Grupo de trabalho estudará solução para impedir fim da profissão de técnico em contabilidade



Um grupo de trabalho com participação da Comissão de Assuntos Sociais (CAS) estudará soluções para impedir o fim da profissão de técnico em contabilidade. O objetivo é reunir nesse comitê o Conselho Federal de Contabilidade (CFC), associações e sindicatos que representam bacharéis e contadores de nível técnico, além de integrantes dos Ministérios do Trabalho e Emprego e da Educação, conforme deliberação de audiência pública realizada pela comissão nesta quinta-feira (20).

Em decorrência de norma aprovada em 2010 pelo Congresso, a atividade passou a exigir formação de nível superior. A partir de 2015, os registros serão concedidos apenas para os bacharéis em Ciências Contábeis. Já os técnicos só poderão se registrar até 1º de junho do ano que vem, sem prejuízo para os que até lá estejam licenciados, atualmente perto de 188 mil profissionais.

- O assunto preocupa e creio que seja necessário novo encaminhamento – opinou o senador Waldemir Moka (PMDB-MS), que preside a comissão.

A audiência foi proposta pelos senadores Paulo Paim (PT-RS) e Paulo Davim (PV-RN). Paim também se mostrou preocupado com o risco de extinção da profissão e apelou para uma saída que atenda aos dois segmentos da atividade. A comissão deverá apresentar alternativas até o final de abril.

Medida Provisória

O limite de prazo para acolhimento dos pedidos de registro de técnicos foi  estabelecido por meio da Lei 12.249, de 2010, decorrente de uma medida provisória que originalmente tratava apenas de incentivos para infraestrutura na indústria petrolífera. Segundo Luiz Sérgio da Rosa Lopes, presidente da Federação dos Contabilistas nos Estados nos Estados do Rio, Espírito Santo e Bahia, o dispositivo foi uma de muitas emendas inseridas na MP durante a tramitação da matéria na Câmara dos Deputados e depois confirmadas pelo Senado.

O dispositivo passou a fazer parte da norma que regulamenta a profissão dos contadores e dos técnicos em contabilidade, o Decreto-Lei 9.295, de 1946. Ainda de acordo com Lopes, esse decreto vinha regendo “harmoniosamente” os dois segmentos até a edição da nova lei, em decorrência de MP que comportou uma “miscelânea suspeita” de modificações, inclusive para tratar do Programa Minha Casa, Minha Vida.

- A esdrúxula lei é fruto das aberrações legislativas que correm em nosso país, por iniciativa daqueles que querem atender interesses minoritários – criticou Lopes.

Ao indagar sobre as motivações da medida, Lopes disse recusar a ideia de que tenha sido adotada com o objetivo de “sufocar” os pequenos escritórios - em sua maioria sob o comando de técnicos – e suprimir a concorrência. A seu ver, nesse caso teria sido cometido um equívoco.

- O mercado encontrará outra solução, até mesmo por meio da supressão da obrigatoriedade da escrituração contábil, em prejuízo dos próprios contadores.

Para Lopes, que tem formação como contador, a restrição aos técnicos também não interessa aos empresários, pois reduzirá a oferta de prestadores de serviços contábeis, o que pode levar ao aumento dos preços impostos pelo cartel dos bacharéis. Ele também mencionou o risco de uma desassistência de profissionais da área em regiões do interior, longe dos grandes centros. A seu ver, os bacharéis dificilmente vão querer atuar nessas localidades.

Filtro

O professor universitário Marcone Hahan de Souza, também contador, defendeu do mesmo modo a coexistência dos dois segmentos. Ele lembrou que o Brasil é um país empreendedor, destacando-se nesse campo em segundo lugar no mundo, havendo lugar e necessidade para bacharéis e técnicos. Disse que há pontos similares nas atividades, mas também diferenças, sendo destinadas aos bacharéis atividades de auditoria e especialização no campo acadêmico.

O professor também criticou os que defendem a extinção da profissão dizendo que a formação do técnico não é adequada. Segundo ele, as provas realizadas pelo CFC já atuam como filtro, selecionando os que estejam aptos para atuar, tanto técnicos como bacharéis. Observou ainda que hoje há atividades comuns entres os dois segmentos, bem como especificidades.

Segundo Marcone de Souza, sempre “pairou uma nuvem” pela extinção dos técnicos. Ele lembrou que o CFC já havia baixado uma resolução nesse sentido, mas que foi derrubada na Justiça. A seu ver, um bom caminho seria regulamentar o nível técnico por meio da regulamentação no campo dos tecnólogos. Também sugeriu que, para uma melhor coexistência, poderia se estabelecer segmentos mais claros das atividades, definindo quem pode ou não fazer perícia ou mesmo estipulando limite de faturamento empresarial que pode comportar a atuação apenas de técnicos na contabilidade.

Cursos irregulares

Oscar Lopes da Silva, que é especialista em contabilidade e auditoria, salientou que não foi a medida provisória que extinguiu a profissão de técnico, Para ele, essa MP apenas regulamentou medida adotada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996, que retirou o curso da lista geral. Assim, lembrou o expositor, os cursos técnicos na área estariam sendo ofertados de forma irregular.

Também professor universitário, Oscar Lopes foi quem mais questionou a qualidade da formação dos técnicos. De acordo com ele, os profissionais chegam ao mercado sem preparo adequado, depois de passar por cursos com carga reduzida e pouco conteúdo específico. Marcone de Souza, em contraposição, afirmou que também há problemas na formação dos bacharéis.

Discussão garantida

A defesa mais firme das medidas de restrição aos cursos técnicos partiu de Zulmir Ivânio Breda, vice-presidente de Desenvolvimento Profissional e Institucional do CFC, que representou o órgão. De acordo com ele, a lei da profissão precisava ser atualizada e a iniciativa foi debatida amplamente em todo o país, por meio de audiências públicas, resultando disso as sugestões levadas ao governo e ao Congresso.

- Pelo que se ouviu aqui, passou-se a ideia de que a proposta foi elaborada em gabinetes fechados, sem qualquer discussão – rebateu.

Depois de reforçar as criticas aos cursos técnicos, ele disse que, apesar das deficiências de formação, esse segmento pode exercer praticamente todas as prerrogativas dos contadores, uma categoria com cerca de 300 mil profissionais. Também afirmou que a área passou por mudanças importantes nos últimos dez anos, desde quando o país foi obrigado a fazer a convergência para os padrões internacionais de normas contábeis, o que amplia as exigências sobre os profissionais.

Para Daniel Souza dos Santos, que preside o Sindicato dos Contabilistas de Porto Alegre, é um contra-senso acabar com o nível técnico no momento em que o governo se esforça para ampliar a formação profissional no país. Ele trouxe para a comissão um abaixo-assinado com apoio de mais de cem entidades pedido a revogação do dispositivo da lei que extingue a possibilidade de registro a partir do ano que vem.

Alerta

Participou ainda da audiência o senador José Pimentel (PT-CE), que também refutou afirmações de que a mudança via medida provisória passou sem o devido debate. Ele esclareceu que qualquer nova solução não poderá nascer por meio de projeto de lei de iniciativa do Legislativo. A prerrogativa seria do Executivo, que responde pela iniciativa de propor lei para regulamentar ou alterar estatutos de profissões. Exatamente por isso, conforme o senador, a extinção do curso aconteceu por meio da LDB, cabendo à medida provisória apenas estabelecer prazo para o fim do registro.

- Estou dizendo isso para que vocês não saiam daqui enganados, com falsas expectativas – ressaltou.



20/03/2014

Agência Senado


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