Polícia prende quadrilha que fraudou R$ 63 milhões do Estado



Operação Garra Rufa prende nove pessoas; dinheiro equivale a cinco anos do programa Dose Certa na capital

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Atualizada às 18h41

Uma operação desencadeada pela Polícia Civil nesta segunda-feira, 1º, pôs fim a um esquema de fraude de R$ 63 milhões que contava com a participação de três laboratórios farmacêuticos, a Associação dos Portadores de Vitiligo e Psoríase do Estado de São Paulo (uma Organização Não-Governamental), um médico, dois advogados, três representantes comerciais, um gerente regional de laboratório e dois diretores da ONG. A quadrilha usava doentes de psoríase, uma doença auto-imune, para ingressar com ações judiciais que obrigavam o governo estadual a comprar medicamentos fora do protocolo indicado pelo ministério da Saúde e fornecê-los gratuitamente.

A ONG selecionava pacientes. O médico produzia laudos que justificassem tratamentos com medicamentos de alto custo. Os advogados ingressavam com ações judiciais que obrigavam o estado a comprar os medicamentos, sempre dos mesmos laboratórios. Todos, inclusive os representantes comerciais, dividiam os lucros decorrentes do aumento das vendas dos laboratórios. Os pacientes e o Estado de São Paulo são vítimas dessa fraude.

“Aí que está a indústria: como a margem do laboratório é grande e o tratamento é caro, o laboratório pagava propina. Então entra médico, advogado e a ONG dos doentes”, observou o governador José Serra. “Três pessoas nem doença tinham, eram pessoas sadias, em que os médicos recebiam o dinheiro dos laboratórios. Eram médicos que prescreviam o remédio e obrigam, através de ação judicial, que a Secretaria entregasse os remédios”, completou o secretário estadual da Saúde, Luiz Roberto Barradas Barata.

Com o montante desviado, São Paulo garantiria a distribuição de remédios do programa Dose Certa durante cinco anos na Capital. O valor representa mais que três vezes a verba aplicada pelo governo estadual na construção do Hospital Regional de Ribeirão Preto. A unidade, com capacidade para atender à população de 26 cidades, recebeu investimento que ultrapassou a casa dos R$ 17,3 milhões.

A operação batizada de Garra-Rufa começou ainda na madrugada desta segunda-feira com a prisão de nove pessoas. O bando foi detido na região de Marília por 50 policiais, dos quais 12 delegados. A equipe também cumpriu 12 mandados de busca e apreensão em três cidades do interior do Estado. “Que esta investigação abra caminho para outras e sirva como exemplo para inibir essa fraude mórbida com desvio de recursos já escassos da Saúde”, sugeriu Serra.

As investigações começaram há nove meses, após um delegado ser incorporado para atuar junto ao gabinete do secretário da Saúde. Ao analisar documentos relativos a ações judiciais para compra de medicamentos, o delegado Alexandre Zakir identificou indícios de fraude na cidade de Quatá, na região de Marília.

Os dados médicos de 15 pessoas – 12 pacientes com psoríase e três sem nenhuma doença – foram usados para promover ações judiciais solicitando medicamentos fora do protocolo do SUS (Sistema Único de Saúde). Os pacientes sequer sabiam de que eram autores de ações contra o Estado.

No interior, as investigações foram comandadas pelo delegado Fabio Pinha Alonso, titular da Seccional de Marília, que ouviu vítimas do esquema, testemunhas e pacientes. Laudos técnicos da Polícia Científica comprovaram a suspeita de fraude nos relatórios médicos que embasavam as ações judiciais. Constatou-se que três dos 15 pacientes não tinham nenhuma doença. Os 12 demais contraíram psoríase, mas num grau menor, o que tornava o tratamento prescrito inadequado. Todos os pacientes sofreram efeitos colaterais ao consumir o medicamento.

Cada frasco do medicamento para tratamento de psoríase custa, nas farmácias, cerca de R$ 3 mil. Em cada processo judicial os investigados ganhavam uma quantia em dinheiro, além de benefícios materiais, como  viagens  e carros subsidiados.  De acordo com uma escuta autorizada pela Justiça, o médico, além de receber dinheiro, chegou a ganhar a reforma de sua clínica para montar um centro de infusão. Ele não cobrava pela consulta quando os pacientes eram encaminhados pela ONG, que recebia R$ 150 por paciente.

A organização está em processo de crescimento, com várias filiais no interior e na Grande São Paulo e até armazenava medicamentos para futuros pacientes. O advogado também ganhava uma quantia em dinheiro por cada ação movida contra o Estado. Já o representante do laboratório recebia comissão pela venda do medicamento. “A ação policial vai prosseguir e esperamos conseguir eliminar esse malefício e esse prejuízo para os paulistas”, lembrou o secretário da Saúde.

Em 2007, a Secretaria da Saúde gastou R$ 400 milhões com o cumprimento de ações judiciais para atender cerca de 30 mil pacientes. “Estimamos que 50% das ações judiciais são objeto de desvio. Mas isso precisa ser apurado com calma”, lembrou Barata.

O programa de medicamentos excepcionais da pasta custa cerca de R$ 1 bilhão por ano, atendendo a 400 mil pessoas. O nome da operação foi inspirada no peixe Garra Rufa, usado em países como a Turquia para fins medicinais.

Cleber Mata, Manoel Schlindwein com informações da Secretaria da Segurança Pública



09/01/2008


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