Crime Organizado: Dossiê de Estudos Avançados



Artigos captam os traços que definem essa chaga da sociedade brasileira

O dossiê Crime Organizado vai fundo no assunto em debate, atento para o que aí há de mais fundamental: as novas formas e o volume que o fenômeno assumiu no País. Ele não é uma novidade entre nós – existiu no passado em forma rudimentar, principalmente no meio rural, sem jamais chegar ao nível de sofisticação das organizações urbanas surgidas nas décadas finais do século 20. O que eram os bandos de cangaceiros e capangas que assolavam os sertões senão formas primitivas do crime organizado? Bandos armados e bem estruturados, primeiro a serviço de antigos escravocratas, e depois de seus descendentes, os coronéis, na verdade senhores da terra e da guerra. Vê-se, assim, que o crime organizado de ontem, essencialmente rural, e que ainda hoje existe em forma residual em regiões remotas do País, assume então uma nova feição, com suas raízes solidamente fincadas nos grandes conglomerados urbanos.

O dossiê, em um dos artigos, capta perfeitamente os traços mais marcantes que definem essa chaga da sociedade brasileira. Em bom trabalho analítico, de autoria de Sérgio Adorno e Fernando Sallas, diz-se textualmente que para “entender como a criminalidade emergiu à cena pública cotidiana, é necessário retroceder aos anos 60 e 70. Desde essas décadas, a sociedade brasileira vem experimentando o progressivo crescimento do crime urbano violento, além de outras manifestações de violência nas relações sociais e interpessoais (...) Os crimes, tráfico de drogas e extorsão mediante seqüestro ao lado dos homicídios, foram aqueles que acusaram as maiores taxas de crescimento”. Mas esclarecem, em seguida, que isso não surgiu do nada, que tem gênese e evolução bem marcadas, que pode ser seguida passo a passo : “A modalidade de criminalidade organizada com sua origem nas prisões se formou nos anos 70, no Rio de janeiro, experimentando rápido crescimento na década seguinte.

Em São Paulo, todavia, esse processo expandiu-se mais tarde, na década de 90, ainda que houvesse sinais de sua existência na década imediatamente anterior. Até então, as prisões eram povoadas por criminosos que, na sua maioria, atuavam individualmente, em pequenos grupos ou quadrilhas desprovidas de laços de identidade que os sustentassem no tempo.” Outros estudiosos do assunto apontam que os primeiros grupos criminosos organizados, “conhecidos nos anos 80 (Falange Vermelha, Serpentes Negras), tanto no Rio de Janeiro como em São Paulo, mais que subproduto de uma convivência entre presos políticos e presos comuns eram conseqüência do que se identificou como “modernização da criminalidade metropolitana”.

Ao longo de quase 240, parece-nos que o Dossiê Crime Organizado consegue o que os editores pretendiam – “abrir um leque de informações e pontos de vista que lançassem luzes sobre os seus aspectos múltiplos e controversos”.  

Fábio de Castro

Da Agência Fapesp