Mudança e compromisso com estabilidade são os temas mais frisados em discursos de posse desde 1995



Um dos momentos mais esperados da posse presidencial é o primeiro discurso à nação. É nesse momento, após a assinatura do termo de posse no Congresso Nacional, que o novo presidente fala sobre seus planos e suas expectativas para os quatro anos de governo. É também uma ocasião para o chefe de estado e de governo lembrar sua trajetória, apresentar sua visão do país e assumir compromissos.

Não é possível antecipar o que a nova presidente da República, Dilma Rousseff, dirá no dia 1º de janeiro de 2011. Os discursos de posse costumam ser preparados com ajuda de poucos assessores mais próximos e permanecem em segredo até o último instante. Além disso, há sempre a possibilidade de pequenas mudanças, de acordo com a vontade da presidente.

No entanto, a se julgar pelas falas dos últimos dois presidentes, Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, que governaram o Brasil por 16 anos, alguns temas não deverão ficar de fora. A ideia de mudança, por exemplo, é uma presença constante nos discursos.

Mudanças

Em 1995, apesar de enfatizar a "base sólida" construída nos dois anos de governo Itamar Franco, do qual foi um dos principais colaboradores, Fernando Henrique Cardoso disse que tinha o "apoio da sociedade para mudar" e encerrou o discurso conclamando o povo a participar desse processo. Quatro anos depois, ao iniciar seu segundo mandato, lembrou como o país havia mudado graças à estabilidade trazida pelo Plano Real e, citando o amigo Sérgio Motta, falecido em 1998, comprometeu-se a continuar "coordenando as transformações do país".

Ao tomar posse como presidente da República, em 2003, Lula já começou seu discurso com a palavra "mudança", afirmando que aquela tinha sido a mensagem da sociedade ao finalmente elegê-lo, em sua quarta tentativa. E pouco adiante prometeu:

- Vamos mudar, sim. Mudar com coragem e cuidado, humildade e ousadia. Mudar tendo consciência de que a mudança é um processo gradativo e continuado, não um simples ato de vontade, não um arroubo voluntarista. Mudança por meio do diálogo e da negociação.

Ao começar seu novo governo, em 2007, Lula se referiu ao discurso de 2003, ainda que para anunciar a nova prioridade de seu governo - o crescimento. "Quatro anos atrás eu disse que o verbo mudar iria reger o nosso governo. E o Brasil mudou. Hoje, digo que os verbos acelerar, crescer e incluir vão reger o Brasil nestes próximos quatro anos."

Justiça social

Tanto em 1995 quanto em 1999, Fernando Henrique destacou as conquistas econômicas, obtidas a partir da implementação do Plano Real em 1994. Ele não esqueceu, contudo, de ressaltar que era preciso ir além e avançar também nas questões sociais. Na posse do primeiro mandato, resumiu:

- Temos de volta a liberdade, portanto. E teremos desenvolvimento. Falta a justiça social. É este o grande desafio do Brasil neste final de século. Será este o objetivo número um do meu governo.

Em 1999, Fernando Henrique afirmou que os brasileiros já podiam "alimentar melhor seus filhos" e citou avanços nas telecomunicações, na produção de energia, na educação e na saúde, mas alertou que "pouco vale ao país ser a oitava economia mundial se continuarmos entre os primeiros na desigualdade social".

Eleito com a promessa de promover maior inclusão social, Lula anunciou, no discurso de posse em 2003, diversas ações voltadas a esse objetivo: o programa Fome Zero, que serviria de plataforma para a implementação do Bolsa-Família; a realização de uma "reforma agrária pacífica"; e a "ênfase especial ao Projeto Primeiro Emprego".

Em 2007, apesar de comemorar os avanços na área social durante seu primeiro mandato, admitiu que "precisamos fazer muito mais". Para tanto, acrescentou a importância de se buscar o desenvolvimento, com equilíbrio entre investimento público e privado. Anunciou, ainda, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Economia e cenário internacional

Talvez pela complexidade do assunto, a economia não teve muito destaque nos discursos de posse de Fernando Henrique e Lula, apesar de seu papel decisivo nas respectivas eleições. Em 1995, o presidente tucano destacou a implementação do Plano Real, no governo Itamar Franco, e comparou a economia brasileira a "uma planta sadia depois de uma longa estiagem". Em sua segunda posse, lembrou a estabilidade conquistada com o real e rejeitou a função de "gerente da crise" financeira, iniciada em 1997 em escala mundial, garantindo que prosseguiria na construção de uma "economia estável, moderna, aberta e competitiva".

Em 2003, Lula, em consonância com seu discurso de campanha, falou brevemente sobre aliar estabilidade e desenvolvimento. "Trabalharemos para superar nossas vulnerabilidades atuais e criar condições macroeconômicas favoráveis à retomada do crescimento sustentado", disse, prometendo se dedicar ao combate à inflação e ao aumento das exportações. Em 2007, não chegou a tecer comentários específicos sobre a economia, limitando-se a mencioná-la no contexto de outros temas, como crescimento, distribuição de renda e educação.

Foi a estabilidade econômica, no entanto, que garantiu uma nova posição para o Brasil no cenário internacional. E Fernando Henrique e Lula dedicaram grande atenção ao assunto em seus discursos de posse. Fernando Henrique, já em 1995, declarou que era "tempo de debater às claras qual deve ser o perfil do Brasil, como nação soberana, neste mundo em transformação". Em 1999, afirmou que "o Brasil voltou a ser respeitado no exterior" e ressaltou a multiplicação dos investimentos estrangeiros no país.

- Mais do que nunca, é necessário que o Brasil saiba identificar os seus interesses nacionais e falar com firmeza para defendê-los nos foros internacionais - afirmou Fernando Henrique, no discurso de 1999. Ao mesmo tempo, ele rejeitou posturas isolacionistas, atribuindo uma dimensão prioritária ao Mercosul e a construção de laços sólidos com União Europeia, Rússia, China e Japão, sem esquecer os "vínculos históricos com a África".

Adiantando a mudança de postura que marcaria seus dois governos, Lula assumiu em 2003 declarando a América do Sul como "grande prioridade" de sua política externa. Pregou, ainda, o aprofundamento das relações com China, Índia, Rússia e África do Sul e o apoio ao desenvolvimento do continente africano. Em relação aos Estados Unidos, defendeu uma "parceria madura, com base no interesse recíproco e no respeito mútuo". Em 2007, o petista comemorou os "excelentes resultados" dessa política, que teria permitido, ao mesmo tempo, manter excelentes relações com as grandes potências e priorizar os laços com o hemisfério Sul.

Congresso Nacional

O Congresso Nacional foi pouco lembrado nos discursos de posse de Fernando Henrique e Lula - em geral como alvo de apelos dos presidentes por colaboração. Em 1995, Fernando Henrique disse contar com o apoio do Congresso para dar continuidade ao Plano Real. Em seguida, salientou que "sem que o Congresso aprove as mudanças nas Constituições e nas leis (-) as boas intenções morrem nos discursos".

Em 1999, reconheceu que só estava ali graças ao apoio do Congresso, que em 1997 havia aprovado a emenda da reeleição. Também ressaltou a "expressiva contribuição às transformações do País nos últimos quatro anos" e convocou a maioria governista a apoiar as reformas previdenciária, administrativa, tributária, política e judiciária.

- Confio nesta Casa, expressão maior da soberania popular, à qual me orgulho de ter pertencido - disse.

Quatro anos depois, Lula também manifestou orgulho por ter sido parlamentar, sem se esquecer do pedido de apoio às reformas que pretendia implementar.

- Eu, que tive honra de ser parlamentar desta Casa, espero contar com a contribuição do Congresso Nacional no debate criterioso e na viabilização das reformas estruturais que o País demanda de todos nós - afirmou, prometendo "uma relação construtiva e fraterna com os outros poderes da República".

Em 2007, o petista agradeceu ao Congresso pelo apoio na implementação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) e fez novo apelo, desta vez para a conclusão das reformas política e tributária - que, contudo, mais uma vez não sairiam do papel.

Discurso de Dilma

Ao ser diplomada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na última sexta-feira (17), Dilma Rousseff deu uma indicação de como pode ser seu discurso de posse. Ela ressaltou sua condição de primeira mulher a ocupar a presidência do país e elogiou a "lisura, eficiência e confiabilidade" do processo eleitoral brasileiro. Em mais de um momento, lembrou do presidente Lula, em suas palavras um homem do povo que conduziu o país para "um momento de extraordinário avanço social e econômico".

Dilma mencionou as áreas da educação, segurança e saúde, e se comprometeu a cuidar da estabilidade econômica e do investimento. Também garantiu que defenderá a liberdade de imprensa e de culto. Depois, repetiu a promessa de Lula de governar para todos, talvez deixando uma dica do tom de seu discurso no dia 1º de janeiro.

- Reafirmo que nenhuma estratégia política ou econômica é efetiva se não se refletir diretamente, concretamente, na vida de cada trabalhador, de cada trabalhadora, de cada empresário, de cada família, de todas as regiões desse imenso e generoso nosso país.



30/12/2010

Agência Senado


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