Escola do Povo de Paraisópolis forma primeira turma de alunos alfabetizados



Com a ajuda de voluntários, programa quer erradicar o analfabetismo na segunda maior favela de São Paulo

A manhã de 10 de janeiro tornou-se um divisor de águas na vida de Marcelo dos Santos(*). Naquele dia, ele iria receber seu salário e abrir pela primeira vez conta em um banco. Ao chegar à agência, passou por situação constrangedora: na hora de assinar a ficha cadastral, não conseguia fazê-lo corretamente. A atendente obrigou-o a assinar várias vezes zombou de sua condição de analfabeto, fez com que ele colocasse sua impressão digital na ficha cadastral e só assim abriu a conta.

Marcelo saiu do banco jurando que iria mudar a história da sua vida. Recorreu à União dos Moradores e do Comércio de Paraisópolis e matriculou-se no curso de alfabetização da Escola do Povo. Hoje (31 de agosto), ele e mais 700 alunos participam de uma cerimônia de formatura no Palácio dos Bandeirantes. A partir de agora, Marcelo e seus colegas poderão continuar os estudos e freqüentar o Ciclo 1 do ensino fundamental (1ª a 4ª séries), também pertencente à comunidade de Paraisópolis, para depois ganhar condições de acesso a uma universidade.

A União dos Moradores de Paraisópolis está comprometida com a melhoria da qualidade de vida destas 15 mil pessoas. A entidade promove alfabetização de adultos desde 2003 e em novembro de 2006 recebeu o Prêmio Dolce Vita de Responsabilidade Social na categoria Ação em Educação & Cultura, prêmio que identifica e reconhece as ações sociais que promovem a diminuição de desigualdade social e a busca por melhores condições de vida a todos que habitam o mesmo espaço – no caso, a região do Morumbi.

“É uma experiência inacreditável ver uma pessoa que não consegue escrever o seu próprio nome, que viveu vários anos dependendo dos outros, ler textos inteiros e escrever, procurar livros em nossa biblioteca e dizer que pretende dar continuidade aos estudos”, diz Juliana Gonçalves Rodrigues, 24 anos, alfabetizadora há quatro anos.

Pais e filhos – O programa Escola do Povo tem um programa ambicioso: erradicar o analfabetismo em Paraisópolis, segunda maior favela de São Paulo e a quinta do Brasil, com aproximadamente 80 mil habitantes, dos quais 15 mil são analfabetos ou semi-analfabetos. Paraisópolis está encravada em um dos bairros mais ricos da cidade de São Paulo, o Morumbi, local onde com mais clareza é possível conhecer as diferenças sociais que existem na capital. Esses moradores convivem com limitações que dificultam o seu desenvolvimento social, sua vida e o bem-estar de suas famílias.

Gílson Rodrigues, presidente da Associação de Paraisópolis, diz que “a falta de oportunidades fez com que muitas pessoas abandonassem a escola para contribuir, desde cedo, com o sustento de seus parentes. A favela de Paraisópolis evidencia os contrastes e contradições de nossa sociedade”.

A ousada empreitada desperta apoios em toda parte. “Sou agente comunitária de saúde e, pelas minhas andanças por Paraisópolis, descobri que muitas pessoas mal conseguiam ler o próprio nome. Queria alfabetizar, mas, não sabia como. Meu filho Francisco, que trabalha como voluntário na União, falou que a Escola do Povo precisava de alfabetizadores. Procurei a instituição e hoje alfabetizo seis pessoas em minha própria casa”, conta Marleide Alves Cavalcante.

Os alunos de dona Marleide têm de 32 a 58 anos. “Muitas mães com bebês vêm à aula, que ocorrem de terça a sexta-feira, das 19h30 às 21h30, porque não têm com quem deixar o filho pequeno e não desejam perder as aulas. Enquanto eu tiver forças e espaço na minha casa, continuarei alfabetizando meus alunos”, diz a agente comunitária.

Didática – O programa, lançado no início deste ano, utiliza o método Paulo Freire para alfabetizar os alunos. Por esse sistema, o professor, por meio de conversas informais, observa as palavras mais usadas pelos alunos e seleciona as que servirão de base para as lições. Os alunos recebem aulas de Português, Matemática e História, nas quais são tratados temas relacionados à cidadania. “Até o final do curso, o aluno já consegue ler textos inteiros. Durante as aulas abordamos vários temas sobre o nosso dia-a-dia”, explica Juliana.

O curso de alfabetização traz novas esperanças a dona Iranilda da Silva. “Quero realizar o sonho de escrever uma carta à minha filha e assinar meus documentos”, diz a veterana moradora de Paraisópolis.

O mesmo sonho é acalentado pela maioria dos estudantes que freqüentam as aulas de alfabetização e “querem ver sua assinatura no documento de identidade no local da digital”, diz Joildo Barreto dos Santos, 21 anos, outro voluntário que trabalha na União dos Moradores.

Para a costureira Zulmira Humberto Lima, de 60 anos, mãe de cinco filhos e avó de sete netos, o sonho é ainda maior. “Pretendo continuar meus estudos e me formar advogada. Quero ajudar as pessoas que não conhecem os seus direitos, principalmente aquelas que querem obter a sua aposentadoria e não sabem como”.

As aulas são dadas na União dos Moradores, em casas de alfabetizadores voluntários, em igrejas, etc. “Basta ter vontade para aprender ou ajudar, não há limite de idade, nem dificuldades que impeçam. A dedicação dos alfabetizadores, todos moradores da comunidade, e o apoio das entidades foram fundamentais para tornar o programa realidade”, garante Gílson. Que promete para o dia da formatura: “A comemoração será em grande estilo e toda a comunidade está correndo de um lado para o outro para tornar esse dia inesquecível. E Juliana complementa: “As costureiras e os salões de beleza estão trabalhando a todo vapor para que essa noite fique marcada para sempre na vida de todos nós”.

Maria Lúcia Zanelli

Da Agência Imprensa Oficial

SERVIÇO

Formatura da Primeira Turma do Programa Escola do Povo

Dia 31 de agosto, às 19 horas

Palácio dos Bandeirantes, Auditório Ulysses Guimarães

Avenida Morumbi, 4.500 – São Paulo

*nome fictício



08/31/2007


Artigos Relacionados


Unilegis forma primeira turma de pós-graduação

Pronatec Copa forma primeira turma em Curitiba

Unesp forma primeira turma de especialização a distância

Primeira turma de professores indígenas se forma em 2008

Univesp forma primeira turma de pedagogia na modalidade semipresencial

Curso de Pintores promovido da CDHU forma primeira turma