Rosalba quer mais recursos para melhorar o SUS
Os 20 anos do Sistema Único de Saúde são o marco para o ciclo de debates organizado pela presidente da Comissão de Assuntos Sociais (CAS), senadora e médica Rosalba Ciarlini (DEM-RN), para avaliar atendimento à saúde e formular propostas.
Como surgiu a ideia de realizar esse ciclo de debates para avaliar os 20 anos do Sistema Único de Saúde (SUS)?
Rosalba - Das reclamações, das situações caóticas a que assistimos todos os dias. Eu fui militante a favor da implantação do SUS. Naquela época eu era pediatra em Mossoró (RN), nas periferias da cidade, com mortalidade infantil altíssima. As pessoas ainda tinham medo de vacinar os filhos. Acreditávamos que o SUS seria bem melhor. Antes, só tinha direito à saúde quem tivesse carteira de trabalho assinada. A assistência médica estava a cargo do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps). O restante era indigente, atendido por serviços filantrópicos.
O avanço do SUS foi dar acesso a um sistema público?
Sem dúvida. Claro que há o que melhorar. O sistema trouxe também algo importante: cada município pode estruturar sua rede de saúde. Mas a municipalização precisa ser fortalecida. Ela ainda enfrenta dificuldades, como a demora nos repasses estaduais e federais.
Isso seria resolvido com a redefinição das competências nas três esferas de governo?
Os conselhos municipais fiscalizam e analisam as ações. Não são executivos, mas são deliberativos. Há também os estaduais e o federal. Todas as ações passam por esses conselhos, assim como prestações de contas. Mas se o recurso fosse direto para o município, não faltaria aquele tipo de exame que é de alta complexidade. O município poderia negociar de forma livre e rápida com quem quisesse: entidade privada ou não. Hoje, se o paciente de uma cidade que não oferece atendimento pleno precisar de uma tomografia, de alta complexidade, tem de ser transferido para a capital ou o prefeito tem de arcar com essa despesa, tirando recursos de outras ações. Outro problema é a quantidade de demandas judiciais de que os municípios são vítimas, muitas vezes decorrentes do descumprimento do atendimento à saúde nas esferas estadual e federal.
Como enfrentar esses entraves?
Defendo que a fiscalização fique no nível federal e estadual. Mas a execução deveria ficar mais a cargo dos municípios, desde que se dêem condições para isso. Há estados em que a maioria dos pronto-socorros e hospitais ainda é de responsabilidade estadual, e com problemas gravíssimos de atendimento. Se em capitais há congestionamento, falta planejamento no interior. Por exemplo, se as cidades sem UTI pediátrica enviam as crianças para a capital, não há como evitar a superlotação. Portanto, é necessário ter cidades-polo. Isso só pode ser criado se os municípios tiverem mais recursos não só para ações básicas, como para formar polos, consórcios, formados pelas associações municipais regionalizadas. Eles seriam regionais e poderiam se intercomunicar, com especializações diferentes em cada núcleo. Se houvesse planejamento, certamente iríamos avançar mais. Esse projeto é de longo prazo.
Especialistas avaliam que as dificuldades seriam mais gerenciais do que a insuficiência de recursos. O que acha dessa avaliação?
Os recursos ainda são insuficientes. Se o orçamento inicial do SUS fosse atualizado, chegaríamos a uma cifra superior a R$ 100 bilhões. Só que a população naquela época era menor. E o que temos orçado é praticamente a metade. Sabemos que praticamente todos os municípios brasileiros estão cumprindo a sua parte, investindo algo em torno de 15%. Mas muitos estados e o governo federal não cumprem suas metas. Isso será assegurado com a Emenda [constitucional] 29, cuja regulamentação está na Câmara para ser votada. Não estou dizendo que não haja problemas de gestão. Mas são pontuais.
No debate sobre o atendimento aos idosos, diagnosticou-se falta de conexão entre a rede básica e os centros especializados. O planejamento resolveria essa falta de conexão na rede do SUS?
Creio nisso. Como está hoje, perde-se tempo, recursos e, inclusive, vidas. A rede digital de comunicação, aplicada em algumas cidades, tem mostrado bons resultados.Nessas cidades, as unidades estão totalmente informatizadas. Isso deve ser disseminado com rapidez, além de se buscar reduzir a burocracia.
A CAS já debateu as condições do país para enfrentar a gripe suína e a saúde mental. A sociedade rediscute a redução de leitos e as dificuldades de internação de pacientes após a reforma psiquiátrica de 2001?
Não queremos voltar ao antigo sistema manicomial. Mas não se pode também eliminar a possibilidade de internação. Os centros de atenção psicossocial (CAPs), que se assemelham a unidades de saúde, que oferecem consulta, acompanhamento e terapias ocupacionais, além de apoio às famílias, precisam ser ampliados. São apenas 1.290 no país e, desses, só 40 são capazes de receber pacientes em crise. Em 20 anos, o Ministério da Saúde fechou cerca de 70% das vagas para internação. Eram 120 mil em 1989; hoje são 37,7 mil. Há estados com apenas sete leitos. Não é para que a pessoa fique morando. Mas para aquele momento em que o paciente precisa de acompanhamento especial. Os que podem estão indo para as clínicas particulares. Mas, e o restante da população? Aumenta a população de rua com problemas mentais, que usa álcool e drogas. Tem que se criar condições de atender essa demanda, muito grande. Tratamento alternativo hoje é feito por instituições filantrópicas e religiosas, como a Fazenda Esperança.
Os debates vão prosseguir até o final do ano?
Organizamos as demandas de debates que já existiam na CAS, como saúde mental, idoso, atendimento materno infantil, média e alta complexidade e o Programa Saúde da Família. Acrescentamos outros temas e montamos o ciclo de debates, até o final do ano. Vamos convidar ministros envolvidos com a implantação do SUS, como Alceni Guerra. É da época dele a Lei Orgânica da Saúde [Lei 8.080, de 1990], que fundou o SUS. Queremos levar o relatório do senador Papaléo Paes [PSDB-AP] ao ministro da Saúde com sugestões.
O Brasil não está muito atrasado na redução da mortalidade materna? A meta da ONU é de 20 óbitos para cada 100 mil pessoas. Em 2005, o Brasil apresentava 53,4 para 100 mil.
Infelizmente. E o pior: 94% das mortes poderiam ser evitadas se as mulheres tivessem feito pré-natal, recebido vacinas para evitar certas doenças. Há mortes por infecção, por falta de equipamento e de UTI onde essas mulheres moram. Os indicadores pioraram no Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Mas as mortes não eram notificadas, o que explica os índices elevados. Quanto mais cresce o Programa Saúde da Família, aumenta a notificação. No entanto, ainda existe subnotificação, principalmente no Norte. Portanto, esses dados podem ser ainda mais elevados. Se não, o indicador revela que o atendimento piorou. Isso tudo vai ser discutido no ciclo de debates.
Cíntia Sasse / Jornal do Senado
08/06/2009
Agência Senado
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