Endividados e sem tecnologia, produtores de cacau não atendem mercado interno
O endividamento, a falta de crédito rural dos produtores e a tecnologia de produção pouco difundida são alguns dos obstáculos ao crescimento da produção de cacau no Brasil. Os produtores brasileiros, que já foram responsáveis pela segunda maior produção do mundo na década de 80, ainda não se recuperaram dos prejuízos causados pela vassoura de bruxa, a praga que destruiu boa parte de suas lavouras no início da década de 90. E agora pedem apoio do governo para ampliar a produção.
A situação da cacauicultura no país foi discutida em audiência pública da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) na tarde desta sexta-feira (27). Produtores, empresários e representantes do Ministério da Agricultura afirmaram que o consumo de chocolate cresceu significativamente nos últimos anos, tanto no mercado interno como no mercado externo. É preciso agora incrementar a produção brasileira para conquistar esse mercado.
- Temos todos os elos da cadeia: produzimos, processamos e consumimos cacau. Seria falta de senso se continuássemos exportando produto barato e importando chocolate caro – argumentou na audiência o diretor da Comissão Executiva da Lavoura Cacaueira (Ceplac), Jay Wallace da Silva Mota.
Segundo Jay Wallace, o cacau é hoje produzido em seis estados brasileiros: Bahia, Pará, Rondônia, Espírito Santo, Mato Grosso e Amazonas, sendo a Bahia o maior produtor. A produção nacional, que já chegou a 400 mil toneladas por ano na década de 80, atualmente fica, em média, em 230 mil toneladas (dados de 2010). O mercado consumidor, no entanto, saltou de 300 gramas por pessoa em 2002 para 1,3 quilo por pessoa hoje. Ou seja, atualmente, a produção nacional de cacau não consegue atender à demanda interna, fazendo com que as indústrias tenham de importar matéria-prima.
Endividamento
Para o presidente da Associação dos Produtores de Cacau (APC), Guilherme Galvão, um dos motivos de a produção nacional não ter se recuperado dos prejuízos da vassoura de bruxa – praga que teria sido propositadamente inserida nas lavouras cacaueiras da Bahia no final da década de 80 – é o grau de endividamento dos produtores. Galvão explicou que, desde os primeiros financiamentos feitos para recuperação da produção, e que não produziram os resultados esperados, pois a praga não foi integralmente contida, os agricultores não conseguem quitar suas dívidas com os bancos.
Com a produção caindo ano a ano, os agricultores seguem sem recursos para investir em tecnologia e aumentar a produtividade. Assim, perdem para a concorrência externa, vinda principalmente da Costa do Marfim e da Malásia. Galvão advertiu que cerca de U$ 1,5 bilhão devem ser gastos com importação de matéria-prima do cacau para processamento no país. Para ele, o Brasil não precisa voltar a ser o maior produtor de cacau do mundo mas, ao menos, conseguir ser autossuficiente no setor.
A preocupação foi compartilhada pelo secretário-executivo da Associação de Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), Walter Tegani. Ele explicou que há mais de uma década as empresas não conseguem fazer investimentos efetivos para ampliação da capacidade de processamento por não ter matéria-prima para trabalhar. Se ampliarem o processamento, precisarão aumentar a importação do produto, já que o mercado interno não consegue atendê-las.
- O mercado brasileiro é o único com boa produção, área para expandir, indústria processadora e mercado consumidor em crescimento. Nossa preocupação hoje não é procurar cliente, mas procurar matéria-prima para viabilizar a manutenção das indústrias e, no futuro, para ampliá-las – lamentou.
Cultura sustentável
Outro ponto destacado pelo representante dos produtores de cacau foi a sustentabilidade. Guilherme Galvão explicou que a lavoura de cacau, especialmente quando cultivada pelo modelo de cabruca (em que o cacau é plantado junto a espécies da flora nativa para que possa usufruir de suas sombras e aumentar a produção de frutos), é uma “escola de sustentabilidade”. Com preservação da mata nativa, proteção do solo e resgate de carbono, a lavoura de cacau é considerada uma das mais ambientalmente corretas. A cacauicultura também representa grande mercado de mão de obra rural para o país. Com cultivo pouco mecanizado, as fazendas de cacau correspondem na Bahia a 60% do mercado rural.
A solução, defenderam os convidados da audiência, passa por renegociar as dívidas dos produtores e investir na divulgação de tecnologias – com implantação de mudas mais resistentes às pragas, controle do sombreamento e do manejo e métodos que aumentem a produtividade por área.
Presidente da CRA, o senador Acir Gurgacz (PDT-RO) afirmou que a comissão fará todo o possível para solucionar os problemas que emperram a produção de cacau no país. O senador se comprometeu a analisar na comissão todas as propostas legislativas relacionadas ao setor e anunciou que a CRA promoverá agora em maio uma audiência pública com representantes do governo federal para debater especificamente o problema de endividamento dos produtores rurais. A reunião tentará encontrar soluções de renegociações das dívidas, que afetam não apenas os cacauicultores mas agricultores de todo o país.
Também participaram da discussão Eduardo Brandão Costa, representante da Conderação Nacional de Agricultura e Pecuária (CNA); Wilson Destro, superintendente regional da CEPLAC em Rondônia; e Rafael Hercelin, responsável pelo projeto Phoenix, promovido pela Associação das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC) para incentivar o aumento da produção de cacau no país.
27/04/2012
Agência Senado
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