Instituto de Química desenvolve aparelho para medir radiação ultravioleta



Acessível, descartável e de fácil leitura, instrumento deve auxiliar no combate ao câncer de pele e outras doenças ligadas à superexposição ao sol

Pesquisadores do Instituto de Química (IQ) da USP desenvolveram um mecanismo de uso pessoal capaz de medir o nível de exposição aos raios ultravioleta (UV). Um dosímetro (medidor de dose) descartável poderá informar – de modo simples, acessível – a pessoa quanto a um possível excesso de radiação, uma dose nociva.

O trabalho rendeu a conquista do prêmio NanoEurope 2006 (categoria médica), na Suíça, um dos maiores congressos de nanotecnologia da Europa. A patente está formalmente registrada, desde junho último, no Instituto Nacional de Patentes e Invenções (INPI).

O invento apresenta-se na forma de um cartão, no qual se encontram pequenos círculos coloridos – optou-se pelo roxo; poderia ser outro corante. O funcionamento é considerado simples. Uma vez exposto à radiação UV, e conforme passa o tempo, o círculo tem a intensidade de sua cor diminuída, como que desbota: o roxo vira lilás. Mais tempo e tem-se um lilás mais claro, cada vez mais. E quem estivesse de posse do cartão – ele não é comercializado – poderia conferir, visualmente, se os minutos ou horas passados sob o sol representam perigo. Numa hipotética escala, o roxo indicaria, por exemplo, 0 minuto. O lilás, uma hora.

“Precisa-se calibrar o dosímetro. Para isso, basta expor a uma fonte ultravioleta de intensidade conhecida e marcar quanto tempo levou para degradar o spot, o pequeno ‘poço’ com corante [o círculo]. A partir daí, podemos criar uma escala comparativa de tonalidades, correlacionado com as doses de radiação UV”, esclarece Sergio H. Toma, um dos autores do projeto e pós-doutorando do IQ. Os demais envolvidos são Juliano A. Bonacin, também pós-doutorando, e os docentes Koiti Araki e Henrique E. Toma, todos do IQ.

Sergio Toma explica por que o dosímetro inventado é “ideal” para apontar os efeitos negativos do sol sobre a pele. “Ela recebe os raios e inicia um processo inflamatório e, depois, de recuperação. Mas o dano vai se acumulando, por isso a pele envelhece. Nesse ponto, o dosímetro mais ou menos simula a pele.”

Ineditismo

Dosímetros capazes de medir a radiação UV recebida durante certo período de tempo existem: são equipamentos eletrônicos sofisticados, caros – por isso, pouco acessíveis. Não havia sido confeccionado, ainda, um aparelho descartável. Prático e barato, o novo dosímetro preenche a lacuna. Sergio Toma esclarece: “A proposta é usar o cartão como um crachá, por exemplo. Porque não envolve só a questão de riscos à saúde nas horas de lazer. Pessoas que utilizam aquelas soldas elétricas, os soldadores – a própria utilização da solda gera ultravioleta”.

O mais próximo de um dosímetro acessível (e comercializável) que temos à disposição são adereços que mudam de cor ao receberem luz solar. Bastante comuns, eles normalmente vêm na forma de presilhas de cabelo. Mas, por definição, não se pode considerá-los dosímetros: não medem dose alguma. Indicam, de fato, certa intensidade de luz ultravioleta, e apenas isso. Desprovidas de qualquer “efeito de memória”, tais presilhas não permitem que se conheça a quantidade total de radiação recebida ao longo de um período determinado.

“No Brasil, esta é a primeira patente para dosímetros visuais”, pondera Sergio Toma. “Existem propostas alternativas de dosímetros na forma de cartão. Só que, na hora da leitura, é preciso que se recolha todos os cartões utilizados e leve até o equipamento para fazer análise. Depois é que sai o resultado.”

Saúde

De início, a premiação no NanoEurope 2006 há que ser atribuída a dois fatores: o ineditismo e a simplicidade – relativa – da idéia. “Se o resultado não é um aparelho sofisticado, o conceito químico do trabalho é bastante elaborado. A questão abrange uma relação entre a química supramolecular e a nanotecnologia, isso foi importante”, aponta Juliano Bonacin.

O dosímetro inventado, em última análise, é um filme de nanopartículas de dióxido de titânio, substância que tem a capacidade de absorver a luz ultravioleta, e só a luz ultravioleta – ela não é sensível às outras. Quando o UV é absorvido, o dióxido de titânio gera um processo de reações fotoquímicas que degradam o corante (um complexo de ferro). 

Na prática, o resultado desse experimento pode representar importante alternativa na prevenção de problemas de saúde causados por doses excessivas de UV. Os olhos e o tecido epidérmico sofrem, e irão sofrer ainda mais, as conseqüências da tendência à diminuição – ou mesmo ausência, em certos pontos próximos aos pólos – da camada de ozônio. Entre 1975 e 2000, informa o texto do trabalho, a incidência do melanoma, a forma mais agressiva do câncer de pele, quase que dobrou. E cerca de 15 milhões de pessoas no mundo sofrem de catarata associada à radiação ultravioleta.

Diz o texto: “Nos países tropicais, como o Brasil, a incidência de câncer de pele é relativamente alta e parece estar aumentando. Cerca de 90 mil casos foram registrados em 2001, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer, por excesso de exposição à luz solar. Assim, a estratégia mais eficiente para conter o avanço é a prevenção. Mas, para isso, é necessário o desenvolvimento de dosímetros acessíveis”.

Mais informações: (0XX11) 3091-3819, com Sergio H. Toma; e-mail [email protected]

Cauê Muraro

Especial para a Agência USP

(R.A.)

 



09/03/2007


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