Deputados usam dinheiro público para fazer viagens









Deputados usam dinheiro público para fazer viagens
Congressistas utilizam passagens até para campanha

A falta de fiscalização da Câmara permite aos deputados federais utilizarem passagens aéreas compradas com dinheiro público para fazer turismo. Os 513 deputados têm direito a receber quatro passagens de ida e volta por mês para seus Estados de origem.

Em vez de comprá-las e entregá-las a cada um dos deputados, a Câmara lhes dá um "crédito mensal de passagens aéreas". O valor é superior aos preços de mercado e varia conforme o Estado. Até os deputados do Distrito Federal têm direito a um crédito mensal.

Com essa cota, a Câmara gasta R$ 3 milhões por mês. Mas seria possível economizar R$ 24 milhões dos R$ 36 milhões que a Casa gasta anualmente com passagens se a Câmara comprasse os bilhetes mais baratos disponíveis no mercado. Sob a justificativa de dar ao deputado o direito de escolher a empresa aérea, a compra é feita pelos próprios congressistas.

A Folha obteve cópia de um "extrato de movimentação de cotas", produzido pelo Sistema Integrado de Gestão de Cotas Parlamentares da Câmara, referente ao crédito de outubro de 2001 de um deputado de São Paulo. O extrato mostra que os deputados federais do Estado recebem R$ 4.879,59 por mês de crédito para passagens aéreas. O valor equivale a oito passagens de R$ 610, com as taxas de embarque incluídas. TAM e Gol, porém, têm tarifas promocionais de Brasília para São Paulo a R$ 155,15 (R$ 146 da passagem e R$ 9,15 da taxa de embarque).

Caso um deputado de São Paulo utilize apenas os vôos mais baratos, ele pode economizar pelo menos R$ 3.630 por mês -equivalentes a R$ 43,5 mil no ano. Os deputados podem comprar as passagens por qualquer preço oferecido pelas companhias e não precisam reembolsar à Câmara o valor que sobra. A "economia" na compra de passagens vira crédito remanescente para os deputados. Com os créditos, eles podem comprar passagens para qualquer lugar, no Brasil ou no exterior, em nome deles ou de outras pessoas.

O valor da cota dos deputados é estabelecido por critérios aleatórios e supera muito o menor preço das passagens existentes no mercado. A Folha apurou que a maioria dos deputados busca comprar as passagens com o maior desconto. Em alguns casos, elas precisam ser reservadas com antecedência ou só estão disponíveis em determinados horários.

Devido ao fato de a Câmara ser um dos maiores compradores de passagens aéreas do país, com pelo menos 4.000 trechos comprados por mês, é possível supor que a Casa teria condições de negociar a compra dos bilhetes pelo menor preço existente no mercado.

Isso poderia significar uma redução de dois terços no valor despendido pela Câmara. A Casa gasta R$ 36 milhões ao ano com a compra de passagens e poderia economizar R$ 24 milhões se pagasse a menor tarifa do mercado. O dinheiro economizado seria suficiente para atender mais 138 mil crianças no Bolsa-Escola, que dá R$ 15 por mês para famílias com renda inferior a R$ 90 per capita.

Deputados ouvidos pela Folha admitiram que têm sobras de créditos para comprar passagens. Alguns doam bilhetes a assessores, mas outros usam o dinheiro público para fazer campanha eleitoral. Mesmo nos meses em que os deputados viajam a Brasília com menos frequência (nos recessos e períodos eleitorais), os créditos para compra de passagens são depositados normalmente.

Em dezembro do ano passado, os deputados ganharam uma passagem extra. Como a Câmara não fiscaliza o destino das viagens nem os nomes dos viajantes, os congressistas podem comprar passagens para eles e suas mulheres para visitar a Europa, por exemplo, como fez o deputado Gerson Péres (PPB-PA).


Fiesp apresenta propostas para candidatos
Entidade divulga hoje documento contendo sugestões para áreas como política industrial e reforma do Estado

A Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) divulga hoje um documento com propostas para os candidatos à Presidência da República.

No trabalho, resultado de seis meses de pesquisa, a principal federação empresarial do país vai abordar temas como política industrial, distribuição de renda e reforma do Estado.

"Não é um programa de governo, muito menos uma proposta para esgotar o tema. Não temos essa pretensão. Trata-se de uma contribuição que a Fiesp vem apresentar ao debate sucessório", diz o diretor do Departamento de Competitividade e Tecnologia da Fiesp, Mario Bernardini.

É a primeira vez que a entidade elabora um documento desse tipo. Em eleições passadas, sugestões foram apresentadas, mas sem serem reunidas em uma "proposta-síntese", como define Bernardini.

"Nossa intenção é mostrar também como fazer as mudanças no país, não apenas o que fazer. E, principalmente, expor a distância que é possível percorrer no período de quatro anos de um mandato", afirma o diretor.

De acordo com Bernardini, a Fiesp não proporá soluções revolucionárias ou radicalmente inovadoras. "Não estamos interessados em reinventar a roda."

O documento terá a chancela da diretoria da Fiesp. Para sua confecção, foram ouvidas empresas de consultoria e entidades como a Fundação Getúlio Vargas.

As propostas da Fiesp serão encaminhadas aos partidos políticos e aos pré-candidatos à Presidência da República. Eles serão convidados a debater as sugestões da federação nos próximos meses.
De acordo com Bernardini, a Fiesp não deverá apoiar de forma oficial nenhum dos candidatos, em razão de a entidade ser "apartidária".

Eventuais apoios deverão ser dados em caráter pessoal. Também deverão ser divulgados cadernos temáticos pela entidade cobrindo diversas áreas.


Garotinho vê declínio de petista
O governador do Rio, Anthony Garotinho, pré-candidato à Presidência da República, disse ontem que o desempenho de Luiz Inácio Lula da Silva nas pesquisas de opinião vem sendo prejudicado pelo desempenho do PT onde o partido ganhou eleições e é governo.

"As administrações do PT prejudicam o crescimento de Lula na sucessão presidencial", disse o governador, para quem a candidatura do petista está em trajetória declinante, ao mesmo tempo em que ele, Garotinho, estaria subindo. "Hoje, o que as pesquisas mostram é que o Lula tem o seu pior desempenho nas cidades que são administradas pelo PT. O meu maior percentual de votos é no Estado que eu administro."

Garotinho convocou ontem uma entrevista para dizer que estava "muito satisfeito" com a divulgação da mais recente pesquisa do Ibope, na qual ele cresceu três pontos percentuais, alcançando 15% das intenções de voto. Lula continua liderando a pesquisa, com 28%, depois de cair dois pontos percentuais.

Segundo o Ibope, Garotinho aparece em um empate técnico com a governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), que contabiliza 18% das intenções de voto.

O presidente regional do PT no Rio, Gilberto Palmares, rebateu as críticas de Garotinho. "A cada eleição o PT cresce eleitoralmente. O governador quer discordar de dados", contestou Palmares.

Jungmann
Ontem, em Recife, sem a presença de nenhuma liderança do PMDB, o pré-candidato do partido à Presidência ministro Raul Jungmann (Desenvolvimento Agrário) lançou a primeira parte do seu programa de governo, que traz propostas para o Nordeste.

A principal medida proposta por Jungmann é a criação de um Ministério Extraordinário de Desenvolvimento do Nordeste. O cargo teria uma espécie de mandato de dois anos, renovável por mais dois, e o ministro teria de ser aprovado pelo Congresso.

Número de policiais no 2º Fórum Social será quatro vezes maior
Evento terá força-tarefa especial de segurança

O assassinato do prefeito de Santo André, Cels o Daniel (PT), as ameaças a políticos do PT, a hipótese de conflitos de rua e o maior número de participantes vão levar quatro vezes mais policiais às ruas de Porto Alegre para a segunda edição do Fórum Social Mundial, em comparação com o evento do ano passado.
""Esquemas de acompanhamento serão intensificados", afirma Jeferson Miola, coordenador-executivo do fórum pelo governo do Estado. Segundo ele, antes mesmo da morte do prefeito, os atentados terroristas nos Estados Unidos já indicaram a necessidade de reforçar a segurança. Como exemplo, cita que membros de entidades internacionais estão chegando à cidade com esquemas próprios de vigilância.

A força-tarefa oficial para garantir a segurança nos seis dias do encontro é formada por 850 policiais da Brigada Militar gaúcha. Ainda há a possibilidade de agregar mais 600 policiais em hora extra. Soma-se a essa quantidade o policiamento normal da capital, com 500 PMs por turno. Os chamados locais de risco para uma manifestação de esquerda, como prédios de multinacionais e veículos de comunicação, ganharão olhares mais atentos dos policiais.

O coronel Ilson Pinto de Oliveira, comandante do policiamento da capital, diz que o efetivo apenas cresceu proporcionalmente ao número de participantes do evento. A organização do 2º Fórum Social Mundial espera a presença de 50 mil a 60 mil pessoas na capital gaúcha, contra 25 mil do primeiro encontro.
Em todos os locais onde se desenvolvem atividades do fórum, como no campus da PUC-RS e no Anfiteatro Pôr-do-Sol, palco de shows no início da noite, haverá acompanhamento também de 200 seguranças particulares.

O coronel Oliveira afirma que a preocupação com manifestações violentas não reside nas marchas promovidas pelo fórum, como a passeata no dia da abertura e outra no dia 4 de fevereiro.
O vice-governador Miguel Rossetto afirma que os movimentos sociais são autônomos na realização de atos públicos. ""Não permitiremos a violência."

A Federação Anarquista Gaúcha divulga na internet que pretende promover manifestações durante o fórum. No próprio site a entidade afirma que pretende "coordenar uma potente intervenção anarquista".

O idealizador do Fórum Social Mundial e integrante do comitê organizador Oded Grajew teme que ações ""pirotécnicas" desviem a atenção do debate de idéias.

A Prefeitura de Não-Me-Toque (270 km da capital) pediu para o Estado reforçar a segurança na área da empresa Monsanto. A multinacional teve uma lavoura experimental de grãos geneticamente modificados e um laboratório destruídos por integrantes do MST e pelo ativista francês José Bové durante o fórum do ano passado.


Sociólogo defende resistência coletiva
ENTREVISTA

O Fórum Social Mundial, que começa nesta semana em Porto Alegre, terá de ser mais conclusivo do que sua primeira edição. Essa é a opinião do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos. Entre as tarefas mais urgentes do evento, ele menciona a necessidade de incrementar as articulações inter-regionais. "É urgente que os países de desenvolvimento intermediário tomem consciência da necessidade de resistir coletivamente à globalização neoliberal."

Sousa Santos, 61, professor da Universidade de Coimbra, vem ao Brasil para participar do evento. Também lançará aqui "A Globalização e as Ciências Sociais", coletânea de ensaios organizada por ele, que sai pela editora Cortez. Leia abaixo os principais trechos da entrevista que Sousa Santos concedeu à Folha.

Folha - O sr. diz que o neoliberalismo vai de encontro aos princípios do liberalismo clássico do século 19 e que esta seria a razão da atual crise do capitalismo. Acredita que a alternativa para uma globalização justa seria retomar fundamentos daquele liberalismo?
Boaventura de Sousa Santos - O neoliberalismo atual está contra o liberalismo clássico do século 19 porque este era a favor de concessões às classes trabalhadoras, e foi a partir delas que surgiram as políticas sociais do século 20. O que distinguia os liberais clássicos dos "demo-socialistas" era a quantidade e a qualidade das concessões. Na Europa, as concessões "demo-socialistas" prevaleceram, e o resultado foi a criação de um "Estado do Bem-Estar". O neoliberalismo atual é hostil às concessões e por isso é herdeiro direto do conservadorismo do século 19.
Temos de avançar para novas soluções com novas articulações entre Estado, comunidade e mercado. O que se se manterá enquanto houver capitalismo é a clivagem entre esquerda e direita.

Folha - Acredita que neste segundo Fórum Social o debate será mais conclusivo?
Sousa Santos - O objetivo do primeiro foi mostrar que há alternativas à globalização neoliberal, e que é urgente que essas alternativas sejam incluídas nas agendas dos Estados e organizações internacionais. Isso foi atingido. Até o 11 de setembro eram visíveis mudanças no discurso político internacional hegemônico: a admissão de que a globalização neoliberal é muito excludente e que isso tem de ser controlado, o reconhecimento de erros passados por parte das agências financeiras internacionais e o propósito de formular políticas mais realistas aos custos sociais que produzem.
Essas mudanças ocorreram por pressão do povo de Porto Alegre e prenunciavam que se seguissem mudanças da agenda política e mudanças políticas concretas.
As tarefas do fórum são agora mais urgentes. Ele terá de tentar obter articulação inter-setorial e inter-regional. Por isso os debates estão sendo desenhados para serem mais conclusivos.

Folha - Como seria possível diminuir a discrepância entre a economia globalizada e a política não-globalizada? Acha que os nacionalismos devem se acirrar como autodefesa dos Estados Nacionais?
Sousa Santos - Essa discrepância existe, e o Fórum Social Mundial é um movimento que busca desenvolver a dimensão global da política. É preciso distinguir o nacionalismo dominante do nacionalismo subalterno. O primeiro predomina nos países mais desenvolvidos e consiste em impor a globalização em tudo o que os favorece. Os Estados Unidos são exemplo paradigmático de nacionalismo dominante.
Por outro lado, o nacionalismo subalterno consiste na resistência a uma imposição hegemônica de globalização. Esse nacionalismo subalterno não tem qualquer viabilidade a menos que se desnacionalize. Ou seja, a menos que se converta numa articulação entre países do Terceiro Mundo, com o objetivo de dar força à globalização alternativa que o povo de Porto Alegre tem proposto.
É urgente que países de desenvolvimento intermediário e com grandes populações tomem consciência da necessidade de resistir coletivamente à globalização neoliberal. Penso em países como Brasil, Argentina, México, Venezuela, África do Sul, Índia. China e Rússia também podem desempenhar um papel. É preciso que os Estados desses países sejam sujeitos à pressão de movimentos sociais progressistas.

Folha - O sr. é um crítico da descolonização realizada por Portugal, tendo estudado mais especificamente o caso de Macau. Em sua opinião, qual é a principal consequência negativa da colonização portuguesa no Brasil de hoje?
Sousa Santos - Portugal, por ser ele próprio um país semi-periférico, foi um colonizador inconsequente. Isso teve um efeito contraditório. Por um lado, tornou possível a independência mais oligárquica e conservadora da América Latina, o Brasil. Por outro, favoreceu relações caóticas entre colonizador e colonizado, fez com que a independência não fosse onerada por neocolonialismos. Reside aqui o grão de verdade do luso-tropicalismo.

Folha - O que pode ser feito sobre a relação entre Portugal e Brasil?
Sousa Santos - Portugal está hoje integrado na União Européia e o modo como decidiu sua integração não lhe permite reivindicar uma política própria apoiada em laços históricos em relação à Á frica ou ao Brasil. A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa tem sido uma oportunidade fracassada. A oportunidade reside em que, não havendo nenhum país hegemônico nessa comunidade, será possível uma articulação solidária com algum peso na comunidade internacional. Em vez disso, temos tido um Brasil ausente e uma luta estúpida pela hegemonia entre dois países não hegemônicos na cena mundial, Brasil e Portugal.

Folha - Por que o sr. não concorda com o termo antiglobalização?
Sousa Santos - Realmente a designação antiglobalização não faz sentido quando aplicada ao movimento que tem no Fórum Social Mundial a sua mais forte expressão, pois ele próprio é global. A maioria dos movimentos que lutam contra a globalização neoliberal não é contra a globalização. É contra esta globalização e luta por uma globalização alternativa.

Folha - O sr. acredita que as alternativas à globalização têm de ser formuladas de forma diferente no Primeiro e no Terceiro Mundo?
Sousa Santos - Penso que a maior hipocrisia da globalização neoliberal é estar dominada por critérios duplos, impondo aos países periféricos o contrário do que países centrais fazem quando seus interesses estão em jogo. Veja, por exemplo, o protecionismo dos produtos agrícolas na Europa ou da indústria do aço e agora os da indústria têxtil, nos Estados Unidos. As articulações Sul-Sul, sobretudo entre países com populações que pelo seu tamanho são um fator de pressão global, são urgentes para dar fim a essa hipocrisia.


MST faz ato por terra no interior de São Paulo
O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) faz hoje uma manifestação pela reforma agrária em Presidente Bernardes (589 km a oeste da capital) e uma passeata, que irá da cidade até Presidente Prudente. O movimento exige dos governos federal e estadual o assentamento de 1.300 famílias na região do Pontal do Paranapanema. Pela manhã, acontece celebração ecumênica no acampamento Oziel Alves, em Presidente Bernardes, onde vivem 180 famílias sem-terra. Após o ato religioso, os sem-terra irão até Presidente Prudente (565 km a oeste de São Paulo) para manifestação pela reforma agrária, que contará com representantes da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e Força Sindical. O líder José Rainha Jr. disse que aproximadamente mil sem-terra participarão da caminhada. Rainha não descartou a possibilidade de o MST fazer um acampamento permanente em Presidente Prudente. Além do assentamento de 1.300 famílias, o MST reivindica a desapropriação de 90 mil hectares na região do Pontal neste ano.


Artigos

O povo e o público
Carlos Heitor Cony

RIO DE JANEIRO - Não dá para entender a quase histeria de partidos e candidatos em busca dos marqueteiros. Profissionais da política, já tentados e testados em outros pleitos, donos absolutos de um eleitorado cativo, mas insuficiente (é principalmente o caso de Lula), se esbofam em melhorar o que chamam de "imagem".

Para conseguir essa melhoria, escondem o que têm de mais legítimo, de mais natural, e adotam a maquiagem preparada para criar um marketing favorável à ampliação do número de votos.

Deixam de ser o que são e passam a ser o que os técnicos do mercado acham que deve ser. Isso inclui desde o corte do cabelo até o corte em alguns pontos essenciais do programa de cada um. Não se fala em moratória, em FMI, em concentração de renda. O discurso tem de ser politicamente correto, "light", sem ameaças ao capital e sem ameaças a ninguém, o que significa, na realidade, uma ameaça concreta para a grande maioria dos cidadãos.

Fica assim a vida política nacional submetida à tirania de um "ibope informal", ou formalizado de tempos em tempos pelas pesquisas. Tal como no caso das telenovelas e dos programas de auditório, quem determina o que vai para o ar é o índice de audiência. O próximo presidente da República terá de ser o produto final de uma fórmula marqueteira que o pautará de acordo com a expectativa de um público e não de um povo.

Já tivemos laboratórios desse novo tipo de eleição. Collor se vestia melhor, penteava-se melhor. Lula tinha a barba mal cuidada, errava os pronomes. Com FHC e o mesmo Lula a dose foi repetida. O poliglota contra o monoglota. O professor contra o ex-operário.

Finalmente, irá mais uma vez para o trono, dentro daquilo que os marqueteiros com razão chamam de "cenário", aquele que for melhor produzido, e não aquele que saiba produzir.


Editorial

RACISMO EXECUTIVO

Que mulheres e negros são discriminados, não é novidade. Estão sub-representados no trabalho, nas escolas, na distribuição de renda. Negros "vencem" em mortalidade infantil, analfabetismo etc.

Pesquisa inédita realizada pelo Instituto Ethos com dados do IBGE mostra agora o tamanho da discriminação nas empresas brasileiras. Negros e pardos ocupam apenas 6% dos cargos de direção das companhias, quando respondem por 46% da população geral. A situação das mulheres é semelhante. Elas também respondem por apenas 6% dos postos mais elevados das empresas ao passo que constituem 50,8% da população brasileira.
Sempre que se percebem distorções tão gritantes, a primeira idéia que vem à cabeça é a criação de cotas para minorias, seja na universidade ou no trabalho. A criação de cotas é problemática. No plano teórico, a medida equivale a tentar reparar uma injustiça criando outra, manobra que raramente dá certo. O combate às diferenças socioeconômicas entre grupos é um imperativo das sociedades democráticas. O racismo e o sexismo precisam ser eliminados, mas isso não pode dar-se a qualquer custo.

Não bastasse essa dificuldade de princípio, a criação de cotas esbarra em sérias dificuldades práticas. Um exemplo: como definir um negro no Brasil? O IBGE utiliza o critério da autodefinição, que, no fundo, é o único democrático. Se um branco disser ao recenseador que é negro, assim será considerado pelo instituto. O que impediria alguém de declarar-se negro para ter acesso às cotas? Mesmo que todos fossem absolutamente honestos, quão negro alguém precisaria ser para fazer jus às cotas?

O Brasil precisa envidar esforços para promover a integração racial. Ações afirmativas devem ser consideradas e implementadas. O limite deve ser o da justiça. Admitir que se deve reparar uma injustiça com a criação de outra, uma variação de "os fins justificam os meios", é um argumento filosoficamente tíbio.


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01/28/2002


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