Debate sobre precatórios coloca poder público e advogados em lados distintos
Na audiência pública realizada nesta terça-feira (3), pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), para debater as sete propostas de emenda à Constituição (PECs) que tratam de precatórios judiciais, ficou claro o apoio à medida pelo devedor, o poder público, e as objeções apostas pelos advogados. Dos cinco convidados, os quatro representantes do poder público foram favoráveis à aprovação do substitutivo já apresentado pelo relator, senador Valdir Raupp (PMDB-RO), enquanto o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, manifestou-se francamente contrário à proposta.
Disseram apoiar a proposta de Raupp os secretários da Fazenda de Minas Gerais, Simão Cirineu Dias, e do Rio de Janeiro, Joaquim Levy; o secretário-executivo da Frente Nacional dos Prefeitos, Gilberto Perre; e a coordenadora jurídica da Confederação Nacional dos Municípios, Elena Garrido. Todos, porém, concordaram em um ponto com o presidente da OAB: a legislação que hoje define o pagamento de precatórios é caótica.
O presidente da CCJ, senador Marco Maciel (DEM-PE), anunciou que a matéria será votada nesta quarta-feira (4). Se aprovada na comissão, terá de ser submetida a votação em Plenário antes de seguir ao exame da Câmara dos Deputados. Por alterar a Constituição, exige quórum qualificado, precisando do apoio de 49 senadores, em dois turnos de votação.
Para Cezar Britto, o projeto "legaliza a torpeza" ao propor que o Estado assuma o papel de comprador, com deságio, dos precatórios. Hoje, os precatórios são comercializados em um mercado paralelo, também com deságio. O presidente da OAB também afirmou que o projeto reconhece que os débitos são impagáveis e que os percentuais estabelecidos para o pagamento farão com que sejam necessários de 50 a 60 anos para que todas as dívidas já reconhecidas pela Justiça sejam quitadas, havendo casos, como no Espírito Santo, em que se poderá esperar 140 anos para receber pagamento de precatório.
A nova audiência pública - a quarta realizada pela CCJ para debater o tema - foi pedida pelos senadores pela Bahia César Borges (PR) e Antonio Carlos Júnior (DEM), que, ao final, manifestaram-se contrários à deliberação da matéria no atual momento. Para ambos, há muita coisa ainda a ser debatida. Entre os principais problemas, citaram a quebra da ordem cronológica de pagamento e a possibilidade de prorrogação sucessiva das dívidas.
Raupp já havia incorporado em seu substitutivo quatro das sete emendas apresentadas por César Borges. Entre as emendas estão a que diminui a idade dos idosos, que terão preferência no pagamento de precatórios, de 65 para 60 anos e a que corrige os valores dos precatórios pelos índices da caderneta de poupança.
A principal mudança proposta no substitutivo de Raupp às oito PECs é instituir, nas Disposições Constitucionais Transitórias, o regime especial de pagamentos. Por esse regime, 60% dos recursos serão destinados ao pagamento dos precatórios por meio de leilões de deságio de valor. Quem conceder o maior desconto terá prioridade no pagamento. Os 40% restantes serão destinados ao pagamento dos precatórios não quitados nos leilões, por ordem crescente de valor.
O substitutivo estipula percentuais diferentes das receitas correntes líquidas de estados e municípios para serem utilizados no pagamento dos precatórios. Esses percentuais aumentam quanto maior for o comprometimento da arrecadação do estado ou do município frente às dívidas de precatórios. O índice de comprometimento da receita entre os estados varia de 0,6% a 2%, e entre os municípios, de 0,6% a 1,5%. O texto dá ainda preferência ao pagamento dos precatórios de natureza alimentícia e, dentre esses, os devidos a pessoas com mais de 60 anos, atendendo à emenda de César Borges.
O senador Valter Pereira (PMDB-MS) afirmou, na reunião, ter recebido telefonema do governador do Mato Grosso do Sul, André Puccinelli, no qual este dizia que o estado não terá condições de cumprir o percentual de 1,5% sem cortar despesas de investimento e custeio.
Elena Garrido afirmou que as receitas dos municípios já são comprometidas com o investimento de 25% das receitas em educação, 15% em saúde e 51,3%, em média, com o pagamento de pessoal. Já Gilberto Perre lembrou que há, no Supremo Tribunal Federal, 4,4 mil pedidos de intervenção federal nos estados e municípios em virtude da inadimplência no pagamento dos precatórios.
Joaquim Levy destacou que o substitutivo de Raupp dá garantias do pagamento dos precatórios. Lembrou que o prazo limite de 15 anos para o pagamento, estipulado na proposta, terá de ser cumprido, e que o leilão dá possibilidade de quitação das dívidas em prazo inferior a esse.
Simão Cirineu reconheceu que "jamais o estado vai pagar se não houver um desbaste por meio de leilão". Segundo ele, o deságio praticado hoje na compra de precatórios no mercado informal chega a 80%. Ele disse que os cálculos para correção das dívidas são equivocados, decorrentes de planos econômicos anteriores. O senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) afirmou serem os precatórios "mais um esqueleto" herdado dos tempos de inflação alta e elogiou a evolução da proposta conduzida por Raupp:
- Não adianta fazermos uma lei ideal se ela não vai ser cumprida - afirmou.
Tramitam em conjunto a PEC 1/03, de autoria do então senador Maguito Vilela; a PEC 23/03, do senador Efraim Morais (DEM-PB); a PEC 51/04, do senador Pedro Simon (PMDB-RS); a PEC 11/05, do senador José Maranhão (PMDB-PB); a PEC 29/05, do ex-senador e atual governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB); a PEC 61/05, do senador Paulo Paim (PT-RS); e a PEC 12/06, do senador Renan Calheiros (PMDB-AL).
03/06/2008
Agência Senado
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