O custo de mudar a lei
O custo de mudar a lei
Aliada do governo, Força Sindical recebeu R$ 785 mil do Orçamento nos últimos 20 dias. Ontem, enquanto a Câmara aprovava mudanças na CLT, R$ 5,1 milhões foram para emendas dos deputados
O governo federal não economizou o combustível preferido de sua base parlamentar — verbas públicas — para aprovar ontem o projeto de lei que submete a Consolidação das Leis do Trabalho a acordos entre patrões e empregados. Nos últimos vinte dias, foram liberados R$ 785 mil do Orçamento da União para a Força Sindical. A central foi a principal aliada do presidente Fernando Henrique Cardoso na costura política para fazer as mudanças na legislação trabalhista. O projeto foi aprovado com 264 votos a favor, 213 contra e duas abstenções.
A última liberação, de R$ 345 mil, foi feita na terça-feira passada, 27 de novembro. Na ocasião, o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, desfilava nos salões da Câmara fazendo lobby em prol do projeto do governo. Ontem, antes da votação, ele foi ao Palácio do Planalto conversar com Fernando Henrique sobre a crise na Transbrasil e sobre a CLT. ‘‘O presidente tirou sarro, dizendo que já havíamos ganho’’, conta.
A primeira liberação aconteceu no dia 14 de novembro, quando R$ 440 mil saíram do caixa do Tesouro para o da Força. A Central Única dos Trabalhadores (CUT), que se opôs ao projeto de mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), não recebeu nenhum centavo do governo em novembro, segundo dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) — rede de computadores que armazena as informações da execução orçamentária.
Força Sindical e CUT são as duas centrais de trabalhadores que receberam dinheiro federal para treinar mão-de-obra neste ano, conforme revela as informações do Siafi. Os recursos vêm do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), formado com uma parcela da arrecadação do PIS (Programa de Integração Social). O PIS é um imposto que vive embutido no preço dos bens de consumo.
As liberações de dinheiro para a Força Sindical durante a batalha em torno das mudanças na lei trabalhista foram descobertas pela assessoria parlamentar do deputado Agnelo Queiroz (PCdoB-DF). Ele promete levar o caso ao Ministério Público. ‘‘É um esquema deliberado de cooptação’’, acusa. ‘‘Isso é uma vergonha, o governo continua usando o Orçamento para vencer votações polêmicas e antipopulares.’’
Não é tudo. Ainda de acordo com dados retirados do Siafi, a execução orçamentária da Secretaria de Desenvolvimento Urbano (SDU), ligada à presidência da República, deu um salto durante a votação do projeto, ontem a tarde. A repartição vinha realizando, em média, 30 liberações de recursos por mês. Mas abriu o cofre. Só ontem, até as 20h, havia feito 128 liberações, totalizando R$ 5,1 milhões.
O orçamento da SDU é onde está acomodada a maior parte das emendas paroquiais dos parlamentares. Seria, portanto, a rubrica ideal para o presidente Fernando Henrique Cardoso cumprir a promessa feita aos seus articuladores no Congresso, de que o governo só ajudaria quem votasse com ele no projeto da CLT. Agnelo Queiroz promete identificar todos os beneficiados. Walter Pinheiro, líder do PT na Câmara, também acusa o governo: ‘‘Ele usou a máquina, foi um horror em liberações de emendas’’.
Num levantamento preliminar, a assessoria dele chegou a alguns nomes. José Lourenço (PFL-BA) foi agraciado com R$ 30 mil provenientes de uma emenda apresentada ao Orçamento da União em 1999. A obra é descrita como ‘‘melhorias habitacionais na cidade de Cordeiros’’. Estava contabilizada como Restos a Pagar. Darcísio Perondi (RS), que mesmo sendo do PMDB votou com o governo, também teve uma emenda liberada.
O QUE MUDA NA SUA VIDA
Se aprovado no Senado, o projeto de lei fará que convenções coletivas, firmadas entre sindicatos de patrões e empregados, prevaleçam sobre as normas da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Se não houver acordo entre as partes, a CLT continuará valendo
Benefícios garantidos pela Constituição ou por normas de segurança não poderão ser retirados das convenções. É o caso do descanso semanal, das férias de 30 dias, do adicional de 50% para horas extras, da jornada semanal de 44 horas, do aviso prévio, da irredutibilidade dos salários, da obrigatoriedade de contribuição para o FGTS
Benefícios não garantidos pela Constituição podem ser retirados das convenções, ainda que previstos na CLT. É o caso dos adicionais por trabalho insalubre ou do piso salarial
Benefícios garantidos pela Constituição, mas que têm sua regulação detalhada na CLT, poderão sofrer modificações. É o caso da forma de pagamento do 13º (hoje em duas parcelas), do tempo de licença à maternidade ou da porcentagem da contribuição das empresas para o FGTS (hoje em 8%)
TCU julga hoje caso TRT
Luiz Estevão, Nicolau dos Santos Neto e os donos da Incal deverão ser condenados a devolver o dinheiro desviado e a pagar R$ 10 milhões de multa
O ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, o senador cassado Luiz Estevão e os empresários Fábio Monteiro de Barros e José Eduardo Ferraz deverão terminar o dia de hoje condenados a pagar aos cofres públicos uma multa de R$ 10 milhões. O Tribunal de Contas da União (TCU) julga hoje o recurso movido por eles. E deve manter a decisão anterior que os condenava como responsáveis pelo desvio de R$ 169,5 milhões da oba do Fórum Trabalhista de São Paulo.
Nicolau, ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho; Estevão, responsável pelo Grupo OK, e Monteiro de Barros e Ferraz, sócios da Incal Incorporações, foram condenados pelo TCU, em julho deste ano, a devolver aos cofres públicos aquele valor, atualizado desde o final de 1999. Além disso, a cada um deles foi aplicada uma multa de R$ 10 milhões. Os réus recorreram da decisão.
Há três caminhos para o relator do processo, ministro Valmir Campelo: rejeitar todos os recursos, acatar parte deles ou acatar todos e reverter a decisão de julho passado. Até ontem à noite, o ministro não havia concluído seu voto. Ele comentou, no entanto, que considera ‘‘difícil’’ modificar a tendência já demonstrada no julgamento do processo. ‘‘A decisão pela condenação foi unânime’’, lembra.
O plenário do TCU costuma decidir por unanimidade em questões pacíficas, mas este não é o caso do desvio de recursos do TRT-SP. Por isso, Valmir Campelo observa que o julgamento da matéria, bastante polêmico, pode não terminar na sessão de hoje à tarde. Depois da leitura do relatório, que tem mais de 60 páginas, e do voto do relator, qualquer ministro pode apresentar pedido de vistas ou voto em separado, o que adiaria a decisão.
Ainda que seja julgado hoje, o caso não estará encerrado. Os réus dispõem de instrumentos que podem ser usados para postergar a decisão final do tribunal. ‘‘Este é o primeiro recurso depois da condenação’’, diz Campelo. ‘‘Depois deste, ainda cabem pedidos de reconsideração e de embargo’’, explica.
A Comissão Mista de Orçamento do Congresso debate a inclusão de R$ 15 milhões no Orçamento de 2002 para o término do prédio do TRT-SP. Para isso, a construção tem que sair da lista de obras irregulares do TCU. A proposta original do Executivo condiciona a liberação dos recursos à regularização da obra. A oposição, para liberar os recusos, quer um parecer do TCU sobre a obra.
O presidente do TRT-SP, Francisco Antonio de Oliveira, mandou ontem um recado ao Congresso ao declarar aos empreiteiros interessados na licitação para a conclusão do prédio que o processo de licitação não permitirá aditivos contratuais. Os aditivos foram um instrumento fartamente usado no esquema de superfaturamento e desvio de re cursos da obra do Fórum. O juiz disse que será permitido, no máximo, o reajuste dos valores com base nos índices oficiais. O aviso aos empreiteiros foi dado durante audiência pública na sede do tribunal.
Novo processo contra Estevão
O juíz Ali Mazloum, da 7ªVara Criminal Federal de São Paulo, aceitou ontem denúncia do Ministério Público contra o ex-senador Luiz Estevão de Oliveira por suposto crime de falsificação de documento público. A denúncia toma por base depoimento da ex-contadora do grupo OK Jesuína Varandas Ferreira, que trabalhou nas empresas do ex-senador por 19 anos. Jesuína acusou Estevão de falsificar balanços e livros contábeis para justificar o dinheiro recebido do grupo Monteiro de Barros, responsável pelo desvio de R$ 169 milhões (em valores sem atualização) da obra do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo. ‘‘Verifico que a peça acusatória está lastreada em razoável suporte probatório, dando conta da existência da infração penal e indícios de autoria, havendo justa causa para a ação penal. Por esse motivo, deve a denúncia ser recebida.’’ O juiz rejeitou, porém, o pedido de prisão preventiva de Estevão, acusado de ameaçar Jesuína Ferreira.
PMDB adia prévias para março
O PMDB adiou para o dia 17 de março a data das prévias que vai decidir o nome do candidato do partido à presidência da República. Esta decisão coloca os peemedebistas em uma situação mais confortável para decidir o melhor caminho a seguir. Por enquanto o PMDB está dividido. A ala governista insiste em manter a aliança com o PSDB, e um outro grupo quer candidato próprio. Até agora o nome mais forte do partido é o do governador de Minas Gerais, Itamar Franco. O adiamento agradou tanto governistas, como os itamaristas. O governador ainda foi beneficiado pela decisão da Executiva Nacional de incluir os 11.300 vereadores do partido nas prévias. Com isso, o universo de delegados sobe de 4 mil para 16 mil. ‘‘A inclusão dos vereadores é uma vitória de Itamar Franco’’, disse o ex-governador Orestes Quércia. Itamar Franco, que estava em Brasília desde segunda-feira, não compareceu ao encontro porque, segundo sua assessoria, teve problemas estomacais.
MP investiga desvio no Paraná
Os promotores que investigam os documentos apontando a existência de caixa dois na campanha de reeleição de Cassio Taniguchi (PFL) para a Prefeitura de Curitiba buscam indícios de desvio de dinheiro público, que poderia ter sido injetado no comitê da coligação encabeçada pelo PFL. O partido declarou um gasto oficial de R$ 3,112 milhões na campanha do ano passado, mas recibos de notas e bilhetes apontam para um caixa dois de R$ 29,7 milhões. Segundo a promotora Maria Espéria Costa Moura, até agora não há provas do desvio de dinheiro público. Mas os promotores estão ‘‘intrigados’’ com as entradas e saídas de quantias expressivas apontadas pelos documentos. ‘‘O que chama a atenção é que se pressupõe que uma doação de determinado valor seja feita e vá permanecer no caixa, mas, quando essa mesma quantia é sacada no dia seguinte, é de se supor que exista envolvimento paralelo’’, diz.
Tasso discursa no BIRD
O governador do Ceará, Tasso Jereissati, participou ontem, em Washington, do seminário ‘‘Participação, Descentralização e Desenvolvimento Rural’’, realizado pelo Banco Mundial (BIRD). O encontro foi organizado pela vice-presidência do Banco para a América Latina e o Caribe e reuniu representantes em nível político, técnico e beneficiários que falaram sobre a sua experiência na gestão de projetos descentralizados e participativos voltados para o combate à pobreza em áreas rurais da América Latina. Tasso apresentou detalhes sobre os projetos de Reforma Agrária Solidária e São José, que têm como objetivos melhorar as condições de vida da população pobre da área rural do Ceará.
Artigos
Sem aventuras
Denise Rothenburg
Pela primeira vez desde que voltamos a escolher o nosso presidente da República, todos os candidatos que se apresentam têm história, nome a zelar e substância político-eleitoral. Isso indica, na opinião de especialistas, que a sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso será disputada até o último voto. Um conselho, leitor: despreze todas as pesquisas de opinião que surgem agora. Não tem já ganhou, nem fulano está no segundo turno. No balanço das horas, tudo pode mudar, graças ao perfil dos candidatos.
Vejamos um a um, e, como manda a etiqueta ocidental, mulheres na frente. Roseana Sarney (PFL) governa o Maranhão pela segunda vez. Musa do impeachment do ex-presidente Fernando Collor em 1992, trabalhando como um leão em busca de votos para afastá-lo da Presidência, por causa das contas fantasmas que abasteciam a Casa da Dinda, sítio presidencial.
No PSDB, o ministro da Saúde, José Serra, não saiu da lâmpada do Aladin. Foi presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) na década de 60, deputado federal, secretário de Planejamento do Estado de São Paulo, foi ministro do Planejamento, é senador e comanda a Saúde. Tasso Jereissati governa o Ceará pela terceira vez, presidiu o PSDB, fez crescer o partido.
Na oposição, não tem coelho tirado da cartola. Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi um dos fundadores do PT, passou os últimos dez anos conhecendo os problemas do Brasil e montando programas para resolvê-los. Muitos desses projetos, aliás, foram adotados pelo atual governo. Ciro Gomes (PPS) tem experiência administrativa — foi prefeito, governador do Ceará, ministro da Fazenda. Saiu de todos os cargos bem avaliado
Anthony Garotinho (PSB), Itamar Franco (PMDB) e Pedro Simon (PMDB) estão longe de ser aventureiros. Garotinho foi prefeito e governa o Rio com boa aprovação. Itamar governa Minas, foi presidente da República. Simon é senador, foi governador, vereador, deputado, é considerado um dos políticos mais éticos e preparados do Congresso.
Esses pequenos resumos mostram que nenhum deles veio ao mundo a passeio. Pela primeira vez, desde a retomada da eleição direta para presidente (1989), não temos espaço para aventureiros e nem planos que, surgidos às vésperas de ano eleitoral, sejam fios condutores do processo. Também não há a reeleição como um deixa ficar. Por isso, 2002 vai ser bacaninha! E para quem, como eu, vai trabalhar muito no ano que vem, melhor relaxar enquanto é tempo. Bom Natal e Tim-tim pra vocês!
Editorial
Demagogia e afronta
A demagogia política e a afronta ao interesse público se mostram de modo indisfarçável no projeto de lei do deputado distrital José Edmar, do PMDB, que pretende legalizar a invasão da Estrutural. É a terceira vez que o parlamentar tenta subverter a ordem urbana de Brasília e causar desastre em área ambiental protegida. Agora, ousa ludibriar a boa-fé dos órgãos responsáveis pela manutenção de relações espaciais sadias. Argumenta que o recém-instituído Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001 e Medida Provisória 2.220) autoriza dar cobertura legal a ocupações irregulares de terrenos públicos em qualquer circunstância.
Trata-se de puro engodo. O governo federal não seria insano ao ponto de sancionar lei, no caso o Estatuto, que tornasse legal a depredação de espaços ecológicos. A legislação enfocada trata de disciplinar situações bem diferentes. Reporta-se a solos urbanos isentos de riscos ambientais. Jamais o Congresso aprovou lei nenhuma que atribuísse a alguém o direito de invadir e permanecer em locais públicos de interesse preservacionista.
As cinco mil famílias humildes que hoje habitam a favela da Estrutural, a maior da região, converteram-se em massa de manobra eleitoral nas mãos de José Edmar. Não há interesse nenhum em partilhar de suas carências, mas largá-las em qualquer lugar, ainda que ao preço de agressões a um significativo canto da cidade dotado de condições de extrema sensibilidade ecológica. E, também, com vocação urbana incompatível com a instalação de uma cidade. É o olho sobre algo em torno de dez mil votantes que desperta a cobiça e estimula a indecência.
Sob pressão da opinião pública inconformada, o governador Joaquim Roriz vetou, em abril de 1999, projeto semelhante aprovado pela Câmara Legislativa e patrocinado pelo mesmo Edmar. Reproduziu o gesto de seu antecessor, Cristovam Buarque, em relação à primeira proposta do parlamentar, também referendada pela Câmara. Roriz, contudo, visitou em seguida a invasão. Prometeu construir dez mil unidades habitacionais populares em Samambaia, com financiamento da Caixa Econômica Federal, para acolher os invasores. Nada fez. Mas as promessas até hoje lhe rendem os louvores e as simpatias políticas dos favelados iludidos em sua boa-fé.
A invasão está em torno de uma unidade de conservação ambiental, ameaça contaminar a água consumida por um terço da população e devastar reservas naturais do cerrado. Explica-se, assim, por que órgãos responsáveis como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Instituto dos Arquitetos do Brasil e o Ministério Público especializado advertem sobre os graves riscos contidos na iniciativa de Edmar.
A Câmara Legislativa está na obrigação de rejeitar semelhante violência contra a ordem urbana da capital da República e o patrimônio comum do povo. E o governador de vetá-la, se acaso a estupidez for aprovada. O Distrito Federal não está disposto a capitular ante a voracidade política de aventureiros.
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12/05/2001
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