Trem-bala: especialistas preferem investimentos em outras áreas




Em debate realizado na Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI), nesta terça-feira (12), especialistas criticaram o investimento a ser feito na implantação do trem-bala no país. Segundo três dos cinco convidados pelos senadores, o Brasil precisa aplicar recursos em áreas estruturantes, como saneamento básico, aeroportos, rodovias, portos, ferrovias convencionais, metrôs e hidrovias.

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A audiência foi convocada pela CI para debater a viabilidade econômica da construção do Trem de Alta Velocidade (TAV), mais conhecido como trem-bala, que ligará os aeroportos de Campinas (Viracopos), São Paulo (Guarulhos) e Rio de Janeiro (Galeão). O Plenário do Senado deve votar nesta quarta-feira (13) a MP 511/10, que autoriza a União a oferecer garantia para financiamento de até R$ 20 bilhões do BNDES ao consórcio que construirá o TAV.

O economista Josef Barat, da Planam Consult, o consultor legislativo do Senado Marcos José Mendes e o diretor do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos), Paulo Fleury, criticaram a opção do governo em dar prioridade ao empreendimento. Antes, o diretor geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Bernardo Figueiredo, e o superintendente da Área de Projetos do BNDES, Henrique Amarante da Costa Pinto, defenderam a viabilidade econômica e a importância estratégica do trem-bala para o país.

O debate durou mais de cinco horas e teve a participação de pelo menos 20 senadores. Ao iniciar os trabalhos, a presidente da CI, senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO), previu que a audiência seria longa e aprofundada ao destacar a importância do tema e a vultuosidade do custo total previsto para o empreendimento, de R$ 34,63 bilhões, com R$ 3,4 bilhões pagos pela União por meio da Empresa de Transporte Ferroviário de Alta Velocidade S.A. (Etav), além do financiamento do BNDES.

Lúcia Vânia reconheceu que o país necessita de mais recursos na área de transporte, setor pouco contemplado nas últimas décadas, em especial no que se refere ao transporte de passageiros. Para ela, não há dúvidas de que o trem-bala pode trazer grandes benefícios para o país, até mesmo nos campos ambiental e de capacitação da engenharia nacional.

No entanto, a senadora considerou preocupante o fato de a MP 511/10 prever que o financiamento do BNDES à iniciativa privada será aportado pelo Tesouro Nacional com taxas de juros subsidiadas e poucas garantias de que o governo não terá de gastar ainda mais para garantir o sucesso da obra. A prioridade do investimento também foi questionada por ela e outros senadores.

Ricardo Ferraço (PMDB-ES) chegou a reclamar do pouco tempo disponível para que assuntos importantes como o trem-bala sejam discutidos pelos senadores. Ele ponderou que havia posições contraditórias entre os convidados para a audiência e que era necessário um debate aprofundado para dirimir todas as dúvidas. A mesma insatisfação foi expressada pelo senador Aloysio Nunes (PSDB-SP). 

Retorno econômico 

Terceiro a falar, o consultor Marcos Mendes informou que sua palestra era um resumo de dois artigos técnicos que produziu para o Centro de Estudos da Consultoria do Senado. Ele reconheceu que os trens-bala são "fantásticos, rápidos, confortáveis, seguros e pontuais", mas ressaltou que, por se tratar de um investimento significativo a ser financiado com dinheiro público, deve-se questionar a prioridade que o país dá a esse projeto.

- O dinheiro que vai ser colocado no trem de alta velocidade poderia ser colocado em outro investimento. Dinheiro não nasce em árvore. Existe no país uma série de investimentos em problemas de infraestrutura que, se resolvidos, vão dar um retorno econômico e social muito superior ao do trem bala. Só para citar alguns: saneamento básico, aeroportos, rodovias. Vale a pena gastar todo esse dinheiro público construindo o trem-bala? - questionou Marcos Mendes, economista de formação.

De acordo com o consultor, o custo total do empreendimento pode chegar a R$ 50 bilhões com o decorrer das obras, ficando de R$ 15 a R$ 35 bilhões a cargo do contribuinte. Com recursos dessa monta, frisou, o país poderia construir mais de 8 mil quilômetros de trens convencionais. Com R$ 25 bilhões, São Paulo dobraria o tamanho de sua rede metroviária, acrescentou.

Para o também economista Josef Barat, que apoiou a argumentação de Mendes, a discussão sobre a viabilidade do trem de alta velocidade desvia o foco de "questões mais importantes para o país", como a necessidade de mais investimentos no transporte de carga, o que aumentaria a competitividade das exportações brasileiras.

Ele afirmou que a Via Dutra, que liga o Rio de Janeiro a São Paulo, não está constantemente congestionada devido a carros ou ônibus de passageiros, mas sim por causa de caminhões transportando cargas diversas. Barat também classificou como "uma vergonha" a saturação dos acessos ao Porto de Santos e disse que os aeroportos nacionais estão há mais de dez anos sem investimentos. Segundo ele, seria melhor para o Brasil investir em trens comuns para passageiros e cargas.

- É um projeto concentrador de renda, atende a parcela muito pequena da população. Investir no barateamento do transporte de carga beneficiaria muito mais pessoas - afirmou Barat.

Por sua vez, Paulo Fleury, da Ilos, lembrou que a primeira justificativa para a construção do trem-bala foi a realização, da Copa do Mundo em 2014, mas, com a impossibilidade de as obras serem concluídas até lá, os defensores do empreendimento passaram a referir-se às Olimpíadas de 2016. Ele ressaltou, porém, que ainda há dúvidas quanto ao cumprimento deste último prazo.

Fleury também argumentou que o Brasil tem custo de transporte de cargas muito alto e que grande parte das estradas brasileiras precisa de melhor pavimentação e sinalização. Acrescentou ainda que os recursos públicos seriam mais bem investidos nas áreas portuária e hidroviária, entre outras.

- Com esses bilhões do trem-bala dá para fazer 300 quilômetros de metrô pelo país, atendendo a população pobre. O TAV vai atender os executivos a trabalho - disse Fleury.

Para ver a íntegra do que foi discutido na comissão, clique aqui.



12/04/2011

Agência Senado


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