Votação do Orçamento avança devagar







Votação do Orçamento avança devagar
Obstruções, brigas regionais e exigências de bancadas tumultuam sessão da comissão

BRASÍLIA – A Comissão de Orçamento aprovou ontem mais de 200 mudanças no texto, que haviam recebido parecer favorável do relator, deputado Sampaio Dória (PSDB-SP). No total, as alterações representam gasto de mais de R$ 540 milhões. No fim da noite, a comissão rejeitou um conjunto de 1.041 emendas do deputado José Carlos Aleluia (PFL-BA), que propunha um corte geral de investimentos da proposta orçamentária de 2002 no valor de R$ 1,8 bilhão.

As emendas tinham por objetivo abrir espaço para que o presidente Fernando Henrique Cardoso pudesse sancionar, sem risco de desequilíbrio entre receitas e despesas, o projeto de lei que reajusta em 17,5% a tabela de descontos do Imposto de Renda Pessoas Física.
Os problemas não ocorreram apenas por causa da obstrução e de exigências da oposição. Brigas regionais atrapalharam os trabalhos. A reunião da comissão foi suspensa, por exemplo, por uma rixa entre o governador de Mato Grosso, Dante de Oliveira (PSDB), e o presidente da comissão, senador Carlos Bezerra (PMDB-MT).

Os aliados de Dante estavam contrariados, pois Dória havia acatado destaques de Bezerra no total de R$ 15,3 milhões, além de R$ 2,7 milhões de sua mulher, deputada Tetê Bezerra. O governador não conseguiu impedir que seu adversário aprovasse as emendas. Mas congressistas a ele ligados foram contemplados com emendas no valor de R$ 14 milhões.
Dória não conseguia fechar as contas para contemplar com previsão de recursos todas as bancadas. Ele havia distribuído R$ 540 milhões para recompor parte dos cortes feitos nas emendas de comissões e de bancadas estaduais para garantir o reajuste do salário mínimo. Com o descontentamento dos governistas, o relator fez novo corte.

O relator reduziu de R$ 4,5 milhões para R$ 1,5 milhão o atendimento do destaque do vice-líder do governo no Senado, Romero Jucá (PSDB-RR), que pretendia elevar de R$ 35 milhões para R$ 40 milhões o total de recursos do Tribunal de Contas da União (TCU) para implementação do plano de carreira dos servidores. Foram cortados R$ 7 milhões dos R$ 14 milhões para obras no âmbito do Ministério do Desenvolvimento Urbano.
Outros três destaques que tiveram os recursos reduzidos foram eram do deputado Paulo Kobayashi (PSDB-SP), coordenador da bancada paulista.

Para fechar um acordo, o presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), foi à comissão e convidou os líderes para uma reunião em seu gabinete. Foi mais uma tentativa de acordo. A oposição aproveitou para fazer exigências. Numa nota intitulada Transparência no Orçamento, os oposicionistas ressaltaram a necessidade de “austeridade fiscal” e apresentaram cinco pontos para abrir negociação.


Governo chega ao limite e não negocia mínimo
Oposicionistas insistem em R$ 220, mas aliados têm pressa e não vêem como cobrir rombo maior

BRASÍLIA – Após várias tentativas frustradas de negociar com a oposição, o governo partiu para o “tudo ou nada” e desistiu de buscar uma forma de tornar viável um novo aumento para o salário mínimo. “Não se trata de não querer negociar, mas é que já temos algumas dificuldades neste Orçamento, que somam R$ 4,6 bilhões e precisamos resolver”, ponderou o ministro do Planejamento, Martus Tavares.

Ele lembrou que ainda é preciso encontrar recursos para cobrir as perdas com o reajuste da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (R$1,8 bilhão), a não aprovação da contribuição previdenciária dos inativos (R$ 1,4 bilhão) e o novo aumento do mínimo, de R$ 180 para R$ 200 (R$ 1,4 bilhão). “Está na hora de concluirmos as votações e aprovar o Orçamento, e não de reabrirmos as negociações.”

A oposição quer subir o mínimo até R$ 220. O governo alega que só pode oferecer R$ 200, dado o custo para a Previdência. “Isso não é uma reivindicação. É capricho, pirraça, malcriação”, criticou o secretário-geral da Presidência, Arthur Virgílio, dizendo que o governo não dará “nem mais um real” para o mínimo. “Parece que confiam tanto na política econômica deste governo que perderam o medo da crise argentina”, ironizou.

Para ele, “é uma bondade falsa, fraudulenta e socialmente perversa” a proposta de aumentar em mais R$ 10 o mínimo. “Seria mais um rombo, que tornaria o Orçamento inconfiável, deteriorando a confiança no Brasil”. O aumento do mínimo para R$ 200 beneficiará 13,5 milhões de aposentados e pensionistas da Previdência. Os gastos do ministério em 2002 serão ampliados em R$ 1,216 bilhão, pelos cálculos do governo.

Tempo – Tanto Martus como Virgílio insistiram na necessidade de votar o Orçamento o quanto antes. “Estou de plantão, mobilizando a base para a votação”, disse o ministro, que está telefonando para líderes e parlamentares. “Fazemos um apelo à base para que vote na comissão e em seguida no plenário, de preferência nesta semana.” Virgílio afirmou que continuará a falar com os oposicionistas. “Se o Orçamento não for aprovado, a derrota não será da oposição, será do crescimento economia e do povo.” Ele avisou que, se a votação não terminar este ano, o presidente Fernando Henrique Cardoso não convocará o Congresso extraordinariamente depois do dia 7, data final da auto-convocação.

Martus afirmou que a aprovação do Orçamento até o fim do mês é “importante para os investidores, um sinal de responsabilidade”. Na sua avaliação, esse “sinal” ajudará a diferenciar o Brasil da Argentina.

Caso o Orçamento não seja aprovado, observou, só poderão ser liberados os recursos para ações continuadas – pagamento de pessoal, juros da dívida pública e transferências constitucionais para Estados e municípios. “A compra de livros didáticos, por exemplo, seria uma das ações prejudicadas”, contou. Além do Orçamento de 2002, Martus tem pedido aos parlamentares que votem os 60 projetos que alteram o Orçamento de 2001 ainda pendentes. Metade deles já foi aprovada na Comissão Mista do Orçamento, mas falta votá-los em plenário.


Comissão decide vetar repasses a obras irregulares
BRASÍLIA - A Comissão de Orçamento aprovou ontem um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) que considerou irregulares cerca de cem obras para as quais foram destinados recursos federais. Agora, essas obras só serão contempladas com mais verbas após sanadas as irregularidades.

Conforme a auditoria do TCU, 39,8% das obras auditadas, que constavam do Orçamento de 2001, estão com irregularidades graves em seu processo de execução. Os problemas maiores concentram-se no extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER).
De 86 obras administradas pela autarquia que passaram pela investigação, 40 tinham problemas. Entre elas, a duplicação da BR-060, que liga Brasília a Goiânia, no trecho do Distrito Federal. A terraplanagem já apresenta sinais de erosão. Entre as irregularidades, destacaram-se: superfaturamento, dispensa indevida de licitação e aditivos irregulares.

Denúncias - A bancada de Alagoas denunciou a liberação de dinheiro para seis obras irregulares no Estado. O mesmo fizeram parlamentares de Minas e de Sergipe. O Ministério Público foi acionado pela oposição e acompanha o desenrolar das apurações. O Fórum Trabalhista de São Paulo também está na lista. A bancada paulista destinou R$ 15 milhões no Orçamento do ano que vem para a manutenção do prédio, mas a Comissão de Orçamento decidiu não fazer o repasse e, agora, o dinheiro só será liberado depois de auditoria do TCU e de aprovação pelo Congresso do envio do dinheiro.

Com o veto à liberação do dinheiro para o fórum de São Paulo, há sério risco de as ob ras não serem retomadas no próximo ano, como era esperado. De acordo com o presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região da capital (TRT-SP), juiz Francisco Antônio de Oliveira, falta vontade política para resolver a questão. Para a conclusão da obra, serão necessários mais R$ 40 milhões.


Candidato, Alckmin não quer fazer campanha
Governador diz que, se disputar a reeleição, não pedirá licença do cargo

O governador Geraldo Alckmin (PSDB) afirmou ontem que não pretende fazer campanha eleitoral, caso o partido confirme sua candidatura à reeleição. "Tem é de trabalhar", declarou, depois de ressaltar que o presidente Fernando Henrique Cardoso "não precisaria ter feito" campanha em 1998. "Quem é governo é governo. Quem achar que o governo está indo bem, mantenha o governo. Quem achar que não está, troque."

Alckmin não demonstra nenhuma intenção de se licenciar do cargo para a disputa no ano que vem. Pelo contrário, e alega não temer acusações de uso da máquina. "É da lógica da reeleição que as pessoas disputem no cargo. Já imaginou o Bill Clinton pedir afastamento? O Tony Blair?", disse o governador. O partido deverá poupar-lhe o constrangimento de não seguir o exemplo do antecessor, Mário Covas, que se afastou do governo cerca de 4 meses antes da última eleição. "Vou apresentar em janeiro uma moção para que o PSDB recomende ao governador que permaneça no cargo", afirmou ontem o presidente regional da legenda, deputado Edson Aparecido.

"Quem vai fazer a campanha é o partido", completou Aparecido. "Alckmin não tem um vice como tinha Mário Covas. O governador vai mostrar a cara nas ações de governo, que nós, tucanos, vamos capitalizar politicamente." Na prática, segundo ele, a campanha será feita durante o horário eleitoral gratuito no rádio e na TV e, prioritariamente, pelos cerca de 150 candidatos a deputado federal e estadual.

O governador participou ontem da assinatura de um convênio para tratamento oftalmológico de idosos no Centro de Referência do Idoso, em São Miguel Paulista, na zona leste. "Trata-se de uma questão conceitual e, se ele está dizendo que não fará campanha, não fará mesmo", comentou o presidente da Assembléia Legislativa de São Paulo, Walter Feldman (PSDB), que acompanhava o governador.

Alckmin também disse duvidar da antecipação do afastamento do ministro da Saúde, José Serra, provável candidato tucano à Presidência.
Serra está sendo pressionado a deixar o cargo para entrar em campanha no fim de janeiro, mas o prazo legal de desincompatibilização é 6 de abril. "Acho que ele (Serra) sai no prazo final, mas essa é uma decisão dele."


PSDB reforça esquema de divulgação em São Paulo
O PSDB paulista está reformulando toda a sua estrutura de comunicação e se prepara para uma “operação de guerra”, de olho nas eleições. A partir de janeiro, o partido vai distribuir um boletim semanal com tiragem de 10 mil exemplares sobre as ações dos governos tucanos, especialmente o do governador Geraldo Alckmin (SP), candidato à reeleição. “Vamos municiar os militantes e representantes do partido com todas as nossas conquistas e apontar os erros dos adversários”, explica o presidente regional do PSDB, deputado Edson Aparecido.

Em janeiro, os tucanos deverão também inaugurar um novo endereço eletrônico na Internet, com todas as informações necessárias para que o militante possa fazer “a defesa da social-democracia”, diz Aparecido. A ofensiva, entretanto, já começou. Na convenção estadual da legenda, no início do mês, foi distribuída a revista Tucano São Paulo. A publicação é a estréia do boletim, que terá o mesmo nome.

A revista tem 32 páginas, com realizações do partido em todas as esferas de governo. Integram o material uma entrevista com o ministro da Saúde, José Serra, e outra com o ministro da Educação, Paulo Renato Souza. Serra é cotado para disputar a Presidência e Paulo Renato, uma vaga no Senado.

“Estamos tentando enfrentar um dos maiores problemas do partido, a dificuldade de se comunicar e divulgar suas ações”, explica o deputado. Segundo ele, a deficiência é constatada desde o início do primeiro governo Mário Covas, em 1995. Como exemplo da dificuldade, ele cita a derrota de Alckmin no bairro de Guaianazes (zona leste), na disputa pela Prefeitura da capital, no ano passado. “Nós levamos o Metrô até lá, construímos um novo hospital na região e não conseguimos capitalizar essas ações.”

Estratégia – O boletim é parte da estratégia tucana que pretende manter Alckmin no cargo e transferir a campanha eleitoral para os candidatos a deputado e militantes do partido. Na prática, governo e partido procuram uma “sintonia fina” para preparar a sucessão. Há algum tempo, os tucanos têm centrado esforços na zona leste da capital, por exemplo.
“Continuamos com a estratégia de investir na zona leste, como sempre fizemos, mas com competência política”, disse o presidente da Assembléia Legislativa, deputado Walter Feldman (PSDB), referindo-se ao fato de que o governo deverá mostrar o que faz “com publicidade, mas com escrúpulo”.

Ontem, o governador esteve em São Miguel Paulista para assinar um convênio para atendimento oftalmológico a idosos. Em fevereiro, Alckmin vai inaugurar uma Faculdade de Tecnologia (Fatec) em Cidade AE Carvalho, também na zona leste. “Será uma faculdade histórica num local onde vivem 4,3 milhões de pessoas”, disse Alckmin.
Segundo Edson Aparecido, o partido cresceu no Estado, no último ano, de 80 mil filiados para 145 mil. Nas eleições de 2000, elegeu 232 prefeitos e 1.700 vereadores. “Depois de 12 anos, o partido consolidou-se no Estado com 643 diretórios nas 645 cidades”, comemorou. “Além disso, temos a maior bancada na Assembléia, com 23 deputados.”

Para garantir a continuidade, cada candidato a parlamentar – pelo menos 150 – vai levar o nome de Alckmin para os recantos do Estado e ser cabo eleitoral de si e do governador. A intenção é apresentar candidatos de todas as 43 regiões do Estado. Fator importante também será a realização de alianças locais que vão dar “musculatura” à disputa.
Os tucanos já contam com o auxílio de partidos aliados. Entre eles, o PTB. O líder da legenda na Assembléia, deputado Campos Machado, promete reforço. “Já visitei 297 cidades do Estado e levei, além do PTB, o nome de Alckmin.”


PT antecipa ressaca no Rio
No fim da eleição municipal de 2000, o PT depositou todas as suas esperanças e desesperanças da campanha de 2002 no desempenho dos prefeitos eleitos naquele ano. Pelo menos um deles, Marcelo Déda, de Aracaju, avisou que a expectativa era um erro e declarou que tinha sido eleito prefeito e não vitrinista de shopping center.
A alta rejeição do candidato petista à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, medida pelo instituto Datafolha exatamente nas principais cidades administradas pelo PT, indica que Déda estava certo ao rejeitar a responsabilização dos prefeitos por erros ou acertos do partido no âmbito federal.

O que o prefeito de Aracaju não previu, porém - nem poderia -, é a sinuca em que os petistas se envolveram no Rio, tendo como origem a malsucedida aliança em 1998 com o PDT, onde estava o governador Anthony Garotinho.
Que o partido de Leonel Brizola nunca deu sorte ao PT, a História já registrou. Mas, justiça se faça, Brizola, deliberada e pessoalmente, jamais montou uma armadilha como a que Garotinho pretende deixar nas mãos de sua vice, Benedita da Silva, assim que - e se realmente - deixar o governo para concorrer à Presidência.

Será em abril e, com precisão, o sociólogo e atual responsável pela montagem da transição em nome do PT, Luiz Eduardo Soares, definiu a situação: "Abril está vindo na nossa direção como uma carreta desgovernada."
Essa franqueza e essa consciência talvez sejam o caminho certo para que o PT consiga se prevenir e evitar o desastre que se avizinha e pelo qual Garotinho anseia fortemente. Há algum tempo o governador já havia tomado e anunciado a decisão de não deixar um só secretário para ajudar Benedita na administração do Estado, enquanto dizia que, se ela concorresse ao Senado e o substituto no governo fosse um aliado como o presidente da Assembléia Legislativa, Sérgio Cabral Filho, manteria a montagem do governo intacta.

Ou seja, de boas intenções é que o governador não está com o PT. Sabe que o Orçamento estadual está blindado pela Lei de Responsabilidade Fiscal, tem consciência de que os melhores quadros petistas não poderão integrar o governo - pois também disputarão eleições -, e acredita que essa conjunção leve Bené a um governo no mínimo medíocre. O suficiente para não apenas ressaltar comparativamente as vantagens do anterior, como também para atrapalhar a vida de Lula, levando em consideração aquela idéia de fazer das administrações petistas vitrines reluzentes da campanha presidencial.

Ora, se o plano der certo e juntarmos isso à rejeição de 37% de Lula em São Paulo - boa parte dela atribuída à gestão de Marta Suplicy na Prefeitura -, o quadro será péssimo para o PT em dois dos maiores colégios eleitorais do País.
Pode-se até discutir o que achará o eleitorado de um governador que dá prioridade às picuinhas políticas em detrimento do destino do Estado. Mas esta é uma outra história, que também implicaria inocentar completamente o PT na briga com Garotinho e na estratégia de forçar Benedita, que queria o Senado, a assumir e disputar o governo.

Mas a questão já não é mais o que poderia ter sido e sim o que já está feito. E esse cenário Luiz Eduardo Soares mostra que enxerga com nitidez, ao citar a imagem da carreta desgovernada.
Nessa altura, ao perceber com clareza o jogo, o PT pode agir preventivamente, tanto na escolha do tipo de administração, quanto na montagem de uma aliança política qualquer que não deixe o partido isolado.

A bomba de efeito retardado montada por Garotinho será mais poderosa se o PT sofrer ataques de outras áreas. Já se fala em conversas de Benedita com César Maia e com Marcello Alencar, do PFL, e do PSDB, adversários na campanha presidencial.
Mas fato é que os tucanos talvez não sejam aliados tão difíceis assim de conquistar. De amores pelo candidato de César Maia, Eduardo Paes, não morrem. Acham o rapaz muito verde. E, a respeito do próprio candidato do PSDB, José Camilo Zito, há dois problemas: a péssima imagem do prefeito de Caxias na cidade do Rio e a disposição do próprio de trocar o certo pelo duvidoso.

Quem sabe por aí - já que os tucanos preferem Lula no segundo turno e não têm interesse em incensar Garotinho - o PT consiga se desviar da rota da carreta desgovernada nos idos de abril.

Afinal, a pólvora Os conselheiros da comunicação do Planalto descobriram, afinal, a pólvora e avisaram ao presidente da República que a população não consegue entender quais foram mesmo os benefícios e em que rumo esse governo pôs o Brasil.
Em boa medida culpa de suas sapiências governamentais, que passaram a maior parte desse tempo convencidas de que estavam fazendo o bem, o que dispensava explicações.


Projeto obriga escolas a alertar sobre tortura
BRASÍLIA - Um projeto de lei do deputado Nilmário Miranda (PT-MG) apresentado este mês obriga as escolas e universidades a oferecerem cursos de esclarecimento sobre o crime de tortura. A proposta prevê que as delegacias de polícia deverão fixar em seu interior cartazes com o número da lei e o telefone 0800-707-5551, que já funciona em 20 Estados para receber denúncias. Na Câmara, tramitam 36 projetos sobre o assunto. O disque-denúncia, iniciado em outubro, recebeu 549 denúncias apenas no primeiro mês de funcionamento.


Artigos

Infeliz IPTU novo
ROBERTO MACEDO

A proposta do iPTu, a versão petista do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), era originalmente tão ruim que os vereadores governistas tiveram de aceitar várias modificações no seu texto para garantir sua aprovação pela Câmara Municipal na madrugada do dia 22. Entretanto, as emendas, ainda que majoritariamente na direção correta, não conseguiram ir a fundo na correção dos sérios defeitos do projeto original. Com isso, os que ficaram com a conta do imposto - 1,4 milhão de propriedades de um total de 2,5 milhões - começarão o ano pagando bem mais à Prefeitura, e todos os munícipes conviverão com as injustiças e distorções impostas pelo imposto, algumas herdadas do passado, e agora agravadas. Isso ao lado de uma novidade, a progressividade no cálculo do tributo, apenas enganadora na sua roupagem de justiça social.

No meio do rolo compressor montado para aprovar o projeto, houve histórias que a imprensa vem buscando elucidar, como a da rebeldia de um vereador petista, Carlos Giannazi, ameaçado de expulsão do partido, e a da adesão ao iPTu de um vereador malufista, Edivaldo Estima. Este o seu partido, o PPB, também ameaçou botar fora. Ainda não se sabe se o vereador Edivaldo, agora estimado pelo PT, verá essa estima traduzida num convite de adesão partidária. Outra história interessante é a da emenda que transformou em isentos os chamados "templos locados", um assunto de interesse da bancada evangélica, cujos cinco membros votaram com a prefeita. Talvez impregnado pela ingenuidade de um anjo natalino, atrevo-me a perguntar: essa isenção será vetada?

O valor venal de um imóvel residencial, para isenção, caiu de até R $65 mil, na proposta, para o limite de R$ 50 mil, o que contribuirá para reduzir de 1,6 milhão para 1,1 milhão o número de propriedades isentas, relativamente à proposta original. E mais: aos imóveis com valor entre mais de R$ 50 mil até R$ 120 mil será dado um desconto de R$ 20 mil antes do cálculo do imposto.

Como os primeiros R$ 50 mil de valor venal não deixam de ser tributados para todos, permanece o problema do degrau inicial da tabela, além de surgir agora outro degrau no limite de R$ 120 mil. Fiquemos apenas no primeiro: um imóvel residencial com valor venal de R$ 50 mil nada paga. Se valer R$ 51 mil, pagará R$ 248, embora sejam muito frágeis os critérios usados para definir essa pequena diferença de valor venal entre os dois imóveis.

Caiu agora a isenção proposta para terrenos vazios, estacionamentos e garagens com valor venal até R$ 20 mil, corrigindo-se um cochilo da Prefeitura, em particular caso das garagens, pois muitas, ainda que com escritura e IPTU separados, estão associadas a apartamentos e salas tributados enquanto tais. Aliás, não seria cochilo se o IPTU fosse, como deveria ser, um tributo também voltado para bem disciplinar o uso do solo.

Nesse caso, a isenção das garagens seria até defensável, pois que um estímulo à sua construção e manutenção, com o que se diminuiria o uso das vias públicas para estacionamento. A preocupação, contudo, resume-se em arrecadar mais, e fazer a tal "justiça social", o que não abre espaço para soluções mais inteligentes.

Caindo de importância nas modificações, houve, para imóveis não-residenciais, a "redução" de 80% (!) para 75% (!) do teto de aumento em relação ao IPTU de 2001. O "limite" para os de uso residencial ficou nos 60% (!) da proposta do Executivo.

E veio a progressividade do tributo, uma idéia defensável se aplicada à renda e à riqueza pessoal total, mas inadequada ao IPTU, que tem como base apenas a propriedade imobiliária. É frágil a correlação entre o valor desta e a renda ou riqueza pessoal total de seus proprietários. Além disso, o ônus do IPTU é transferido a inquilinos e aos que adquirem bens e serviços cujo custo total tenha como componente o uso de um imóvel. Como resultado dessa miopia da progressividade, haverá pessoas de renda baixa pagando IPTU alto, inclusive miseráveis que ocupam cortiços tributados em função de sua área total. Outras, inclusive as mais pobres, pagarão os acréscimos de custo embutidos nos preços dos diversos bens e serviços afetados. Neste último caso, cabe um exemplo, dado pela Lorenzetti, empresa conhecida pelos chuveiros elétricos que produz. Seu IPTU subiria de R$ 250 mil para R$ 765 mil, segundo informou à imprensa o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva. Com o "limite" de 75%, o imposto ficará em R$ 437,5 mil, um acréscimo que a empresa vai transferir para os preços, com o que teremos muita gente pobre tomando banhos de iPTu. Isso se a Lorenzetti não perder competitividade, diminuir empregos ou até fechar ou os transferir para cidades mais preocupadas em ampliar seu número.

Aprovou-se, enfim, uma idéia mal explicada, e bem distorcida na sua aplicação. Muitos se iludirão com a condição de isentos, sem perceber que foram também isentos ou alienados em sua cidadania ao deixarem de contribuir - embora muitos possam fazê-lo - para o custeio de serviços públicos que recebem. Alguns efeitos, como as injustiças apontadas e os acréscimos de preços igualmente injustos nos seus desdobramentos, já ocorrerão a partir de 2002, que assim começa com um infeliz IPTU novo. Outros, como na localização empresarial, se manifestarão mais diluídos no tempo.

A boa prática tributária foi atropelada, mas deve render bons dividendos políticos ao PT. Este poderá alardear a ouvidos incautos os "isentos" e a "progressividade" que uma cidade mal representada por seus vereadores acaba de aprovar, num processo a que não faltaram golpes da velha politicagem.


Colunistas

RAQUEL DE QUEIROZ

O sonho de um velho padre
É um padre velho meu amigo de muitos anos; é cardíaco, vive retirado, nem sei se ainda celebra regularmente, mas ainda se preocupa demais com o mundo e os seus problemas, o que será a sua maneira de continuar se preocupando com Deus. Poucos dias atrás, logo depois da tragédia no WTC de New York, recebi dele esta carta:

"Se eu ainda fosse moço, capaz de paixão, iria me meter numa cruzada pelo ecumenismo. Estou convencido de que a fonte de todas as desgraças do mundo, de todas as guerras, está no fanatismo religioso. O fanatismo é a origem de tudo; pois se alguém se diz pronto a morrer pela sua fé, sempre acha outro alguém que o queira matar... Contudo, todas as religiões monoteístas do mundo basicamente se apóiam na crença num Deus único que se manifesta aos homens através dos seus profetas e, no caso dos cristãos, através do Seu próprio Filho. Praticamente nenhuma delas discorda no todo - só discordam no detalhe. Nenhuma dessas religiões prega a maldade, a crueldade, a depravação em qualquer forma, a avareza, a luxúria, a preguiça. Leiam-se os códigos de moral de qualquer confissão religiosa: eles se baseiam todos, quase uniformemente, nos Dez Mandamentos do Senhor. Judeus e cristãos por que se odiarem, se combaterem, se praticam, em essência, a mesma fé? Apenas os cristãos declaram que o Messias já veio e os judeus ainda o esperam, sem reconhecerem o Cristo como tal. Mas os cristãos medievais inventaram que foram os judeus que mataram Cristo - e por isso tão desumanamente os perseguiram, os torturaram, os aprisionaram em guetos, até chegarem a essa coisa monstruosa que foi o nazismo. Sabe-se, porém, por todos os depoimentos históricos, que foram os romanos que crucificaram Cristo, 'lição' dada a todos os agitadores que ameaçassem o poder imperial de César.

Os muçulmanos, se eles chamam ao seu Deus de Alá - é apenas uma tradução, pois na essência a pregação é a mesma e eles, diferentes dos judeus, até reconhecem Cristo como profeta.

E há também a questão dos ritos - quero dizer, da liturgia. Eles primeiro divergem de um ponto da doutrina e daí partem para as diferenciações dos ritos. Mas, pensando bem, de que vale um ritual? Um rito, uma liturgia, é a forma de cada crente manifestar sua adoração ao Senhor. Mas por que deixará o Senhor de ouvi-lo se ele fizer o sinal da cruz da direita para a esquerda, ou se disser 'Pai Nosso' em vez de 'Padre Nosso'? Mas basta isso para desencadear um cisma. No entanto se você recitar o Padre Nosso (a única oração que Cristo nos ensinou para um judeu, um católico, um protestante de qualquer das suas milhares de seitas - e até mesmo para um muçulmano - eles vão descobrir que não há nessa prece uma única palavra que discorde da fé de cada um. Bastava só que a humanidade compreendesse isso. Que Deus não pode se importar com a forma pela qual O veneramos, se de joelhos, se prostrados no chão, se virados para Meca ou de olhos para o céu. Se Ele é Onipotente, Onisciente, saberá nos entender e nos aceitar.

Já pensou num mundo em que os homens não se matem em nome de Deus? Onde a Sinagoga fique ao lado da Igreja Católica, da mesquita e do templo protestante?

Por que tanto ódio, por que tantas mortes, por que tantas bombas lastreando esta nova 'guerra santa' desencadeada por insensatos fundamentalistas islâmicos? Com a diferença no tempo, mas igual à loucura assassina das cruzadas? Por que a Inquisição queimou os judeus? Por que aquela cena dantesca de aviões cheios de gente cortando ao meio aquelas torres cheias de gente? Em nome do mesmo Deus fizeram isso tudo. O homem é um animal muito louco.
É com esta reconciliação que eu sonho, minha filha. E nessa esperança vou morrer."


Editorial

Falta preparação para a Alca

Uma nova etapa da negociação para a formação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) deve começar em 15 de maio. Será a discussão substantiva sobre acesso a mercados, um dos pontos básicos de todo acordo de integração comercial. No início de abril deverá terminar o debate sobre métodos e modalidades para tratamento do assunto. O Brasil precisa preparar-se para essa nova fase.
Governo, empresários e trabalhadores terão de resolver, com rapidez, quais são os interesses brasileiros nessas negociações. Não bastarão vagas definições de princípio. Será preciso fixar, com razoável clareza, de que forma cada setor da economia nacional deverá integrar-se num mercado hemisférico mais aberto.

Os americanos, principais interlocutores nessas discussões, sabem que os brasileiros não estão prontos para tratar de todos os pontos. "Não presumam que elas (as negociações) não vão acontecer, levem seus temas a sério e definam o que vocês querem na Alca", disse ao correspondente Paulo Sotero, em Washington, o vice-presidente internacional da Associação Americana da Indústria, um lobby setorial, Frank Vargo. Segundo Vargo, um ex-funcionário do Departamento de Comércio dos Estados Unidos, o Brasil deixou claro o que não quer, mas ainda não mostrou o que poderá ser um acordo aceitável, que se possa descrever como equilibrado e benéfico para todas as partes.

Pode-se formular a mesma crítica de outra maneira: o Brasil deixou claros, até agora, somente uns poucos objetivos. Os negociadores brasileiros, assim como o presidente Fernando Henrique Cardoso, têm defendido a liberalização do comércio agrícola e o abandono, pelos Estados Unidos, de mecanismos unilaterais de proteção. Têm defendido, por isso, a adoção de regras multilaterais mais estritas para a aplicação, por exemplo, de medidas antidumping. Não interessa ao País, como disse o presidente Fernando Henrique, um acordo em que uma das partes - e a mais poderosa - tenha o direito de impor barreiras ao comércio, a qualquer momento, segundo seus critérios.

Esses pontos são muito importantes, mas não bastam para compor uma pauta de negociações. O Brasil tem uma das economias mais diversificadas da América Latina. É preciso levar em conta ess e dado até para explicar o vigor e o poder de competição da agroindústria e da agropecuária brasileiras. No entanto, não se vê, nas negociações internacionais, a presença dos vários segmentos da produção.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) tem acompanhado as discussões da Alca, mas a maior parte das entidades setoriais parece distante desse trabalho. Surgem, de vez em quando, pronunciamentos de empresários de um ou de outro segmento a respeito da integração continental. O setor têxtil, por quase tudo que vêm dizendo seus representantes, poderá ser beneficiado por um acordo como o da Alca. Representantes de outras indústrias, como a de carnes, também têm feito declarações a favor da integração. Mas não há indícios de um amplo debate, com participação de representantes das várias indústrias, para definir como se poderá negociar a participação brasileira num mercado hemisférico.

Dificilmente a discussão da Alca deixará de avançar, mesmo que o mandato conferido ao presidente dos Estados Unidos - a autoridade para promoção comercial, ou fast track - seja insatisfatório para o Brasil. Os diplomatas americanos sempre poderão argumentar, como fez Frank Vargo, que, mesmo com as restrições impostas pelos congressistas, nenhum tema será excluído das negociações.

A advertência de Vargo foi formulada anteriormente pelo embaixador brasileiro em Washington, Rubens Barbosa. É preciso que os brasileiros estejam prontos para responder, no momento em que as partes tiverem de expor suas pretensões, suas reservas e suas ofertas de concessão. Isso envolverá, internamente, uma discussão muito mais complexa do que tudo que se tem visto, no Brasil, até agora.

Além de tudo, o Brasil não negocia sozinho. Os quatro sócios do Mercosul têm atuado em bloco e é preciso, portanto, articular com mais detalhes os seus objetivos. O tempo é curto e não se pode esperar que o cronograma da Alca seja suspenso por causa da crise argentina.


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12/27/2001


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Orçamento impositivo: mesmo sendo de interesse do Congresso, proposta não avança

Depois de sete horas de votação, avança pauta prioritária do Senado

Bancadas chegam a acordo sobre recursos para os estados e Orçamento avança