Hospital Infantil Cândido Fontoura completa 50 anos
Além de atendimento médico para criança e jovens, o hospital oferece palestras sobre maus tratos e refluxo
Prestes a completar 50 anos, o Hospital Infantil Cândido Fontoura, localizado no bairro Água Rasa, na zona leste, passou por ampla reforma no ano passado. Novos equipamentos como uma UTI móvel, maior espaço físico e mais leitos e consultórios são algumas das mudanças. Até a cara está com ar jovial. Alegre e colorida, dá as boas vindas aos 12 mil jovens pacientes (de recém-nascido até 21 anos) que chegam ao pronto-socorro ou ao ambulatório todos os meses. Para comemorar seu aniversário, haverá uma semana de atividades culturais e de saúde, a partir do dia 28.
Na reforma, ampliação e compra de materiais (hospitalar e mobiliário), a Secretaria Estadual da Saúde investiu R$ 22,8 milhões. O Hospital estadual nasceu, dia 30 de setembro de 1958, com a vocação de cuidar de crianças e adolescentes. Seu nome tem forte ligação com o público infantil. Homenageia o farmacêutico Cândido Fontoura Silveira, inventor do Biotônico Fontoura, fortificante amplamente adotado como complemento alimentar da criançada. Sua construção atendeu a solicitação da população que não dispunha de serviço semelhante na região.
Nessa época, dedicava-se a tratar de diarréias agudas, desidratação e broncopneumonias. Na década de 70, enfrentou o desafio de conter a epidemia de meningite. Hoje, a equipe médica lida com quase 10 mil patologias. Atualmente é referência em atendimento médio hospitalar, ambulatorial e de urgência dos jovens pacientes. Oferece assistência em cardiologia, nefrologia, dermatologia, otorrinolaringologia, endocrinologia, neurologia, cirurgia infantil, psiquiatria, oftalmologia, ortopedia, gastroenterologia, nutrição, psicologia e molésticas infecto-contagiosas. Não atende casos de traumas.
Equipamentos sofisticados – Na nova rotina instituída no hospital, ao entrar no Pronto Socorro a criança é pesada e sua temperatura, aferida. Se estiver com febre, é medicada imediatamente. Depois, passa por consulta com o clínico geral e encaminhada para exames, se necessário. Febril e indisposto, Albert Alves da Silva, de 3 anos, chegou ao local e foi medicado. Depois, fez inalação e recebeu soro para curar uma virose. Ao retornar ao consultório, o pequeno dirigiu-se de imediato ao médico para que ele tirasse a agulha do braço que o impedia de brincar.
Para casos mais graves, o hospital dispõe de equipamentos de emergência, como desfibriladores. Com equipamentos de última geração, espaço físico mais adequado (2.880 metros de área construída), informatização e a equipe médica preparada, o hospital tem aumentado os atendimentos e melhorado a qualidade dos serviços, afirma a diretora, Ana Chadad. “Nossa UTI nada fica a dever a hospitais como o Sírio Libanês”, garante orgulhosa. Em cada UTI (neonatal e pediátrica) há 14 leitos.
A diretora diz não poupar recursos no tratamento de saúde dos pacientes. “Há leite especial que custa R$ 400 a lata”, exemplifica. “Aqui as crianças são tratadas como se fossem meus filhos”, acrescenta. Pelos corredores, cujas paredes são enfeitadas com painéis, quadros e desenhos de temática infantil, circulam por mês três mil crianças e adolescentes para fazer exames de raios-X. Outras 280 passam pelo ultra-som. O hospital dispõe de ultra-som com doppler, ecocardiograma, eletrocardiograma, eletroencefalograma e laboratório de análises clínicas.
Brinquedoteca distrai e diverte – Mensalmente são feitas aproximadamente 30 endoscopias. Foi esse exame que Fernanda Pereira de Souza, de 11 anos, teve de se submeter após tratamento de gastrite. “É para saber se os remédios curaram”, explica a mãe, Lucielene Pereira de Souza. Por mês, mais de 100 pacientes vão parar em uma das quatro salas de cirurgias que dispõem de 14 leitos. Quase 300 delas ficam internadas, como é o caso da Geovana Costa, de 2 anos e quatro meses. Permanecerá uma semana, para tratar de pneumonia, acompanhada pela mãe, Celina de Fátima Costa.
Celina relata que o médico da unidade básica de saúde prescreveu medicação para virose. Como Geovana não melhorou, voltou à unidade de saúde e foi encaminhada ao hospital. É a segunda vez que a garota fica internada, conta. Elogia as instalações e, também, a comida. A instituição fornece três refeições por dia aos pacientes e acompanhantes. Por mês, são quase oito mil. Além de alimentação, há um solário e vestiários exclusivos para os acompanhantes.
Situação semelhante ocorreu com Natália Vasconcelos, de 6 anos. Com broncopneumonia, foi direto para a UTI e ficará internada por mais oito dias. A mãe, Maria Rocha Miranda, diz que a filha tossia muito, vomitava e estava cansada. Agora, ainda recebendo soro na veia, anima-se com a melhora da pequena paciente. “É excelente o atendimento aqui”. Quando a garota estiver melhor, poderá se divertir e distrair na brinquedoteca, onde há atividades lúdicas e recreativas. Natália também poderá estudar na Classe Hospitalar enquanto aguarda a alta.
Aula, biblioteca e história – As professoras com formação em Pedagogia e especialização em Classe Hospitalar, Maria Aparecida Roveran e Ângela Maria Sanches, ensinam as crianças internadas para não perder o vínculo com a escola. A classe simula o ambiente estudantil (carteiras, livros, cadernos e computadores) e fornece atividades, conteúdos didáticos e provas, de acordo com o grau escolar da criança. Para quem não puder se locomover, a aula é ministrada no próprio leito com um notebook. Por mês, 30 crianças estudam no local. Iniciada em 2003, a Classe Hospital já atendeu quase mil crianças.
A principal diferença, diz Maria Aparecida, é que elas estudam de pijama, tem horário flexível e recebem tratamento diferenciado por estarem em condições fragilizadas. Ângela lembra que a rotina é muito importante para crianças. “Ir á escola faz parte da vida delas. Elas ficam felizes de vir para cá”. Outra atividade disponível é a biblioteca com quatro mil exemplares. Há romances, contos, poesias, didáticos e revistas. A maioria é de literatura infanto-juvenil, clássicos infantis e gibis. A biblioteca integra o programa da pasta da Cultura de levar a leitura até o cidadão e conta com contribuições de funcionários e doações de editoras.
A bibliotecária Aparecida do Carmo Neves atende os pacientes e acompanhantes na biblioteca e, três vezes por semana, circula pelo hospital com um carrinho de livros decorado com bichinhos. Cidinha, como é chamada, usa um avental enfeitado com desenhos e bichos coloridos. Conta que se for de branco será confundida com médico ou enfermeira e a criança tende a se retrair. Diz que o gosto do público é bem eclético. As crianças menores preferem livros coloridos e repletos de fotos e desenhos; os adolescentes optam pelos gibis; as mães, pelas revistas.
Maus tratos e refluxo – Ela orienta os acompanhantes a ler para os filhos e vez ou outra, ela mesma lê para eles. Desde maio de 2004, a bibliotecária e outras três funcionárias reúnem as crianças para contar estórias e apresentar peças teatrais. Cidinha está negociando com o hospital a compra de 10 exemplares do livro Quando você está doente ou internado – um guia para curar crianças, de Tom McGrath. “O livro explica o motivo de a criança estar no hospital, como proceder, o que está ocorrendo, por exemplo, e isso é bem útil para a criança entender a sua situação e reagir bem”.
Outro diferencial do hospital é receber recém-nascidos que requerem tratamento após alta hospitalar. Para isso há um berçário externo, com 15 leitos, e uma UTI neonatal, com 6. Desde 1995, a medicação utilizada no hospital é feita pelo sistema de distribuição de medicamentos por dose unitária. Para cuidar de todo o público infantil, o hospital dispõe de 170 médicos, 173 auxiliares de enfermagem, 35 enfermeiros, 83 profissionais com nível superior, 299 pessoas na área administrativa e 9 Jovens Acolhedores.
Além de serviços médicos, o hospital c riou uma comissão para tratar de maus-tratos a partir da constatação de que muitas crianças e adolescentes que chegavam para receber atendimento eram vítimas de violência. Também promove palestras com funcionários de creches sobre refluxo e outros cuidados básicos.
Identificar sinais de maus-tratos e denunciar agressores
Criança com lesões incompatíveis com o acidente relatado. Outra que chega às 2 horas da manhã com braço quebrado porque caiu. Um bebê, que nem anda ainda, vem várias vezes ao hospital tratar de fraturas. Outro de apenas quatro meses fratura a perna ao ser puxado pela grade do berço pelo irmão de três anos. Acidentes domésticos ou maus-tratos? Não é tarefa simples e fácil diferenciá-los, responde o diretor-clínico do Hospital Cândido Fontoura, Fernando Domingues Gonsales, que também é presidente da Comissão de Maus-Tratos da instituição.
A dificuldade se dá porque o médico que está no corre-corre de um pronto-socorro tem pouco contato com o paciente e não aprendeu a identificar vítimas de maus-tratos porque nenhuma faculdade de medicina ensina isso, afirma Gonsales. Como principal dica na caracterização de agressão, diz que é ter um olhar diferenciado durante a consulta para enxergar os detalhes envolvidos no caso e observar aspectos velados e subliminares. Por exemplo, lesões incompatíveis com o fato relatado pelo responsável do menor devem ser investigadas.
Ao atender uma criança com queimadura e a mãe informar que isso ocorreu porque o filho colocou a mão na porta do forno quente e as lesões são muito extensas, há algo errado, alerta o médico. “Se a criança tivesse apenas tocado o vidro por acidente, ela tiraria rapidamente a mão por instinto. A queimadura seria superficial”, justifica. Na verdade, continua o médico, esse tipo de lesão só ocorreria se alguém segurasse a mão da criança no fogão por algum tempo. E foi isso o que ocorreu.
Sinais de alerta – Como explicar que uma criança caia de madrugada quando deveria estar dormindo, questiona Gonsales? O horário da ocorrência é um bom indicador para o médico levantar suspeitas, ensina. E se a resposta do responsável fosse “porque estava dormindo no beliche e caiu no chão”? Seria até justificável se a criança não tivesse menos de três anos e as lesões fossem compatíveis com a queda, responde. Mas acrescenta: “Só o fato de colocá-la no beliche já é negligência”.
Em casos suspeitos ou pouco verossímeis, a “principal providência é tirar toda a roupa da criança e procurar marcas ou vestígios antigos de lesões (provocadas por cinta, fivela, cigarro). Se houver cicatrizes, a possibilidade de a criança ser vítima de violência é grande”. Outro sinal de alerta é a credibilidade da estória. É possível acreditar que um menino de três anos tenha condições de quebrar a perna de seu irmão ao puxá-lo pela grade do berço, como a mãe diz ter ocorrido? Nesse caso, explica o clínico, além de tirar a radiografia da perna quebrada, é necessário fazer uma checagem em todo o corpo do bebê.
E, de fato, após os exames de raios-X, constatou-se que a outra perna e o pescoço estavam lesionados. O caso foi denunciado ao Conselho Tutelar e a mãe perdeu a guarda das crianças. Gonsales ressalta ser preciso tomar cuidado antes de fazer denúncia. “A criança que já é vítima pode ainda ser punida de novo com a perda da família”. Uma alternativa, em caso de suspeita, é internar a criança no hospital e investigar o caso antes de tomar qualquer providência, orienta.
Gonsales diz haver um “pacto de silêncio” na classe médica por ficar com a responsabilidade de depor, responder a processos e correr riscos de estar equivocado já que o profissional não tem preparo e nem treinamento para lidar com isso. Diz que é preciso romper esse pacto para cuidar dos agredidos e punir os agressores. “É melhor errar por excesso de cuidado. Se a vida ou a integridade do menor estiver em risco, é preciso denunciar para salvar a criança. A omissão é a pior violência.” Ele disse existirem casos em que as agressões físicas foram se intensificando até por fim a vida de crianças.
Identificar e denunciar – A omissão e o silêncio também podem ocorrer na família. Foi o caso de um bebê que nem andava, mas foi ao hospital várias vezes tratar as fraturas. A mãe dava explicações pouco convincentes aos médicos, embora tivesse sido alertada das agressões pela pessoa que ficava parte do tempo com a criança. A pessoa relatou que o pai machucava o filho e uma vez o colocou no andador e o empurrou escada abaixo. Até as responsáveis pela creche comunicaram à mãe que o filho mostrava sinais claros de insatisfação quando o pai ia buscá-lo.
Embora os casos variem muito, o hospital tem um perfil do agressor graças às pesquisas de centros de referência no assunto (veja o boxe). Os profissionais começaram a ficar atentos à questão ao perceber que crianças e adolescentes que chegavam ao hospital eram vítimas de violência e não de acidentes domésticos. Em maio de 2007, o hospital criou a Comissão de Maus-tratos e Abuso de Adolescentes. Em 2007, foram registrados 49 casos de abusos, maus tratos e abandono. Até 20 de agosto deste ano, foram mais 40 atendimentos.
A comissão é responsável pelo treinamento e orientação aos médicos, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos e outros profissionais envolvidos no atendimento para que identifiquem casos de maus tratos. Ela também oferece suporte e assistência antes de fazer a denúncia e ajuda no encaminhamento do caso à justiça. O hospital já promoveu cinco palestras sobre o assunto. Os encontros ocorrem na ultima sexta-feira do mês e as inscrições podem ser feitas pelo telefone (11) 2603-5433.
Perfil do agressor
O agressor é alguém íntimo da criança e do adolescente. Em casos de abuso sexual, a maior vítima é a menina com idade a partir de 7 anos e o agressor é do sexo masculino (pai, tio, padrasto). Quem mais comete violência física é a mãe, principalmente, as jovens e as adolescentes. Elas respondem por 60% das agressões. Até o 7 anos, o menino tende a ser mais agredido que a menina porque é mais indisciplinado. As mães ainda costumam usar a força física para educar os filhos.
Treinamento em primeiros socorros e refluxo
Crise de convulsão, febre, acidente, queimadura, fratura. Como os profissionais de educação infantil podem evitar essas ocorrências e como devem proceder em cada situação? Devido às recentes mortes por refluxo, o Hospital Infantil Cândido Fontoura promoveu palestras destinadas aos profissionais de educação infantil de creches municipais da zona leste. O clínico-geral do hospital, Fernando Domingues Gonsales, disse que os profissionais chegaram ávidos por informações e orientações e estavam ansiosos para aprender tudo que fosse possível para cuidar das crianças.
Infelizmente, lamenta o médico, não é possível dar todas as informações para resolver todos os casos. O ideal é que houvesse um profissional de saúde em cada creche capacitado para cuidar das ocorrências mais simples, fazer o atendimento imediato (primeiros socorros) e encaminhar ao pronto-socorro, quando necessário. Como não há pessoa habilitada para isso, a principal orientação é prestar muita atenção nas crianças e redobrar o cuidado se houver mudança de comportamento.
No treinamento em primeiros socorros dos casos de refluxo foi informado como evitar que isso ocorra. Os profissionais receberam orientação de como identificar e proceder. Em casos de acidente e queimadura, a orientação é procurar o posto de saúde mais próximo ou o pronto-socorro. Se houver queda com fratura, não remover a criança do local e pedir ajuda imediatamente. Na primeira palestra, participaram 75 funcionários de creche. Na segunda, participarão 80.
Distribuição dos 146 leitos
61 enfermaria
19 observa
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