MARCOS VILAÇA À TV SENADO: "NÃO PODEMOS DESPERDIÇAR A ESPERANÇA"



As perspectivas de mudança do Estado brasileiro em resposta às expectativas da sociedade, os caminhos da cultura brasileira, e uma proposta de nova visão do papel do Tribunal de Contas da União, saindo da ótica simplesmente punitiva para a de uma atuação voltada à prevenção e educação do administrador no trato com o dinheiro público, são temas lançados pelo escritor, intelectual e ministro do TCU, Marcos Vilaça, em entrevista concedida à TV Senado, que vai ao ar neste final de semana:
- O mundo está passando por transformações muito intensas e rápidas, às quais precisamos responder. No Brasil, não podemos desperdiçar nada: nem dinheiro, nem tempo, nem a esperança do povo - enfatizou.
Vilaça ressaltou que é preciso pensar num formato novo para os Poderes da República, que responda à necessidade de melhoria do Estado no Brasil, mudando a concepção de escolha dos governantes e do processo legislativo, e incluindo maior exigência quanto à composição desses poderes.
O ministro defende também mudanças na atuação do TCU:
- A contribuição do tribunal ao Brasil não deve se circunscrever ao aspecto do rigor, nem da expedição punitiva e paranóica de descoberta da fraude. Acredito muito no trabalho pedagógico que uma corte de contas pode fazer, ao mesmo tempo que aplica a lei. Não temos hospitais para cultivar a doença, e sim porque preconizamos a saúde - argumentou.
Para alcançar esse objetivo, o próprio TCU precisa estar bem preparado, o que tem sido buscado, segundo o ministro, através dos cursos de aprimoramento de seu quadro, composto de servidores de elite, e também do estreitamento de laços com instituições no exterior, a exemplo dos técnicos que atualmente cursam administração pública nos Estados Unidos, e aprendem a lidar com a aplicação da tecnologia moderna à fraude:
- Não temos alternativa: ou saímos do casulo, ou vamos ficar marcando passo. Precisamos também habilitar nossos servidores a lidar com o crescimento do Mercosul. A noção de Estado que aprendemos está mudando sensivelmente, a multilateralidade é um imperativo dos tempos modernos. São João da Cruz dizia que não há caminhos, há que caminhar. Isso não se aplica só à mística, mas também à vida das Nações - comentou.
Vilaça preconiza mudanças de rumos também para a educação e cultura, e considera os 500 anos do descobrimento uma grande oportunidade para esta reflexão:
- O povo brasileiro ainda não tem consciência cultural, porque não existe adequação entre educação e cultura. Mas não sou pessimista, a linha é ascendente. A consciência da cidadania ainda não atinge todas as faixas da população, mas acho que há uma marcha para a frente, e no momento em que viabilizarmos melhor a educação, com interação no plano da cultura, vamos corrigir esse problema - enfatizou.
De positivo, Vilaça apontou "a maior valorização dos bens culturais", visível, por exemplo, na forma como as comunidades tem reagido ao tombamento pelo Patrimônio Histórico "de maneira muito melhor", e advogou a ampliação dessa conscientização, com a introdução do conceito de patrimônio imaterial, que inclui, além dos monumentos e igrejas, os aspectos etnográficos das populações interioranas, por exemplo.
Outra proposta do entrevistado é que o país encontre meios financeiros para levar sua produção ao mundo, não mais com a imagem caricata "café, mulata e Pelé":
- O Brasil tem uma expressão cultural fortíssima, um lugar marcado no mundo, nas artes plásticas, na música, na literatura, mas não estamos sabendo exportar cultura - afirmou.
A dificuldade existe mesmo em relação aos países que falam a nossa língua, e um dos exemplos apontados pelo entrevistado é "a Academia Brasileira de Letras chegar aos cem anos sem ter ao menos um sócio-correspondente africano lusófono", embora o senegales de fala francesa Senghor figure na lista, ao lado do português Mário Soares:
- Angolanos, caboverdeanos e moçambicanos nunca compareceram à nossa nominata. Não nos freqüentamos. O Brasil tem uma capacidade de influir nessa literatura, até porque temos autoridade para falar com eles no plano político, mais do que Portugal, por conta do ranço colonialista - acredita o escritor.
Quanto ao relacionamento com Portugal, Vilaça acha que "está na hora de sair da retórica do bemquerer e buscar, com objetividade, tirar melhor partido dessas relações":
- Portugal tem de acabar com a inveja: não falamos errado, falamos o português do Brasil. Portugal precisa se convencer de que suas duas melhores criações são "Os Lusíadas" e o Brasil. Há prazer maior para um pai do que o reconhecimento de seu filho? E o Brasil também precisa parar de pensar com aquele estereótipo de que Portugal é fado, bacalhau e azeitona - polemizou.

26/05/2000

Agência Senado


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