”, afirma a médica. O peso médio da amostragem, após seis meses da cirurgia, caiu de 136,2 para 100,9 quilos, o que representa uma redução média no Índice de Massa Corporal (IMC= peso/altura2) de 49,5 kg/cm2 para 36,6 kg/cm2. Após o mesmo período, houve aumento na produção de citocinas IL-12 e IL-18 por linfócitos.
O trabalho, que recebeu apoio da Fapesp, não teve a intenção de apresentar dados sobre a incidência de câncer, já que o período de estudo foi de apenas seis meses. “Por isso não posso afirmar com certeza que a redução de estômago ajuda a prevenir tumores em obesos mórbidos. Mas a perda de peso induzida pela cirurgia bariátrica pode ter impacto sobre o desenvolvimento de infecções e cânceres associados com a obesidade, já que modifica as respostas de algumas citocinas relacionadas com a função das células NK e melhora a sua atividade”, conclui.
Obesidade
De acordo com a pesquisa, a obesidade vem ganhando status de epidemia global. No Brasil, estudos epidemiológicos mostram que a evolução da doença é ascendente, atingindo 40% da população adulta, ou cerca de 60 milhões de pessoas. Nos EUA, a prevalência de obesidade grau III ou mórbida (IMC=40 kg/m2) é de 2,8% em homens e 6,9%, nas mulheres. De acordo com a pesquisadora, dados tão específicos ainda não foram definidos na população brasileira, mas estima-se que obesos mórbidos correspondam a 0,2% e 0,8% da população masculina e feminina, respectivamente.
O excesso de peso provoca grande impacto na saúde pública, já que está associado a doenças cardiovasculares, osteoartrite, apnéia, alguns tipos de câncer e distúrbios psiquiátricos. Nos EUA, a morbidade relacionada à obesidade é responsável por 5,7% das verbas destinadas à saúde. Naquele país, o que se gasta com um adulto de obesidade grau III é 47% a mais do que a verba destinada a outro de grau I. Os dados indicam que mais de 100 mil mortes por ano são atribuídas a esta doença crônica.
Mais informações: [email protected], com Cristiane Moulin. Tese orientada pelo professor Alfredo Halpern e co-orientada por Luiz Vicente Rizzo.
Laura Lopes, especial para Agência USP de Notícias
(I.P.)
10/12/2007
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