Marginalizado, usuário de 'crack' precisa de tratamento especial



O tratamento dos usuários de crack, muitas vezes marginalizados socialmente, não pode ser o mesmo dos usuários de cocaína, que não raro possuem uma melhor condição socioeconômica - já que a cocaína é mais cara. Essa foi uma das observações feitas por Bo Mathiasen, representante do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) para o Brasil e o Cone Sul, na audiência pública realizada pelo Senado nesta terça-feira (17). Ele também lembrou que há estudos sobre uma possível vacina para as duas drogas - mas sem previsão de lançamento.

Essa audiência faz parte do ciclo de debates que vem sendo promovido pela Subcomissão do Senado sobre Políticas Sociais para Dependentes Químicos de Álcool, Crack e Outras Drogas. O avanço do crack, droga derivada da cocaína, está entre os principais temas discutidos pela subcomissão.

Ao reiterar que a marginalização social dos usuários de crack "é um dos aspectos que torna seu tratamento um desafio", Mathiasen frisou que, "entre eles, é mais forte o rompimento dos vínculos e das relações sociais".

Já a maioria dos usuários de cocaína, quando comparados aos de crack, "vivem em contexto socioeconômico melhor, têm à sua disposição uma estrutura mais 'confortável' e, por isso, apresentam uma resistência maior à dependência". Mathiasen disse que essas conclusões se baseiam na experiência de países como Estados Unidos, Canadá, Alemanha, França, Reino Unido, Itália e Holanda, entre outros.

- Atualmente, as formas de tratamento mais promissoras no caso do crack são o aconselhamento e a terapia psicossocial - disse ele, acrescentando que "os tratamentos farmacológicos mostram algum resultado, mas ainda deixam a desejar".

Mathiasen destacou ainda a importância da terapia familiar, da terapia cognitiva comportamental, da entrevista motivacional e "prevenção da recaída".

Ele observou que, além da "segregação socioeconômica" provocada pela diferença de preço, "a cocaína é consumida geralmente em uma situação de convívio social, como uma festa ou em uma boate, enquanto o crack tem efeitos tão intensos que a pessoa se fecha e não interage com os outros ao consumi-lo".

Vacina

O representante da UNODC também lembrou que existem pesquisas sobre uma possível vacina para a cocaína e o crack. Segundo ele, a vacina neutralizaria os efeitos dessas substâncias e talvez possa ser utilizada, inclusive, de forma preventiva ("antes mesmo que se tenha contato com tais drogas").

- Já estão sendo realizados testes nos Estados Unidos e na Europa, mas não é possível afirmar quando ela ficará pronta - ressaltou.

Apesar de se mostrar otimista com as pesquisas, Mathiasen frisou que o desenvolvimento da vacina implica questões éticas, como o eventual consentimento do paciente com o tratamento e a obrigatoriedade ou não da vacinação de indivíduos considerados de "maior risco".

- Como definir esse critério de "maior risco"? Quem decidiria quais são as situações de "maior risco"? - questionou ele.

Bernardino Vitoy, representante da Organização Pan-Americana da Saúde, defendeu a ampliação da rede de assistência aos usuários de drogas, como é o caso dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), "que funcionam com porta de entrada para o tratamento desses dependentes". Ele também sugeriu a criação de casas de acolhimento transitório, nas quais os pacientes possam ser abrigados durante o tratamento. Bernardino enfatizou ainda a necessidade de que as políticas públicas destinadas ao combate às drogas estejam articuladas com outras, como às destinadas à educação.

A audiência desta terça-feira foi conduzida pelos senadores Wellington Dias (PT-PI) e Ana Amélia (PP-RS), respectivamente presidente e vice-presidente da subcomissão.



17/05/2011

Agência Senado


Artigos Relacionados


Internação involuntária de usuário de crack divide opinião dos especialistas

Acir Gurgacz defende programa para atender usuário do crack

Foco da Lei de Drogas também foi o de garantir tratamento ao usuário

Subcomissão debate tratamento de dependentes de 'crack'

Pesquisa aponta que 80% dos usuários de crack querem tratamento

Em debate, saúde pública e tratamento para dependentes do 'crack'