O TCU e o plágio do almanaque







O TCU e o plágio do almanaque
Ministro assina relatório de viagem ao exterior e, em 17 páginas, copia trechos inteiros de publicação da Editora Abril

BRASÍLIA - O Tribunal de Contas da União (TCU) não economizou para cumprir a tarefa de fiscalizar o Executivo. Voou até o outro lado do mundo. Em agosto, uma equipe do tribunal, chefiada pelo ministro Valmir Campelo, percorreu embaixadas e consulados brasileiros na Austrália, Nova Zelândia e África do Sul durante 23 dias. Com tudo pago. Na volta, o ministro fez justiça às diárias de R$ 25,9 mil. O relatório da auditoria ocupa 17 páginas do Diário Oficial. Parece contar uma empolgante história. E conta. Boa parte do texto foi, literalmente, copiado do Almanaque Abril 2001.

''Não pretendia roubar o texto de ninguém'', desculpa-se Campelo, o signatário do impressionante relato da viagem. ''Deve ter sido erro de algum técnico.'' Tal falha repete-se em inúmeras ocasições no extenso diário da auditoria. É especialmente visível na análise política e econômica de cada país auditado. O capítulo da África do Sul abre com uma retrospectiva histórica. ''Os europeus chegam ao país em 1487, quando o navegador português Bartolomeu Dias contorna o Cabo da Boa Esperança''. Tal e qual está impresso, assim como os oito parágrafos seguintes, na página 102 do inspirador almanaque.

Nem tudo, contudo, é plágio. Algumas recomendações da auditoria chamam atenção pela originalidade. Durante a turnê, a equipe do TCU visitou cinco unidades diplomáticas brasileiras. Em todas, os diligentes fiscais notaram a falta de padronização na forma de identificação do mobiliário. ''Os bens são identificados por etiquetas coladas. Esse tipo de identificação tende, inevitavelmente, a descolar com o tempo'', registra o texto publicado no Diário Oficial. O ministro Campelo, em conversa com o Jornal do Brasil, justificou a observação: ''A gente aproveita a viagem e anota tudo''.

A ''gente'', no caso,inclui, além do ministro, um assessor de gabinete e dois auditores. Apenas em diárias, o grupo consumiu R$ 68,4 mil. A cota de cada um foi calculada em dólar. Com uma pequena diferença. Embora tenham viajado juntos, cada moeda americana do ministro valia R$ 2,53. A dos auxiliares, R$ 2,46.

Mal endereço - Dedicada, a equipe fez descobertas surpreendentes, como a incômoda localização da embaixada brasileira em Pretória, capital administrativa da África do Sul. ''A chancelaria situa-se em bairro cuja vizinhança expõe os servidores a certo constrangimento, uma vez que a área é ponto de prostituição'', descreve o relatório. Em Canberra, na Austrália, a deficiência era outra. O TCU sugeriu o conserto do telhado da casa do embaixador.

A corriqueira fiscalização do tribunal cresce de importância quando inclui viagens ao exterior. Apenas nessas ocasições, invariavelmente, há participação direta dos ministros. Geralmente, o trabalho de campo cabe aos fiscais. O ministro limita-se a analisar o relatório técnico. ''Nossa presença é obrigatória nesse caso'' justifica Campelo. ''O embaixador é a maior autoridade brasileira no país onde está baseado e não pode ser fiscalizado por auditores.'' A deferência não inclui o presidente Fernando Henrique Cardoso. Os gastos da Presidência da República, como são executados em Brasília, acabam investigados por servidores sem tanta graduação no TCU.

Segredo - O ''Plano de Auditoria no Exterior'' entra no rol de assuntos confidenciais do tribunal. O cronograma de viagens e a escala de embarque de ministros e assessores é definida em sessão secreta. Responsável pela transparência das contas públicas, O TCU não autorizou a divulgação do custo total da viagem de Campelo e sua equipe.
De qualquer forma, defende a fiscalização dos investimentos públicos no exterior. As viagens, observa a Assessoria de Comunicação do tribunal, apontam irregularidades ou equívocos na administração dos postos diplomáticos. Como se localizam foram do país, embaixadas e consulados não seguem a legislação brasileira para efetuar compras e fechar contratos. ''As observações feitas sobre uma embaixada podem ser aplicadas pelo Ministério de Relações Exteriores a outros escritórios diplomáticos'', alegou Campelo. ''Pode gerar economia.''


O suspeito acidente de Garotinho
Três mecanismos para ativar trem de pouso de avião do governador não funcionaram e aparelho fez aterrissagem forçada

O governador do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho (PSB), é mesmo homem de sorte. Sete anos depois de uma batida de carro que o deixou hospitalizado e provocou sua conversão à religião evangélica, sofreu o susto do que poderia ser o segundo acidente grave de sua vida. Às 12h de ontem, o avião em que viajava fez pouso forçado no aeroporto de Viracopos, em Campinas. Houve falha no acionamento do trem de pouso. A aeronave aterrissou de barriga, deslizou 800 metros, deu um cavalo-de-pau, saiu para o gramado e por pouco não se incendiou. O piloto Leandro Cordeiro e Garotinho suspeitam de sabotagem. ''Isso tudo pe muito estranho e será objeto de investigação'', disse o governador.

Nenhum dos três mecanismos - dois ligados a motores hidráulicos e um manual - para baixar o trem de pouso funcionou. O piloto teria dito a assessores do governador que ''isso não existe'' e sugeriu a possibilidade de sabotagem.

Sem espuma - A situação da pista aumentou o risco do pouso. Em situações de emergência, usa-se uma espuma para diminuir o atrito entre o avião e o asfalto. É para impedir que as faíscas provoquem explosão. Não havia espuma, segundo o assessor político de Garotinho, Paulo Fona, que também estava a bordo, com mais três passageiros, o piloto, o co-piloto e uma comissária. Garotinho ia para Barretos, em campanha pela Presidência da República. Depois do susto, seguiu o roteiro inicial.
A aeronave é um Hawker 400 inglês, com capacidade para dez passageiros, e voa a 800 quilômetros por hora. Pertence à empresa paranaense Jet-sul, usada com freqüência por Garotinho em viagens. Na segunda-feira, um avião da Jet-sul o levara a São Paulo.

Opções - A pane foi detectada por volta de 10h10, quando o avião se preparava para descer em Barretos. O piloto avisou ao ajudante-de-ordens do governador, major-bombeiro José Luís, que havia ''um problema de freio''. Disse que desviaria para Campinas ou Curitiba. Optou-se pela cidade paulista, onde a estrutura de emergência é melhor.
O avião sobrevoou Campinas, despejando combustível para diminuir o risco de explosão na aterrissagem. Até esse momento, os passageiros desconheciam a gravidade da situação. Ficaram tensos quando souberam que o trem de pouso não baixava e o avião faria um pouso de emergência. O governador pôs-se a orar em silêncio. O mais nervoso era o presidente regional do PSB, Pedro Coelho, que recebeu um calmante de Garotinho. ''Ele estava muito inquieto'', contou Fona.

Fogo - Um esquema de emergência foi montado em Viracopos, com seis carros de bombeiros e duas ambulâncias. Quando o avião parou, quase um quilômetro depois de tocar o solo, com a asa direita e a fuselagem muito danificadas, a cauda pegava fogo. Era possível ver labaredas, apagadas pelos bombeiros. Os ocupantes saíram da aeronave às pressas.
O chefe de manutenção da Jetsul, coronel-aviador reformado Pedro Souza, disse ao Jornal do Brasil que não considerou o acidente grave. ''Entre grave, médio e leve, diria que foi leve. Grave é quando morre todo mundo'', resumiu. Ele tampouco acredita na possibilidade de sabotagem, apesar de dizer que é raro o trem de pouso não funcionar. ''Devem ter dito isso (sabotagem) porque a gente ainda não encontrou uma explicação''. Souza considerou a atuação do piloto perfeita. Disse que o avião é relativamente novo - tem de 10 a 15 anos de uso, ''muito menos voado que os da Força Aérea Brasileira''.

Chapa - O fato de ser uma aeronave ''robusta'', como a descreveu Souza, dificultou a explosão. ''Os ingleses são precavidos e põem uma chapa resistente em baixo para situações como essa'', explicou. O Hawker estará voando novamente em 15 dias, garante.


De Paris a Petrolina
Fernando Henrique vai ao Nordeste em nome do social

BRASÍLIA - De volta a Paris, o presidente Fernando Henrique Cardoso vibrou ''vive la France''. Em Londres, jantou com o primeiro-ministro inglês Tony Blair. Cruzou o oceano e, em Washington, solidarizou-se com o presidente americano George W. Bush. Em Nova York, discursou na Organização das Nações Unidas (ONU).
O roteiro de viagens de Fernando Henrique agora perde glamour e ganha caráter social ao entrar em etapa nacional. Depois de acumular milhagem no exterior, FH chega ao Nordeste brasileiro. Hoje o presidente segue para Petrolina, Pernambuco, quase Bahia. Em seguida, estica até Araripe, no sertão cearense.

Mas antes do roteiro interno, Fernando Henrique matou as saudades das viagens para o exterior, inovando: ontem na cerimônia de assinatura de uma série de acordos de cooperação com a Nova Zelândia, resolveu saudar dez integrantes da comitiva da primeira ministra Helen Clark, com o hongi, gesto ritual no qual duas pessoas que se cumprimentam tocam os narizes. O costume é típico dos Maori, uma etnia que representa 16% da população da Nova Zelândia.

No Nordeste não é costume ficar tocando narizes. E, evidentemente, não é para isso que o presidente leva junto Raul Jungmann, ministro do Desenvolvimento Agrário. O pernambucano Jungmann é candidato confesso às eleições de 2002 - provavelmente a uma vaga de deputado federal. Na turnê, ambos anunciam novos mecanismos de emergência criados para combater os efeitos imediatos da seca. O primeiro é o Vale-Comida. Com o projeto, 800 mil famílias do sertão nordestino receberão R$ 15 mensais para comprar cestas-básicas. O projeto tenta resolver o drama das cestas-básicas governamentais que, despachadas para a região, chegam atrasadas ou em número insuficiente.

Fernando Henrique e Jungmann também anunciam o Seguro-Safra, beneficiando, segundo cálculos do governo, 1,1 milhão de famílias. Trata-se de uma garantia oficial ao pequeno agricultor que apostar em lavoura de subsistência de milho, arroz, feijão ou até algodão em áreas até 10 hectares. Com o seguro, se a seca arrasar a plantação, o agricultor recebe, em seis meses, R$ 600 como espécie de indenização.
Outros três programas permanentes serão anunciados na viagem. Um para melhorar o abastecimento de água. Outro, meteorológico, para prever o tempo na região com seis meses de antecedência. O terceiro prevê a adoção de tecnologias agrícolas desenvolvidas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
O Bolsa-Renda continuará valendo. Há três meses, um milhão de famílias dos municípios em estado de emergência recebem bolsa mensal de R$ 60.


PMDB acaba com sonho de Itamar
BRASÍLIA - O PMDB praticamente destruiu o sonho do governador de Minas Gerais, Itamar Franco, de voltar ao Palácio do Planalto. A Executiva do partido, dominada pelos governistas, restringiu as prévias que escolherão o candidato à Presidência da República - marcadas para 20 de janeiro - a 3.800 eleitores. Itamar queria 100 mil votantes. Com o resultado, o governador pode abandonar a anunciada pré-candidatura. As opções que restam são concorrer ao Senado ou à reeleição em Minas Gerais. A decisão da Executiva será submetida ao Conselho do partido, também controlado pelos governistas.

Com um quórum pequeno, o resultado das prévias é facilmente controlável pela ala do partido ligada ao Palácio do Planalto. O ex-presidente do partido Paes de Andrade acusou o PMDB governista de ''golpe sujo''. O governador de Minas só se pronunciou por meio de um bilhete lido pelo secretário estadual da Casa Civil, Henrique Hargreaves. ''A sugestão da Executiva do PMDB merece avaliação profunda na sua condição de candidato inscrito às prévias. Especialmente tendo em vista a exclusão dos vereadores'', leu Hargreaves. E ficou nisso.

Diretórios - A decisão da Executiva foi por 11 votos a três. Votaram a favor de prévias amplas os senadores Renan Calheiros (AL), Carlos Bezerra (MT) e o deputado Renato Vianna (SC). Votam nas prévias governadores, deputados, senadores, prefeitos, convencionais e integrantes dos diretórios estaduais e federal. Ficaram de fora os diretórios municipais.
O grupo de Itamar pretende recorrer da decisão convocando uma Convenção Nacional Extraordinária. A intenção é cancelar a decisão. ''Não estamos considerando esse resultado definitivo'', disse o presidente do partido em Minas Gerais, deputado Saraiva Felipe.

Se Itamar desistir de ser candidato ao Planalto, as prévias deverão ser canceladas. O PMDB adiará sua decisão para junho. ''Para mim isto é um golpe no ex-presidente Itamar e nos diretórios municipais'', disse o senador Maguito Vilela (GO). Ele distribuiu carta, de agosto, em que o presidente do partido, deputado Michel Temer (SP), principal articulador da derrota de Itamar, defendia prévia com 150 mil pessoas. ''Cento e cinqüenta mil era um número cabalístico. Só prévias restritas serão fiscalizáveis e limpas'', respondeu Temer.
Irritado com a decisão da Executiva, Itamar Franco tentou se distrair assistindo ao filme A cartada final, com Marlon Brando e Robert De Niro, em um shopping. O filme trata de golpes e trapaças. De manhã, já havia tentado comprar um livro, mas desistiu por causa do assédio de fotógrafos. O governador passou o resto do dia trancado em um quarto de hotel. Não pôde voltar a Minas porque os aeroportos de Belo Horizonte estavam fechados devido ao mau tempo.

Enéas - O vice-governador de Minas, Newton Cardoso, considerou a decisão ''a destruição do PMDB''. Pela manhã, ele tentou negociar com Michel Temer uma prévia com 50 mil votantes. Ouviu um não e atacou o presidente do partido. ''Se Itamar não for candidato até Enéas ganha do PMDB. Temer vai ser o homem que enterrou o PMDB nacional.''
A agressividade de Newton Cardoso teve como resposta a ironia do líder do PMDB na Câmara, Geddel Vieira Lima (BA). ''Ele quer que Itamar seja candidato até a síndico de prédio para ele tomar o governo de Minas.'' Para se candidatar à reeleição, Itamar terá de negociar com Newton Cardoso. O vice tem interesse em se candidatar ao governo mineiro.


Servidores e governo selam acordo
Funcionários do INSS votam hoje o fim da greve, postos ficarão abertos por 12 horas e salário sai na segunda

BRASÍLIA - O Ministério da Previdência e os servidores do INSS assinaram ontem um termo de acordo que pode colocar fim a uma paralisação iniciada em 8 de agosto. O texto ainda será votado em assembléias regionais, mas os líderes da greve vão defender a suspensão do movimento. Assim que as agências forem reabertas, os segurados serão atendidos com prioridade, de acordo com a negociação fechada ontem. Os postos do INSS funcionarão durante 12 horas diariamente até a atualizaçáo do serviço. O governo não punirá funcionários que ocupam cargos de confinça.

O projeto de lei que regulamenta as carreiras do setor não será enviado imediatamente ao Congresso. Os servidores do INSS não querem ser regidos pela CLT e sim pelo Regime Jurídico Único (RJU) - forma que assegura o direito de greve. O ministro da Previdência, Roberto Brant, concordou com a exigência apesar de resistir à sua adoção.

Sindicalistas e técnicos do governo revezaram-se em reuniões por mais de oito horas. O ministro encontrou-se com os grevistas no fim da tarde. O dia serviu para o ajuste de pequenos detalhes. Os salários serão pagos quando os funcionários voltarem ao trabalho, na segunda-feira.

Pontuação - Os servidores f estejam outra vitória. Conseguiram aumentar o teto de pontos previstos na nova gratificação por desempenho. Esse novo penduricalho no contracheque do servidor será criado tão logo a greve se encerre. Prevê o máximo de 100 pontos a ser alcançado pelas três categorias de funcionários do INSS. De acordo com a escolaridade, cada ponto pode variar de R$ 0,92 a R$ 6,45.

Ainda não há acordo em torno da pontuação de aposentados e pensionistas. O governo quer limitar em 10 pontos, os funcionários propõem 30. De qualquer forma, o governo se compromete em reajustar os rendimentos básicos dos previdenciários em 11%. Sem saber se a greve havia ou não terminado, milhares de pessoas fizeram fila nas portas das agências do INSS em todo o país. O Ministério da Previdência chegou a anunciar a abertura de 45% delas, Os grevistas, contuddo, alegam que não passa de 2% o índice de postos em atividade. O INSS tem 1.135 agências.


FH apóia estrangeiro na comunicação
BRASÍLIA - Dirigentes das entidades que representam as empresas de comunicação reuniram-se, ontem, com o presidente Fernando Henrique Cardoso para defender a proposta que prevê a participação de 30% de capital estrangeiro em jornais, emissoras de tevê, rádios e editoras do país. O projeto de emenda constitucional mantém o controle acionário nas mãos de brasileiros.

Os presidentes e diretores da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT) e da Associação Nacional dos Editores de Revistas (ANER) disseram a Fernando Henrique que as mudanças no artigo 222 da Constituição são vitais. Possibilitam às empresas jornalísticas crescer e competir internacionalmente. ''O presidente disse que iria conversar com o deputado Aécio Neves para colocar o projeto em votação ainda este ano'', informou Francisco Mesquita Neto, presidente da ANJ.

A proposta está no Congresso desde 1999. Por ela, pessoas jurídicas (estrangeiras ou brasileiras) podem ser proprietárias de empresas de comunicação. ''Hoje isso só é permitido a pessoas físicas'', disse Paulo Cabral de Araújo, presidente dos Diários Associados. O projeto estabelece que os donos de empresas jornalísticas são obrigados a informar ao Congresso qualquer alteração do controle acionário.
O porta-voz da Presidência, Georges Lamazière, confirmou que FH vai conversar com o presidente da Câmara sobre o projeto, mas não informou o dia.


OAB investiga processo contra Gloria Trevi
BRASÍLIA - O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Distrito Federal (OAB-DF), André Barros, disse ontem que vai investigar o processo de extradição da cantora mexicana Gloria Trevi. Barros foi indicado para acompanhar o inquérito instaurado pela Polícia Federal para apurar as circunstâncias da gravidez da cantora. ''Está tudo estranho neste caso'', disse.
O advogado de Gloria, Otávio Neves, garante que só existe uma ordem de apreensão da cantora para depor ao Ministério Público mexicano. Segundo ele, na lei brasileira isso corresponde a uma ordem de comparecimento em juízo. Barros acha ''muito estranho'' alguém ficar quase dois anos preso aguardando extradição sem haver provas contra ela no país de origem.

''Quero ver o processo e o pedido de extradição da cantora, tudo traduzido'', disse Barros. ''Vou verificar todos os prazos.'' Ele afirmou que uma pessoa só ficaria tanto tempo presa aguardando julgamento para garantia da instrução criminal no Brasil como forma de manter a ordem pública e garantir a aplicação da lei penal. ''Isso é para alguém que pode ameaçar ou impedir a instrução.''
Barros lembrou que a acusação de corrupção de menores, que pesa contra Gloria, o empresário Sérgio Andrade e a assistente Maria Raquenel, não é um crime hediondo. Ele afirma que manter essas pessoas dois anos presas é uma punição excessiva.

Segundo Barros, o que a OAB quer é verificar se as investigações estão correndo dentro da legalidade. ''Temos que ver se a polícia está realmente buscando a verdade.''


Serra denuncia à PF fraude em licitação
Até a ata de compra de computadores teria sido adulterada

BRASÍLIA - O ministro José Serra, da Saúde, enviou à Polícia Federal uma denúncia de fraude. Ele afirma que houve tentativa de falsificar documentos da licitação aberta para a compra de 6.385 computadores e impressoras para o Programa Saúde da Família. Serra mandou para a PF papéis aparentemente falsos que imitam a ata da comissão de licitação do ministério sobre o resultado da concorrência internacional n° 5/2000. Nela, a primeira colocada aparece em quinto lugar. Isso sugere manipulação no resultado publicado em agosto, pelo qual a proposta vencedora ficou em US$ 10,148 milhões.

A papelada sobre a suposta fraude na licitação foi encaminhada ao ministro pelo deputado federal Osmanio Pereira (PSDB-MG). Há dois meses, ele recebeu a ata adulterada. O material foi entregue por um empresário do setor de informática de Brasília. Pereira disse imaginar que outras cópias tenham sido distribuídas com o objetivo de atingir o ministro, um dos possíveis candidatos do PSDB à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso.

''A empresa vencedora da licitação (Novadata Sistemas e Computadores) aparecia na ata em quinto lugar, dando a entender que o resultado final divulgado havia sido alterado por fraude'', disse o deputado. A quinta colocada, Ritron International Corporate, aparecia como a vencedora.

Pistas - Para a PF, os falsificadores deixaram poucas pistas, até porque a suposta ata não foi escrita nem mesmo em papel timbrado do Ministério da Saúde ou da comissão de licitação. Mesmo assim, será investigada a legalidade da licitação e se houve favorecimento à empresa vencedora.
A concorrência 05/2000 foi aberta para a melhoria do Programa Saúde da Família e conta com recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento. O BID, afirma a PF, já reconheceu a regularidade da concorrência, o que dificulta a identificação de falhas.

Essa é a segunda denúncia do ministro em menos de dois meses. Ele já tinha pedido ao Ministério Público e à PF abertura de inquérito contra o lobista Alexandre Paes dos Santos. Quatro funcionários públicos foram afastados, suspeitos de ligação com o lobista, representante de grandes laboratórios.


Nicolau vai continuar na cadeia
BRASÍLIA - O juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto vai continuar preso na Casa de Custódia da Polícia Federal de São Paulo. O ministro Fernando Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou liminar em habeas-corpus que pede o restabelecimento do regime de prisão domiciliar.
Principal acusado no desvio de R$ 196,7 milhões da obra inacabada do Fórum Trabalhista de São Paulo, Nicolau está preso em sala especial. No fim de outubro, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região cassou, a pedido do Ministério Público, o regime de prisão domiciliar. A decisão tomada ontem pelo ministro Fernando Gonçalves não é definitiva. O mérito do habeas-corpus ainda será julgado pelo STJ.


Artigos

Brasil possível
Marilia Pastuk

A Ação Comunitária do Brasil (ACB) completou 35 anos em agosto. É um feito, considerando tratar-se de organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, mantida pela iniciativa privada. É uma instituição pioneira. E foi implantada numa época na qual a política vigente era a remoção de favelas, com todos os traumas daí advindos. A ACB nasceu com uma proposta inovadora. Acreditava que a urbanização dessas comunidades era a via mais adequada para a inclusão de seus moradores nos processos de desenvolvimento.

Em determinado momento, chegou a atuar em 64 favelas e 16 conjuntos habitacionais populares, onde procurou estabelecer la ços de solidariedade e ajudar na construção de redes afins, através da realização de atividades de educação comunitária e de iniciação profissional, voltadas, sobretudo, para a autogestão.
Naquele momento a ACB já questionava o paradigma do assistencialismo e desconfiava de que talvez não fosse a melhor via para garantir uma cidadania plena a seus sujeitos-beneficiários. Hoje, tem certeza disso, e aposta no paradigma dos direitos, o qual orienta sua atuação no desenvolvimento de quatro projetos integrados: Qualificação Profissional e Oficinas Produtivas (Fazer-Ser), Saúde e Qualidade de Vida, Ação-Escola (Mexendo em Casa de Marimbondo) e Estética, Arte e Cultura. A ACB aposta igualmente no trabalho em parceria. Busca parceiros com os quais estabeleça uma relação dialógica.

Entre esses parceiros, trabalha com o Estado, entendendo que este tem o papel fundamental de formular, executar e avaliar políticas participativas, transparentes e efetivas no sentido de satisfazer as demandas dos diversos segmentos populacionais, sobretudo daqueles em situação de vulnerabilidade e risco social.
Essa não tem sido tarefa fácil, principalmente considerando a desigualdade que o Brasil apresenta, capaz de comprometer tentativas, sempre conjunturais, de fazer justiça social. De todo modo, é nesse contexto que o trabalho da ACB se inscreve, percebido enquanto um desafio. De fato, mesmo com 35 anos de experiência de trabalho junto a populações de baixa renda, e talvez mesmo por conta dessa experiência, a ACB está revendo sua prática.

Está se sentindo mais madura para tanto, se permitindo a autocrítica. Assim, neste momento, mais do que nunca, está observando, escutando seus interlocutores, refletindo acerca do seu papel, planejando e avaliando suas ações. Estão participando desse processo, de forma intensa e solidária, parceiros das comunidades de Cidade Alta (Cordovil) e da Vila do João (Complexo da Maré) e da iniciativa privada, que sempre estiverem conosco. A eles, nossos especiais agradecimentos, reconhecendo a importância de acreditar em um Brasil possível.


Colunistas

Retroceder, jamais?

Tanto se falou, na semana passada, sobre o sucesso do Brasil na reunião da Organização Mundial do Comércio, no Catar, que a gente fica daqui se perguntando duas coisas: primeiro, de onde saíram tanto talento e formosura que fizeram o país transitar do baixo clero - em reuniões passadas - à mesa das principais negociações e à liderança de duas vitórias importantes: o reconhecimento de que a saúde pública não pode submeter-se ao acordo sobre patentes de medicamentos e a admissão da União Européia de, na próxima rodada, incluir a questão da gradual redução dos subsídios à agricultura na pauta dos debates.

E ainda tivemos o ministro das Relações Exteriores, Celso Lafer, dividindo com Boutros Ghali a condição de ''sábios'' encarregados de facilitar os entendimentos - que nesse tipo de encontro só vale por consenso, não por maioria - por meio da interligação de assuntos e interesses.
A segunda dúvida é: tal inserção internacional é fluida ou já está suficientemente consolidada para que, independentemente de governos, o Brasil continue proprietário de tal conquista, ou corremos o risco de viver a situação em que dia de muito é véspera de nada?

Dois participantes da reunião, os ministros da Saúde, José Serra, e da Agricultura, Pratini de Moraes, têm opinião sobre essas questões.
Vamos à primeira, na versão de Pratini: ''O Brasil é hoje responsável por 5% das exportações mundiais e, mais do que isso, o presidente Fernando Henrique Cardoso conseguiu construir um patamar de respeitabilidade no exterior que nunca tivemos.'' Pratini inclui, aí também, a organização da economia em relação a tempos de barata-voa total.

Já Serra, também dá crédito ao prestígio de FH no exterior, mas atribui mérito ao bom preparo dos diplomatas brasileiros, à ajuda das Organizações Não-Governamentais e, surpreendam-se (pelo menos ele se surpreendeu) ''à maior flexibilidade do governo Bush nas questões comerciais''.
Muito bem, quanto à segunda dúvida, a respeito da perenidade desse poder - afinal o enfrentamento, notadamente no tema agricultura, já começa em 2002, ano eleitoral na França, cujo lobby pró-subsídio é fortíssimo internamente - José Serra é diretíssimo: ''Isso vira fumaça de um dia para o outro. Se o governo não entender bem do assunto, podemos cair em duas situações: um terceiro-mundismo à cubana ou um comportamento de colônia.''

Pratini de Moraes, quase parte para cima de Luiz Inácio Lula da Silva, de novo - ''se tivermos um presidente contra a exportação e a favor de subsídios, o retrocesso é certo'' -, mas resolve dizer o mesmo de outro jeito: ''O Brasil conquistou isso com firmeza de posições, capacidade de diálogo e autoridade. Não podemos destruir isso, e é preciso deixar bem claro que propostas demagógicas e populistas terão como conseqüência a destruição da estabilidade econômica.''

Não vamos perguntar a nenhum dos dois quem seria capaz de construir ou destruir trabalho tão festejado porque, além de integrantes do governo Fernando Henrique, são ambos pré-candidatos à Presidência da República. Fato que já retiraria ante o leitor boa parte da credibilidade da defesa das teses.
Como de Serra não se arranca uma palavra sobre sucessão, passemos então à análise do cenário que faz o ministro Pratini de Moraes, estrela única do último programa do horário gratuito do PPB.

''Quem nega, mente''
O ministro da Agricultura vai entrando nesse jogo devagar, às vezes vendo a bola ser dividida com Delfim Neto, outras com Esperidião Amin. Mas, como se, o que couber a ele for a candidatura ao governo do Rio Grande do Sul, olha o plano mais amplo sem estresse, mas com uma vontade que vou te contar: ''Eu quero, e quem diz que não quer está mentindo'', resume referindo-de à presidência.

Em geral, visto como técnico, surpreende esse apetite todo pela política que ele mesmo, sem subterfúgios, explica: ''O poder é fascinante, pois te dá oportunidade de mudar as coisas, como mudei na Agricultura.''
Sobre esse assunto, aliás, faz previsões ultra-otimistas caso sejam favoráveis os resultados da rodada da OMC: ''Em seis anos o Brasil pode saltar de US$ 23 bilhões para US$ 48 bilhões em exportações.''

Mas Pratini não se apresenta como santo milagreiro. Solução para tudo não tem. Faz um diagnóstico básico que traduz na palavra desenvolvimentismo. ''O jovem quer emprego, educação e oportunidades, e os velhos, cada vez em maior número, precisam de assistência.''
Ministro de governos militares, nem por isso Pratini sente-se o representante da direita num país onde há um congestionamento monstro na centro-esquerda: ''Sou pragmático e tenho dois lemas: respeito às instituições democráticas e defesa de uma política de eficácia econômica e social. Se isso é direita ou esquerda, não saberia dizer.''

Bem, mas, e a aliança governista? Pratini acha que o ideal é ter um candidato só contra a oposição, mas se não for possível, acha que uma dupla de governistas torna a disputa de bom tamanho.
O nome da dupla? Aí já é subestimar o tirocínio de um técnico que convive há 30 anos na política.


Editorial

Águas Turvas

A Cedae está devendo uma boa explicação aos cariocas. Que espécie de líquido anda distribuindo pelas torneiras da cidade? Quando se juntam dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio o resultado é água, substância definida assim pelo Aurélio: ''líquido incolor, sem cheiro ou sabor, essencial à vida.''. A Cedae, num relatório oficial, afirma que: ''A água distribuída à população encontra-se dentro dos padrões para consumo humano, exceto para o parâmetro odor e para o par âmetro turbidez.''. Ora, se o líquido que a Cedae distribui tem cheio e é turvo, não pode ser água, o que será?

Há mais de uma semana moradores de vários bairros do Rio vêm reclamando que o líquido que a Cedae distribui tem um forte mau cheio, ora assemelhando-se a um inseticida, ora a cloro. Além disso tem uma coloração esverdeada. Em alguns casos foram registradas reações alérgicas e até episódios de diarréia, o que põe em dúvida o tal ''padrão para consumo humano''. Pelo sim pelo não, a população esgotou os estoques de água mineral dos supermercados e alguns contribuintes, mais assustados, estão usando água engarrafada até para cozinhar. Os que não podem fazê-lo, fervem o liquido da Cedae antes de ingeri-lo.

Um dos fatores que diferencia os países desenvolvidos daqueles que não prestam atenção a seus serviços essenciais e continuam vítimas do atraso é a torneira. Em qualquer país sério não há filtros ou ozonizadores na cozinha para tentar purificar a água que chega da rua. Bebe-se direto na bica. Qual é o consumidor consciente que se atreve a fazer o mesmo numa grande cidade brasileira? Apenas os políticos ou dirigentes de empresas distribuidoras de água, responsáveis diretas pela má qualidade dos serviços públicos, o fazem, demagogicamente, quando surge uma crise como a atual. Para eles, vale a pena correr o risco de tentar impor uma ficção à opinião pública, em lugar de investir seriamente na melhoria dos serviços que prestam, ou deveriam prestar, à comunidade.

Mesmo que a água do Guandu saia - dos reservatórios da Cedae - própria para o consumo, apesar de indícios de grande presença de cloro para tentar conter a poluição dos mananciais - consumidores que a deixam decantar no copo observam a presença de uma camada leitosa - a água se contamina em encanamentos vetustos, sem pressão suficiente, mistura-se ao esgoto, cai em cisternas inadequadas, resultando em desperdício que chega a 50 por cento do líquido fornecido, conforme dados divulgado há pouco mais de um ano.

De onde provém a água do Rio? Vem da bacia do Rio Guandu, poluído por industrias que ficam às suas margens, pela destruição do meio ambiente, por mineradoras que retiram areia em grande quantidades, degradam a terra e propiciam a formação de lagoas sem escoamento onde proliferam algas verde-azuladas conhecidas pelos cientistas como cianobactérias. O apodrecimento dessas algas libera matéria orgânica a dá a cor verde azulada às águas. Quando chove, como ocorreu recentemente, as lagoas transbordam e contaminam o Guandu. A matéria orgânica das algas mistura-se com o cloro usado no tratamento da água e resulta em substâncias conhecidas como organoclorados, com poder inseticida, cheiro forte e muito tóxicas, a ponto de muitos inseticidas organoclorados serem proibidos para o uso doméstico.

Além disso, a falta de informação e de fiscalização fazem com que moradores e empresas usem o rio para despejar lixo doméstico, entulho, esgoto e resíduos industriais. O sistema do Rio Paraíba do Sul, ao qual o Guandu pertence, banha parte da região mais industrializada e desenvolvida do país, fornecendo água a mais de 15 milhões de pessoas. O Rio Paraíba é hoje uma cloaca a céu aberto.

O governo nos bombardeia diariamente com propaganda e grandes obras visando à despoluição da Baia da Guanabara e da Lagoa Rodrigo de Freitas. É bom. Essas obras são indispensáveis e chegam tarde para tentar corrigir uma história de descaso que dura há mais de 400 anos. Mas o carioca não bebe nem a água da baia, nem a da lagoa. Para o contribuinte é incompreensível que não se dê ainda mais atenção ao estado dos rios que fornecem a água que consumimos, essencial para a nossa sobrevivência. O que está fazendo o poder público para evitar que a poluição e degradação de rios e mananciais continue?

Multas, em geral irrisórias, e ações isoladas não bastam. É preciso ser drástico, definitivo. Ter vontade política e fazer valer a lei. Água de manancial é sagrada, não pode ser poluída. Nada deve ser despejado neles e a natureza à sua volta deve ser mantida o mais intocada possível. Os romanos, há mais de 2 mil anos, já faziam isso. A água pura e o sofisticado sistema de aquedutos romanos essenciais para o desenvolvimento de Roma. Quando a barbárie se impôs, a água foi cortada, os mananciais poluídos e os aquedutos destruídos.

Foi preciso muito tempo para que se entendesse a importância da água pura. Em Londres, até os anos 60, o Rio Tâmisa era um esgoto pastoso e fétido. Decidiu-se limpá-lo e hoje pescam-se trutas em suas águas limpas.
Está na hora de parar o nosso namoro com o descaso e a barbárie. Á água será a grande commodity do século 21. Vai ficar cada vez mais escassa pelo mundo, mas no Brasil somos privilegiados, temos água á vontade, mas não a teremos por muito tempo se a trocarmos, como está ocorrendo no Rio, por um líquido verde e cheio de organoclorados que pode até ser um veneno muito bom para matar mosquitos mas, certamente, não servirá para saciar a sede.


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11/21/2001


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