PF divulgou o fax errado
PF divulgou o fax errado
Documento distribuído à imprensa não foi o mesmo que chegou ao presidente
BRASÍLIA - A Polícia Federal reconheceu que distribuiu o documento errado na quarta-feira, ao tentar justificar o fax enviado ao presidente Fernando Henrique durante blitz na empresa da governadora do maranhão, Roseana Sarney. Em vez da mensagem para Fernando Henrique, a polícia divulgou outro, enviado horas antes pelo delegado Paulo de Tarso Gomes para a chefia da PF. ''Nunca tive o documento verdadeiro'', justificou a delegada Viviane Rosa, chefe da assessoria de imprensa da PF. ''O presidente não iria enviar uma coisa dessas para mim.''
Extratos da companhia telefônica do Maranhão, publicados ontem pelo Jornal do Brasil, provaram a manipulação. O documento liberado pela PF era, na verdade, um texto enviado às 17h55 pelo aparelho de fax da Lunus para a Decoie, divisão de inquéritos especiais da PF. A transmissão para Fernando Henrique com o relatório da operação foi feita às 21h49, conforme o JB revelou na edição de terça-feira. As justificativas da PF são confusas.
A delegada Viviane afirmou que a intenção da nota oficial divulgada na quarta-feira era mostrar apenas o ''conteúdo'' do que foi passado da Lunus para o Alvorada. Supostamente, uma cópia do mandado de busca e apreensão. O documento distribuído aos jornais, no entanto, era uma reprodução de fax. A delegada não soube explicar por que não esclareceu na nota oficial que a cópia não era verdadeira. Nem o porquê de não usar uma xerox do mandado - documento em poder da PF - ao invés da mensagem enviada por Paulo de Tarso para a Decoie.
As explicações sobre a discrepância de horários entre os faxes são ainda mais nebulosas. De acordo com Viviane Rosa, no dia da ação policial na Lunus, o diretor-geral da PF, Agílio Monteiro Filho, havia viajado para Belo Horizonte, onde mora sua família. Em seu lugar, ficou o delegado Itanor Carneiro, segundo homem na hierarquia da corporação. Foi para ele que Paulo de Tarso teria enviado o primeiro fax. O material teria ficado sobre a mesa de trabalho de Carneiro quando ele saiu para a Academia de Polícia Federal, onde mora, numa região próxima à cidade-satélite de Sobradinho.
O delegado Carneiro, contou Viviane, já estava no quarto quando recebeu um telefonema de Agílio. O diretor-geral, acionado pelo ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, teria pedido que remetesse uma cópia do mandado de busca para Fernando Henrique. A 20 quilômetros do Palácio da Alvorada, com carro, gasolina e motorista pagos pelo contribuinte, o delegado Carneiro preferiu telefonar para Paulo de Tarso, no Maranhão, e pedir que enviasse o documento para o fax 411-4058, na Ajudância de Ordens da residência presidencial.
No início a noite, o porta-voz da Presidência, Alexandre Parola, evitou responder as perguntas dos jornalistas. Usou o tempo da entrevista diária no Palácio do Planalto para divulgar nota sobre a saída do PFL do governo.
Presidente faz aposta no tempo
Fernando Henrique aceita pedidos de demissão de ministros liberais, mas acredita em reaproximação no futuro
BRASÍLIA - O presidente Fernando Henrique Cardoso não fará a reforma ministerial forçado pelo fim da aliança com o PFL. Pouco afeito a mudanças bruscas na equipe, FH pretende, agora, esperar a poeira baixar, enquanto imagina o redesenho da Esplanada dos Ministérios. Desistiu de procurar a reconciliação com os liberais. Fez a última tentativa pela manhã. Entendimentos futuros, contudo, não foram descartados. O governo nem pensa em demitir liberais incrustrados nos segundos e terceiros escalões.
O presidente mal conseguiu dormir. Assim que desembarcou da viagem ao Panamá, telefonou ao secretário-geral da Presidência, Arthur Virgílio, e ao ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga. ''Fiz o que pude, mas o PFL está decidido'', disse à Virgílio. FH ligou para o vice-presidente, Marcos Maciel, e recebeu um não ao convidar a cúpula do partido para o café da manhã no Alvorada. Insistiu. Meia hora depois, conversou com o presidente do PFL, Jorge Bornhausen. Não havia clima.
Ontem à noite, o Palácio do Planalto anunciou o nome dos ministros que assumirão interinamente as três vagas deixadas pelo PFL. No Esporte e Turismo, fica o presidente da Embratur, Caio Luiz de Carvalho. Na Previdência, o secretário-Executivo, José Chechin. E o polivalente Pedro Parente acumulará a Casa Civil com o de Minas e Energia. O deputado Ricardo Barros (PPB-PR) assumirá o lugar de Heráclito Fortes (PFL-PI) na liderança do governo no Congresso. Também na condição de interino.
À tarde, o presidente se reuniu os líderes do PMDB e do PSDB para tratar da crise política. Ficou acertado que a prioridade é aprovar a emenda constitucional que prorroga a CPMF. O Planalto acredita que contará com os votos de pefelistas para a prorrogação e não quer descartar as chances de uma reconciliação.
Para manter as portas abertas para futuros entendimentos, o presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), visitou a governadora Roseana Sarney. Especialmente, no segundo turno de uma eleição presidencial. Agora, a expectativa do palácio do Planalto é com o resultado das pesquisas de opinião. Cinco institutos registraram levantamentos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para divulgá-los nos próximos dias. FH recebeu a informação de que uma das pesquisas aponta queda de Roseana em três pontos percentuais.
Documento prova elo com Sudam
BRASÍLIA - O auto de apreensão feito pela Polícia Federal durante a busca na empresa Lunus Participações, uma semana atrás, mostra que os proprietários, a governadora Roseana Sarney e o marido, Jorge Murad, mantiveram investimentos na Agrima Agricultura e Pecuária até o ano 2000. A Agrima controla a Nova Holanda Agropecuária, investigada por desvio de recursos da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (S udam). Murad foi sócio da Agrima, mas afirma ter se afastado da empresa em 1993.
No ''Plano de Contas da Lunus'', que consta do auto de apreensão, uma coluna demonstra os investimentos na Agrima. Não há valores detalhados. Estão registradas outras aplicações, em diferentes empresas ligadas ao grupo de Roseana e Murad.
A documentação deixa claro que a Lunus funcionava como escritório do casal. Foram recolhidos os balanços de campanhas de Roseana ao governo do Maranhão, em 1994 e 1998. Há documentos sobre as doações da Nova Holanda à candidata, em 1998.
Os agentes encontraram uma lista de cheques ''emitidos nominalmente à Prefeitura, sacados diretamente no caixa do banco ou depositadas em contas não identificadas, sem registro em movimento diário de caixa''. Outro item do auto é uma pasta com a etiqueta ''Sudam'', os tópicos ''Usimar Pendências'', ''Reunião do Condel'' e ''Resumo do Projeto''. A Usimar Componentes Automotivos é outro projeto envolvido nas fraudes da Sudam.
O Condel é o Conselho Deliberativo da autarquia, o qual Roseana integrava quando foi aprovado o financiamento para a Usimar, mesmo com restrições do Ministério da Fazenda. A documentação mostra que Murad continuou a ter vínculos com a Sudam até 1999, quando recebeu, por fax, ofício do órgão dirigido à Usimar, ''a/c de Maria Auxiliadora Barra Martins''. Trata-se de uma das principais acusadas pelos desvios. . O ofício é assinado por José Arthur Guedes Tourinho, ex-superintendente, também suspeitop de participar do esquema .
Uma grande quantidade de extratos, canhotos de cheques, comprovantes de depósitos e apólices de seguro das empresas de Murad e Roseana estavam na Lunus. A lista inclui documentos relativos aos bancos do Maranhão, Bradesco, Itaú, Boston, BNB, CEF e Citybank.
Os policiais apreenderam computadores, disquetes e outros componentes de informática, além de arquivos, declarações de renda e cadastros. Um dos disquetes traz o nome ''Government'', supostamente com dados do governo do Maranhão. Um outro leva a etiqueta ''Proppa Sudene''. Murad conrolava o número de ''Terrenos adquiridos''.
O material está guardado na PF em São Luís, agora sob a responsabilidade do Superior Tribunal de Justiça, que agora concentra a investigação. Mas o Ministério Público, a Justiça Federal e a Polícia Federal irão aprofundar a apuração nas empresas ligadas ao casal, como a Usimar e a Planor Construção e Comércio.
Investigação ganha foro especial
BRASÍLIA - O inquérito criminal em curso na Justiça Federal de Tocantins está suspenso com relação ''a atos que possam ser atribuídos'' à presidenciável governadora do Maranhão, Roseana Sarney. Todo o material apreendido na operação realizada pela Polícia Federal, na sede da Lunus, em São Luís, deve ser remetido ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Inclusive o dinheiro encontrado, R$ 1,39 milhão.
A decisão é do ministro Ruy Rosado de Aguiar, do STJ. Ele acolheu a reclamação dos advogados de Roseana. Como governadora, ela tem direito a foro especial. Por isso, o processo correrá no Superior Tribunal de Justiça.
Em seu despacho, o ministro Ruy Rosado requer a remessa ao STJ de ''todos os documentos resultantes do cumprimento da ordem de busca e apreensão na empresa Lunus Ltda., que aqui serão autuados e enviados ao Ministério Público Federal para os fins da lei, uma vez que dessa apuração poderá resultar a instauração de processo criminal de competência do STJ''.
Mas essa pode ser apenas uma vitória temporária. Não há ainda uma data prevista para o julgamento do mérito da reclamação de Roseana Sarney pela Corte Especial do STJ. Se o julgamento não ocorrer antes de 5 de abril - fim do prazo de desincompatibilização da governadora para concorrer à eleição presidencial -, ela perderá o direito a foro privilegiado. Nesse caso, o inquérito voltará à Justiça comum, ou seja, à vara federal de Tocantins.
Essa questão é importante porque a defesa da governadora maranhense pede ainda que todos os atos praticados pelos juízes federais de Tocantins e do Maranhão, no inquérito Sudam-Finam, com relação à Lunus, sejam declarados nulos. Inclusive a ordem de busca e apreensão cumprida pela Polícia Federal.
Roseana Sarney é sócia majoritária (82,5% das ações) da empresa sob investigação. Seu marido, Jorge Murad, detém 17,27% das ações, e Severino Francisco Cabral apenas 0,23%.
A parte da investigação que não envolva Roseana nem suas empresas vai continuar normalmente na justiça federal de Tocantins. Apenas o material apreendido na sede da Lunus será remetido ao STJ.
Megaoperação na Favela Pantanal
O refúgio que abrigou o prefeito de Santo André, Celso Daniel, seqüestrado em 18 de janeiro e assassinado um dia depois, passou ontem por uma operação de guerra. Cerca de 1.200 policiais, em 400 viaturas, invadiram a Favela Pantanal, próximo a Diadema, zona sul de São Paulo. A polícia prendeu 15 pessoas, descobriu três supostos cativeiros e apreendeu drogas e 18 armas.
Foi a maior operação da história da Polícia Civil em São Paulo. Às seis da manhã, carros e viaturas fecharam as entradas e saídas da favela, considerada um dos locais mais violentos da capital paulista. Cálculos da polícia, indicam que serviu de cativeiro para sete em cada dez seqüestros na cidade.
A blitz que começou às seis da manhã só acabou às 13 horas. A polícia tinha autorização da Justiça para entrar nos dez mil estabelecimentos da favela. Cerca de quatro mil locais foram vistoriados, dentre casas, bares e comércio. No muro de uma creche, havia cocaína, crack e 100 trouxinhas de maconha. Documentos de Ivan Rodrigues da Silva, o Monstro, suposto líder do grupo também foram achados. Os suspeitos foram levados e interrogados numa ''delegacia'' improvisada num campo de futebol.
Circuito de TV filmou tiroteio em Sorocaba
PCC confirma que alvo do comboio era avião pagador
As dúvidas sobre a operação da polícia paulista em Sorocaba na manhã de terça-feira podem estar perto do fim. Parte do tiroteio que resultou na morte de 12 integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) foi filmada pelo circuito de TV da Via Oeste, concessionária da Rodovia Castelinho. O vídeo foi anexado ao inquérito e pode ajudar a esclarecer se houve excesso de violência por parte das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota). Parentes dos mortos protestaram na quarta-feira alegando que os bandidos não tiveram chance de reação.
Quando a ação começou, as câmeras do pedágio, operadas manualmente, apontavam para o lado oposto. Não se sabe se foram viradas a tempo de registrar quem atirou primeiro. A pouca nitidez do vídeo pode prejudicar a análise. Detalhes sobre as imagens não foram divulgados. O relações-públicas da Polícia Militar, tenente-coronel Renato Perreneaud, informou que o sigilo é uma medida de segurança.
Além de acompanhar o inquérito aberto pela delegacia de Sorocaba, que investiga a hipótese de execução, a PM vai apurar o caso internamente. Os laudos preliminares da Polícia Civil mostram que apenas três dos 12 criminosos atiraram.
Avião - Um porta-voz do PCC confirmou por telefone celular, de dentro de um presídio, que o objetivo do comboio interceptado era mesmo assaltar um avião pagador que pousaria no aeroporto de Sorocaba. Esta era a primeira hipótese defendida pela polícia, mas o Departamento Aeroviário de São Paulo (Daesp) informou que não há mais transporte aéreo de valores na região. A partir daí, passou-se a acreditar que a intenção era libertar presos numa penitenciária.
O Daesp foi desmentido pela Associação dos Donos de Hangares de Sorocaba. ''Eles negam porque permitem esse tipo de vôo mesmo sem a segurança necessária'', acusou o presidente da associação, Paulo José Garcia de Oliveira, garantindo que aviões pagadores passam por ali de duas a três vezes por semana.
Artigos
Quem mandou nascer mulher
Marta Rocha
Diz-se que antes de serem criados o mar, a terra e o céu, o mundo era conhecido como Caos. Em determinado ponto, um deus cujo nome não se sabe, levantou montanhas, escavou vales, distribuiu os bosques, permitindo aos peixes a posse do mar, às aves, do ar e aos quadrúpedes, da terra.
Entretanto, era necessário um animal mais nobre, e foi feito o homem. Para criá-lo, Prometeu, um titã, membro de uma raça gigantesca, que habitou a Terra antes do homem, foi chamado. Incumbido de fazer um ser superior a todos os outros animais, concedeu ao homem o dom do fogo, meio com o qual lhe seria possível construir armas, aquecer sua morada e cunhar moedas.
Como a mulher não fora criada. Júpiter mandou Pandora com boa intenção, pois esta seria concebida para agradar ao homem. A ela, como presente de casamento, o rei dos deuses entregou-lhe uma caixa, em que cada deus colocara um bem. Entretanto, Pandora abre a caixa, inadvertidamente, e todos os bens escapam, exceto a esperança, que nunca abandonaria por inteiro as mulheres, mesmo nos momento em que se sentissem totalmente desgraçadas.
É sobre este pano de fundo que a história da mulher vem sendo contada. Na Grécia, era ela excluída do mundo do pensamento, do conhecimento, tão valorizado pela civilização grega.
No que se refere a civilização romana, seu código legal legitima a discriminação da mulher.
Estudos demográficos revelam que havia na Idade Média uma predominância do contingente feminino adulto, pois os homens estavam envolvidos em constantes guerras e longas viagens. Mesmo assim, o trabalho feminino sempre recebeu remuneração inferior ao do homem.
Na perseguição às feiticeiras , exacerbada no século 16, se retrata a luta pela manutenção de uma posição de poder por parte do homem, pois a bruxa supostamente teria conhecimentos que lhe confeririam espaços de atuação que escapam ao domínio masculino.
As mulheres sofreram revezes tanto no campo do preparo profissional quanto no da formação intelectual. Assim, não há registro de mulheres freqüentando universidades até meados do século 19. Da mesma forma, nos currículos escolares se enfatizava às meninas o aprendizado das prendas domésticas e sua escolarização não as preparava para o ensino superior que, aliás, não lhes era acessível.
Em 8 de março de 1857, as operárias da indústria têxtil de Nova York empreenderam uma marcha pela cidade, protestando contra seus baixos salários e reivindicando uma jornada de trabalho de 12 horas. Passados 51 anos, em 1908, ainda em Nova York, as operárias novamente saem as ruas denunciando as mesmas condições degradantes de trabalho e acrescentando às suas reivindicações o direito ao voto, integrando-se às duas frentes da luta do operariado: a luta por melhores condições de trabalho e pelos direitos de cidadania, que não incluía, no entanto, o sufrágio feminino.
Os anos compreendidos entre 1930 e 1940 permitem as mulheres votar e ser votadas, ingressar nas instituições escolares e participar do mercado de trabalho.
Apesar da referência explícita à igualdade de direitos do homem e da mulher, a partir da aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, a idéia de direitos humanos nem sempre foi agregada à de que não há direitos humanos sem a defesa dos direitos das mulheres.
Na atualidade a diferenciação entre homens e mulheres ainda se faz presente. Embora ingressem no mundo do trabalho e tenham um nível educativo cada vez maior, as mulheres ainda ganham menos que os homens; sua inserção é predominante no mercado informal ou em trabalhos domésticos.
Mesmo ocupando cargos públicos, a representação pública ainda é pequena em cargos parlamentares.
Nas escolas e nos meios de comunicação ainda são reproduzidos estereótipos retratando a mulher como objeto sexual.
A esterilização é expressiva entre as mulheres em idade reprodutiva, sendo muitas vezes realizada sem o seu consentimento.
O índice de mulheres com Aids aumenta a cada dia, atingindo sobretudo as casadas e as que vivem em união estável e monogâmica.
A violência doméstica e sexual contra mulheres é fenômeno diário e nem sempre notificado ou punido.
As meninas são objeto de abuso sexual e muitas delas tornam a prostituição sua forma de sobreviver. Em alguns países, por tradição e cultura, as mulheres têm seus órgãos mutilados, como garantia de que a fidelidade existirá se o prazer sexual lhes for negado.
A violência praticada contra as mulheres durante os confrontos bélicos é vista como arma de guerra, consentida e tolerada.
Nesse contexto, o trabalho seguinte só poderá ser o de não aceitar como inquestionável o destino de nascer mulher, mas sobretudo o de garantir o empowerment e a autonomia das mulheres com a melhoria de seus status político, social e econômico, por constituírem requisito essencial para a edição do novo contrato social, que a igualdade e a paz impõem adotar.
Colunistas
COISAS DA POLÍTICA – Dora Kramer
Inimigos, graças a Deus
O PFL apostou numa jogada de risco - diga-se, a única possível nas circunstâncias impostas pela governadora Roseana Sarney - que, se não for bem administrada, poderá vir a se configurar numa aventura. Política é risco e até aí não se pode criticar o PFL dadas as condições de temperatura que se estabeleceram (ocioso repisar por culpa de quem) com o Palácio do Planalto: retirar a candidatura de Roseana significava um final horroroso e antecipado, pois a deixaria na posição de ré confessa. Melhor arriscar a eventualidade de um horror sem fim durante a campanha.
O partido reuniu-se com ela e, a exemplo do que fez o PMDB lá atrás, quando surgiram as primeiras denúncias envolvendo o então senador Jader Barbalho, pediu garantias de que nada havia em sua vida que pudesse desaboná-la moralmente.
Tal como Jader, Roseana assegurou que estava limpa como um querubim, não obstante tenha fornecido até agora quatro versões diferentes para a existência de um milhão e meio de reais em sua empresa, sem que nenhuma delas explique a origem do dinheiro. Do salário de governadora certamente é que não é.
Mas, como não se vê nos jornais grande interesse em discutir a questão - embora ao eleitorado possa assolar tal curiosidade -, vamos nos ater às possíveis conseqüências políticas do gesto. E, a menos que haja jogada inteligentíssima por trás de tudo isso e que ninguém está ainda percebendo, à primeira vista o PFL errou as contas.
Se para a candidatura de José Serra o efeito do rompimento é ruim - dada a importância do pefelê como aliado -, para a de Roseana os resultados podem vir a ser desastrosos. Já de início, o partido precisará buscar novas alianças e, onde existe espaço para essa conquista - no PTB e no PL -, seria necessário que o PFL tivesse nas mãos os instrumentos que fazem a alegria de políticos que dependem de estrutura governamental para se eleger.
Nesse aspecto - horrível, aliás, pois ligado ao fisiologismo - os governistas levam vantagem. Entre outros motivos porque, com a saída do PFL, abrem-se vagas para moços e moças que, embora nem sempre sejam de fino trato, dispõem de uma maleabilidade ideológica bem pragmática.
Uma saída bastante favorável ao PFL poderia ser um acordo com o PMDB. Aí sim o partido deixaria o tucanato envolto em problemáticos lençóis. Só que não há hoje a mais remota hipótese de o comando pemedebista mudar sua disposição de seguir com José Serra.
Para que não fique isolado, o PFL precisa de que a candidatura Roseana solidifique-se de tal maneira junto ao eleitorado, receba uma tal sorte de apoios na mídia e no empresariado, que tudo isso consiga transformá-la num daqueles fenômenos populares contra os quais a racionalidade nada pode.
Embora ainda não haja pesquisas disponíveis, uma medida é a reação dos leitores, cuja maioria quase unânime prestou mais atenção na investigação do Ministério Público e na autoritária reação da governadora do que propriamente nos argumentos de que ela foi vítima de uma armação política. A julgar pelas manifestações por e-mail, essa proporção é de um para cada 100.
O que autoriza a suposição de que a sorte que vem acompanhando Fernando Henrique ao longo desses dois mandatos pode não tê-lo abandonado. Pois se hoje notarmos o quadro de seus inimigos - Antonio Carlos Magalhães, Paulo Maluf e Orestes Quércia, para citar apenas alguns - veremos que, perante a opinião pública, não soará de todo mal que se inclua no grupo outra oligarquia, esta representada pelos Sarney.
Ou seja, FH, que iniciou o governo debaixo de críticas pelas alianças que fez com as forças do atraso - circunstancialmente interessadas em apoiar alguns avanços, enquanto a esquerda mantinha-se conservadora frente às mudanças do mundo -, pode terminar seus dois mandatos entregando a José Serra uma conformação política bastante mais palatável ao gosto popular.
Para isso, porém, terá de tomar extremo cuidado com os acordos que vier a firmar com o PMDB e outras possibilidades partidárias já citadas. Na linha dos males que vêm para o bem, não é um delírio pensar que FH esteja diante de uma excelente oportunidade para se reconciliar com setores mais organizados e modernos da sociedade.
Recíproca verdadeira
Na avaliação interna do PFL, a aposta na candidatura de Roseana pode mesmo ser um risco, mas com grande margem de segurança. A expectativa é de que haja, inicia lmente, uma queda dela nas pesquisas até significativa.
Mas, além de acreditar na recuperação rápida e, conseqüentemente, na consolidação de índices positivos, os pefelistas ainda analisam que os votos eventualmente perdidos por ela não irão para José Serra, e, sim, para Luiz Inácio Lula da Silva.
Donde se conclui que ao PFL não interessa lutar contra o PT, mas, primordialmente, derrubar os tucanos. Como, aliás, temia Serra desde o início.
Editorial
FORA DE CONTROLE
Encurralado num episódio recheado de amadorismo político, o PFL decidiu ontem deixar o governo a que serviu por sete anos, como Jacó serviu a Labão, ''pai de Raquel, serrana bela''. E serviria outros tantos pela jovem cuja mão pretendia. ''As razões políticas que sustentaram a aliança com o governo desapareceram'', explica o PFL, para concluir: ''Nossa presença no governo não mais se justifica.''
A decisão foi exigência da governadora Roseana Sarney, virtual candidata à sucessão presidencial pelo partido, depois de uma arrancada na preferência aferidas pelas pesquisas eleitorais, a título de reparação pelo cumprimento do mandado judicial de busca e apreensão levado a cabo pela Polícia Federal. O efeito rocambolesco da revelação do episódio impediu que os partidos políticos pusessem a razão acima das emoções e do amadorismo avaliassem as conseqüências de tratar em linguagem de campanha eleitoral uma situação potencialmente grave. Não foi um episódio à altura da evolução política brasileira, com responsabilidade democrática.
Mas foi o que aconteceu. Sabido que o governo não consegue ter controle sobre a ação da Polícia Federal, cuja autonomia tem raízes no passado, o caso resultou em repercussão política intencional. A Polícia Federal alega, com razão, que não podia deixar de cumprir a decisão judicial. Onde já se viu um delegado mandar um fax para a Presidência da República, quando no desempenho de uma operação de busca e apreensão? No escritório da Lunus, fez à secretária da empresa a recomendação: ''Este é o fax mais importante da sua vida''. Foi o suficiente para desencadear o festival de amadorismo por parte de um órgão de governo que não tem controle de suas ações nem é controlado de fora.
O resto foi desdobramento ocioso. Sendo o PFL um partido que faz parte visceral do governo e que sempre se pautou por instintivo senso de moderação, o episódio que envolve a empresa de que a governadora do Maranhão é um dos proprietários e tem como sócio-gerente o próprio marido, era inevitável a repercussão política para a candidatura que as pesquisas impuseram ao partido. A cobrança de um gesto do Executivo em relação a uma decisão judicial foi descabida, tanto quanto a queixa de que a governadora poderia ter sido prevenida da ocorrência. Seria também interferência indébita do Executivo. A situação ascendente nas pesquisas levou à interpretação política de que tudo se deveu a uma trama eleitoral premeditada para abalar a posição de Roseana Sarney.
Em nenhum momento desde a invasão do escritório da Lunus houve tentativa de reduzir o caso a suas reais proporções. O que era cisão em andamento nas relações entre o PFL e o PSDB se consumou pela desconfiança. Tudo, porém, não fosse troca de desconfiança de fundo eleitoral. Até que a própria candidata se impacientou e exigiu resposta à altura, sob pena de desistir da candidatura na qual o partido e seus dirigentes puseram as melhores esperanças de sucesso. O rompimento é inseparável dos antecedentes que levaram o PFL a tentar, e conseguir, uma autonomia política que ocorreu inesperadamente. O crescimento da candidatura Roseana Sarney nas pesquisas, ao empatar tecnicamente com Luiz Inácio Lula da Silva, transtornou a direção do partido.
A repercussão ainda não foi avaliada e circunscrita nos seus efeitos de campanha. O rompimento não parece ser o melhor caminho para uma legenda que não dispõe de lastro de popularidade. Também não parecem ter sido devidamente consideradas as opiniões cautelosas de seus maiores, como o presidente do partido, Jorge Bornhausen, ou o vice- presidente da República, Marco Maciel.
É secundária a circunstância do horário da 6a.feira em que o presidente Fernando Henrique foi informado. Parece claro que o Presidente de nada ficou sabendo com antecedência. Não é uma questão de horas e minutos, mas de poder de decisão. Mais importante é levar em conta que a Polícia Federal não cumpre ordens do Governo, mas não pode deixar de cumprir ordens do Judiciário. As disputas entre as facções internas da PF datam do autoritarismo e fogem a qualquer controle, como já se viu antes e se vê de novo. Não custa lembrar que não está em causa o cumprimento de ordem judicial e sim a divulgação do que foi apurado numa operação policial garantida pelo segredo de Justiça. Por aí é que devia ter se processado a apuração das responsabilidades e sido retomadas as negociações
A esta altura, depois do rompimento do PFL com o governo, confirmada na saída dos seus ministros, é inevitável a conclusão de que o partido apostou seu saldo histórico não na promissora candidata, pois afinal dependurou o seu futuro político na reputação do marido Jorge Murad. As diferentes ponderações foram em vão. Em nenhum momento o presidente da República, com toda equipe de seus operadores próximos, deixou de agir com espírito moderador pela melhor solução do caso.
Consumada a ruptura, não custa creditar ao PFL a confiança de que honrará suas teses históricas na votação de projetos importantes para o país. O Partido da Frente Liberal não pode perder de vista que é o maior interessado em contribuir para uma transição normal de governo, pela qual todos os partidos são igualmente responsáveis.
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03/08/2002
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