Praça Argentina abriga ato de desforra









Praça Argentina abriga ato de desforra
Prefeitura descerra placa de solidariedade ao povo vizinho no mesmo local que ostentava homenagem a ditador

Com panelaços, faixas e bandeiras, uma multidão binacional de participantes do 2º Fórum Social Mundial celebrou no sábado uma desforra histórica na Praça Argentina, centro de Porto Alegre.
Foi descerrada no local uma placa em homenagem à “luta do povo argentino”, concebida para levar ao esquecimento o bronze alusivo ao ditador Jorge Rafael Videla arrancado há dois anos, depois de duas décadas de polêmica.

O monumento novo foi inaugurado por quem protestou contra a instalação do antigo. No dia 22 de agosto de 1980, Gerson Almeida era um dos líderes estudantis corridos a gás lacrimogêneo ao tomar a Avenida João Pessoa na esperança de estragar a festa do general. No final da tarde de sábado, ele entrou sem resistência na Praça Argentina para comandar a cerimônia. Como secretário municipal do Ambiente, representou a prefeitura. Dividiu as honras do ato com a deputada estadual Luciana Genro (PT), da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia, autora da idéia, e com a argentina Hebe de Bonafini, líder das Mães da Praça de Maio.

Há quatro anos, Hebe criticou o então prefeito Raul Pont por se negar a remover a saudação a Videla, feita pelo presidente João Figueiredo no dia 23 de agosto de 1980. A exemplo de líderes de entidades de direitos humanos, considerava o marco uma vergonha para Porto Alegre. Pont resistiu: mesmo dedicada a um tirano acusado de ser responsável por milhares de mortes entre 1976 e 1981, a placa fazia parte do patrimônio do município. É importante preservar evidências de períodos históricos, alertaram técnicos da prefeitura.

Há dois anos, a discussão foi sepultada por uma reveladora pergunta:
– Que fim levou a placa em homenagem ao genocida? – questionou o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), Jair Krischke.

Assim ele alertou para o sumiço, ocorrido no início de março de 2000. O bronze havia sido furtado. Não deixou saudade para centenas de manifestantes agrupadas na praça no sábado, entre faixas com dizeres como “Que gobiernen los trabajadores”, “Fuera yanquis” e “Abajo el Alca”. A maioria dos hispânicos presentes integra organizações de oposição tanto a Videla – hoje em prisão domiciliar – quanto ao atual governo, como o Partido Obrero (PO) e o Movimiento Socialista de los Trabajadores (MST). Este carregou uma bandeira argentina de cem metros. A peça gigante acompanha a história da Argentina há 17 anos. Foi doada ao MST por peronistas.

– Os de antigamente. Que eram bem diferentes – esclareceu Cristian Riveros, 20 anos, um dos empunhadores da bandeira.

O estudante secundarista assistiu a discursos se revezarem em português e espanhol e convergirem para idéias semelhantes.

– O Brasil é a Argentina de amanhã – previu o ex-líder cara-pintada Lindberg Farias, do PT do Rio.
Ao fim de duas horas de discursos e de palavras de ordem como “Um, dois, três, quatro, cinco, mil, a luta da Argentina é a luta do Brasil”, os manifestantes rumaram à Cidade da Juventude. Deixaram na praça seu marco, com os dizeres “Homenagem à luta do povo argentino e em memória dos que tombaram nas manifestações de dezembro de 2001”.


A discreta despedida de Bové
O acampamento levantado na manhã de ontem em frente à falida Companhia Geral de Indústrias, em Guaíba, recebeu apoio internacional.

Organizado por metalúrgicos, com apoio do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do Movimento Nacional de Luta pela Moradia e da Central Única dos Trabalhadores (CUT), o protesto serviu como despedida do ativista francês José Bové de terras gaúchas.
Bové embarcou ontem rumo à França. Recebido com pompa, dentro da simplicidade da manifestação, ele foi o centro das atenções na assembléia que discutia a falta de trabalho que atinge a categoria nos últimos 12 anos.

O presidente da Federação dos Metalúrgicos do Estado, Milton Viário, abriu o discurso agradecendo a presença de Bové:
– Nós nos orgulhamos de tê-lo no nosso meio. José Bové é um camponês amigo da classe – declarou.

Mesmo tendo sido informado por uma tradutora de que não se tratava de um protesto contra uma multinacional, seu alvo predileto, o ativista fez um discurso direcionado aos excluídos.
– Apoiamos todas as lutas – afirmou.

Delegações italianas e espanholas estavam presentes à reunião, que contou ainda com argentinos e uma comitiva francesa, que não desgrudou de Bové. Falava-se em união e luta.
O síndico da massa falida da indústria, Roberto Ochoa, concordou com os metalúrgicos sobre a necessidade de soluções, mas alertou sobre os riscos da manifestação:
– Colocar pessoas dentro da empresa não quer dizer que haverá trabalho. É preciso pagar as dívidas antes.

Na manhã de hoje, o Sindicato dos Metalúrgicos discute o assunto com representantes do governo do Estado. Os rumos da manifestação e um possível fim do acampamento devem ser definidos após a conversa.


Evento debate gastos bélicos
Numa assembléia coordenada pelo governador Olívio Dutra, participantes do 2º Fórum Social Mundial ouviram ontem a defesa de seis aplicações alternativas para os US$ 800 bilhões gastos anualmente com a guerra e a indústria bélica.

Até as 17h de hoje, os inscritos na assembléia (cerca de 2 mil até ontem) poderão votar nas três opções que consideram prioritárias. Batizada de Orçamento Participativo dos Gastos de Guerra, a atividade termina amanhã com a divulgação dos resultados. As urnas estão distribuídas na PUCRS, no Auditório Araújo Vianna, no Acampamento da Juventude (Parque Maurício Sirotsky Sobrinho), na Casa de Cultura Mário Quintana, no Auditório da UFRGS e na Usina do Gasômetro.
Com uma camiseta preta em que se lia “Aqui se Constrói a Paz”, Olívio participou de toda a assembléia.

A defesa das alternativas foi feita por Anuradha Mittal, diretora do Instituto para o Desenvolvimento da Política de Alimentação (Food First), Morten Rostrup, presidente da organização Médicos Sem Fronteiras (Prêmio Nobel da Paz de 1999), Raymond Offenheiser, presidente da Oxfam-América, Dom Pablo Gonzales Casanova, sociólogo e ex-reitor da Universidade Nacional Autônoma do México, Kailash Satyarthi, fundador e coordenador da Marcha Global contra o Trabalho Infantil, e Marc Laviolette, sindicalista e presidente da Reconversão da Indústria de Guerra.


Mulheres rompem silêncio
Exploração sexual e de mão-de-obra foi tema de conferências, debates e protestos

A globalização acrescentou novas formas de discriminação e de violência contra as mulheres.
Agora, elas também são vítimas das perseguições aos imigrantes, na Europa e nos Estados Unidos, e do crescimento do tráfico de mão-de-obra e de escravas a serviço da máfia da prostituição.

– Na globalização, mercadorias, dinheiro e empresas podem circular livremente, mas não as pessoas – disse Noemie Szatan-Glaymann, do Grupo de Informação para Imigrantes, da França, na conferência de ontem sobre Migrações e Tráfico de Pessoas, no terceiro dia de debates do 2º Fórum Social Mundial, em Porto Alegre.

A degradação dos imigrantes, geralmente em situação irregular nos países que escolhem para viver, atinge historicamente os homens. Nos últimos anos, as mulheres e, muitas vezes, famílias inteiras passaram a enfrentar os horrores da repressão que os trata como criminosos, segundo o francês Luca Marin, do Centro de Estudos sobre Migrações Internacionais. Mulheres da Ásia, da África e da América Latina reforçaram os movimentos migratórios em busca de trabalho ou são exlorad as por máfias internacionais.

– Mais de 50 mil chineses são levados por traficantes todo ano para a Europa e os Estados Unidos. Das Filipinas, 80% das pessoas traficadas são mulheres usadas como domésticas ou prostitutas – disse Marin.

Noemie lembrou que, há cerca de 10 anos, cresceu o tráfico de mulheres do Leste Europeu para o resto da Europa. O destino: a prostituição, em muitos casos de adolescentes. O imigrante, segundo Noemie, é tratado quase sempre como uma mercadoria, sem quaisquer direitos, e tem a situação agravada pelas redes que se especializaram em revender pessoas na Europa, enquanto crescem os partidos e movimentos articulados por políticos racistas e antiimigração.

A baiana Rosa Mendes, 53 anos, de Salvador, mora há 10 anos em Roma e lidera desde 1996 a Associação de Mulheres Brasileiras na Itália, uma das dezenas de organizações criadas especialmente para defender mulheres imigrantes no país. Biliotecária, divorciada, duas filhas, ela conseguiu cidadania italiana. Mas está preocupada com a situação de muitos dos 40 mil brasileiros que moram na Itália e estão sob ameaça de extradição.

O governo do primeiro-ministro Silvio Berlusconi encaminhou ao parlamento uma lei que restringe a entrada de imigrantes. Até agora, uma pessoa pode ficar no país se tiver a garantia de um residente de que pode vir a arranjar emprego. A lei prevê que só permanecerá quem já tiver contrato de trabalho. Ilegais podem ser extraditados e, se reincididentes, presos por no mínimo quatro anos.

– Os imigrantes passam a ser vistos apenas como força de trabalho – diz Rosa, que, nas eleições de maio, candidatou-se a vereadora pelo Partido da Refundação Comunista, mas não se elegeu.
A repressão a migrantes que desejam apenas trabalhar é muitas vezes frouxa no combate ao tráfico de gente. Para a professora Maria Lúcia Leal, da Universidade de Brasília, é clara a relação entre tráfico e migração. Ela coordena uma pesquisa nacional sobre tráfico de mulheres no Brasil, um comércio institucionalizado que desafia a Polícia Federal e a Interpol.

Para que esses e outros problemas deixem de ser “invisíveis”, como disse Maria Lúcia, é preciso debate e mobilização, como a que orienta o trabalho de Rosa na Itália. Ontem, mulheres que participam do Fórum fizeram sua parte com barulho. Dezenas delas ocuparam as escadarias da PUCRS e fizeram um apitaço contra todos os tipos de discriminação. No grupo, um cartaz com fotos de uma afegã escondida sob uma burka. Outras burkas, menos fotográficas e bem mais próximas, continuam invisíveis.


A violência não respeita fronterias
A mulher está subjugada pela violência masculina em todo o mundo, independentemente do tipo de sociedade, religião e classe econômica.
A denúncia foi feita no Fórum Social Mundial, ontem, durante a conferência sobre Cultura e Violência Doméstica.

– O diagnóstico é universal – ressaltou a coordenadora da conferência, Fátima Mello, integrante da Associação Brasileira de Organizações Não-governamentais.

Líderes da Marcha Mundial das Mulheres denunciaram, na conferência, as violações que ocorrem em todos os países. A delegada da Índia Sashi Sail disse que as mulheres estão submetidas a uma opressão “ancestral, múltipla e crescente”. Lembrou costumes bárbaros na Índia, como o de cremar a mulher viva quando o marido morria, na pira funerária. Ela não tinha direito à viuvez.
– O século 20 testemunhou o avanço dos direitos das mulheres, mas não reduziu a violência – diz Sashi.

A delegada da França Suzy Rojtman advertiu que a violência assume formas diferentes, até invisíveis. Lamentou que a globalização tenha articulado as máfias dos países, dando dimensão “planetária” à prostituição. A representante do Canadá, Diane Matte, acrescentou que a dominação masculina deixou as mulheres em “estado de medo e de vulnerabilidade constante”:
– O patriarcado instituiu a dominação sócio-econômica sobre a mulher.

O psicanalista Jurandir Freire Costa, do Rio de Janeiro, constatou que o “abuso de poder físico e moral” exercido sobre as mulheres decorre de dois mecanismos: os homens sentem-se capazes de justificar uma eventual transgressão, e os atores da violência ignoram a gravidade do ultraje. Ele sugeriu que as mulheres têm parcela de responsabilidade. Como mães, educam os filhos que, adultos, se tornam eventuais agressores. A mudança de comportamento começa na própria família.

A conferência discutiu meios de inibir a violência. As propostas incluem a criação de um tribunal internacional e a adoção, em cada país, das convenções internacionais de proteção aos direitos da mulher.


Com burka ou sem burka, as mulheres estão privadas de direitos”
Entrevista: Mariam Rawi, representante da Rawa

A professora afegã Mariam Rawi, 27 anos, vive há 18 anos no exílio. Seu pai juntou-se à resistência contra o exército soviético, que invadiu o Afeganistão em 1979, e foi morto em 1982. Mariam e a família – a mãe, a avó e quatro irmãs – deixaram Cabul e buscaram abrigo no Paquistão. Nesse país, Mariam formou-se numa escola da Associação Revolucionária das Mulheres do Afeganistão (Rawa, sigla em inglês), grupo feminista fundado em 1977. Convidada pela rede feminista Articulação Marcosur para o 2º Fórum Social Mundial, ela chegou ontem a Porto Alegre, onde comandou uma oficina e fez uma palestra. Antes, concedeu entrevista a Zero Hora. Fez uma única exigência: a de ser fotografada de forma que seus traços não pudessem ser identificados. As integrantes da Rawa costumam ser atacadas por grupos fundamentalistas no Paquistão e evitam revelar suas identidades.

Zero Hora – Qual é o significado da queda do Talibã para o povo afegão?
Mariam Rawi – A queda do Talibã foi uma mudança positiva, mas não a grande mudança. Os grupos fundamentalistas e os líderes criminosos estão outra vez no poder. Alguns podem ser da nova geração, mas a maior parte é da velha geração. Eles mataram milhares de pessoas, destruíram 90% de Cabul e demoliram museus e escolas. Estupros, assassinatos, seqüestros, invasões de casas e destruição aconteceram antes do Talibã, sob o Talibã e continuam acontecendo. O período de 1992 a 1996, antes do Talibã, quando a Aliança do Norte estava no poder, foi um dos mais obscurantistas de nossa História. Infelizmente, a comunidade internacional e a mídia ocidental esqueceram esses quatro anos.

ZH – Qual é a situação atual do Afeganistão?
Rawi – O Afeganistão está outra vez dividido, e há luta entre facções fundamentalistas, apoiadas por países como Paquistão, França e Estados Unidos. Todos estão interessados na região. As Nações Unidas informaram que não podemos desenvolver programas no Afeganistão por razões de segurança. De acordo com fontes da Agence France Presse (AFP), as pessoas têm uma lembrança positiva do Talibã, porque pelo menos tinham segurança pessoal. Hoje, muitos dormem com armas sob as camas, por medo.

ZH – Após a queda do Talibã, o mundo viu imagens de afegãs tirando burkas e voltando à escola. Não é uma mudança significativa?
Rawi – Estamos presentes no Afeganistão e vemos que as mulheres não estão prontas para tirar as burkas. Se poucas mulheres fazem isso, não é importante. A maioria está com medo de grupos militares, em razão dos freqüentes estupros, seqüestros e casamentos forçados. Elas se sentem inseguras. Não querem deixar suas casas para ir à escola. Não é tão importante se as mulheres vestem burka ou não. O problema das mulheres do Afeganistão não é vestir burka. O problema é a condição social sob o poder dos fundamentalistas. Com burka ou sem burka, as mulheres estão privadas de direitos.

ZH – Que mudanças ainda precisam ocorrer no Afeganistão?
Rawi – Lutamos contra o fu ndamentalismo. Esse é o grande inimigo de nossos homens e, especialmente, de nossas mulheres. Lutamos por um governo democrático. A democracia é a única forma de salvar a vida do povo e assegurar direitos às mulheres. Lutamos também por educação e por assistência à saúde da mulher.

ZH – Quais são os objetivos da Rawa?
Rawi – Fomos o primeiro grupo político independente a lutar pelos direitos das mulheres. Com a invasão soviética, mudamos nosso objetivo, porque acreditávamos que, sem independência, não teríamos democracia nem mudanças. Começamos a lutar contra os soviéticos e continuamos a lutar contra o fundamentalismo. Promovemos manifestações, encontros, edição de publicações e de um site na Internet. Temos programas sociais para mulheres, organizamos aulas e cursos.


“Há um silêncio total do governo sobre os índigenas no Brasil”
Entrevista: Rigoberta Menchú, Prêmio Nobel da Paz de 1992

– Há um silêncio total sobre os indígenas no Brasil.

A denúncia é da guatemalteca Rigoberta Menchú Tum, Prêmio Nobel da Paz em 1992 por sua luta pelos direitos indígenas na América Central. Ativista dos direitos humanos, Rigoberta, 42 anos, teve a mãe, o pai e um irmão mortos na luta contra o poder militar na Guatemala, em 40 anos de guerra civil.

Em 1998, um escândalo afetou sua imagem e levou críticos a contestarem o prêmio. Foram imputados ao livro Eu, Rigoberta Menchú, de 1983, mentiras e exageros sobre a tragédia que abalou sua família. A líder indígena, porém, reafirma a autenticidade de suas memórias.
Convidada de honra do Fórum, ela chegou a Porto Alegre no sábado para participar da conferência Um Plano de Paz para a Colômbia, ontem, na PUCRS. Pela manhã, concedeu a seguinte entrevista a Zero Hora:

Zero Hora – Como os indígenas podem se integrar ao processo de globalização?
Rigoberta Menchú – Integrar-se a um processo de globalização é um conceito que tem sido ditado pelos bancos, especialmente o Banco Mundial (Bird). Eles pensam que não há outro caminho. É uma visão muito arrogante. Temos lutado nos últimos 20 anos nas Nações Unidas para propor um projeto de declaração universal sobre os direitos indígenas. É preciso instrumentos, órgãos adequados que compreendam o direito de livre determinação dos povos, como é o caso dos indígenas.

ZH – O que a senhora sabe sobre a luta dos indígenas no sul do Brasil?
Rigoberta – Abordamos o Brasil como um continente a mais, apesar deste grande país fazer parte da América Latina. A referência de luta que temos é, em primeiro lugar, o trabalho do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do PT e de Lula. Isso é Brasil para nós. Neste país, no entanto, não se conseguiu projetar a luta dos povos indígenas.

ZH – Em 1994, quando esteve no Brasil, a senhora fez críticas contundentes às políticas do presidente Fernando Henrique Cardoso a respeito dos sem-terra. Alguma coisa mudou desde então?
Rigoberta – Falar dos sem-terra no Brasil é falar de uma altíssima porcentagem da população que sofre de extrema pobreza e fome. A luta dos sem-terra é algo que descreve bem o Brasil. Em nossas escritórios temos recebido muitas denúncias.

ZH – Que tipo de denúncias provenientes do Brasil chegam a seu escritório?
Rigoberta – Muito abandono, pobreza e miséria. Há um silêncio total do governo sobre os indígenas no Brasil e esse é um método de genocídio. O governo não quer que os dirigentes indígenas participem de nenhum fórum internacional. É o país que mais tem freado o reconhecimento dos direitos indígenas na comunidade internacional.

ZH – Como a senhora enfrentou a contestação de alguns críticos ao seu prêmio?
Rigoberta – O Prêmio Nobel é uma medalha e um diploma. Recebi 23 diplomas nestes 15 anos. Se pudesse vender meu diploma para construir uma escola, seria muito mais útil. Temos 10 anos de Prêmio Nobel. Neste período, lutamos muito. Tenho autoridade moral para criticar e opinar, porque não devo nada a ninguém.

ZH – Quem estava por trás das críticas a seu livro?
Rigoberta – Sempre tive consciência de que a CIA (a agência de inteligência americana) estava por trás. Havíamos começado a trazer a público os resultados do genocídio na Guatemala. O relatório da Igreja Católica reconhecia a existência de cerca de 200 mil vítimas na Guatemala. Havíamos contabilizado cerca de 50 mil desaparecidos no país. Na ocasião, também estava para ser publicado o relatório da ONU, que contabiliza 646 massacres em comunidades indígenas e 440 aldeias destruídas. Estávamos a ponto de publicar o informe. Eles pensavam que era importante desfigurar minha imagem. Eles falharam. Não precisam acreditar em mim, mas nos relatórios da ONU.


Palestra de Lula vira comício
Conferência da tarde de sábado foi disputada por centenas de participantes

A conferência do candidato a presidente da República do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, no Fórum Social Mundial, transformou-se na tarde de sábado num comício de campanha eleitoral e disputou com a de Noam Chomsky o primeiro lugar em afluência de público.

A cada frase, Lula explicitava ponto a ponto o que deverá constar de seu programa de governo, da segurança pública à defesa dos direitos dos homossexuais. Da platéia vinham gritos, aplausos e até sons de corneta.

Sob o título Um Outro Brasil É Possível, a fala de quase uma hora de Lula enumerou cada uma das propostas do PT para solucionar os principais problemas do país. Faltaram cadeiras e espaço nos corredores do salão 3 do Centro de Eventos da PUC – o maior do prédio 40. Houve empurra-empurra para conseguir vaga na sala, mas para muitos a solução foi assistir à fala de Lula pelo telão.

No início e no final da conferência, o petista foi saudado pelo público que subiu nas cadeiras e gritou “Brasil, urgente, Lula Presidente”, “Olê, olê, olê, olá, Lulá Lulá” e com o jingle da campanha de 1989, “Sem Medo de ser Feliz”. Ao lado de Maria da Conceição Tavares, do jornalista Mino Carta e do governador Olívio Dutra, Lula fez um pronunciamento no mesmo estilo dos que costuma fazer Brasil afora.

Quem acompanhou toda a visita de Lula a Porto Alegre constatou uma mudança no seu comportamento. No início, um certo constrangimento quando era chamado de candidato, já que disputará a prévia com Eduardo Suplicy em 17 de março. No final, Lula mostrava-se à vontade no papel de candidato à Presidência.

Lula foi um dos participantes mais destacados do Fórum, ocupando o lugar assumido no ano passado pelo camponês francês José Bové. Veio na condição de convidado e cumpriu uma agenda pesada: reuniu-se com magistrados, com a juventude no Acampamento Intercontinental e com a missão de autoridades francesas, assistiu conferências e concedeu duas entrevistas coletivas, até fechar o roteiro com sua própria participação prevista no programa do evento. Ontem à noite, voltou para São Paulo .

– Acredito que os organizadores do Fórum estão dando uma lição de democracia para o mundo. Em Nova York, os ricos estão cercados de policiais com medo que os pobres façam manifestações. Aqui, há um debate sem vetos de cor, sexo ou ideologia – afirmou, omitindo a proibição às participações do vice-presidente do Banco Mundial (Bird), Mats Karlsson, do candidato a governador do PDT, José Fortunati, e de outros interessados.

Na noite de sábado, os restaurantes do Mercado Público da Capital abriram suas portas aos simpatizantes do PT dispostos a contribuir para a compra da nova sede estadual do partido. As 1,7 mil pessoas que pagaram ingresso para jantar apreciaram, além da comida, um show de escola de samba e discursos de Lula e de outras estrelas do PT. A quantia arrecadada será anunciada hoje.


Intercâmbio com franceses
Em uma reuniã o, sábado, na Cachaçaria Água Doce, em Porto Alegre, foi firmado um acordo de cooperação entre o PT e o Partido Socialista Francês. As direções dos dois partidos acertaram que o PS dará total apoio à possível candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República e o PP se dedicará a defender o primeiro-ministro Lionel Jospin na disputa, que terá o primeiro turno em 21 de abril. Em abril, Lula irá à França para se encontrar com Jospin.

Participaram do encontro os ministros da França Christian Paul (secretário de Estado do Ultramar), Jean-Luc Melénchon (Ensino Profissional), o secretário-geral do PS, Françoise Hollande, além de parlamentares franceses. Pelo PT estavam a prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, o presidente nacional José Dirceu, Lula, o assessor de Relações Internacionais da prefeitura de São Paulo, Luís Favre, o secretário da Cultura de São Paulo, Marco Aurélio Garcia, o secretário para Questões Internacionais da prefeitura, Jorge Mattoso, e o governador Olívio Dutra.


Juízes preparam fórum do ano que vem
Documento final do evento defende a independência dos magistrados

Pelo menos duas entidades internacionais, o Movimento Europeu dos Juízes Democráticos e o Sindicato da Magistratura da França, devem se integrar à comissão organizadora do próximo Fórum Mundial de Juízes.

O evento será realizado em 2003, dias antes do início do 3º Fórum Social Mundial.

Para o juiz gaúcho Umberto Sudbrack, da Associação Juízes pela Democracia, uma das seis organizações brasileiras da categoria que promoveram o fórum deste ano, a adesão dessas entidades comprova o sucesso da primeira edição do evento. Encerrado no sábado, o encontro reuniu 350 juízes de 12 países para discutir a democratização do acesso à Justiça. Foi aprovada a criação de um portal na Internet para divulgar os trabalhos do encontro, que passou a ser um fórum permanente de discussões.

No documento final do fórum, que convoca para a próxima edição do evento, os participantes aprovaram o texto: “Só juízes e cortes independentes, cônscios de sua função na sociedade e integrantes de um Poder Judiciário democrático, podem exercer uma jurisdição orientada a deter o avanço do poder político e econômico sobre as liberdades públicas e os direitos individuais, coletivos e sociais, evitando a multiplicação das desigualdades”.


Assalto frustrado causa apreensão
Diante da ação de quadrilha, debates da manhã de ontem ficaram em segundo plano

Uma tentativa de assalto, com tiroteio e morte de um assaltante, no Centro de Eventos da PUCRS, causou apreensão entre os participantes do Fórum Social Mundial e virou notícia internacional.
ÀS 7h10min de ontem, uma hora antes do início da primeira conferência, quatro homens armados com uma metralhadora e uma pistola tentaram assaltar um carro-forte que reabastecia caixas eletrônicos do Banrisul no prédio onde se realiza o Fórum.

Os ladrões estavam no prédio 40, na área dos caixas eletrônicos, e teriam atirado quando os seguranças desceram do veículo. Os guardas revidaram e atingiram um dos assaltantes, que morreu a caminho do hospital.

Segundo o comandante do Destacamento Especial do Partenon, tenente-coronel Nelsohoner Sebajes da Rocha, o assalto não teve relação com o Fórum Social Mundial. O assalto frustrado assustou participantes vindos de países latino-americanos e europeus e chamou a atenção dos jornalistas brasileiros e estrangeiros. As principais agências internacionais distribuíram informações sobre o caso e os jornais reproduziram a notícia em seus sites na Internet.

A área onde ocorreu o assalto foi isolada pelos policiais. Jornalistas de outros estados brasileiros e estrangeiros concentraram-se em frente às escadarias que levam ao saguão onde ficam os caixas automáticos, à espera de informações.

De acordo com o comandante, o carro-forte da Prossegur chegou à PUCRS às 7h05min para abastecer os caixas eletrônicos do prédio 40. A área dos caixas fica na lateral do prédio, perto da entrada do estacionamento do campus. Segundo a Brigada Militar (BM), os ladrões esperavam do lado de dentro pela chegada do veículo.

Na universidade, estavam os vigilantes contratados para a segurança do evento e, nas ruas ao redor do campus, os policiais militares do Destacamento Especial do Partenon deslocados para o policiamento na região.

Quatro seguranças teriam saído do carro-forte para inspecionar a área. Logo que desembarcaram, foram recebidos a tiros. Os guardas e o motorista, armado com uma espingarda calibre 12, dispararam. A chegada de vigilantes e PMs, atraídos pelo barulho dos tiros, forçou os ladrões a saírem do prédio. Um dos assaltantes foi ferido. O tiroteio durou de um a dois minutos.

Segundo a BM, mais de 20 tiros teriam sido disparados, deixando marcas nos vidros do saguão onde ficam os caixas eletrônicos, nas paredes do prédio 40 e do estacionamento, e no carro-forte.
Ao deixar o prédio, sem levar nada, os ladrões tomaram um dos vigilantes da PUCRS como refém. Mesmo com um deles ferido, os quatro conseguiram passar pelo carro-forte e chegar ao estacionamento, onde um Fiat Marea fora deixado preparado para a fuga. O guarda foi libertado pouco depois, na saída da universidade.

Já em outro carro, os assaltantes foram para o Hospital Conceição em busca de atendimento para o ferido. O médico plantonista constatou que o jovem baleado – um rapaz branco ainda não-identificado – estava morto e ofereceu uma ambulância para levá-lo ao Cristo Redentor, que tem plantão judiciário. Os outros disseram que levariam o rapaz no próprio carro, mas abandonaram o corpo em um lixão na Zona Norte da cidade. Os três não foram localizados. O Marea usado na fuga foi deixado na Rua dos Cubanos, próxima ao campus.


ETA consegue fazer inscrição
Pelo menos uma entidade e um partido político relacionados ao grupo separatista basco ETA (Pátria Basca e Liberdade) participam ativamente do 2º Fórum Social Mundial.

Além de entregar panfletos com pedindo a independência do território basco, participaram de conferências – inclusive as do Fórum Parlamentar Mundial – e de um seminário no sábado.
No Fórum, há representantes do sindicato Langile Abertzallen Batzordeak (LAB), que realizou uma oficina na sexta-feira e participou do seminário de autodeterminação dos povos, sábado, dois parlamentares do partido Harri Batasuna, braço político do grupo separatista, além de bascos que integram a Via Campesina.

Luis Cuadrado Torres foi inscrito como delegado representante do Batasuna, e Joseba Alvarez, parlamentar de Victoria, conseguiu se cadastrar como parlamentar. Eduardo Lertxundi, integrante do LAB, também se cadastrou pela Internet sem enfrentar problemas.

O sindicalista, que está hospedado em um hotel no centro da Capital, contou que, no ano passado participou do encontro. Destacou que a experiência de gestão pública com a participação popular por meio do Orçamento Participativo (OP) desperta seu interesse.

Baseando-se na Carta de Princípios do Fórum, que não aceita entidades tenha como princípio a luta armada, Cândido Grzybowski, membro do comitê organizador, diz que a participação dos partidos e do sindicato são consideradas ilegítimas.


Roriz pede desculpas
Governador acha que foi mal-interpretado

O governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PMDB), publicou nota nos jornais de Brasília pedindo desculpas a quem possa se considerar atingido com a expressão “crioulo petista”, usada por ele durante um discurso.

Na noite de quinta-feira, em Brazlândia, cidade satélite de Brasília, Roriz pediu ao povo “uma salva de vaias para um crioulo petista” que protestava na multidão contra a cobrança de IPTU numa área sem saneamento e sem asfalto. Ele se referia a Marinaldo Nascimento, de 53 anos.

Na nota publicada ontem, o governador diz que a não teve intenção de ofender Marinaldo, seu eleitor, e que pode ter sido mal-interpretado porque tem o hábito de utilizar uma linguagem mais simples e direta, como os pobres.

O PT de Brasília pretende pedir hoje ao Ministério da Justiça que o governador seja interpelado na Comissão Nacional de Direitos Humanos. O PT também apresentou uma representação contra Roriz no Ministério Público.

O partido pede que o governador responda por crime de racismo e por incitação à violência. O PT ainda apresentou representação no Tribunal Superior Eleitoral contra Roriz por improbidade administrativa. Segundo o partido, o governador está utilizando-se da máquina pública para fazer campanha eleitoral.


Identificados dois novos suspeitos de assassinato
Polícia investiga morte de prefeito

O Departamento de Investigação sobre o Crime Organizado (Deic) identificou no sábado mais dois ladrões que estariam envolvidos no seqüestro e na morte do prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT).

Eles são ligados a cinco homens já detidos e recolhidos à disposição do Deic por determinação da Justiça. ]

Os dois identificados teriam participação direta no assassinato do prefeito. Os policiais do Deic se recusam a falar sobre a evolução das investigações. Com base nas informações dos detidos, tentam encontrar as armas que teriam sido usadas na abordagem à Pajero onde viajavam o prefeito e seu amigo, o empresário Sérgio Gomes da Silva.

As fotos desses dois novos identificados deverão ser mostradas a Silva possivelmente hoje. Na manhã de sábado, o empresário esteve no Deic para fazer o reconhecimento dos outros detidos, mas não identificou nenhum como sendo o que seqüestrou o prefeito.

Nesta segunda-feira, o Instituto de Criminalística deverá concluir o laudo de comparação da terra encontrada na sola do sapato do prefeito assassinado para saber se é a mesma terra do cativeiro da Favela Pantanal, descoberto na última quarta-feira. Na ocasião, policiais do Deic encontraram no salão da Rua Guaicuri (no interior da favela), onde funcionara um bar, um comprovante de recibo de pagamento da Sul América Saúde em nome do prefeito Celso Augusto Daniel.


Garotinho convida Alencar para vice
Governador propôs alianças

O governador do Rio, Anthony Garotinho (PSB), convidou no sábado o senador José Alencar (PL-MG) para ser seu vice na chapa à Presidência.

O convite foi feito na convenção do PL em Uberlândia, Minas Gerais. Além de fazer o convite, Garotinho propôs a união dos dois partidos também nas eleições para outros cargos executivos e para o Legislativo neste ano.

Alencar não disse se aceitará o convite, mas ressaltou que se sentia honrado por ter sido lembrado. A resposta do senador só deve vir depois do Carnaval e depende de composições estaduais entre PSB e PL. No Rio, por exemplo, o PL apoiaria o candidato do PSB ao governo estadual em troca do lançamento do bispo Marcelo Crivela para o Senado.

– O ideal seria uma coalizão dos partidos de oposição para garantir uma vitória no primeiro turno – disse Alencar, durante a semana.]

Alencar é um nome disputado pela oposição. O PT também não esconde o desejo de tê-lo como vice. O PT busca entendimento com o PL e o pré-candidato Luiz Inácio Lula da Silva já falou de sua simpatia por Alencar. Mas o deputado José Genoino (PT) disse que a decisão sobre o vice será tomada com calma.


Ciro Gomes acusa PT e Lula se irrita
De passagem por Porto Alegre para participar do Fórum Social Mundial, o candidato a presidente da República pelo PPS, Ciro Gomes, acusou o governo federal e os partidos de oposição – numa clara insinuação ao PT – de utilizar de forma oportunista o assassinato de prefeitos e o próprio Fórum para ganhar espaço.

A acusação deixou seu principal adversário irritado. Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que Ciro deveria se informar melhor antes de sair dizendo bobagens sobre o Fórum Social e principalmente sobre o PT.

– É preciso morrer um homem de notoriedade para que as pessoas da política que mandam projetem uma aparente e falsa preocupação com aquilo que é, na vida diária de nosso povo, um drama premente – criticou Ciro.

– Nosso plano de governo para a segurança pública vinha sendo construído há 14 meses. Celso Daniel foi assassinado há pouco mais de duas semanas e se alguém conseguir fazer um programa para segurança nesse período ganhará um prêmio – revidou Lula.

Ciro disse que a taxa de homicídios em São Paulo chega a mais de 80 por cada 100 mil habitantes, uma das mais altas do mundo, e que nos morros do Rio a expectativa de vida dos jovens é de 23 anos.

Sobre eleições, Ciro disse estar cumprindo uma estratégia de campanha e chamou de “versão” os resultados das últimas pesquisas, que colocam na sua frente, além de Lula, o governador do Rio, Anthony Garotinho (PSB), e a governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL).

Para o candidato do PPS, a pré-campanha eleitoral “tem muito pseudofato e muita fumaça”. Ciro acredita que os programas de TV têm sido responsáveis pela subida de alguns nas pesquisas, mas afirma ter certeza de que a situação de hoje mudará mais tarde.

Perguntado sobre a dificuldade que teria nos programas de TV em razão do pouco tempo do PPS, caso não feche aliança com partidos maiores, desconversou:
– Eu pretendo governar o Brasil e diante disso essa questão da televisão some das minhas preocupações.

O plano de Ciro para motivar sua campanha eleitoral é conquistar apoios significativos dentro do Congresso e ampliar sua base de votos entre a população. Afirma que seu objetivo é formar uma aliança de centro-esquerda que se materializaria com uma aproximação com o PTB e com o PDT.
Sobre o PDT, Ciro garante que nunca interrompeu a relação com o partido, posição que entre os pedetistas não confere, já que um rompimento por carta foi oficializado no ano passado pelo presidente nacional do PDT, Leonel Brizola. Para Ciro, há apenas alguns momentos em que a falta de sintonia toma mais relevo.


Serra desdenha pesquisas durante congresso em Imbé
Candidatura própria para disputa no Estado ganha força

Os tucanos que lotaram a sala de convenções do Hotel Três Figueiras, em Imbé, no congresso estadual do PSDB, ouviram o ministro da Saúde, José Serra, falar pela primeira vez no Estado como candidato à Presidência da República.

Serra desdenhou as pesquisas eleitorais, que colocam à sua frente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Roseana Sarney (PFL), Anthony Garotinho (PDT) e Ciro Gomes (PPS).

– Faltam oito meses para a eleição. Nesse prazo, pesquisa só se presta a avaliar desempenho de sabonetes – ironizou.

No discurso, o ministro chamou a atenção para possíveis enganos com candidatos que “não são o que são pelo que dizem, mas pelo que fazem”. Questionado sobre se a frase era uma alusão a Roseana Sarney, Serra disse que não comentaria “tititi”. Serra tampouco fez menção ao nome para compor a chapa governista como candidato a vice.

– Não estamos dando volta em nomes, mas sim na questão das alianças. Governar é viável apenas com a maioria – afirmou.

Serra não quis comentar a inclinação do governador do Ceará, Tasso Jereissati (PSDB), em apoiar a candidatura de Roseana ao Palácio do Planalto. O ministro alegou desconhecer a declaração de Jereissati, feita um dia antes, em Nova York. O candidato só deixou de lado o cenho franzido para responder, com ironia, ao secretário do Tesouro Americano, Paul O’Neill. No Fórum Econômico Mundial, O’Neill atribuiu as altas taxas de juros no Brasil à corrupç ão.

– Fosse por isso, os Estados Unidos precisarão aumentar suas taxas por conta do escândalo da Enron, que jogou lama sobre o Congresso Americano, a Casa Branca e a Bolsa de Nova York – opinou.

Sob intenso foguetório, Serra chegou de helicóptero às 13h24min acompanhado dos presidentes do PSDB nacional, José Aníbal, e gaúcho, Nelson Marchezan. Os tucanos gaúchos que o receberam solidificaram a tese da candidatura própria ao governo do Estado, mas não evoluíram na escolha do nome.

Faixas no hotel evidenciaram a existência de dois grupos, um em apoio à deputada federal Yeda Crusius e outro ao ex-vice-governador Vicente Bogo. Yeda diz que não deseja concorrer ao Piratini, mas Bogo já manifestou o desejo de concorrer. No congresso, Marchezan, João Gilberto Lucas Coelho e os deputados estaduais Adilson Troca e Jorge Gobbi foram nomeados delegados à convenção nacional, marcada para 24 de fevereiro.


Prévia abre crise no PMDB
A um mês e meio das prévias para escolher o candidato à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso – marcadas para o dia 17 de março–, o PMDB entra em sua maior crise.

Ontem, o presidente nacional da sigla, deputado Michel Temer (SP), admitiu que seu partido passa por uma situação muito delicada e não tem um candidato forte para disputar a sucessão de FH. Defensor da manutenção da aliança governista, o governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, disse que seu partido se meteu em uma “grande enrascada”.

Temer lembrou que o governador de Minas Gerais, Itamar Franco, o mais cotado, caiu de 9,8% para 3,8% nas pesquisas de intenção de voto. E os outros dois – o senador Pedro Simon e o ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann – nem aparecem nas pesquisas. Com base nesses dados, a executiva nacional planejava fazer uma reunião, na terça-feira, em Brasília, para discutir as prévias. Entretanto, o encontro foi cancelado por Temer em razão da proximidade do Carnaval.

A intenção do grupo de Temer é deixar o PMDB preparado para negociar a composição de uma chapa com o PSDB do ministro da Saúde, José Serra, ou com o PFL da governadora do Maranhão, Roseana Sarney. Pelos levantamentos, Roseana aparece com cerca 21% das intenções de voto. Serra tem pouco mais de 7%. Para Vasconcelos, o primeiro erro foi o de se decidir pela realização de prévias.

Ao tomar conhecimento da iniciativa de Temer, a ala contrária ao governo e a uma aliança com Serra começou a coletar assinaturas para realizar uma convenção extraordinária no dia 3 de março.

– A intenção é tirar da executiva nacional o controle do programa gratuito no rádio e na TV, além de estabelecer regras claras para as prévias – disse o senador Roberto Requião (PR).

Temer disse que nem se o grupo de Requião conseguir um terço das assinaturas dos integrantes do diretório nacional para convocar a convenção do dia 3 de março, a convocação será automática. O pedido terá de ser encaminhado a ele.

Convicto de que sem aliança a base governista não ganha a eleição, Vasconcelos ainda acredita no diálogo para reverter a situação. Nesse contexto, não aceita falar sobre a proposta do PSDB de fazê-lo candidato a vice numa chapa liderada por Serra.

– Isso em nada ajuda, nesse momento, no plano nacional – avaliou, dizendo que vai a Brasília no dia 19 para discutir a sucessão.


PPS e PDT caminham para acordo
Ao sair do encontro com o presidente nacional do PDT, Leonel Brizola, ontem à noite no Rio de Janeiro, o candidato do PPS à Presidência Ciro Gomes disse estar bastante animado com as possibilidades de uma aliança.

Apesar disso, Ciro admite que muitas etapas ainda têm de ser cumpridas.

Além de Ciro e Brizola participaram do encontro os presidentes do PPS, senador Roberto Freire (PE), do PTB, deputado José Carlos Martinez (PR), e o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ).

Na sexta-feira, Brizola elogiou Ciro numa entrevista à Rádio Gaúcha, dizendo que ele é o candidato mais bem preparado para administrar o país e enfrentar seus problemas. Na mesma entrevista, Brizola disse que seu partido estava buscando “uma aliança trabalhista” com o PPS e o PTB.

No mesmo dia, já no Rio, ele disse que não havia previsão de quando esse acordo nacional seria feito, porque embora as conversas estivessem adiantadas, dependia ainda de composições regionais:
– Estamos pensando que a aliança tem que guardar coerência em todos os Estados.

Ontem, Ciro foi enfático ao afirmar que a aliança teria que ser alinhava também nos Estados com um candidato único. Um dos principais obstáculos, até então, para o acordo entre Ciro e Brizola era a possível candidatura do ex-governador Antônio Britto, desafeto do trabalhista, ao Piratini
O apoio do PDT de Brizola é bom para a candidatura de Ciro, que vem caindo nas pesquisas de intenção de voto.

O acordo interessa também ao PDT, que está rompido com o PT e afastado do PSB por causa da candidatura de Garotinho.


Prefeito é internado com problemas respiratórios
Célio de Castro sofreu derrame no final do ano passado

Vinte e dois dias depois de receber alta, o prefeito de Belo Horizonte, Célio de Castro (PT), voltou para o hospital. Com problemas respiratórios, o prefeito foi internado ontem no hospital Mater Dei.

Segundo os médicos que o atenderam, exames constataram que o prefeito desenvolveu coágulos no pulmão. Para combater o problema, foi iniciado um tratamento baseado em anticoagulantes. Os médicos avaliam que o estado de saúde do prefeito é estável do ponto de vista clínico. No ano passado, Célio teve três complicações médicas que o levaram a ficar afastado da prefeitura por cerca de 60 dias.

Em fevereiro de 2001, sofreu uma pancreatite, causada por uso de medicamento para combater uma inflamação no joelho. Em abril, o prefeito teve pneumonia, o que o deixou internado por duas semanas. O problema mais grave ocorreu em novembro: o prefeito mineiro sofreu uma isquemia cerebral temporária (interrupção do fluxo sangüíneo), que evoluiu para um derrame.

Na ocasião, Célio precisou ser submetido a neurocirurgia para a retirada de um coágulo no cérebro e passou seis dias em coma induzido. O prefeito só saiu do hospital em 12 de janeiro.


Mulher de Garotinho sofre acidente
Rosinha Matheus ia para Angra dos Reis

Os exames de tomografia realizados na primeira-dama do Rio, Rosinha Matheus, não constataram nenhuma lesão.

Rosinha sofreu um acidente de carro na tarde de sábado na rodovia Rio-Santos, quando ia para Angra dos Reis.

O carro em que a primeira-dama viajava foi atingido por trás por um veículo da própria segurança do governo do Estado. Após a batida, Rosinha se queixou de dores nas costas e na cabeça e foi encaminhada ao hospital Costa Verde, em Angra dos Reis. A primeira-dama viajava acompanhada por sua filha mais velha, Clarissa, e mais três pessoas. A viagem não era de caráter oficial.

O governador Anthony Garotinho, que estava em Minas Gerais articulando sua candidatura à Presidência da República, cancelou sua agenda e voltou para o Rio.


Artigos

Contraste mundial
Paulo Brossard

Segundo a versão oficial, as coisas no Brasil vão muito bem e o caos argentino serviria para sobrevalorizá-las. Já notei que o desastre lá ocorrido não aconteceu do dia para a noite e nem por acaso e é isto que me preocupa. O nosso descuido quanto ao futuro continua sendo uma característica nacional. E eu não posso deixar de inquietar-me com o que se passa por aqui e o que pode suceder amanhã.

Dou um exemplo, que não é meu, mas que me foi transmitido por um observador. O fato é simples, mas de alta significação. Pode ser assim resumido: u ma pessoa que, quando da implantação do real, houvesse depositado R$ 100 em caderneta de poupança, teria hoje R$ 374 e com eles poderia adquirir quatro pneus de automóvel; se no mesmo dia 1º de julho de 1994 alguém houvesse sacado R$ 100 no cheque especial, teria hoje uma dívida de R$ 139.259, o que corresponderia ao preço de nove carros populares. Não posso jurar pela exatidão matemática dos valores indicados numa e noutra hipótese, mas não tenho por que deles duvidar, tendo em vista a notória modéstia da remuneração da poupança e os juros aqui escandalosos cobrados no cheque especial, mais de 250% ao ano. Sem gastar muitas palavras, pode-se dizer que a comparação é altamente ilustrativa e serve para mostrar, didaticamente, como é ilusória a nossa propalada saúde econômica.

O progresso de um país tem suas raízes
na poupança interna

O progresso de um país tem suas raízes na poupança interna. Desgraçado do que depende da poupança externa, que chega sob a forma de empréstimo, para progredir. É claro que um empréstimo, externo ou interno, conforme, as circunstâncias e condições, pode ser vantajoso, senão necessário; mas o desenvolvimento de um país não pode ficar na dependência exclusiva deles. O saudoso Barbosa Lima Sobrinho escreveu um livro intitulado O Capital se Faz em Casa e o título diz tudo a respeito.

Ora, a poupança tem três inimigos no Brasil: a remuneração baixa da grande maioria da população, em virtude do que pouco sobra para poupar, o consumismo desenfreado que prospera sob os estímulos de uma propaganda desvairada a ponto de converter o Natal em insigne acontecimento mercantil e, por fim, a política que, por motivos conhecidos, limitou a remuneração da poupança a nível mais ou menos simbólico, se comparada com a da atividade financeira.

Quando se trata do juro oficialmente mantido aqui, que se não é o mais alto do mundo, como chegou a ser, ainda é dos mais elevados, o governo não se peja em dizer que nada pode fazer, embora por duas vezes tenha elevado a taxa em 100% da noite para o dia, pois tudo depende do mercado, ou da “gasolina”, para repetir o que, na Rússia, em sua última viagem ao Exterior, não hesitou em afirmar o chefe do governo, num ultraje à inteligência do povo. Vale insistir, quando se trata da poupança popular o governo pode interferir e interfere com mão de ferro, mas em se tratando da alta finança ele procede como donzela pudica e se recolhe aos penates. É espantoso.

A pergunta que me faço é se essa política macabra, que oprime a poupança popular e engorda a usura triunfante, pode levar o país a bom porto ou se se está fabricando formidável bomba de efeitos catastróficos, capaz de comprometer a nossa estabilidade econômica e social. Volto a dizer, o que aconteceu no país vizinho não ocorreu por acaso, nem de repente. Que nos sirva de advertência.

Se não estou em erro, enquanto os Estados Unidos reduziram a taxa de juros, mês a mês, até chegar a 1,75% ao ano, nós mantivemos, mês a mês, a nossa em 19% sob os pretextos mais grosseiramente ridículos e quem o fez foi o governo, por intermédio do Copom; não foi o mercado e muito menos a gasolina. Foi o governo e só o governo. Por que e para quê? Para que continuem a vir recursos externos a fim de que possa rolar a espantosa e criminosa dívida pública que chegou, não a R$ 624 bilhões como foi divulgado, mas a R$ 660 bilhões no fim do ano de 2001. R$ 660 bilhões! Só no ano passado, 2001, ela cresceu R$ 97 bilhões. Quando o atual presidente assumiu, a dívida não chegava a R$ 70 bilhões. Agora, em um ano, aumenta mais de R$ 97 bilhões. E a carga tributária continua uma das mais altas do mundo, os juros astronômicos, a arrecadação superando todas as previsões. E o país quanto pagou só de juros, no ano findo? R$ 86 bilhões? Eis por que tenho e não posso deixar de ter preocupações, embora não ignore que é tempo de Carnaval...


Colunistas

ANA AMÉLIA LEMOS

Buscando alianças
As principais lideranças políticas e os candidatos à sucessão presidencial trabalham intensamente para definir, até maio, alianças que possam melhorar as condições eleitorais da disputa. O PSDB quer fechar acordo com o PMDB. O candidato do partido, ministro José Serra, já disse que gostaria de ter o governador Jarbas Vasconcellos, de Pernambuco, como candidato a vice, na sua chapa. O PFL, que se sentiu marginalizado pelo candidato tucano, também oferece a vice-presidência ao PMDB. Especulou-se que o candidato do PPB, Pratini de Moraes, poderia ser o vice na chapa encabeçada pelo PFL. Roseana Sarney, bem colocada nas pesquisas, se vale dessa situação confortável para ampliar o leque de entendimentos. O presidente do PFL, Jorge Bornhausen, esteve com o ex-governador Leonel Brizola. Este, no entanto, prefere a construção de uma aliança trabalhista-nacionalista, que seria integrada por PPS, PTB e PDT. O ex-governador já mostrou clara simpatia e apoio à candidatura Ciro Gomes.

O fato novo na sucessão é a posição do governador Anthony Garotinho, do PSB, que está, segundo a última pesquisa Ibope, tecnicamente empatado com Roseana Sarney, embora a da governadora do Maranhão, na simulação para o segundo turno, seja a única candidatura que bateria Lula, o nome do PT, maior partido de oposição. O governador do Rio de Janeiro admitiu, esta semana, em entrevista à Rádio Gaúcha, que está em entendimentos com o PL. As alianças são importantes na definição do tempo de televisão, no horário gratuito. O palanque eletrônico é decisivo na eleição. Se essas projeções se confirmarem, restará ao PT alianças mais à esquerda, com PC do B, PV e PSTU. As esquerdas continuarão divididas.

Neste momento, a prioridade dos candidatos é, via alianças, aumentar o tempo, na televisão. Secundariamente, garantir maioria no Congresso para a governabilidade. O governador do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho, acha que é possível vencer a eleição, sem aliança. Para governar, a conversa é outra. Começará logo após a apuração das urnas, no segundo turno.


JOSÉ BARRIONUEVO

Tarso registra candidatura amanhã
Prefeito da Capital avisa que não está blefando quanto à candidatura ao Piratini

O prefeito Tarso Genro confirmou ontem ao presidente nacional do PT, José Dirceu, que registrará sua pré-candidatura, determinado a enfrentar Olívio Dutra na prévia marcada para o dia 17 de março. Diante dos boatos que circularam durante o Fórum Mundial de que retiraria a candidatura, Tarso foi enfático:
- Se eles (o grupo que apóia o governador) imaginam que estou blefando, estão muito enganados comentou durante almoço em sua residência ao qual compareceram, além de José Dirceu, a prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, Luiz Dulci (secretário-geral nacional) e os principais dirigentes do PT Amplo, entre eles Estilac Xavier, Adão Villaverde e Paulo Ferreira.

Em campanha
Ontem à noite, todos os grupos que apóiam a candidatura se reuniram na residência de Tarso quando foi assegurada, formalmente, a sua participação na prévia. Está sendo convocada uma plenária estadual para amanhã com a participação do PT Amplo, Rede, MCS de Maria do Rosário, MES de Luciana Genro, Força Socialista, Tendência Humanista de Marcos Rolim e de parte da Articulação de Esquerda. Ao final do encontro, será registrada a candidatura, antecipando-se ao prazo final marcado para o dia 15. A partir de hoje, começa a ser montada uma estratégia no Interior para buscar o apoio das bases para uma prévia que deverá contar com a participação de mais de 40 mil filiados.

Se for vitorioso na prévia do dia 17 de março, Tarso passa a prefeitura para João Verle duas semanas depois, no início de abril.

Ciro costura frente
Ciro Gomes foi ao encontro de Leonel Brizola, ontem, levando a disposição do PPS e do PTB gaúchos de f ormar uma grande aliança com o PDT em nível nacional e regional para presidente da República e para governador do Estado. Recebido no aeroporto, sábado, pelos líderes do PPS, Ciro ouviu de Antônio Britto, José Fogaça e Nelson Proença um relato de que a aliança é fundamental não apenas para vercer a eleição mas em nome da governabilidade do Estado. Britto repetiu que Sérgio Zambiasi é seu candidato e que não tem restrições a José Fortunati. Em jantar na residência do presidente da Assembléia, também no sábado, Ciro ouviu de Zambiasi sua preferência por Britto como candidato a governador, o que provocou um comentário do presidenciável.

– Nunca vi nada parecido. Em outros Estados estão se matando. Isto é demais para um cearense.

Maçãs para Patrícia
Zambiasi entregou a Ciro uma caixa de maçãs como presente a Patrícia Pillar, namorada do presidenciável, que faz tratamento de quimioterapia após retirada de um câncer de mama. Trouxe especialmente de Vacaria, terra da maçã, onde esteve pela manhã.

Sono e paixão
Na inauguração das conferências sobre a paz, sexta-feira nem mesmo o brilho da estrela do Fórum Social Mundial, o norte-americano Noam Chomsky, conseguiu conter o sono do senador Eduardo Suplicy. Enquanto o lingüista atacava “os senhores do universo”, que se reúnem em Davos, o senador entregava-se aos braços de Morfeu. Numa outra ponta, Marta, sua ex-mulher, e Luis Favre posavam mais uma vez para fotos.
Apesar da soneca, Suplicy foi a atração por onde andou. Sucesso mesmo o senador fez no Planeta Atlântida, onde assistiu ao show do filho Supla.

Veto a Fortunati
Um dos pontos negativos do FSM foi o veto ao presidente da Câmara, José Fortunati, que havia sido convidado pelo Ibase para participar como painelista do seminário Controle Social do Orçamento Público. O veto teria partido do PT local, o que atinge em cheio o PDT de Leonel Brizola, novo partido de Fortunati. O vereador remeteu carta ao comitê organizador do FSM repudiando o veto.

Mirante
• Lula terminou sendo a grande atração do Fórum. A platéia entrou em delírio. Todo o plenário, de pé, entoou o jingle da campanha de 1989 “Olê, olê, olá, Lulá, Lulá”. Virou comício, com direito a charanga. No ítem entusiasmo, o lingüista Noam Chomsky ficou reduzido a pó.

• Miguel Rossetto tinha boas razões para estar satisfeito, ontem, com o FSM. Há apenas um ano e meio, em julho de 2000, o vice-governador fazia sua primeira incursão a Genebra na formulação da proposta. Hoje, Porto Alegre ocupa a vanguarda do pensamento político de esquerda mundial.

• A garantia de que o 3º Fórum será realizado em Porto Alegre credencia o RS como pólo político alternativo. A maior prova, segundo Rossetto, é o reconhecimento do FSM pelo Fórum Econômico.

• Marchezan mostrou no congresso do PSDB em Imbé, ao lado de Serra, um outdoor que estará nas ruas hoje: “Pergunte à prefeitura de Porto Alegre por que 23.464 crianças não recebem Bolsa Escola do governo federal”. Marchezan entende que Tarso foi relapso.

• Tarso recebeu na semana passada nova pesquisa, com resultados diferentes da avaliação feita pelo diretório. Diante da dúvida, cópias das pesquisas deveriam ser entregues à imprensa. Para conhecimento.


ROSANE DE OLIVEIRA

Amostras do Brasil
Nenhum jornalista ou participante do Fórum Social Mundial presenciou a tentativa de assalto que virou notícia internacional por ter ocorrido no prédio onde se realizam as conferências. Como tudo aconteceu muito cedo, só os seguranças e funcionários correram riscos, mas assim mesmo a imagem de Porto Alegre ficou arranhada aos olhos dos visitantes.

Os estrangeiros ficaram chocados: um homem morreu na tentativa frustrada de assalto ao carro-forte. Jornalistas de agências internacionais queriam saber se havia possibilidade de o assalto “ser coisa da direita”. Os brasileiros explicaram que não: assalto é coisa corriqueira por aqui. Violência urbana, simplesmente.

Depois deste domingo, os convidados entenderão melhor porque se falou tanto de segurança neste Fórum. No começo, por conta do assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel. Ao assalto ocorrido nas barbas dos participantes do Fórum somou-se a repercussão do fim do seqüestro do publicitário Washington Olivetto, em São Paulo. São pequenas amostras do Brasil transmitidas via satélite.

O caso de Olivetto não foi assunto entre os participantes do Fórum apenas pela curiosidade natural com o desfecho do seqüestro do publicitário mais conhecido do Brasil. Como a polícia paulista levantou a hipótese de crime político – os seqüestradores seriam estrangeiros em busca de dinheiro para financiar as atividades guerrilheiras das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia –, os líderes do PT se rebelaram.

A cúpula do PT expressou sua convicção de que os adversários estão fazendo uso político de seqüestros no Brasil, com o objetivo de atingir a candidatura presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva. Tanto Lula quanto o presidente do PT, José Dirceu, reagiram à insinuação de que o PT defende seqüestradores. A polícia sugeriu que os seqüestro de Olivetto poderia ser obra de um grupo idêntico ao que seqüestrou o empresário Abílio Diniz – e cuja repatriação foi defendida por petistas como o senador Eduardo Suplicy.


Editorial

GLOBALIZAÇÃO ÉTICA

Na véspera do seu encerramento, o 2º Fórum Social Mundial já registra um notável avanço conceitual em relação ao primeiro encontro realizado em Porto Alegre: a globalização deixou de ser um inimigo satânico, condenado de forma intransigente e irracional. Agora, graças à contribuição de pensadores arejados como o norte-americano Noam Chomsky e de lideranças respeitadas como a alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, a irlandesa Mary Robinson, a globalização a ser combatida parece melhor identificada. É aquela que gera desemprego, miséria e destruição do meio ambiente. E a globalização a ser conquistada também ganhou um adjetivo: globalização ética.

Assim definida pela senhora Robinson na apresentação que fez na última sexta-feira, a mundialização do conhecimento e da tecnologia deve se concentrar na luta contra a pobreza, no respeito às identidades culturais e na preservação ambiental. A ex-presidente da Irlanda identificou no fórum porto-alegrense um ambiente propício a mudanças sociais por meio de ações positivas e de posicionamentos morais que acabam influenciando decisivamente as decisões de governos e entidades privadas.

É este o resultado mais positivo deste encontro que reúnemilhares de opositores do liberalismo na capital gaúcha

É este, possivelmente, o resultado mais positivo deste encontro que reúne milhares de opositores do liberalismo na capital gaúcha. Embora ainda esteja devendo propostas concretas de novas políticas que transformem as boas intenções em resultado prático, o Fórum Social Mundial substituiu a pirotecnia dos protestos inconseqüentes por um debate melhor direcionado, voltando para a paz e para o progresso sem exclusão.

A grandiosidade e a diversidade do evento ainda geram algumas deformações, como a presença de grupos e pessoas mais interessadas em promover os seus próprios interesses do que em se alinhar à luta por um mundo melhor. Porém, considerando-se o gigantismo da reunião que trouxe a Porto Alegre representantes de mais de cem nações e militantes de organizações de múltiplas tendências, até que os excessos foram mínimos. Cabe reconhecer que os organizadores do evento, entre os quais o governo estadual e a prefeitura da Capital, estão fazendo um grande esforço para prevenir e evitar atos violentos, que comprometam a segurança dos participantes e da própria população.

São avanços dignos de regis tro na comparação com o fórum anterior, que se caracterizou por imagens de questionável civilidade como a destruição de uma lavoura de soja, a queima de bandeiras e os ataques contra uma rede de lancherias. Neste segundo encontro, marcado pela paz, redefine-se o inimigo e busca-se propor alternativas. É de se esperar que o terceiro, já confirmado para Porto Alegre, acrescente à sua pauta o pragmatismo, o pluralismo e a tolerância com idéias diferentes, que são itens essenciais à busca da desejada globalização ética, com desenvolvimento e justiça social.


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02/04/2002


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