Tucano se recusa a falar de 'baixaria'



 





Tucano se recusa a falar de 'baixaria'
O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, recusou-se ontem a comentar a afirmativa de Anthony Garotinho (PSB) de que ele arrecadou R$ 1 milhão num jantar com empresários e banqueiros. Em Ribeirão Preto (SP), onde foi participar de uma exposição agropecuária, o tucano limitou-se a dizer que não iria ''descer os degraus'' para chegar à ''baixaria'' do concorrente.

Serra também não quis falar sobre o provável vice na sua chapa: ''Ainda não está na hora de abordar esse assunto''. E em relação às últimas pesquisas, disse apenas que, por enquanto, ''elas não revelam nada''.

O candidato foi a Ribeirão Preto acompanhado dos presidentes do PSDB, José Anibal, e do PMDB, Michel Temer. Aproveitou a presença maciça de produtores rurais em Ribeirão Preto para elogiar a agricultura brasileira. Segundo o tucano, o setor contribui decisivamente para a economia porque ''garante a estabilidade dos preços, é gerador de empregos, estimula o desenvolvimento regional e produz um apreciável superávit comercial''.

Em busca de votos numa área onde não é muito forte, Serra percorreu na quarta-feira quatro distritos de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, em companhia do prefeito José Camilo Zito (PSDB), coordenador da campanha no Estado. O candidato à Presidência pelo PSDB gostou tanto da experiência que programou pelo menos uma visita por semana, sempre em campanha do prefeito, a outras localidades da Baixada Fluminense e do interior.

José Serra volta hoje ao Rio, para se encontrar, em Madureira, com representantes da Convenção Nacional da Assembléia de Deus, a denominação evangélica com maior número de seguidores no país. A Convenção Nacional já fechou seu apoio ao candidato, enquanto a outra facção, a Convenção Geral, com sede em São Paulo, pretende ouvir todos os pretendentes ao Planalto, antes de indicar um nome aos fiéis. Logo depois do encontro, Serra participa de um debate com empresários do comércio, no Flamengo.


Cresce pressão do mercado sobre Lula
Setor financeiro especula com vitória do PT

O mercado financeiro aumentou a pressão sobre a campanha eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT à Presidência da República. Depois de os bancos americanos Merril Lynch e Morgan Stanley desaconselharem a clientes negócios com títulos da dívida externa brasileira, ontem foi a vez de o holandês ABN Amro, dono do banco Real no Brasil, fazer a mesma recomendação. As análises das instituições baseiam-se na consolidação de Lula na disputa presidencial. Opetista lidera todas as pesquisas de intenção de voto, com índices que variam entre 32% e 39%.

A cotação dos títulos da dívida externa brasileira caiu ontem. Os C Bonds perderam 1,75% de seu valor e o risco Brasil subiu 3% - taxa maior que a da Venezuela, país que acaba de sofrer um golpe militar. Isso significa que ficou mais caro para o Brasil tomar novos empréstimos no mercado mundial. A Bolsa de Valores registrou queda de 4,17%, a mais expressiva do ano, influnciada, em parte, pela turbulência eleitoral.

Houve reflexo no câmbio e o dólar fechou ontem a R$ 2,397, a maior alta desde janeiro.

No fim da tarde, o presidente do ABN no Brasil, Fábio Barbosa, divulgou nota à imprensa. Afirma que a instituição não compartilha da posição dos analistas expressas no relatório. ''Entendemos que a economia brasileira tem fundamentos sólidos e defendemos o pluralismo de idéias como sendo vital no processo de evolução democrática'', afirma Barbosa na nota. Ele ressalva que essas análises são rotineiras e que os economistas são livres para interpretações. Segundo Barbosa, as operações do banco no Brasil somam 18% do faturamento mundial da instituição. Os analistas do banco rebaixaram o Brasil de uma posição ''positiva'' para ''neutra'' no mercado.

Lula reagiu à especulação financeira envolvendo a possibilidade de sua vitória na eleição de outubro. ''Tentar ligar a desvalorização de títulos à campanha política é a mesma coisa que tentar ligar a desvalorização a um jogo de futebol. Isso não existe'', afirmou, lembrando que os papéis brasileiros já tiveram queda no mercado quando ele não concorria ao Palácio do Planalto. ''O Brasil é um país grande economicamente viável, com potencial industrial extraordinário. A gente tem que estar muito mais preocupado em elaborar um modelo de desenvolvimento para o país voltar a crescer, do que ficar preocupado com o relatório de um banco.''

O presidente Fernando Henrique Cardoso disse a interlocutores considerar a avaliação dos bancos e suas cnsequências no mercado uma intromissão nos negócios internos do país. Ele está empenhado em mostrar que as contas públicas estão sob controle e que não há razão para a desconfiança externa. O chefe da missão do Fundo Monetário Internacional (FMI) no Brasil, Lorenzo Perez, ajudou o governo. Disse que o país está no rumo da retomada do desenvolvimento e que a inflação está domada.


PTB racha entre Ciro e Serra
BRASÍLIA - O PTB prefere o candidato tucano à Presidência, José Serra, a Ciro Gomes (PPS) em dez Estados do país. É o caso de Mato Grosso, Rondônia, Acre, Distrito Federal, Paraíba, Tocantins, Sergipe, Roraima, Piauí e São Paulo. O diretório de Goiás está dividido em duas correntes, mas nenhuma delas apresenta afinidades ''eletivas'' com Ciro Gomes. O candidato do PPS ainda tem a garantia de apoio nacional do PTB e do PDT, mas em 20 dos 27 estados a aliança partidária que o sustenta enfrenta divergências regionais.

Fecharam com Ciro Gomes os diretórios do PTB no Ceará, Maranhão, Rio Grande do Norte, Pará, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Rio de Janeiro, Paraná e Amapá.

Nem no PPS, partido de Ciro, há consenso em torno do nome dele. José Serra conta com a simpatia dos diretórios Acre, Espírito Santo e Sergipe. Nesses estados, o PPS é dominado por partidários do tucano. O diretório sergipano é controlado por Leonor Franco, mulher de Albano, governador do PSDB. No Espírito Santo, o diretório do partido é presidido pelo deputado federal Ricardo Ferraço, nome de confiança do senador Paulo Hartung (PSB), que por sua vez se dá muito bem com o candidato do PSDB.

O presidente do PPS, senador Roberto Freire (PE), considera ''completamente descartável'' a possibilidade de Ciro perder o apoio do PTB e PDT. Freire reafirmou ontem que não há hipótese de o partido retirar a candidatura. O senador também diz ser inviável uma união com o petista Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro turno. ''Não temos incompatibilidade com o PT e estou disposto a conversar, mas não para discutir retirada de candidatura'', diz Freire.

Mesmo em briga com Roberto Freire, o presidente do PTB, José Carlos Martinez (PR), e o líder nacional do PDT, Leonel Brizola, garantem que o apoio dos partidos a Ciro está mantido. Detalhe, essa a aliança partidária só caminha totalmente unida em sete estados. Roraima, Pará, Santa Catarina, Maranhão, Ceará, Piauí e Amapá.

Só em oito praças eleitorais o PTB, sigla que tem o ex-presidente Getúlio Vargas como símbolo, não está ligado a grupos políticos tradicionais, que se alternam há décadas no poder regional. No Amapá, as principais lideranças do PTB surgiram do movimento sindical. ''Somos diferentes mesmo do resto do país'', diz o secretário do partido no Estado, Pedro Braga.

O PTB é uma sigla sem importância e que vive à sombra dos governadores do PFL na Bahia, em Tocantins, no Amazonas e no Piauí. Os governadores Hugo Napoleão (PI), Siqueira Campos (TO) e José Bianco (RO) se consideram ''amigos pessoais'' de José Serra.

Ciro Gomes pode até ter palanque em Roraima, mas sabe de antemão que não é o preferido da turma que controla o Est ado. PPS, PTB e PDT apóiam Ottomar Pinto ao governo. O candidato a governador é marido da senadora Marluce Pinto (PMDB) e tem o voto do casal tucano Romero e Teresa Jucá, senador e prefeita de Boa Vista.


Garotinho critica jantar de Serra com empresários
''Diga-me com quem andas e te direi quem és.'' Foi com um ditado carregado de ironia que o candidato do PSB ao Palácio do Planalto, Anthony Garotinho, referiu-se ao ex-ministro da Saúde José Serra (PSDB), ao comentar um jantar com empresários e banqueiros, esta semana, no qual o tucano teria arrecadado US$ 1 milhão para a campanha presidencial. ''Serra é o nome da direita nestas eleições'', afirmou o ex-governador do Rio, com um penteado novo, moldado por muito gel. ''Ele finge que é de oposição, vive criticando o governo e deixa o presidente Fernando Henrique muito mal'', completou.

Garotinho participou de um encontro com jornalistas internacionais na sede da Associação dos Correspondentes de Imprensa Estrangeira no Brasil (ACIE). Classificou como ''impossível'' uma aliança com o PT de Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro turno. Tudo por causa do atrito com a governadora do Rio, Benedita da Silva. ''Fomos tratados por ela de maneira desleal e desonesta'', protestou. ''Não há possibilidade de entendimento.''

Os repórteres estrangeiros cobraram a opinião do candidato sobre relações internacionais. ''Se o Brasil voltar a crescer, será o líder natural da América Latina'', afirmou Garotinho, que não poupou o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush. ''Em vez de ajudar a resolver os confrontos mundiais, os americanos tomam partido e só acirram ainda mais as disputas'', avaliou. ''A política externa deles é equivocada e beligerante.''

O ex-governador prometeu adotar posição mais firme no cenário mundial, caso seja eleito. ''O Brasil deve orientar sua diplomacia para condenar nos fóruns internacionais os equívocos que temos visto'', disse, negando que a mudança possa ser interpretada como um ato antipático. ''Sem hostilidade, podemos marcar nossa presença'', declarou.

Garotinho passou a tarde de ontem num casarão no bairro da Gávea, gravando o programa nacional de televisão do PSB, que vai ao ar no dia 16 de maio.


PMDB insiste em Alves. Serra quer Simon
BRASÍLIA - O nome do deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) foi aceito ontem pelo candidato tucano à Presidência, José Serra para ser seu companheiro de chapa. Mas com uma condição - que o nome seja apoiado por todo o PMDB. Serra sugeriu ao presidente do partido, Michel Temer que aceite a sugestão feita pelo senador Pedro Simon (PMDB-RS) para nova tentativa de reunificação do PMDB. Simon é o nome preferido do ex-ministro da Saúde e está em franca campanha por adesões no PMDB. O candidato oficial à sucessão de Fernando Henrique acredita que a definição do vice estancará as especulações sobre o desempenho econômico do Brasil.

Serra só deu sinal verde para o nome de Henrique Eduardo ontem à tarde, depois de saber da agitação que tomou conta do mercado financeiro. O ABN AMRO Bank, seguindo exemplo dos bancos de investimento Morgan Stanley e Merrill Lynch, desestimulou seus clientes a negociar títulos da dívida externa brasileira em função das pesquisas eleitorais que indicam favoritismo de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, e estagnação de Serra.

Ontem, Simon iniciou uma ofensiva para emplacar como vice na chapa. Elogiou Serra chamando-o de ''candidato progressista'', ao mesmo tempo que criticou a tentativa do PFL de zerar a sucessão presidencial substituindo Serra por outro tucano, como Tasso Jereissati. ''Tasso é que representaria uma candidatura de direita, ao contrário de José Serra que segue uma linha progressista'', disse.

A reaproximação com o PFL é outra estratégia acertada por Serra com o PMDB. Nova investida para tentar trazer o PFL à aliança será realizada em almoço, terça-feira, na capital federal. Temer convidará os dois presidentes do PFL, Jorge Bornhausen e do PSDB, José Anibal para retomar as conversas. Mas descartará a idéia de retirar a candidatura de Serra.


Artigos

As agências têm razão
José Nivaldo Cordeiro

Economista
No começo dos anos 80, trabalhei na Serasa, a empresa que fornece análise de balanços aos bancos de crédito e faz o registro das ocorrências negativas das pessoas físicas e jurídicas, como protestos, pedidos de falência e concordatas. Cumpre uma importante função para o mercado. Na época, a cor da ficha cadastral sinalizava para os banqueiros e seus gerentes qual a potencialidade de crédito e de inadimplência das empresas analisadas. Se a cor fosse rosa, sem chances de crédito, pois aquela empresa poderia estar prestes a quebrar.

Se amarela, podia ter crédito, com garantias adicionais. Se verde ou azul o risco de calote seria mínimo e o crédito era liberado mais facilmente. Prestava-se um ótimo serviço ao mercado financeiro, classificando previamente a potencialidade de crédito de cada tomador.

Essas lembranças me ocorreram em virtude da postura de nossos governantes em relação ao rebaixamento da classificação do Brasil pelas agências internacionais. Com direito até a moção de repúdio por parte de membros do PT e declaração do ministro da Fazenda. Ora, tudo que se diga não afetará em nada a opinião daquelas agências. Elas funcionam como uma espécie de Serasa internacional, a serviço do mercado financeiro.

Mas se eu fosse um analista dessas agências internacionais, qual seria a minha recomendação em face da iminente vitória do PT? Em primeiro lugar, analisaria os fundamentos econômicos, para saber a situação em que se daria a transmissão de poder. Em segundo lugar, o histórico dos governos do PT. Em terceiro, os discursos e os documentos partidários. Por fim, o Programa Econômico do PT.

O Brasil depende da entrada anual de US$ 20 bilhões em capitais de risco para fechar as contas internacionais. Os credores não querem fazer empréstimos adicionais, na medida em que a relação dívida/PIB está em nível perigosamente alto. A carga tributária é tamanha que não poderá ser elevada facilmente sem uma rebelião. É explosivo o déficit da Previdência Social, que a cada mês bate recordes. Não é uma situação que dê tranqüilidade a quem concede créditos. Qualquer problema de financiamento internacional poderá deflagrar aqui um processo bastante parecido com o da Argentina. A chegada do PT ao poder poderia ser o estopim dessa explosão, precisamente pela escassez de investimentos internacionais.

Por onde passaram, os petistas marcaram a sua administração por forte elevação da carga tributária, por ação antiempresarial, por excesso de regulamentação, por promover a estatização, por procurar fugir da Lei da Responsabilidade Fiscal, por adotar a prodigalidade na administração do funcionalismo público, por hipertrofiar a regulamentação da vida econômica. Não é uma situação que inspire tranqüilidade para quem vai emprestar o seu dinheiro.

Os discursos e os documentos partidários são fartos em referências à denúncia do capitalismo, em acusações aos banqueiros e empresários, em ímpeto estatista e tributarista, em ojeriza ao livre mercado e à propriedade privada. Não é algo que recomende a liberação de créditos.

Finalmente, o programa econômico do PT. Lá está escrito com todas as letras que será feito o calote dos pagamentos internacionais e responsabiliza-se o mercado financeiro internacional por todos os males econômicos do país. Basta sublinhar esse ponto que trata do capital financeiro internacional, do maior interesse para as agências de crédito. É claro que uma declaração de intenção dessas simplesmente eliminaria qualquer disposição dos banqueiros a emprestar recursos para um governo petista. Se essas agências tivessem fichas como as da Serasa, teriam uma vermelha como aquele cartão que os árbitros de futebol usam para expulsar jogadores.


Colunistas

COISAS DA POLÍTICA - Dora Kramer

Sandálias para todos
Escaldado pela alta temperatura da cadeira onde sentou fora de hora e que lhe queimou pelos menos algumas centenas de votos na eleição para a Prefeitura de São Paulo, há 17 anos, o presidente Fernando Henrique Cardoso viu-se na obrigação de dar conselhos a Luiz Inácio Lula da Silva, na forma de recomendações sobre a humildade.

Muito generosa e até professoral a atitude do presidente, mas não vai adiantar nada. E, não, porque seja exclusividade do PT a irresistível tendência à arrogância quando se nos apresenta uma situação extremamente favorável na vida. É da natureza humana: por mais que tenhamos aprendido, de cor e salteado, a lição segundo a qual a soberba senta praça na ante-sala do fracasso, em festa de gala quem recebe as homenagens o faz sempre em cima de saltos altíssimos.

Pois, a despeito da propriedade ou não da intervenção do presidente da República - esquecido de que conselhos, não fossem para ser ignorados, seriam vendidos e não distribuídos -, é evidente que Lula vem assumindo ultimamente ares de presidente eleito.

Ares estes que não combinam com o discurso dele, cujo conteúdo é exatamente o oposto e guarda relação com a necessidade de se evitar o ''já ganhou''. O candidato fala isso sempre que se pronuncia em público, mas anda agindo com uma desenvoltura e uma certa empáfia que podem levá-lo a escorregões fatídicos.

É claro que ninguém precisa mergulhar no baixo-astral do PSDB, que só falta pedir desculpas porque acha seu candidato ruim na arte de fazer amigos e influenciar pessoas. Os tucanos agem feito aquele anfitrião que, de antemão, avisa sobre a má qualidade da comida em sua casa. Excelente maneira de garantir ausências, pois se ele, que é dono da casa, detesta o que se serve lá, não serão os convidados que se arriscarão a uma indigestão. Pois é assim que se sente o eleitor, ainda indeciso ante a postura do PSDB diante da candidatura de José Serra.

Posto que o exemplo tucano não deve ser seguido, o outro extremo, no qual começam a se reunir os petistas, também não é um terreno em que a prudência aconselhe ninguém a permanecer. Nem mesmo aqueles que não têm grandes vitórias a comemorar, mas apenas estão temporariamente mais bem posicionados que outros companheiros.

É o caso, por exemplo, da direção do PMDB em relação ao grupo chamado oposicionista, que perdeu rumo e posições. Integrante cada vez menos convicto desse grupo, o senador Pedro Simon propôs ontem que o comando pemedebista deixe o orgulho de lado e procure aqueles que até há pouco lhe faziam ferrenha oposição.

Se dos vencedores, dentro do PMDB, não se pode tirar certa razão quando se recusam a entregar posições importantes - como a vaga de vice na chapa de Serra - aos perdedores, é impossível negar alta dose de bom senso à sugestão de Pedro Simon. Sempre se poderá argumentar que o que o move é o desejo de ser ele o vice.

Pois muito bem, então se aponte nesse mundo algo ou alguém que não se mova por interesse específico e teremos um extraterrestre. Aqui, pouco importam os motivos de Simon, mas o conteúdo da proposta, porque de fato já não cabe o alongamento de divergência dentro de um mesmo partido, ainda mais quando a direção, ao ser eleita, disse, com todos os efes-e-erres, que lutaria pela unidade.

Os chamados governistas acusavam Itamar Franco e seus adeptos de incentivadores da divisão. Pois estão, agora, diante de boa oportunidade de aproveitarem o conselho de FH a Lula e perceberem que o momento aconselha a todos a vestimenta de resistentes, básicas e confortáveis sandálias que permitam a travessia dos próximos meses por caminhos menos festivos, mas, certamente, mais seguros daqui até a eleição.

Anistia adiada
Na próxima terça-feira as associações de anistiados farão grande reunião na Câmara dos Deputados, com dois objetivos: conseguir a votação e aperfeiçoamento da medida provisória que criou comissão especial para examinar processos de pedidos de anistia de gente comprovadamente perseguida pelo regime militar e pleitear a liberação do pagamento de indenizações já aprovadas pelo Ministério da Justiça.

Nesse último caso, estão cerca de 60 pessoas cujos processos de anistia já foram aprovados e homologados por aquela instância, sem que as indenizações tenham sido pagas até hoje. A despeito de a aprovação do pedido pela comissão de anistia, com posterior aval do ministro, ser equivalente a uma ordem expressa para pagamento, o Ministério do Planejamento vem postergando a liberação do dinheiro, criando a desconfiança de que a União está querendo não apenas protelar ao máximo esses pagamentos, como também se esquivar de pagar os valores de fato devidos.

Para um governo que se orgulha da ênfase na questão dos Direitos Humanos, trata-se de uma postura não apenas incongruente como altamente desrespeitosa a brasileiros que esperam o resgate dos malefícios impostos pela ditadura. Sem isso, lembra o advogado José Oscar Pelúcio - há 23 anos no aguardo de uma anistia agora já aprovada -, ''não se completa o ciclo da redemocratização''.


Editorial

CONGRESSO

O Congresso terá de salvar pelo menos as parências se não quiser deixar ao sol e à chuva deputados e senadores interessados na renovação do valioso mandato que chega ao fim. A prioridade absoluta - atestada pelas pesquisas de opinião pública - é o desemprego e a insegurança. A campanha eleitoral vai aguçar a reivindicação de emprego e segurança mas o Congresso não poderá corresponder à expectativa criada no começo do ano, quando a curva da criminalidade chegou ao apogeu e a cidadania se sentiu desamparada da lei.

O relatório final da Comissão Mista de Segurança Pública foi entregue aos presidentes da Câmara e do Senado, mas o tempo disponível ficou curto: dos 24 projetos encaminhados, três emendas constitucionais serão adiadas pela dificuldade de garantir quórum qualificado. Diz o senador Ramez Tebet que votar meia dúzia ''já seria bom demais''. Para o cidadão, é desalentador ouvir isso.

O ponto de vista do cidadão é outro: o Congresso não se deu conta do potencial da insegurança na sociedade.

Ou se esqueceu de que haverá eleições gerais. O crime organizado comprova diariamente que a segurança é deficiente e desorganizada. Já se perdeu tempo demais com a falta de objetividade. Empilharam-se durante anos centenas de iniciativas nas gavetas e comissões.

Aécio Neves e Ramez Tebet trancaram-se por uma hora e resolveram que cada Casa vote as próprias iniciativas, a título de satisfação à opinião pública exasperada pelo cotidiano do crime nas cidades. Para não confirmar a falta de sensibilidade parlamentar, o Congresso pode dar conta nos últimos 60 dias úteis de um conjunto com peso no combate ao crime. Quando nada, dada a impossibilidade anunciada de aprovar os projetos relativos ao porte de arma, ao tráfico de drogas, ao seqüestro-relâmpago, às penas para casos de corrupção e à unificação das polícias, algumas medidas de impacto emocional coletivo.

O relator--geral, deputado Moroni Torgan (PFL), abre uma janela de esperança para os cidadãos quando lembra que ''existem os ritos regimentais'' mas declara que ''o rito político pode superar tudo isso''.

É o que os cidadãos, a serem tratados como eleitores nos próximos cinco meses, queriam ouvir. Se faltou sensibilidade política para apressar a votação, ainda que parcial, de tantas iniciativas apresentadas para marcar presença, é tempo de salvar mais do que as aparências com deculpas. Tempo havia, e o que faltou foi disposição .

Não pode é a sociedade continuar exposta à criatividade do crime e à inibição legislativa do Congresso. A estatística cresce enquanto parlamentares divergem . Se não há tempo normal, que o fabriquem.


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05/03/2002


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