PCC mostra força com novos motins







PCC mostra força com novos motins
Um ano depois de provocar rebeliões em 29 presídios paulistas, facção criminosa causa 15 mortes em oito penitenciárias

São Paulo - Exatamente um ano depois da rebelião que mobilizou 29 presídios e provocou a morte de 19 detentos no Estado de São Paulo, a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) voltou a dar demonstrações de força. A ''comemoração'' do primeiro aniversário da megarrebelião começou pouco depois da meia-noite de ontem, com a explosão de uma granada em frente à Secretaria da Administração Penitenciária - o terceiro atentado ao prédio desde quarta-feira. Ao longo do dia, os presos promoveram motins em seis penitenciárias, e pelo menos nove morreram e sete ficaram feridos. No domingo, outros seis foram mortos durante conflitos com facções rivais.

A data, simbólica para os presos, fez a Polícia Militar e os funcionários do sistema carcerário entrarem em estado de alerta. O secretário da Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa, determinou que os detentos fossem recolhidos às celas ao menor sinal de tensão. A precaução, no entanto, não foi suficiente para impedir a série de conflitos entre as facções, deflagrados em oito unidades prisionais. Ontem, houve uma morte em São Vicente, uma em Presidente Bernardes, duas em Ribeirão Preto e três em Assis, no interior do Estado.

A situação mais tensa foi no Cadeião de Pinheiros, Zona Oeste de São Paulo, onde os detentos picharam a sigla do PCC no pátio. Com os rostos cobertos por máscaras improvisadas, feitas com roupas, sacudiam lençóis brancos em protesto contra os policiais que sobrevoaram o local de helicóptero. No chão, escreveram em letras garrafais o lema o Primeiro Comando, Paz, Justiça e Liberdade - o mesmo usado no Rio de Janeiro pela facção criminosa Comando Vermelho.

De 14h30 às 17h, os detentos mantiveram três funcionários como reféns, libertados sem ferimentos. Segundo a Secretaria de Segurança Pública, responsável pela administração do cadeião que abriga 1.100 detentos, dois morreram e outros dois ficaram gravemente feridos. No único caso classificado de rebelião pelo secretário Furukawa, os presos do Centro de Detenção Provisório de Belém, também na Zona Oeste, fizeram oito reféns - um delegado, um advogado, um investigador, um escrivão e quatro agentes penitenciários.

A única exigência dos detentos para pôr fim às 23 horas de rebelião foi a divulgação de uma carta com reivindicações, entregue a advogado Murilo Ricardo, uma das vítimas. Os presos pediram o fim da repressão contra o PCC, o cumprimento de direitos previstos na legislação penitenciária (não especificaram quais) e a regularização imediata da situação dos apenados com direito a regime semi-aberto. Em junho do ano passado, o secretário Nagashi Furukawa criou um regime disciplinar mais rigoroso para líderes de motins.

Na véspera do aniversário da megarrebelião, os integrantes do PCC começaram a acertar contas com a facção rival Comando Democrático da Liberdade (CDL). Os detentos do Primeiro Comando assassinaram e decapitaram três rivais na Penitenciária 3 do Complexo Campinas-Hortolândia. Horas antes, três homens do PCC foram mortos e um ficou gravemente ferido na unidade 2 da Penitenciária de Aparecidinha, em Sorocaba. Eles teriam sido vítimas de rivais do CDL e do Comando Revolucionário Brasileiro do Crime (CRBC), que invadiram a cela.


Segurança opõe aliados
BRASÍLIA - Violência e segurança devem dominar a retórica dos palanques eleitorais este ano e as atividades do Congresso no primeiro semestre. Não é por menos que a Comissão Mista de Segurança Pública se instala hoje em clima de guerra entre PFL, PMDB e PSDB. Aliadas governistas, as três legendas disputam o comando dos trabalhos. A relatoria será ocupada pelo deputado Moroni Torgan (PFL-CE), autor do projeto de segurança da candidata do partido à Presidência, Roseana Sarney. Substituirá o deputado Custódio de Mattos (PSDB-MG), ligado ao comando da campanha do concorrente tucano, José Serra.

A troca foi um erro das mesas diretoras da Câmara e do Senado, que usaram uma lista desatualizada para compor a comissão. Com a morte do ex-deputado Nelson Marchezan (PSDB-RS), o PFL tornou-se a maior bancada da Câmara - 95 deputados contra 94 do PSDB. O líder do PSDB na Câmara, Jutahy Magalhães (BA), surpreendido, prometeu protestar contra a contagem.

O PMDB garantiu a presidência. Vai escolher entre os senadores Íris Rezende (GO) e Amir Lando (RO). O PFL não concorda. O líder do partido no Senado, José Agripino Maia (RN), tenta um acordo com o PMDB para entregar o posto ao senador Edison Lobão (MA), ligado à Roseana. ''Ele dará mais poder à comissão'', argumenta Agripino. O líder do PMDB, senador Renan Calheiros (AL), simpático a Serra, não aceita a idéia. ''É golpe.'' Para encerrar o impasse, o secretário-geral da Presidência, Artur Virgílio, convocou reunião para amanhã com os dirigentes dos partidos.

A disputa pelo controle da Comissão de Segurança deve provocar o adiamento para semana que vem da retomada das votações no Congresso. O presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), fará hoje tentativa de acordo com os líderes para desbloquear a pauta. Quer votar logo as medidas provisórias, como a que aumenta o poder de fiscalização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre o mercado financeiro e a que define as novas condições para a renegociação das dívidas de produtores rurais. A MP que permite contratação temporária de servidores públicos em casos excepcionais, como o de greve do funcionalismo, foi vetada pelas oposições. ''Não ajudaremos no desbloqueio se o governo não retirar o projeto'', advertiu o líder do PT, Walter Pinheiro (BA).


Reajuste foge ao poder de FH
Petrobras culpa mercado internacional por aumento nos preços de combustíveis

BRASÍLIA - Três dias depois de desautorizar um reajuste no preço dos combustíveis, o presidente Fernando Henrique Cardoso perdeu a queda de braço com os auxiliares. O ministro das Minas e Energia, José Jorge, e o presidente da Petrobras, Francisco Gros, afirmaram ontem que os derivados de petróleo vão subir. A alta depende da definição do percentual e a data em que os novos valores entram em vigor. Técnicos do governo admitem manter o reajuste anunciado pela Petrobras, de 2,2% para o preço do litro da gasolina.

Em Buenos Aires, onde participou da reunião dos presidentes do Mercosul, Fernando Henrique mostrou-se conformado. ''Só peço que me dêem explicações por quê o preço subiu ou caiu'', disse, ao contar que havia tomado conhecimento dos motivos da Petrobras para o reajuste.
José Jorge reconheceu ter errado ao não informar o presidente da decisão. ''Foi um curto-circuito'', desculpou-se ontem. ''Houve um acidente, uma falha de comunicação'', confirmou Gros, ressalvando que a empresa não tem obrigação de avisar o presidente sobre reajuste de preços. O ministro contou que se reuniu com o presidente da estatal às vésperas do carnaval para tratar do aumento. A decisão foi comunicada ao ministro da Casa Civil, Pedro Parente. Nenhum dos três avisou Fernando Henrique.

Segundo José Jorge, os preços vão seguir o mercado internacional e a cotação do dólar. Segundo ele, na reunião na sede da Petrobras, no Rio, foram apresentados números que atestavam a necessidade do reajuste. ''O preço do combustível hoje não é mais controlado'', disse. A Petrobras, que havia reduzido em 25% o preço da gasolina na refinaria, decidiu o aumento de 2,2% para se alinhar ao mercado internacional. ''Cabe à Petrobras definir os preços da gasolina na refinaria'', resumiu Gros.

Surpreendido na última sexta-feira, Fernando Henrique, por meio de assessores, desautorizou o aumento. O constrangimento d o presidente se explica. Em dezembro, ele foi à televisão anunciar uma queda de 20% no preço do litro da gasolina a partir de janeiro, fruto da liberação do mercado de combustíveis. O resultado não foi o previsto. Produtores, distribuidores e donos de postos não abriram mão de lucros.

A abertura às importações foi prevista na lei 9.478, de 1997, que tirou da Petrobras o monopólio sobre a exploração e produção de petróleo. Com a mudança, estatal e União acertaram contas de uma dívida acumulada graças ao tabelamento dos preços nas refinarias. Até 2001, quando o barril do petróleo subia lá fora, a Petrobras cobria a diferença, evitando oscilações de preços. A empresa refina uma mistura de petróleo nacional com importado.

O diretor de Abastecimento da companhia, Rogério Manso, explicou que, quando a empresa decidiu reduzir o preço da gasolina em 25% nas refinarias, em janeiro, o litro de petróleo no Golfo do México variava entre R$ 0,27 e R$ 0,31. Este mês, o barril subiu, o câmbio também, elevando a faixa de preços do combustível para R$ 0,31 a R$ 0,35. A Petrobras estimou o aumento em 4,70%. Optou por um percentual menor. ''Temos que avaliar o mercado e a relação com os clientes'', disse Gros.


O radical cobra contradições do PT
Ele se autodefine como um raclamão incorrigível e resolveu, mais uma vez, fazer barulho. Agora, o deputado federal Milton Temer, do PT, grita contra a provável aliança entre o partido e o PL do senador mineiro José Alencar, megaempresário do setor têxtil. Acredita que a união tira a força do discurso petista, de esquerda, e não será capaz de render votos a Luiz Inácio Lula da Silva. ''É como cruzamento de cavalo com vaca: não puxa carroça nem dá leite'', define.

Temer critica ocomportamento de Lula e de dirigentes petistas. Cobra clareza de propostas, sobretudo em relação ao sistema financeiro. ''Temos que dizer que vamos tirar dinheiro dos bancos para bancar nossos projetos sociais'', prega. ''O Olávo Setúbal (dono do banco Itaú) tem ódio do PT. Se deixar de ter, ou ficou louco ou o PT mudou.''

Oficial de marinha cassado pelo regime militar em 1964, ex-comunista, jornalista, Temer não pretende renovar o mandato parlamentar pela terceira vez. ''Chega um momento em que aquele deputado que está lá todo o tempo marcando em cima tem que ser substituído'', anuncia. Escalou os candidatos a ''chatos de plantão'': Lindberg Farias e Chico Alencar. ''Eleitos, podem me substituir muito bem'', prevê.


Fraude no DNER chega à Justiça
BRASÍLIA - As fraudes no extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) levaram o Ministério Público Federal a denunciar o ex-ministro dos Transportes Eliseu Padilha, o ex-secretário-geral da Presidência da República Eduardo Jorge Caldas Pereira e mais 14 suspeitos, entre funcionários públicos, empresas e lobistas.

O procurador da República Luiz Francisco de Souza pediu à 6ª Vara Federal de Brasília a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico dos envolvidos. Procurados ontem, os ex-ministros não foram localizados. Juntamente com o ex-diretor-geral do DNER Maurício Hasenclever Borges e assessores do Ministério dos Transportes são acusados de liberar ilegalmente R$ 2,3 milhões para o pagamento da dívida judicial do DNER com a Comércio, Importação e Exportação 3 Irmãos Ltda.

O pagamento decorreu de uma suposta briga judicial, em torno do aluguel de um prédio no Rio de Janeiro. A decisão foi administrativa, não seguiu os ritos judiciais. ''Isso é ilegal e inconstitucional'', acusa Luiz Francisco. Em dezembro,o Jornal do Brasil antecipou a irregularidade, detectado pela Advocacia Geral da União. De acordo com a Justiça, a dívida era de R$ 185 mil.

Pedido - Eduardo Jorge encaminhou, em setembro de 1997, ofício a Padilha intercedendo para que o DNER liberasse o dinheiro à empresa. O pedido fora feito pelo então deputado Álvaro Gaudêncio Neto (PFL-PB).
O ex-parlamentar, também no rol de suspeitos do Ministério Público, nega a intermediação ''Nunca ouvi falar dessa empresa e não conheço nenhum dos diretores'', diz Gaudêncio. ''Estou disposto a abrir mão de todos os sigilos para provar que não tenho qualquer envolvimento.'' Afirma que Eduardo Jorge conversou com ele há poucos dias, insistindo que lembrasse ter encaminhado o pedido. ''Nunca tratei desse assunto'', diz.

O Ministério Público Federal ouviu do ex-procurador-geral Pedro Elói Soares e do ex-diretor de Administração e Finanças José Gilvan Pires de Sá que Padilha e assessores no ministério, além de Eduardo Jorge, influenciavam nos pagamentos da autarquia. ''O senhor Eliseu Padilha controlava a operação do pagamento para a firma 3 Irmãos, tendo como interessado principal Eduardo Jorge Caldas Pereira'', aponta o procurador.

Em outro depoimento, um empresário revela o pagamento de propinas para a liberação de precatórios do DNER. O esquema brindaria funcionários e o alto escalão do ministério com carros importados.


Jader pega carona de primo para ter privilégio
Deputado, também acusado, é processado no Supremo

BRASÍLIA - Um primo deputado é a esperança do ex-senador Jader Barbalho para escapar da Justiça de Tocantins e manter no Supremo Tribunal Federal (STF) o processo em que é acusado de envolvimento direto nas irregularidades da extinta Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam).
O primo providencial é o deputado federal José Priante (PMDB-PA), também indiciado no inquérito. Na petição ao ministro Carlos Velloso, do Supremo, Jader alega que como o parente tem mandato, e, portanto, direito a foro privilegiado, o processo deve continuar sob o controle do STF.

A expectativa dos advogados do ex-presidente do Senado, é que, com o inquérito no Supremo, Jader não passe mais por dissabores como a prisão decretada pelo juiz Alderico Rocha Santos, da 2ª Vara Federal de Palmas (Tocantins), revogada na noite de sábado, com habeas-corpus concedido pelo presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, Tourinho Neto.

O ministro Carlos Velloso - que também é o relator dos inquéritos sobre irregularidades no Banpará e na venda de Títulos da Dívida Agrária (TDA)s - pediu informações ao juiz Alderico Rocha Santos. O magistrado tem cinco dias para prestar informações sobre os indiciados e as medidas que tomou.
Além do inquérito referente aos escândalos na Sudam, o das TDAs também deve ser relatado por Velloso, porque a ex-mulher de Jader, a deputada federal Elcione Barbalho (PMDB-PA), está incriminada.

O ministro Velloso espera que o inquérito do Banpará - no qual Jader é o principal indiciado - fique mesmo na Justiça comum. O parecer do Ministério Público informa que a deputada Elcione Barbalho aparece nesse processo apenas como ''beneficiária indireta das aplicações financeiras''.


Roseana luta contra a frieza dos números
Ruim com ela, pior sem ela. Em quase oito anos de governo, Roseana Sarney (PFL) tornou ''menos piores'' os indicadores socioeconômicos do Maranhão. A discreta evolução pode ser o gancho para atenuar o efeito dos números assustadores na campanha da pré-candidata do PFL à presidência. Mas o quadro geral ainda é preocupante. A situação do Estado é péssima até quando comparada à já combalida Região Nordeste.

De olho nas estatísticas, Roseana deve receber hoje, no Rio, dados encomendados ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Ontem, no entanto, desdenhou das tabelas que colocam os índices de pobreza nas alturas. ''Se o Maranhão tem problemas, o Brasil também tem. Mas no Estado não há fome, disso eu tenho absoluta certeza'', afirmou após um almoço no Planetário da Gávea com o prefeito César Maia e o presidente nacional do PFL, Jorge Bornhausen. ''O candidato não é o Maranhão, e sim a Roseana'', defendeu-se, sem esconder ce rta irritação com a questão dos números.

Adotando um discurso agressivo, a governadora jogou no governo federal parte da culpa pelas mazelas estaduais. Alega ficar de mãos atadas com os poucos recursos que recebe. ''A nossa transferência de verba é uma das menores do País e só perde para os antigos territórios brasileiros'', lembrou. Mesmo assim, considerou seus índices sociais melhores que os das periferias de grandes cidades como São Paulo.

Sem campanha - A governadora fica na cidade até sexta-feira, e deve visitar o Ipea, a Fundação Getúlio Vargas e a escola de samba Acadêmicos do Grande Rio, que homenageou o Maranhão no Carnaval deste ano. A viagem, segundo ela, não servirá para definir estratégias de campanha. O afastamento do governo para se dedicar exclusivamente à disputa está previsto para o dia 5 de abril.
Sobre a matéria publicada domingo pelo Jornal do Brasil, mostrando que os líderes das pesquisas em início de campanha geralmente caem na reta final, Roseana se disse confiante. ''Devemos considerar a linha evolutiva e neste momento todos os dados mostram que nossa candidatura é consistente e competitiva'', explicou, reconhecendo que o segundo lugar ostentado atualmente não é garantia de bom desempenho nas urnas. ''Se fosse assim, não haveria necessidade de eleição'', afirmou.

Jorge Bornhausen acredita no crescimento nos próximos meses. ''Ela vai se firmar, nossa posição está mais sólida que a dos outros'', avaliou, numa referência implícita ao ministro da Saúde, José Serra (PSDB).

Aliança - O presidente nacional do PFL não descarta a possibilidade de uma aliança com os tucanos, mas ressalta que a chapa deve ser encabeçada por quem estiver melhor posicionado segundo as pesquisas, nas quais Roseana mantém grande vantagem sobre o adversário.
O almoço no Planetário foi um convite de César Maia. Na sexta-feira, o prefeito recebeu Serra no Rio e passou a manhã inteira disfarçando o constrangimento - no Carnaval, havia declarado não acreditar na força eleitoral do ministro. Ontem, ao lado de sua presidenciável preferida, estava mais à vontade. Mesmo assim, entrou mudo e saiu calado da entrevista coletiva.


Artigos

Perdidos no ninho
Nelson Hoineff

Grande parte do mundo cinematográfico passou as duas últimas semanas em Berlim, onde terminou, domingo, a gigantesca Berlinale, que exibiu mais de 1.000 filmes para uma gama de pessoas que vão de compradores a críticos, ou simplesmente aficionados de cinema.
O brasileiro O invasor, dirigido pelo paulista Beto Brant, foi um dos bons filmes entre essa coleção monumental. Não conseguiu o lobby suficiente para entrar na competição, na qual estaria, sem dúvida, entre os melhores. Acabou ficando numa conceituada mostra paralela, o Panorama. Sua visibilidade foi relativizada por centenas de outros filmes, ainda que ele tenha conseguido chamar a atenção de muitos compradores que foram vê-lo no mercado.

Quando se fala em festivais de cinema, imagina-se glamour e vaidades, mas quando se fala no mercado que gira em torno deles, pensa-se nos números, que, em si, não tem glamour algum, mas que sustentam a atividade audiovisual e de quebra o que vem atrás dela. Tal atividade não é apenas uma geradora de riquezas; ela é, acima disso, um agente essencial para a determinação, interna e externamente, da imagem do país.

O invasor poderia ser um bom case-study. É um filme criativo, vibrante, seguramente popular. E também de baixo orçamento, realizado com cerca de 30% do custo médio de um filme no país. Mas é sobretudo uma importante fotografia do Brasil contemporâneo, da violência urbana nas capitais, das contradições que permeiam a coexistência de universos distintos que mutuamente se invadem.
É esse o valor que filmes assim agregam. Por que eles têm êxito apenas relativo em termos de visibilidade e mercado fora do pais? Há uma resposta para isso. Em primeiro lugar, porque a oferta internacional do produto audiovisual é da ordem de cinco novos filmes a cada dia; em segundo, porque 95% desse mercado está ocupado, no Brasil e em quase todos os países do mundo, pelo produto norte-americano.

Ocorre que tal produto conseguiu, ao longo dos últimos 100 anos, duas façanhas admiráveis. Impôs ao resto do mundo a sua linguagem, e desenvolveu mecanismos artísticos e industriais capazes de torná-lo, tanto aos olhos do público quanto dos críticos, de excepcional qualidade.
O quadro que se apresenta, então, é mais ou menos o seguinte: cerca de 3.000 filmes (ou 600% da produção americana) disputam anualmente um espaço de 5% do mercado internacional. Entre esses filmes estão os brasileiros, os iranianos, os turcos, os poloneses e os israelenses, mas estão também os franceses, os italianos e os alemães.

É uma batalha desigual, mas essa é uma situação de fato, que tem de ser enfrentada. Tem e não apenas pode, porque sem a presença do audiovisual o país tende a se tornar um grande desconhecido aos olhos dos demais e de sua própria sociedade.

Em termos de industria cultural, dificilmente se pode expressar um padrão nacional de qualidade. Não existe um cinema brasileiro, assim como não há um cinema egípcio ou um cinema holandês, porque as produções são felizmente desiguais. Em termos de fixação de mercado, pode-se dizer que existe um cinema americano, mas, ainda assim, filmes americanos são sujeitos a méritos e deméritos, a sucessos retumbantes ou fracassos dolorosos.

O lado mais simples da questão consiste na necessidade de sedimentação de um mercado interno que contemple a diversidade da produção e a necessidade de que todos os filmes tenham a chance de ser avaliados por seu público. Isso é importante no momento em que a industria recomeça a discussão sobre a quota de tela no país, um tema que sempre gera polêmica porque é tangencial a um ideário xenófobo e que tem de considerar também a necessidade de se garantir a livre circulação do produto cultural, seja lá de onde vier.

O outro lado passa pelo reconhecimento da necessidade de uma política ousada de difusão externa de filmes nacionais. Há uma sutil diferença entre isso e a distribuição indeterminada de cinema brasileiro. Uma empresa privada - com o apoio do governo - tem feito sistemático trabalho de oferecimento de filmes brasileiros em quase todas as mostras e festivais do mundo. Isso é bom e necessário, mas é por meio do reconhecimento da pluralidade da produção - em termos qualitativos, temáticos e de target, por exemplo - que o audiovisual brasileiro vai poder buscar uma posição nesses 5% que cabem a toda a produção não-americana e trazer, atrás de si, todo um país.

Essa é uma posição estratégica, que não seria possível há cerca de cinco anos, por exemplo, quando os níveis de qualidade da produção eram bem menores. Ver um filme essencial como O invasor, perdido entre centenas de outros num festival do tamanho da Berlinale, é doloroso. Mas o audiovisual brasileiro está, neste momento, na confortável e rara posição de poder dizer que não quer ser simplesmente jogado às feras - e tem de descobrir meios para tirar proveito desta situação.


Colunistas

COISAS DA POLÍTICA – DORA KRAMER

A bola está com o eleitor

Chama atenção no episódio Jader Barbalho muito mais a postura do eleitorado do que a decisão da Justiça de decretar a prisão preventiva do ex-senador. Tanto é polêmica a questão que uma instância judicial mandou prender de manhã e a outra determinou a soltura à noite.
Vítima de ''armação'' como alega, ou não, o fato é que o então senador, na condição de presidente licenciado - mas eleito - do Congresso Nacional, recebeu julgamento político que resultaria em cassação, não tivesse primeiro redundado em renúncia, e, hoje, é alvo de vários proce ssos judiciais por desvio de verbas e formação de quadrilha.

Muito bem, só isso já deveria bastar para que o eleitorado de seu Estado, mesmo aquele que lhe é simpático politicamente, suspendesse temporariamente essa predileção até que ficasse provada a inocência ou a culpa no que tange ao Código Penal.
Mas, surpreendentemente, já antes mesmo da cena da prisão - note-se que discutível do ponto de vista dos direitos individuais e da letra fria da lei -, Jader Barbalho despontava como franco favorito ao governo ou ao Senado pelo Pará e, depois dela, sentiu-se mais fortalecido politicamente para lançar-se oficialmente candidato a governador.

Se, do ponto de vista do político um certo pudor não cairia mal, no que diz respeito ao eleitor não seria de todo inútil que parasse um pouco de apontar os defeitos das instituições e daqueles que as representam e pusesse as mãos na própria consciência.
Afinal de contas, Jader Barbalho não é o único político a ter a conduta questionada no âmbito nacional e, na província, a receber o aval para prosseguir a trajetória como se nada tivesse ocorrido.
Os exemplos mais óbvios, mostrados pelos jornais recentemente, são os de Fernando Collor de Mello, Antonio Carlos Magalhães e Paulo Maluf, todos indo muito bem obrigado nas pesquisas de opinião nas respectivas aldeias. E que não se venha argumentar que um foi absolvido pela Justiça, o outro não roubou nem matou e o terceiro jamais sofreu condenação legal.

Todos - e outros mais que o espaço seria insuficiente para nominar - tiveram como pano de fundo da contestação de suas condutas a presunção de que o poder poderia sofrer o abuso que bem lhes aprouvesse. E, ainda assim, recebem do eleitorado local um certificado de garantia com prazo de validade vencido no que se refere à opinião pública nacional.
É muito fácil a sociedade apontar o dedo contra a Justiça no que diz respeito aos ''poderosos'', argumentando que nunca ficam presos o suficiente, esquecendo-se de que este mesmo problema ocorre com o facínora que é solto pelo mesmo arcabouço legal que lhe confere sensação de impunidade suficiente para que os crimes sejam repetidos.

Este é um problema cuja discussão deve ser travada no âmbito do debate sobre como são feitas e aplicadas as leis.
Podemos e devemos falar sobre isso, como é dever da sociedade também não deixar de apontar e exigir correção de malfeitos. O que não se pode ignorar - sob pena de o esforço da revolta contra o alheio resultar inútil - é que o cidadão precisa fazer a sua parte.
E não nos parece que esteja fazendo quando se deixa levar por regionalismos, por conveniências, pelo canto da sereia do populismo, pelas conclusões equivocadas conduzidas por sofismas muito bem engendrados pelos diretamente interessados, pela convicção de que o inferno é um lugar sempre distante daqui mesmo.

O argumento é recorrente, algo gasto, mas urge repeti-lo dada a falta de compreensão de seu significado preciso: cada um daqueles senhores e senhoras que estão no Congresso ou em postos eletivos, seja no Executivo ou no Legislativo estadual e municipal, não chegou ali por obra e graça do Espírito Santo.
Eles não arrombaram portas. Se arrombaram cofres ou sigilos de computadores foi depois de terem recebido delegação de boa parte de seus conterrâneos.

Portanto, para que não se deixem responsabilidades atribuídas à metade - o que muitas vezes resulta em atribuição de responsabilidade alguma -, é imprescindível que, com a discussão a respeito do que está institucionalmente errado neste país, não se deixe de olhar para as distorções e os equívocos daquilo que deveria ser o exercício austero - a mesma austeridade que se cobra dos homens públicos - da cidadania.
Entre eles um dos mais sagrados, que é o do voto.

Crítica interna
Não se pode dizer que as propagandas de televisão mostrando a vida pregressa do candidato José Serra tenham feito grande sucesso no PSDB. Muito antes pelo contrário.
No momento em que o que o tucano mais precisa é mostrar-se próximo ao eleitorado que vota agora - a grande maioria com menos de 40 anos -, falar sobre sua atuação na UNE, nos anos 60, ou no governo Franco Montoro, nos anos 80, cheira a naftalina. E esta é a crítica mais amena que se ouve nas internas.


Editorial

Tempos Estranhos

O confronto de juízes no caso Jader Barbalho caracterizou uma espécie de açodamento que a própria Justiça se encarregou de colocar nos trilhos. O ex-presidente do Senado ficou 13 horas encarcerado, a título de prisão preventiva, tempo suficiente para que sua imagem, com algemas, mal escondidas por um livro sintomaticamente chamado Tempos muito estranhos, corresse o país.

A operação policial de prisão e soltura passou para a opinião pública mensagem que necessita ser analisada com mais vagar, principalmente num país no qual acusados de lesão ao patrimônio público costumam se defender, às vezes interminavelmente, em liberdade. No caso Jader Barbalho há ingredientes policiais e políticos a considerar, já que o ex-governador do Pará e ex-presidente do Senado protagonizou episódios traumáticos da vida pública brasileira.

O juiz-presidente do TRF da 1ª Região (Brasília) definiu como ''interpretação esdrúxula'' o pedido de prisão preventiva do juiz da 2ª Vara de Palmas. Para o juiz Fernando Tourinho Neto, ''enquanto não houver sentença condenatória, não mais passível de recurso, o acusado deve ser tido como inocente''.
Mais uma vez se discute o conceito de clamor público, que permeia a discussão jurídica do assunto. Alega o magistrado que a prisão do indiciado deve atender o interesse da Justiça, e não sua repercussão junto à opinião pública. Que o caso Jader Barbalho não se perca nas dobras de possíveis querelas entre juízes. Há acusações gravíssimas no ar. Algumas delas já existiam mesmo antes de Jader Barbalho assumir a presidência do Senado, fato que provocou atritos até hoje não resolvidos com seu arquiinimigo Antônio Carlos Magalhães.

Ambos por sinal se demitiram do Senado quase ao mesmo tempo: Jader Barbalho sob pesadas acusações de fraude na Finam e na Sudam (calculadas em R$ 1,7 bilhão) e Antônio Carlos Magalhães pelo seu envolvimento no episódio do painel eletrônico. São fatos de grandezas diferentes com desfecho quase idêntico. Um deles, o do painel do Senado, esgotou-se em si mesmo. Mas o dos escândalos da Sudam lançou metástases que precisam ser apuradas antes que seus efeitos penetrem mais agudamente nos interstícios da política.

Inquéritos abertos em três estados - Pará, Tocantins e Amapá - ainda estão evoluindo e carregam consigo verdadeira avalanche de suspeitas - envolvendo pelo menos 59 empresários, comerciantes, políticos, servidores e antigos aliados de Jader Barbalho. Denunciado por crimes de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e estelionato, é o maior interessado em desfazer tramas de coloração política ou sem fundamento jurídico. Que a querela dos juízes e as rivalidades políticas - sobretudo em ano eleitoral - não abafem aquilo que é mais importante nesta história: a apuração dos fatos.


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02/19/2002


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