Onda de revoluções derruba mitos sobre Oriente Médio, dizem participantes de painel
A onda de revoluções que tem se espalhado desde o início do ano no Norte da África e no Oriente Médio levou até o momento à queda de apenas dois governos - os da Tunísia e do Egito. Mas tem contribuído para derrubar diversos mitos a respeito da situação política da região, como observaram participantes do painel "As Insurgências no Mundo Islâmico e seus Reflexos na Estabilidade Política do Oriente Médio e da África Setentrional", promovido nesta segunda-feira (25) pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE).
Primeiro a expor sua visão a respeito do tema, o embaixador Marcos Azambuja ressaltou a "espontaneidade dos acontecimentos" na região e recordou não haver, até o momento, "nenhuma sugestão de que esses acontecimentos se devam a influências externas". Por outro lado, observou, os movimentos têm em comum o aspecto laico, sem conotação religiosa "sectária". O embaixador lembrou ainda que a Itália e a França, países que conviveram bem com o governo líbio ao longo dos últimos 40 anos, depois se tornaram defensores de uma intervenção internacional contra o regime do coronel Muamar Kadafi.
Como apontou a professora Arlene Clemesha, da Universidade de São Paulo (USP), nos últimos meses alguns dos regimes mais autoritários do planeta "se revelaram mais frágeis do que se poderia imaginar". O cenário político da região, destacou, vem se alterando rapidamente, com o surgimento de novas lideranças.
- No Oriente Médio, as revoluções apontam a vontade de um contexto mais democrático, o que tem o efeito de mostrar a fragilidade e a falsidade da linha divisória imaginária entre um Ocidente democrático e progressista e um Oriente atrasado, radical e extremista. No Egito, a população foi às ruas para derrubar um governo autoritário aliado dos Estados Unidos. A revolução tem derrubado mitos - ressaltou Arlene.
O movimento nas ruas dos países da região para derrubar regimes "autoritários, truculentos, corruptos e ineficientes" também foi ressaltado pelo professor Márcio Scalércio, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro. Ele questionou o argumento segundo o qual "os árabes vivem divorciados do mundo moderno, atrasados e retrógrados".
- Não é assim. E ainda bem que as multidões foram às ruas para dizer isso - afirmou Scalércio.
O professor Eduardo Viola, da Universidade de Brasília (UnB), ressaltou a "baixa capacidade de previsão" dos estudiosos de Relações Internacionais. Ele recordou que as agências de inteligência dos países mais ricos do mundo também não previram o movimento conhecido como a "primavera árabe". Ao concordar com o argumento, a senadora Ana Amélia (PP-RS) observou que os estudiosos de Relações Internacionais não estão sozinhos, uma vez que os analistas econômicos também não previram a crise econômica de 2008.
A grande participação nos movimentos políticos dos últimos meses das populações urbanas foi lembrada pelo professor Reginaldo Nasser, da PUC de São Paulo. Ao lembrar o grande crescimento das cidades no mundo árabe, ele afirmou que "lá está o foco" das rebeliões dos últimos meses.
- Ali estão os jovens intelectuais desempregados. Esse é o problema. Até a revolta da Tunísia, se falava em levar a democracia à região. Depois das revoltas, veio o desespero. Este é o momento importante para o Brasil exercer uma posição mais assertiva. O modelo das grandes potências se esgotou, a rua árabe se manifestou contra ele - disse Nasser.
Ao comentar os pronunciamentos dos expositores convidados, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) expressou sua preocupação com o destino dos países da região nos próximos meses. "Não sabemos se vai ganhar o caos ou a ordem", observou Cristovam. Por sua vez, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) defendeu a posição do governo brasileiro a favor de uma solução pacífica dos conflitos. "O Brasil tem tido a possiblidade de influenciar os países árabes em função de nosso exemplo", afirmou.
Presidido pelo senador Fernando Collor (PTB-AL), o painel integra o ciclo de palestras sobre Geopolítica e Relações Internacionais, promovido pela comissão.
25/04/2011
Agência Senado
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