USP debate com a sociedade o papel da universidade pública
Durante dois dias, especialistas de várias áreas discutiram na USP a atuação da universidade e o futuro do País
O Brasil despontará entre as grandes economias no ano 2050, segundo estudos de Jim O´Neill, da Goldman-Sachs. Hoje, o País integra o grupo denominado BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), mas o crescimento econômico brasileiro tem apresentado decréscimo nas últimas décadas. O crescimento do PIB brasileiro per capita (de 1996 a 2005) é de apenas 1,3%. O da China, no mesmo período, 7,7%, da Índia, 4,4% e o da Rússia, 4,3%. O índice brasileiro chegou a 3,9% no período 1950-1979.
Para discutir a situação econômica e o papel da universidade pública no esforço para inserir o Brasil entre as grandes nações emergentes foi realizado o Simpósio Presença da Universidade no Desenvolvimento Brasileiro, uma Perspectiva Histórica, na Cidade Universitária. Durante dois dias, especialistas de diversos setores – produtivo, governamental, acadêmico e da sociedade civil – debateram as principais questões sobre o papel da universidade pública.
De acordo com Shozo Motoyama, realizador do simpósio, o evento teve como objetivo mostrar como as forças sociais e políticas agem dentro da universidade e como ela pode interagir com a sociedade, sem perder a liberdade acadêmica.
O simpósio foi dividido em quatro grandes painéis: Documento Setor Produtivo; Documento Sociedade Civil, Documento Governo e Documento Universidade. O painel Documento Setor Produtivo contou com a presença de diversos segmentos da cadeia produtiva: Associação Brasileira das Indústrias Eletroeletrônicas (Abinee); Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (CTEEP). Do encontro saíram alguns documentos que serão encaminhados aos governos estadual e federal e às cidades que abrigam os campi da USP. Esses documentos têm como finalidade mostrar a diversidade do ensino universitário no Estado de São Paulo e como seus profissionais podem ajudar no desenvolvimento do País. Motoyana calcula que, em aproximadamente três meses, o documento final do encontro será transformado em livro.
Fator tempo
Para o diretor do Ciesp-Fiesp, Nelson Luis de Carvalho Freire, os principais entraves para a integração da universidade com o meio produtivo são o fator tempo e a falta de mão-de-obra qualificada para os postos de trabalho que existem na indústria. O executivo explicou que os maiores desafios da indústria brasileira no mercado global são os ganhos em escalas globais, ambientes produtivos mais competitivos por causa das condições fiscais e financeiras; e a maior oferta de mão-de-obra qualificada e com menores encargos tributários.
Outros fatores apontados para a perda na corrida global do Brasil são os pertinentes à infra-estrutura do País, além da falta de marcos regulatórios, que geram riscos adicionais nas decisões de investimentos produtivos.
Para o presidente da Abinee, Humberto Barbato, outro fator que impede o avanço da economia brasileira é a demora na concessão de patentes. Nos Estados Unidos, no período de 2004 a 2006, foram concedidas 248.731 patentes, enquanto no Brasil, somente 304.
Entre os países pertencentes ao BRIC, a Índia apresentou evolução de 55% nas concessões de patentes, a China, 59%. Já o Brasil recuou 9%.
No setor de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação, o Brasil investe somente US$ 9, 6 milhões ao ano, enquanto os Estados Unidos investiram, no ano passado, US$ 338 milhões. Freire explicou que 66% das empresas brasileiras não investem na área de inovação, o que leva a indústria instalada no País a apresentar um ambiente empresarial fragilizado, baixa escala produtiva e sedentarismo tecnológico.
Doutores nas empresas
O número de doutores e mestres cresceu no Brasil na última década. Hoje, existem no País 13 mil doutores que publicam 18 mil artigos científicos por ano. Esses números são compatíveis com os dos países industrializados, mas parte desse contigente continua no magistério e nos departamentos de pesquisa. “A maioria das empresas não contrata doutores, porque consideram o seu custo alto”, explicou o professor Glauco Arbix (Coordenador do OIC-USP). Para o presidente da CTEEP, José Sidnei Colombo Martini, “é preciso adequar a carga horária dos mestrandos e doutorandos para receberem treinamento nas indústrias e, dessa maneira, conseguir capacitar os profissionais em suas diferentes competências”.
Pessimismo
O doutor Crodowaldo Pavan (professor emérito da USP) está pessimista com a situação das universidades. Acredita que o modelo adotado dentro dos centros acadêmicos “está sucateado e defende a formação de profissionais com senso crítico, não apenas de administradores excelentes que aumentem o lucro das empresas”.
“O princípio da autonomia deve ser defendido pelos agentes que trabalham dentro das universidades, mas elas devem ter consciência do seu papel no âmbito social e ver os novos desafios não como obstáculos, mas como meio para melhorar a qualidade de ensino. Hoje, a formação plena deve estar baseada no tripé ciência básica, técnica e humanidades”, argumentou o professor doutor Edgard Salvadori di Decca, reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Ações futuras
Do encontro foram levantados os seguintes pontos para futuras ações: a defesa da autonomia financeira da universidade pública; a criação de um fórum para a análise dos mecanismos internacionais que favorecem a interação universidade-sociedade, em particular nas economias emergentes; manutenção e reforço dos mecanismos nacionais que beneficiem a interação universidade-sociedade, e que já demonstram sua eficácia, como os Institutos de Ciência e Tecnologia; melhoria do ensino fundamental e médio e a revisão da estrutura organizacional da universidade, em relação ao modelo departamental; regimes de trabalho e a sistemática de avaliação dos docentes.
Maria Lúcia Zanelli
Da Agência Imprensa Oficial
(I.P.)
10/08/2007
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