Roberto Campos morre aos 84 no Rio



Roberto Campos morre aos 84 no Rio Ex-ministro influenciou a vida brasileira, tornando-se um dos principais economistas do país no século passado O ex-ministro Roberto Campos, de 84 anos, faleceu ontem por volta de 20h em sua residência no Rio, vítima de isquemia cerebral. Campos havia sido internado em julho na Clínica São Vicente, com retenção de fezes. Contraiu pneumonia que lhe provocou desequilíbrio renal e insuficiência respiratória, mas sobreviveu. A isquemia cerebral, que o atingiu em fevereiro de 2000 e veio a matá-lo ontem, limitara sua capacidade de falar e escrever. Defensor apaixonado do liberalismo, era considerado articulista brilhante e polêmico. Exerceu a diplomacia e a política numa vida que se pautou pela coerência de pensamento. Esteve presente em muitos acontecimentos decisivos do país na segunda metade do século, ocupando cargos de ampla visibilidade e importância no Estado brasileiro. Ingressou no Itamaraty em 1939, após deixar o seminário (em suas conferências, tinha o hábito de fazer uso de frases em latim). Em seguida, foi servir na embaixada brasileira em Washington, nos Estados Unidos. Graduado em Economia, participou em 1944 da Conferência de Bretton Woods (EUA), que redesenhou o sistema monetário internacional depois da II Guerra Mundial, na companhia de Eugênio Gudin e Octávio Gouvêa de Bulhões – dois dos mais influentes economistas brasileiros no século passado. Nessa conferência foram criados o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, por exemplo. Ocupou cargos importantes nos governos de Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, João Goulart e Castelo Branco. De sua mente saíram criações como o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, a caderneta de poupança, a correção monetária, o Banco Central, o Banco Nacional da Habitação e o Estatuto da Terra, por exemplo. Campos foi assessor econômico de Getúlio Vargas e participou, em 1951, da criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), que mais tarde acrescentaria o Social ao nome e um S à sigla. Tornou-se o presidente da instituição. No mesmo ano, propôs a criação da Petrobras com capital estrangeiro. Ao final do século passado, no entanto, chamava a Petrobras de Petrossauro, querendo dizer que a superestatal era uma espécie em extinção. No governo seguinte, de Juscelino Kubitscheck, preparou o programa de desenvolvimento para a economia brasileira de 1955 a 1962, influenciando o Plano de Metas do presidente. Mas esse plano não previa a criação de Brasília e a transferência da capital federal do Rio para o Planalto Central. Em 1961, no governo Jânio Quadros, retornou a Washington na condição de embaixador. Lá, conseguiu um acordo com o FMI, para o alongamento do perfil da dívida externa. Dois anos mais tarde, já com João Goulart na Presidência, pediu demissão por discordar das nacionalizações de empresas estrangeiras realizadas pelo governo. Após o golpe militar, em 1964, voltou ao governo como ministro do Planejamento de Castelo Branco. Em 1974, foi nomeado embaixador em Londres, onde permaneceu até 1982. Nos 16 anos seguintes, foi parlamentar – senador e deputado. Como senador (PDS-MT), foi defensor intransigente das privatizações. Economia de mercado, abertura econômica e sistema tributário eram assuntos preferenciais de seus projetos. Teve atuação destacada na aprovação das emendas constitucionais que quebraram os monopólios da Telebrás e da Petrobras. Em 1994, lançou o livro Lanterna de Popa, sua autobiografia. O pregador do liberalismo Ao comemorar 80 anos, em 1997, no Rio, Roberto Campos brincou que os liberais vivem mais. A frase “os liberais vivem mais” surgiu na comemoração dos 80 anos do economista austríaco Friedrich von Hayek. Um ultraliberal, Hayek não poderia ter melhor divulgador do que Campos contra o Estado intervencionista. No fim da vida, Campos saboreava a vitória sobre os detratores, com a prevalência das idéias liberais. Para ele, comunismo era um misto de despotismo político e ineficiência econômica. Mas avaliava que no Brasil o liberalismo não emplacou. Escreveu que o país era um grande desapontamento pela diferença entre o potencial enorme e um desempenho medíocre. Inseria o Brasil na categoria dos naturalmente ricos mas com vocação para ser pobre. O país, dizia, não chegara ao capitalismo liberal-competitivo. Via-o saindo do mercantilismo patrimonialista para o capitalismo de Estado. Achava que o Brasil teve sorte em não agravar seus problemas ao aderir à democracia política e à economia de mercado. O problema: a prática não foi contínua nem competente. Frasista cortante e de memória invejável, fulminava os desafetos. Mas teve troco. O escritor e jornalista Nelson Rodrigues cunhou para ele a frase “nada mais insignificante que ex-ministro”. E, num século que viu a ascensão e a queda do comunismo, não por acaso recebeu da esquerda a alcunha de Bob Fields. Nasceu no ano da Revolução Socialista Russa, em 17 de abril de 1917, em Cuiabá (MT). Seminarista em Guaxupé (MG), trocou a vida religiosa pelo Itamaraty. Em vez de pregar o Evangelho, foi semear o liberalismo. Sem-terra acampam no Senado Grupo de manifestantes deixou o auditório ontem à noite Reunidos ontem no Auditório Petrônio Portela, do Senado, para participar do Tribunal Popular da Reforma Agrária, centenas de trabalhadores rurais, incluindo integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), realizaram uma assembléia e só deixaram o local por volta de 23h. Os manifestantes aceitaram desocupar o auditório do Senado depois que o ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann, aceitou recebê-los hoje. Inicialmente, o grupo ameaçava passar a noite no local. – Não ocupamos. Nós estaremos em vigília permanente nesse prédio, que é o prédio do povo. Essa é a única linguagem que o governo entende – afirmou Gilmar Mauro, um dos líderes do MST. As principais reivindicações são terra para as 85 mil famílias acampadas, crédito para quem não recebeu nenhum tipo de financiamento, renegociação das dívidas e liberação dos convênios já assinados entre ministério e Incra. Enquanto aguardavam, os integrantes do MST organizaram um show de calouros. Eles formavam o júri. O presidente do Senado, Ramez Tebet (PMDB-MS), determinou à segurança que se mantivesse atenta para evitar conflito. Inicialmente, os trabalhadores foram ao Senado participar do Tribunal Popular da Reforma Agrária. A idéia de acampar foi tomada por volta do meio-dia, após Mauro retornar do ministério sem conseguir conversar com o secretário executivo José Abrão. No bilhete enviado ao secretário, o MST afirmou que foram removidos todos os argumentos utilizados pelo ministério para não negociar. Abrão respondeu com uma nota: “Para que se possam restabelecer negociações e entendimentos produtivos é sempre indispensável que os movimentos sociais ajam dentro da lei e em respeito à ordem”. Mulheres querem ter maridos como dependentes Sindicatos de servidores estaduais estão reivindicando tratamento igualitário entre homens e mulheres no Instituto de Previdência do Estado (IPE). As entidades exigem que o pagamento de pensões e a assistência médica sejam estendidos aos maridos e companheiros das funcionárias públicas. A legislação determina que a concessão dos benefícios é dada somente a mulheres e filhos menores dos servidores. No caso dos filhos, o limite de idade pode chegar aos 24 anos, desde que o dependente esteja cursando o Ensino Superior e não tenha renda própria. – Nós, mulheres, contribuímos com os mesmos percentuais que os homens e não podemos oferecer assistência médica e previdenciária aos nossos maridos – diz a presidente do Sindicato dos Fiscais de Tributos Estaduais (Sintaf), Zulma Rejane Rodrigues. Ontem, Zulma e os dirigentes de outros seis sindicatos entregaram ao presidente da Comissão Especial da Assembléia para tratar de assuntos da autarquia, deputado Otomar Vivian (PPB), um documento com a reivindicação. Vivian lembrou que a Constituição assegura a isonomia de direitos e obrigações entre homens e mulheres. O presidente do IPE, Luiz Henrique Mota, disse que ainda não recebeu o pedido dos servidores, mas adiantou “que qualquer benefício tem que ter custeio próprio”: – Estender o benefício sem fonte de custeio seria agravar a crise financeira do instituto. Em seus 70 anos de história, o IPE enfrenta graves problemas de caixa, que motivaram a formação da comissão do Legislativo. No ano passado, um outro grupo havia sido criado com a participação dos três poderes, com o objetivo de apresentar uma solução para o impasse. As conclusões desse estudo serão examinadas pelos deputados. Custeando 52,4 mil pensões por mês, as maiores dificuldades do instituto ocorrem na área previdenciária. A arrecadação do setor é menor do que a verificada para a assistência médica. Aécio manda investigar Medeiros Deputado é acusado de desviar dinheiro doado por empresários à Força Sindical Na véspera da promulgação do Código de Ética e Decoro Parlamentar, o presidente da Câmara dos Deputados, Aécio Neves (PSDB-MG), determinou ontem a abertura de um inquérito contra o deputado Luiz Antônio de Medeiros (PL-SP). O parlamentar é suspeito de envolvimento num esquema de desvios de recursos doados à Força Sindical por empresários. – Há indícios suficientes para investigar o caso – justificou o presidente da Câmara. Após o anúncio da decisão, a Corregedoria-geral da Câmara informou que Medeiros e seu ex-assessor Wagner Cinchetto, autor das denúncias, deverão ser ouvidos pela Casa. Para o corregedor-geral, deputado Barbosa Neto (PMDB-GO), as acusações publicadas pelos jornais são “provas suficientes” para recomendar que Medeiros seja alvo de um processo por quebra de decoro parlamentar, que poderá resultar na cassação de seu mandato. O corregedor pretende ainda requerer à Justiça uma série de documentos, entre os quais os relativos à movimentação de uma conta bancária secreta no Exterior, na qual teria sido depositado dinheiro desviado da Força Sindical. Desde cedo, a movimentação em torno do caso era grande. Antes de o pedido de investigação contra Medeiros ser protocolado pelo deputado Jair Meneguelli (PT-SP), Aécio orientou o corregedor a se preparar para apurar a fraude. O requerimento deverá dar origem a um pedido de abertura de processo por falta ao decoro. No documento, Meneguelli diz que, depois de confirmadas as denúncias, ficará comprovado que o ex-presidente da Força Sindical mentiu sobre sua participação no esquema e recebeu “vantagem indevida”. – Nós já tínhamos recebido a informação indicando que o esquema havia sido montado por Medeiros, mas faltavam provas – declarou Meneguelli, ex-presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), entidade adversária da Força Sindical. De acordo com o Código de Ética, que será promulgado hoje, o conselho da Câmara terá 60 dias para concluir processo por quebra de decoro e encaminhar projeto determinando a punição. O prazo poderá ser maior (90 dias), se o caso for de cassação de mandato. A decisão final será do plenário. Hoje, Aécio vai pedir que os líderes dos partidos indiquem os 15 titulares e 15 suplentes do conselho para que ele seja instalado na próxima semana. Líder da Força Sindical evita comentar denúncias A representação da Força Sindical no Rio Grande do Sul evitou comentar ontem o teor das denúncias envolvendo o ex-dirigente nacional Luiz Antônio Medeiros. O secretário de Formação da Força Sindical no Estado, Nilton Souza, considerou precipitado opinar sobre as acusações de que Medeiros teria desviado recursos da entidade para uma conta pessoal. Ligado ao Sindicato dos Comerciários de Porto Alegre, Souza acredita que as denúncias interessam à Central Única dos Trabalhadores (CUT) – principal concorrente da Força Sindical – e visam a atingir a “honra” do atual presidente nacional Paulo Pereira da Silva, o Paulinho. – A CUT está interessada em divulgar essas denúncias para conter o nosso crescimento. O Paulinho é hoje o contraponto, mostrando que o sindicalismo só de reivindicações e de greves não dá mais certo. Hoje, o trabalhador quer sindicalismo de resultados – afirmou. Embora admita que Medeiros errou ao abrir uma conta em Nova York para depositar o dinheiro destinado ao Instituto Brasileiro de Estudos Sindicais (Ibes), o sindicalista gaúcho disse que enquanto não forem comprovadas as denúncias não há como fazer julgamento: Se for comprovado que foi ato ilícito, o Medeiros deve ser julgado perante a lei. Não podemos crucificá-lo antes disso. A Força Sindical tem hoje no Rio Grande do Sul cerca de 90 entidades filiadas. A CUT tem aproximadamente 280 sindicatos filiados no Estado. 139 prefeituras não cumpriram Lei Fiscal TCE divulgou ontem avaliação Prefeituras de 139 municípios gaúchos poderão deixar de receber repasses voluntários da União e do Estado por terem descumprido a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) no ano passado. Além de não expedir mais certidões de regularidade fiscal para essas prefeituras, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) vai enviar cópias dos processos para o Ministério Público, que poderá denunciar à Justiça os prefeitos em exercício na época. Presidentes de 164 câmaras municipais também poderão ser denunciados pelo mesmo motivo. Como ordenadores de despesas, esses prefeitos e presidentes de câmaras – a maioria não ocupa mais os cargos – desrespeitaram o artigo 42 da Lei Complementar N 101, de maio de 2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal. O artigo proíbe, nos últimos dois quadrimestres do mandato, “contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito”. As principais irregularidades foram a falta de prestação de contas e a realização de despesas nos últimos dois quadrimestres de 2000 sem dinheiro em caixa. Para o presidente do TCE, Hélio Mileski, que divulgou ontem os resultados da avaliação da gestão fiscal de 2000 nos municípios, essa é uma das regras mais eficientes na moralização do processo eleitoral. – Além de dificultar a realização de obras com o objetivo de angariar votos em época de campanha eleitoral, os prefeitos e chefes de legislativos não podem mais comprometer, e até inviabilizar, o mandato do sucessor – diz Mileski. O TCE analisou também a adequação dos municípios aos limites de gastos com a folha de pagamento: 54% para o Executivo e 6% para o Legislativo. Apenas 18,1% do total de prefeituras e câmaras ainda não respeitam esses limites. Os que estão em situação irregular têm o prazo legal de duas gestões fiscais, que se encerra em 2002, para se ajustar às regras. Artigos A segurança do vôo LETÍCIA PEREZ Durante muitos anos o quesito segurança de vôo não foi um assunto tratado amplamente pelo cidadão comum, pelos que costumam voar e também os que nunca voaram. O fato que originou toda essa curiosidade acerca da aviação civil foi, claro, o atentado ao World Trade Center, de Nova York. Junto com os passageiros e pilotos, morreram comissários de bordo. Em uma das aeronaves seqüestradas, uma comissária cumpriu heroicamente seu papel, avisando a torre do seqüestro e das mortes de seus colegas. Assistindo às imagens, lembrei daqueles profissionais que saíram para trabalhar na segurança do vôo e acabaram fazendo o último vôo de suas vidas, de suas carreiras. Mas para que serve, afinal, um comissário de bordo? Serve para, em primeiro lugar, garantir a máxima segurança do vôo. Em segundo lugar, para o atendimento, para o marketing, para a magia da aviação. O profissional de comissariado é habilitado e treinado exaustivamente para situações potenciais e reais de risco que ocorrem em vôo. Na origem desta profissão, tinha-se uma mescla de enfermeira com garçonete. Hoje, ao contrário do que era, os comissários sabem como agir em casos de fogo a bordo, atuam como paramédicos, desde hipoglicemias, problemas com álcool até a eventualidade de algum nascimento. Para ser comissário, o candidato ou candidata precisa estar com plena saúde física e mental, comprovadas através de check-ups anuais pelos hospitais de base da aeronáutica. Durante o curso de formação, são ministradas aulas teóricas sobre emergências, em potencial – seqüestros, fogo, pânico etc – e reais – estudam-se profundamente acidentes aéreos com vídeos, simulações dos relatos e dias em situação de sobrevivência real na selva e no mar. Depois de formados, os comissários fazem uma prova teórica no DAC (Departamento de Aviação Civil) para comprovar o seu conhecimento, para oficializar que sabe o que e como fazer para salvar vidas. As empresas aéreas habilitam seus comissários durante um treinamento de aproximadamente 40 dias, para voarem em aeronaves específicas. Só podem voar em Airbus A-319, por exemplo, aqueles habilitados para este aparelho. Só poderão voar no Airbus os comissários que souberem de olhos fechados onde estão os equipamentos auxiliares de emergência, as saídas e quais são cada um deles. Este certificado é revalidado a cada dois anos. O que se discute é a segurança nos aeroportos, quando a aeronave ainda está em solo A segurança de um vôo é fundamental para o desenvolvimento da aviação civil no mundo, mesmo em países como os EUA ou Canadá, com uma tradição prática e política na área da segurança. O que se discute é a segurança nos aeroportos, quando a aeronave ainda está em solo e tragédias como a de setembro poderiam ser evitadas. A segurança começa em solo. Os comissários são profissionais mais do que necessários no mundo da aviação. São vitais. Durante um vôo, não há tempo para discussões sobre o que fazer em casos de despressurização, por exemplo. O passageiro, a partir do momento em que escolhe voar em determinada companhia, está entregando a ela a sua vida. É a tripulação que vai estar apta para ajudar, para fazer sobreviver um passageiro até o pouso em segurança. Este profissional é digno de respeito e merece ser homenageado, pois sua vida é cuidar da vida de 200, 300 passageiros, incluindo crianças, idosos, jovens, adultos e passageiros com necessidades especiais todos os dias, ao mesmo tempo. Voe, voe com segurança e sem medo. O ruim e o bom CÂNDIDO NORBERTO Não está sendo lá essas coisas o primeiro ano do novo século, embora a maioria das pessoas o tenho recepcionado com um festival de esperanças. Os ricos sonhando em ficarem mais ricos e os pobres almejando pelo menos ficarem menos pobres. Pelo que se tem podido ver até aqui, quando 2001 já está entrando em seu crepúsculo, quem deve estar se sentindo mais agraciado são os fabricantes de armas. Estas, leves ou pesadas, estão ensejando incalculáveis lucros. Servem para morticínios no varejo e no atacado. O mundo está como eles gostam. E pelo que se nota, não têm o mínimo motivo de se preocupar com a simples possibilidade de que a paz entre os homens, individual ou coletivamente, possa diminuir-lhes os lucros. O presente e o futuro lhes sorriem. Guerra é para isso mesmo. Enfim... Já internamente, tirante a insegurança e a violência que nos atormentam do nascer ao pôr-do-sol, temos pelo menos um motivo alentador no campo político. O Senado Federal, por sua maioria, está emitindo alentadores sinais de sua disposição de expurgar-se. De higienizar-se. De expelir seus maus elementos. Nessa direção, apontam quatro acontecimentos ao menos parcialmente positivos. O primeiro deles foi a cassação – cassação mesmo – do nababesco ex-senador Luiz Estevão, cujo, se a memória não está me traindo, chegou até a passar uns poucos dias na cadeia. Seguiram-no as renúncias de dois outros figurões políticos que pareciam intocáveis: Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda. Acuados pelo Conselho de Ética do Senado, optaram pela renúncia, que foi o jeito que encontraram para evitar a cassação que os tornaria inelegíveis nos próximos oito anos. Uma breve súplica ao primeiro ano deste ainda flamante século: obséquio pôr fim a mais esta guerra iniciante A poeira desses episódios ainda não havia baixado quando outro escândalo veio a furo: Jader Barbalho, no exercício da presidência do Senado, foi atingido em pleno vôo por denúncias de milionárias patifarias cometidas nos tempos em que governou o Pará e em sua passagem por um ministério que lidava com polpudas verbas. Apesar de suas negativas e de sua arrogância, viu-se na contingência de assumir duas atitudes vergonhosas: a primeira, licenciando-se da presidência do Senado; a segunda, renunciando a seu mandato para escapar da cassação que o impediria de, já no próximo ano, voltar à vida pública, da qual, por tudo que se ficou sabendo, só se valeu para tirar proveitos pessoais. Para finalizar, uma breve súplica ao primeiro ano deste ainda flamante século: obséquio pôr fim a mais esta guerra iniciante e zelar mais pelos dinheiros públicos do pobre povo brasileiro, livrando-os dos Lalaus et caterva. Amém. Colunistas ANA AMÉLIA LEMOS Protecionismo agrícola Embora tenha dado uma boa notícia para a pecuária gaúcha, o comissário agrícola da União Européia, Franz Fischler não pôde tapar o sol com a peneira. Depois de anunciar que uma missão irá verificar, no Rio Grande do Sul, os procedimentos de controle da febre aftosa para que, depois, possam ser retomadas as exportações de carne bovina para o mercado europeu, deixou claro que há divergência de interesse, no setor agrícola entre o Mercosul e a União Européia. Para que possa ser feito um acordo entre os dois blocos “serão necessárias concessões de ambas as partes”. Como os mais fortes sempre levam vantagem nessa hora, é pouco provável que na próxima rodada de negociações da OMC os países que integram a UE aceitem uma redução substantiva dos atuais subsídios concedidos ao setor agrícola. Apesar de o cenário não ser muito favorável, o ministro Pratini de Moraes considerou importantes os entendimentos mantidos com o comissário Fischler, e as decisões anunciadas ontem terão grande repercussão econômica no Rio Grande do Sul, pois, além da busca das precondições para a exportação de carne bovina, foram também discutidas formas de ampliação das exportações da carne suína da Região Sul (RS, SC, PR) para o mercado europeu. Também de interesse da economia gaúcha é a visita que técnicos na área de vinhos europeus fará para avaliar o sistema de produção do Estado e, então, abrir as portas para esse importante setor. O entusiasmo comedido na área governamental foi percebido também entre os representantes da Confederação Nacional da Agricultura. “Foi boa a reunião”, classificou Carlos Sperotto. O vice-presidente da CNA, Gilman Viana Rodrigues, responsável pela área internacional, deixou claro ao comissário Fischler que “persiste o desapontamento, entre os produtores brasileiros, no que se refere à abertura comercial agrícola. Tenho a obrigação, em nome desse setor, de transmitir parte da angústia e revolta que nosso produtor está passando com relação ao perversivo protecionismo praticado pelo mundo desenvolvido”, disse o empresário. O comissário, que parece rouco de tanto ouvir esse tipo de queixa, disse que na próxima rodada da OMC “haverá liberalização do comércio, inclusive do setor agrícola”. Tomara que isso não seja apenas retórica. JOSÉ BARRIONUEVO – PÁGINA 10 Olívio ou Tarso, o difícil consenso Ao assumir a presidência regional do PT, David Stival terá uma árdua tarefa: estabelecer o consenso em torno de um nome ao Palácio Piratini, tendo como pré-candidatos os dois maiores expoentes do PT gaúcho, o governador Olívio Dutra e o prefeito Tarso Genro. Pesquisa é um dos fatores David Stival entende que a disputa está embolada entre Olívio e Tarso do ponto de vista da densidade eleitoral recolhida nas pesquisas de opinião pública. A perspectiva de vitória é um fator importante se um dos candidatos tiver grande vantagem. Foi o que influenciou a decisão do partido na escolha entre Tarso e Raul Pont. Stival, que optou por Tarso em 2000, considera normal o índice de rejeição de Olívio hoje, num primeiro governo do PT. Avalia que o quarto mandato na prefeitura, num contexto político de estabilização, não oferece desgaste para Tarso. O presidente eleito ressalta que, diferentemente de 1998, o PT hoje coloca em julgamento um programa de governo, que estará em execução durante a campanha eleitoral. O ungido deve associar a questão programática com a viabilidade eleitoral de Tarso e Olívio. Considerar apenas a pesquisa, quando a diferença é pequena, significa tirar voz e voto do militante, ou seja, dar mais importância ao Ibope do que à base partidária. Decisão até janeiro Diante da definição dos candidatos dos demais partidos, o PT pretende oficializar o candidato bem antes de março, mês da prévia marcada para o dia 3. Stival iniciou a peregrinação esta semana, antes da posse, por encontros com Tarso e Olívio para ter a tarefa concluída em três meses. Modelo para o mundo Stival não tem dificuldade em afirmar que a experiência do PT, dentro de um processo democrático, é única no RS. Por isso vê um desafio maior em 2002, quando o partido deve se afirmar como “modelo da esquerda no mundo”. Entende que o PT não pode chegar dividido à segunda edição do Fórum Social Mundial, marcado para o final de janeiro. Palácio lembra promessa do prefeito No Palácio Piratini, a pesquisa eleitoral é apenas um ingrediente para a definição do candidato. Pelo Datafolha, observam os analistas próximos a Olívio, o governador leva vantagem em relação a Tarso. Mas a vantagem de um sobre outro seria considerada se fosse expressiva, como ocorreu entre Tarso e Raul em Porto Alegre, que influenciou os militantes. Na eventualidade de uma candidatura de Tarso, dois obstáculos são apontados: o desgaste por ter prometido cumprir o mandato até o final, o que comprometeria a credibilidade do candidato; o segundo aspecto deixa uma indagação: se o governo é bom, por que trocar o candidato? Significa dizer que a retirada do governador da disputa ofereceria discurso aos adversários que diriam: o governo é tão ruim que o próprio PT preferiu não tentar a reeleição de Olívio. Rossetto opina O vice Miguel Rossetto não se fixa na nova correlação de forças que resultou das convenções do PT no RS. Discorda até de referência feita na coluna, ontem, sobre perda de espaço do Amplo na executiva estadual. A base de suas reflexões sobre a sucessão no PT está firmada no seguinte conceito: Não importa qual corrente cresceu mais. O que importa é que o PT cresça e se fortaleça para dar continuidade a este governo Futuro do PSB Para David Stival, o PSB deve integrar a Frente Popular independentemente da candidatura de Garotinho. Segmentos do PT entendem que a relação com o PSB deve ser reavaliada com a candidatura do governador do Rio. Beto Albuquerque reforçou sua posição na Secretaria dos Transportes com a declaração de Garotinho, ontem, de que apóia Lula. No segundo turno. Palestra Os projetos do PT para o último ano do governo Olívio Dutra serão expostos hoje por Miguel Rossetto em palestra durante reunião-almoço da Federasul, sob o tema “A contribuição do modelo gaúcho ao Brasil”. Tarso considera a prévia salutar Em carta ao colunista, Tarso Genro considera a realização das prévias no dia 3 de março como “um meio salutar para verificar a força política interna real de cada um dos candidatos”. A carta do prefeito de Porto Alegre, que é defensor da política de “desbloqueamento”: Prezado jornalista José Barrionuevo: Pela especial influência que têm as informações que são passadas na sua coluna, no contexto político, sou obrigado a prestar dois esclarecimentos em relação à Página 10 de ontem: 1. A agenda que cumpri neste fim de semana é uma característica do meu mandato atual, portanto, desde o início do ano, e do meu mandato anterior. Posso garantir que neste ano, por exemplo, já estive em mais de cem reuniões no centro, nos bairros e na periferia da cidade. Não se trata de ‘malabarismo de candidato’, interpretação esta que considero natural, face ao período de discussão sobre candidaturas que está aberto no interior dos partidos e na crônica política. Trata-se, na verdade, de um método de governar que acredito correto e coerente com o nosso programa de governo. 2. A preocupação do companheiro David Stival com eventuais prévias no partido é justa e pertinente por dois motivos: 1º) Como até agora não temos nenhum pré-candidato formalmente apresentado, é possível pensar num consenso, embora, na minha opinião, as prévias sejam um meio salutar para verificar a força política interna real de cada um dos candidatos. Ela se expressa independentemente da orientação das correntes, que não controlam totalmente, como de resto já ficou provado, a ampla base partidária. Depois da política de ‘desbloqueamento’ isso se torna ainda mais evidente; 2º) O meu entendimento pessoal é que o nome do companheiro Paim, além das condições políticas que reúne, é um dos mais fortes eleitoralmente. Por isso, creio que a sua pré-candidatura deverá ser considerada por todas as correntes e tendências internas do partido. Antes dos interesses de tendências, de grupos ou correntes, temos que preservar o interesse maior do partido e do projeto que representamos. Cordialmente Tarso Genro Mirante • Presidente da Associação dos Comissários de Polícia, Francisco de Paula Souza da Silva concorre à reeleição, hoje, apoiado por novos e antigos policiais. • Maria Augusta Feldman assume no conselho da Agergs amanhã, às 14h. • No comando da Comissão de Fiscalização e Controle, o deputado Berfran Rosado (PPS) pretende demonstrar hoje, em reunião marcada para as 11h, as distorções do projeto de Orçamento. Berfran cunha um novo termo: o “custo PT”, que a sociedade gaúcha paga. • Em pronunciamento durante o período do Grande Expediente, hoje, o deputado João Osório (PMDB) fará uma radiografia da crise na Segurança Pública no Estado. Os números são contundentes. Assunto para a CPI. Editorial O Brasil e a guerra Embora sem esconder sua contrariedade com o início dos bombardeios sobre o Afeganistão, pois era partidário de uma solução negociada que evitasse a eclosão da guerra, o presidente da República vem buscando ver no conflito dimensões que ultrapassem as do confronto entre uma superpotência e o braço armado do terror. Pretende o senhor Fernando Henrique Cardoso aproveitar a conjuntura de união internacional contra o fanatismo e a barbárie para desencadear um movimento mundial de combate à pobreza e de inserção das nações emergentes nos processos decisórios. Observa o primeiro mandatário que, se foi muito doloroso o que aconteceu em 11 de setembro, é esta também a hora para consolidar as bases de uma paz mais duradoura, a começar pela redução dos níveis de miséria que em algumas regiões do planeta atingem níveis alarmantes. Em dois pronunciamentos subseqüentes, um no domingo e outro na segunda-feira, o chefe do governo manifestou sua esperança em que as operações militares deflagradas procurem evitar a perda de vidas inocentes e preservar populações civis. “Se repudiamos o terrorismo – enfatizou na primeira manifestação – em todas as suas formas e quaisquer que sejam suas origens, estamos também do lado da racionalidade e da sensatez. Esta não é uma luta contra um povo, um Estado ou uma religião. O objetivo é um só: conter o flagelo do terrorismo.” Igualmente incisivo foi seu posicionamento na segunda, em cadeia de rádio e TV. Conclamou ele as forças políticas a dar ao país o apoio necessário para “enfrentarmos, juntos, as dificuldades que teremos pela frente”, pois “tempo de conflito lá fora deve ser tempo de união aqui dentro”. São pontos de vista respeitáveis. No que toca à questão da miséria, guardam eles sintonia com posições do presidente do Banco Mundial, para quem a pobreza não é fonte de conflitos, imediata e diretamente, e menos ainda de terrorismo. É ainda James Wolfensohn quem defende um maior protagonismo internacional das nações em desenvolvimento, precisamente como prega Fernando Henrique Cardoso, ao cobrar a inserção dos povos emergentes nos processos decisórios internacionais. Parece evidente que, neste momento grave para a humanidade, o grande desafio a superar é conter organizações terroristas bem identificadas, que na investida brutal contra os Estados Unidos vitimaram mais de 7 mil pessoas. Não pode haver contemplação para com as matrizes da insanidade e da destruição, que, em nome de uma fé que na prática renegam, expõem dezenas de nações a atrocidades inomináveis. Mas se a guerra é contra o ódio, não se pode alimentar da cegueira. Choram-se no Afeganistão os primeiros mortos. Entre eles estão, deploravelmente, quatro integrantes de uma organização não-governamental, ligada à ONU, que se devotava à desativação de minas terrestres. O apelo que esse fórum mundial dirigiu ontem à comunidade internacional para que se protejam os civis inocentes é certamente o mesmo que fazem nesta hora todos os homens de boa vontade. Distorção deplorável As denúncias ligando o deputado Luiz Antônio de Medeiros (PL-SP) a uma suposta operação de desvio de recursos e remessa ilegal para o Exterior de dinheiro destinado à formação da Força Sindical têm repercussões sérias tanto no meio político quanto no sindical. Ao mesmo tempo em que repercutem na formação de alianças voltadas para as eleições de 2002, representam um desafio para a Câmara dos Deputados, a começar pelo fato de que vão se constituir no primeiro teste do novo Código de Ética parlamentar, aprovado na última semana. O caso merece também uma reflexão sobre a falta de seriedade com que determinadas entidades não governamentais movimentam recursos de terceiros. Assim como vem ocorrendo desde 1995, quando as denúncias encaminhadas à justiça vieram à tona, é fundamental que o ex-sindicalista e hoje deputado continue dispondo de amplo direito de defesa. Ao alegar que não se lembra se fazia ou não prestação de contas de contribuições destinadas a viabilizar uma das mais importantes entidades sindicais do país, porém, o mentor do chamado sindicalismo de resultados expôs uma despreocupação infelizmente comum nestes casos. É natural que, diante da falta de condições do poder público de continuar atuando em determinadas áreas, a própria sociedade se empenhe em suprir este papel. A liberdade com que as entidades civis se organizam, porém, não pode autorizar qualquer tipo de impunidade, deixando de preservar regras mínimas como a transparência de seus atos. Precondição para qualquer entidade não-governamental, seja qual for a causa – algumas das quais no mínimo duvidosas –, esta preocupação é particularmente relevante no meio sindical. Historicamente atreladas ao Estado no Brasil, as instituições sindicais conseguiram se reorganizar de forma espontânea nas últimas décadas. É sob esta forma que vêm conseguindo registrar avanços importantes, a começar pela capacidade de adaptação da pauta de reivindicações às circunstâncias econômicas. Certamente, as suspeitas envolvendo dirigentes de uma entidade não podem comprometer uma estrutura que, em diferentes áreas, vem conseguindo dar resposta eficaz a demandas crescentes da sociedade. Até mesmo para preservar esta saudável capacidade de organização, porém, é imprescindível que sejam investigadas de forma exemplar para que não pairem dúvidas em relação às denúncias, para que seja possível a responsabilização dos culpados e o reembolso de recursos desviados. Seja na política, no sindicalismo ou em qualquer outra atividade, é imprescindível que os princípios éticos possam pairar acima de qualquer outro. Topo da página

10/10/2001


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