Câmara: líderes aprovam aumento
Câmara: líderes aprovam aumento
BRASÍLIA. A Mesa Diretora da Câmara se reúne hoje, na casa de seu presidente, Aécio Neves (PSDB-MG), para decidir se concede reajuste de 20% para seus funcionários, previsto no novo plano de carreira. O presidente do Sindicato dos Servidores do Legislativo, Ezequiel Nascimento, conseguiu o apoio de todos os líderes da Câmara à regulamentação da proposta. Todos assinaram um documento, que será encaminhado hoje a Aécio.
Segundo os argumentos dos técnicos da Casa, essa decisão tem de ser tomada antes do final do ano por causa da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Pela LRF, os gastos com folha de pagamento não podem crescer mais de 20% ao ano. E, caso a reestruturação das carreiras da Câmara seja fixada só em 2002, não será permitida a contratação de um único funcionário no ano que vem, já que o aumento comprometeria exatamente 20% da folha.
Ontem, Aécio não descartou a possibilidade de concessão do aumento. Disse, no entanto, que conversaria com o presidente do Senado, Ramez Tebet (PMDB-MS), antes de decidir. Para os dois, seria politicamente mais conveniente uma decisão conjunta. O Senado também já tem pronto um plano de cargos e salários que aumentará os servidores em média em 20% em 2002.
— Estamos analisando a hipótese, mas ainda não está decidido. Hoje (ontem), essa não é minha prioridade — argumentou Aécio.
Após uma conversa com Aécio, o terceiro-secretário da Casa e responsável pelos gastos com a folha, Paulo Rocha (PT-PA), foi mais otimista:
— Essa tabela vai sair, sim — garantiu.
Na reunião, também será discutida a situação dos deputados Silas Câmara (PPB-AM) e José Aleksandro (PSL-AC), que podem perder o mandato a pedido da CPI do Narcotráfico. O corregedor da Casa, Barbosa Neto (PMDB-GO), deverá recomendar hoje à mesa abertura de processo contra eles no Conselho de Ética.
Impasse emperra Orçamento
Nem a intervenção do presidente Fernando Henrique conseguiu evitar ontem o fracasso na tentativa de acordo para aprovação do Orçamento ainda esta semana. No Congresso, líderes governistas e de oposição já dão como praticamente certo o adiamento da votação para fevereiro. Até lá, ficarão suspensos os principais programas sociais do governo, com dotação de pelo menos R$ 4,6 bilhões. Desta vez, o atraso está sendo provocado por uma disputa pela paternidade do aumento do salário-mínimo.
O clima ficou pesado no Congresso. Ao longo do dia, oposição e governo trocaram acusações. A oposição fincou pé, exigindo um mínimo de R$ 210. E, para piorar, os representantes da oposição levaram à presidência do Congresso denúncias de irregularidades na elaboração de emendas pela bancada de Alagoas.
— Agora é que vamos obstruir mesmo — avisou o líder do PT na Câmara, Walter Pinheiro (BA).
— De zero a dez, a chance de aprovação do Orçamento este ano é de 0,01% — admitiu o líder do governo na Câmara, Arnaldo Madeira (PSDB-SP), após frustrante reunião de líderes na casa do presidente da Casa, Aécio Neves (PSDB-MG).
“Não votar é uma atitude terrorista”
Na reunião, os líderes de oposição insistiram na fixação de um mínimo de pelo menos R$ 210. Chegaram a apresentar alternativas de receita para cobrir os gastos. Mas Madeira foi categórico:
— O mínimo é de R$ 200.
No início da noite, o secretário-geral da Presidência, ministro Arthur Virgílio Neto, fez um apelo para que a oposição vote o Orçamento:
— Não aprovar o Orçamento é uma atitude terrorista. Uma coisa cafona e cucaracha.
À noite, Fernando Henrique conversou com Aécio, preocupado com a interrupção dos programas sociais, e apelou por um acordo, principalmente depois da decretação do estado de sítio na Argentina.
Virgílio completou:
— Cabe aqui um apelo: meditem hoje e acordem amanhã com disposição de votar o Orçamento. Olhem o que está acontecendo na Argentina
Sem qualquer possibilidade de acordo, acabou sendo descartada a idéia de convocação do Congresso na semana que vem.
— Não vamos fazer pirotecnia barata sem chance de quorum ou avanço nas negociações — disse Aécio, acrescentando que só convocará os parlamentares se houver a possibilidade de um acordo.
Ontem, a oposição obstruiu a sessão da comissão do Orçamento em que seriam votados 66 pedidos de crédito adicional ainda para este ano. Só foi votado um pedido. Na reunião na casa de Aécio, o líder do PFL na Câmara, Inocêncio Oliveira (PE), disse não ver possibilidade de acordo.
— De zero a 100%, a possibilidade de votarmos é de 1% — disse.
Congresso não quer cortar emendas
Além disso, foi rejeitada a idéia de novos cortes nas emendas de parlamentares para assegurar recursos para um mínimo maior ou para compensar as perdas com a correção da tabela do Imposto de Renda.
Na reunião, os parlamentares receberam fax do Planalto com a minuta da medida provisória sobre a renegociação da dívida dos pequenos e médios produtores rurais, outra reivindicação da oposição. Mas, numa análise preliminar, o PT notou o descumprimento de três itens do acordo.
Com o adiamento, serão protelados 11 programas do governo, entre eles o Bolsa-Escola (R$ 1,955 bilhão) e as ações para erradicação do trabalho infantil (R$ 475,4 milhões). As verbas para assentamentos também ficarão retidas.
Subida de Roseana nas pesquisas acende a luz amarela no PT de Lula
BRASÍLIA, SÃO PAULO e RIO.O crescimento da pré-candidatura da governadora Roseana Sarney (PFL) nas pesquisas, confirmada ontem por consulta do Datafolha, acendeu a luz amarela no PT de Luiz Inácio Lula da Silva, que continua liderando a disputa. Na pesquisa do instituto, Lula se mantém com 31% das intenções de voto, enquanto a governadora do Maranhão subiu três pontos, passando de 16% para 19%. Mas o dado que mais alarmou os petistas foi a simulação de segundo turno entre os dois.
Segundo o Datafolha, se as eleições fossem hoje Roseana teria 46% dos votos no segundo turno contra 44% de Lula — um empate técnico, mas que garantiria a vitória à pefelista.
Lula reagiu dizendo que Roseana é vendida como um produto de marketing.
— Sou um produto político, mas não quero ser vendido como Coca-Cola. A Roseana está sendo vendida como Coca-Cola. Do jeito que o PFL a vende, ela não é política, é apenas mulher, mãe e avó. Acho que isso não se sustenta — disse.
Lula promete dobrar poder aquisitivo do salário-mínimo
Lula fez até promessas como pré-candidato: disse que, se for eleito, vai dobrar o poder aquisitivo do salário-mínimo em quatro anos de governo. O petista ainda acusou o PFL de tentar dissociar a imagem de Roseana da dos Sarney:
— O PFL não diz que ela é da família Sarney, que governa o Maranhão há mais de 50 anos. Não diz que o Maranhão tem o pior índice de mortalidade infantil do Brasil — disse.
O próprio Lula, porém, disse não desprezar o marketing como ferramenta política:
— É humanamente impossível hoje fazer uma campanha sem marketing. Tenho brigado muito por isso no PT e vou tentar fazer a mais profissional campanha da minha vida.
Reservadamente, integrantes da cúpula petista já torcem para que o ministro José Serra, pré-candidato do PSDB que caiu de 8% para 7% no Datafolha, reaja e consiga conter a tendência de crescimento de Roseana. Os petistas acham que Serra é um candidato mais fácil de ser enfrentado no segundo turno.
— Acendeu uma luz amarela no PT. O sinal de alerta está piscando. Roseana está se revelando a candidata mais competitiva na área governista. Mas está crescendo cedo demais. Isso pode mudar quando o eleitorado a identificar como a candidata do governo — disse o líder do PT no Senado, José Eduardo Dutra (SE).
— Nenhum de nós jamais imaginou que fôssemos ganhar a eleição de lavada. Vai ser uma campanha dura — afirmou o deputado Jaques Wagner (PT-BA)
PFL não esconde o entusiasmo
Já no PFL o clima foi de entusiasmo com os números da pesquisa. Roseana, porém, foi cautelosa ao comentar seu crescimento:
— Os dados mostram que um número maior de brasileiros tomou conhecimento do meu trabalho e o aprova — disse ela.
Para responder às críticas de que o crescimento da governadora é resultado apenas do marketing, a assessoria de Roseana argumentou que ela não apresentou propostas e programas de governo porque ainda não é candidata.
— É um dado valioso do momento. Roseana está se consolidando, mas temos um longo processo até 3 de outubro — disse o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC).
— A preferência por Roseana não é uma coisa espasmódica ou episódica, é consistente — disse o líder no Senado, José Agripino (RN).
Garotinho sobe dois pontos e já é o terceiro
O governador Anthony Garotinho (PSB) agora está em terceiro, tendo subido de 9% para 11% dos votos, segundo o Datafolha. Sem citar o nome da governadora do Maranhão, Garotinho ironizou:
— Existe uma grande diferença entre a candidatura que tem o brilho da estrela e a que tem o brilho do cometa. As estrelas brilham menos que o cometa, mas brilham de forma constante e duradoura. O cometa brilha muito, mas passa.
O governador de Minas, Itamar Franco (PMDB), e o pré-candidato do PPS, Ciro Gomes, não quiseram comentar o resultado da pesquisa.
Virgílio: pesquisa mostra que Lula não é imbatível
O secretário-geral da Presidência, Arthur Virgílio, disse que o crescimento de Roseana mostra que Lula não é imbatível:
— Ela está dando uma surra no Lula! O Duda Mendonça (responsável pela campanha de Lula) vai ter que botar a cabeça para funcionar.
Mas Virgílio fez questão de dizer que o PSDB não abre mão de lançar candidato à sucessão do presidente Fernando Henrique e de ser o cabeça de chapa em caso de aliança. Ele disse que o partido vai investir na candidatura Serra.
— Fico feliz com a Roseana, mas ficaria mais feliz ainda se o candidato do PSDB a ultrapassasse — disse.
Para o ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, Roseana tem prestígio junto ao eleitorado mas não inviabiliza a candidatura de Serra.
Pedida prisão de ex-senador acusado de desviar verbas
GOIÂNIA. O caso Caixego, como ficou conhecido o escândalo do desvio de R$ 5 milhões do banco estadual para a campanha do PMDB em 1998, sofreu uma reviravolta ontem com o pedido de prisão preventiva de Otoniel Machado Carneiro, ex-senador e irmão do senador Íris Rezende, Edivaldo da Silva Andrade e Isaias Carlos da Silva. O Ministério Público também afirmou ter comprovado que pelo menos R$ 4,5 milhões dos R$ 5 milhões, devolvidos em março, têm origem irregular.
O pedido de prisão deverá ser analisado nos próximos dias pela juíza Maria das Graças Carneiro Requi, da 10 Vara Criminal de Goiânia, que preside o processo contra os três acusados e outras 11 pessoas.
Advogado diz que pedido não tem base jurídica
Pouco depois de saber dos pedidos de prisão, o advogado do ex-senador Otoniel Machado, Ney Moura Teles, viajou para Brasília. No diretório estadual do PMDB, o advogado disse que o pedido de prisão não tem base jurídica e que só foi feito nesse momento “numa tentativa de tirar o brilho da festa de Íris Rezende”. O partido prepara uma festa pelo aniversário do senador no sábado.
Íris Rezende, em carta ao povo goiano, disse que o objetivo maior do Ministério Público é lançar dúvidas sobre sua honra “e exercer, sobre a magistratura que vai decidir, pressão ilegítima”. Em outro trecho, lembra as agressões que sofreu na década de 60, durante o regime militar, e afirma que não se abalará nem se intimidará.
Governo cria novo sistema de multas
BRASÍLIA. Começa a funcionar na véspera de Natal o Registro e a Câmara Nacional de Compensação de Multas Interestaduais (Renacom). Pelo sistema, criado ontem pelo ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, o governo poderá cobrar multas emitidas fora dos estados onde os carros foram emplacados.
O controle dos dados dos motoristas infratores e da cobrança das multas ficará a cargo do Banco do Brasil. O sistema está sendo criado depois de longas negociações entre o governo e os Departamentos Estaduais de Trânsito (Detrans).
Aloysio decidiu criar o Renacom para corrigir uma das mais graves falhas do sistema de trânsito no país. Hoje, motoristas que cometem infrações de trânsito fora do estado de origem de seu carro quase nunca são punidos. Isto porque os Detrans não trocam informações sobre infratores. E quando trocam, não têm interesse em cobrar a multas porque, se forem pagas, não dão lucros para os Detrans responsáveis pela emissão dos boletos dessas infrações.
Por mês, 200 mil multas não são cobradas
Pelos dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), por causa da falta de comunicação entre os Detrans, 200 mil multas deixam de ser cobradas por mês no país.
Agora, com a criação de um sistema de informação que interliga os Detrans, Aloysio acha que a farra das multas está com os dias contados. Segundo o diretor do Denatran, Jorge Guilherme Francisconi, o sistema entra em operação no dia 24 e, já no início de fevereiro, as multas estarão chegando aos infratores.
Os recursos serão repartidos entre os Detrans que emitem e aqueles que cobram as multas. Os percentuais de cada um serão estipulados em janeiro. Segundo o ministro, o objetivo não é cobrar multas, mas forçar os motoristas a se comportar de forma civilizada.
“Combate à desigualdade é a agenda das próximas décadas”
Comandante do Censo 2000, o presidente do IBGE, Sérgio Besserman, diz que mal dá tempo para comemorar os expressivos avanços sociais da década de 90 — “praticamente todas as crianças de 7 a 14 anos estão na escola e o analfabetismo tende a zero no país” — pelo tamanho dos novos desafios. Em sua sala, no último andar de um prédio antigo do Rio com vista para a Baía de Guanabara, ele ressalta melhoras no saneamento, mas reconhece que a distribuição de renda não mudou e combater a desigualdade é prioridade.
Chico Otavio, Flávia Oliveira e Gustavo Villela
Que grande conclusão pode ser extraída do Censo 2000?
SÉRGIO BESSERMAN: As condições de vida, vistas sob todos ângulos, melhoraram nos anos 90, exceto uma, a questão da violência, que afeta especialmente os homens de 15 a 39 anos. Estamos acostumados a pensar a tendência pelo ângulo da vitimização, quando alguém da família é assaltado ou sofre agressão. E não é só isso: a violência deve ser vista, por exemplo, como realidade do cotidiano de crianças que moram em lugares violentos. É possível ver pelos resultados do Censo que melhoram as condições de domicílio, escolaridade e nível absoluto da renda. Algumas coisas com velocidade maior, outras mais lentas.
O senhor diria que esta velocidade é adequada?
BESSERMAN: É como a história do copo d’água. Alguns dizem que está meio cheio. Outros, meio vazio. O IBGE sempre dirá que está pela metade. É uma apreciação que cabe a cada brasileiro. Mas nada é mais importante que o dado de escolaridade. Nos anos 90, conseguimos colocar praticamente todas as crianças de 7 a 14 anos na escola. O analfabetismo tende a zero no país, mas o estoque de analfabetos ainda é muito alto.
Ainda há grandes distâncias entre Norte-Nordeste e Sul-Sudeste com relação à renda das famílias?
BESSERMAN: A renda do responsável pela família tev e ganho real muito expressivo, mas sabemos que a distribuição de renda na década de 90 não se alterou. É basicamente a mesma do início ao fim da década. Melhorou para todo mundo, mas não diminui a desigualdade na renda. Em outros indicadores, houve avanços. A população que teve acesso à água era a mais pobre. As crianças que estavam fora da escola eram principalmente da população mais pobre. Mas é muito mais difícil alterar a desigualdade do que combater a pobreza. Uma transformação tão profunda quanto à alteração da desigualdade construída no Brasil em cinco séculos de História é um projeto de toda a sociedade e certamente será a agenda da vida brasileira nas próximas décadas.
O senhor, então, concorda com o que pensa o presidente Fernando Henrique?
BESSERMAN: Como senador, Fernando Henrique disse que o país não é pobre, mas injusto. Se nossa renda per capita está no terço mais elevado do mundo, poucos países têm distribuição de renda pior que a nossa.
Por que o Brasil não consegue superar as desigualdades?
BESSERMAN: O que, em cinco séculos, está mais relacionado à produção dessas desigualdades? A falta de democracia. Ao fato de que nos tornamos um país democrático apenas ontem. Nós nos redemocratizamos ontem. E ainda há muito pela frente até que a democracia formal se transforme em democracia substantiva. Na medida em que a mulher se escolariza, ela é mais capaz de evitar a discriminação de gênero. De fazer o mesmo trabalho e evitar ganhar um salário menor. Na medida em que negros podem se organizar e tornarem-se mais conscientes de seus direitos. É este processo de democratização que vai alterando a brutal desigualdade no país.
O fato de o Brasil ter mais de oito milhões de domicílios sem banheiro é importante?
BESSERMAN: Os dados sobre oferta de água, acesso à rede de esgoto e de lixo, embora com diferença importante, mostram que melhorou. No saneamento, eram 71% os que tinham abastecimento de água e são agora 78%. Uma melhora de 10%, que faz toda a diferença do mundo para essas pessoas. Mas outra forma de olhar é que faltam 22% de lares que não têm água. O que se vê é uma melhora, mas há muito o que fazer, e rápido. Vivemos num país em que não se pode olhar para trás.
No Norte mais da metade não tem água. As regiões que demandam mais têm ritmo mais lento...
BESSERMAN: O ritmo até que não. Enquanto no Brasil a cobertura de água subiu 10%, no Nordeste passou de 53% para 66,5%, o que dá pouco mais de 10%. Se olhar o esgoto, no Brasil foi 10%; no Nordeste, foi de 24% para 38%. Bem mais que os 10%. Mas isso não é de soltar rojão. É o que era de esperar. Quando é muito ruim, é mais fácil andar rápido. A desigualdade no Brasil é também regional. E estamos falando do Nordeste, com dezenas de milhões de pessoas fora da dinâmica econômica de mercado, da desigualdade de gênero (homem e mulher) e de cor. O que realmente vai modificar a desigualdade é uma população mais educada, mais consciente e mais organizada.
Que regiões mais avançaram? O que ficou aquém e o que evoluiu nos resultados?
BESSERMAN: Na média, as condições de vida estão melhorando e bastante na década de 90. Mas esta avaliação — bastante bom, bom, insuficiente ou mal — cabe a cada brasileiro fazer com a sua visão da realidade, porque diz respeito à velocidade com que as coisas mehoraram. O Censo brasileiro não vai fazer ninguém votar no Lula, na Roseana, no Serra ou nos outros, mas permitirá que cada um respalde a sua visão do país com mais conhecimento. Nós mal demos os primeiros passos. Botar as crianças na escola é ótimo. Mas falta qualidade do ensino, ensino médio, educação infantil, equacionar o ensino superior, a produção de ciência e tecnologia. No Brasil, não dá para descansar: mal dá tempo para comemorar os resultados, pelo tamanho dos desafios que há pela frente. Mas estamos caminhando e isso permite a todos nós entrarmos no século XXI com otimismo.
Artigos
Por uma outra legitimidade
Daniel Aarão Reis
Arecente greve de professores, estudantes universitários e funcionários técnico-administrativos, de mais de três meses, teve o mérito de mostrar, mais uma vez e para toda a sociedade, a crise que atravessa a universidade pública brasileira: instalações carentes, corpo docente insatisfeito, truculência e falta de diálogo por parte de autoridades políticas e administrativas.
Entretanto, e ao mesmo tempo, as greves prolongadas (a deste ano e a do ano passado), a forma como foram conduzidas e as concepções políticas e sindicais que as orientaram evidenciaram um distanciamento crescente entre as direções sindicais e a comunidade de docentes.
Mesmo entre docentes mais politizados, a legitimidade de um certo sistema sindical começa a ser contestada. Entre as muitas divergências, duas são particularmente importantes: a validade da insistência na escolha de uma certa forma de luta — a greve por tempo indeterminado. E os questionamentos a certas formas precisas de organização: as assembléias centralizadas cujas orientações e ritmos são ditados pelos chamados “comandos”.
Cresce, cada vez mais, a consciência de que as greves por tempo indeterminado são tão nocivas à universidade pública quanto as medidas autoritárias e erráticas do governo. Quebrando o ritmo do semestre letivo, dispersando e atomizando professores e estudantes, desmobilizando a instituição, seus eventuais ganhos políticos e sindicais não estariam compensando as perdas e os estragos que vêm causando.
É verdade: muitos professores identificam-se como “trabalhadores da educação”, recriam a universidade como se fora uma fábrica, e imaginam ser possível recorrer à greve, uma forma de luta clássica dos operários fabris. O mimetismo, porém, não se sustenta porque, entre muitas outras, há três diferenças óbvias.
Primo, a universidade pública, como diz o nome, presta um serviço público — não produz lucros privados; secundo, e em conseqüência, o principal prejudicado com elas não são patrões privados, mas o distinto público, no caso, os alunos da graduação e, por extensão, os próprios professores, embora estes não sejam os mais punidos, porque continuam suas pesquisas, e a preparação de artigos e livros, além de continuar recebendo os salários, o que é, ou deveria ser, no mínimo, constrangedor. Tertio, e finalmente, cumpre dizer que o prejuízo causado pelas greves nas universidades é irrecuperável, pois as “reposições de aulas”, ao contrário de um produto que deixou de ser fabricado durante uma greve operária, nunca chegam a “repor” as que deixaram de ser dadas.
Sempre se argumenta que a greve chama a atenção das pessoas para a “crise da universidade”. Embora isto às vezes ocorra, é de se indagar se outras formas de luta — como manifestos e manifestações, em recinto fechado e, no limite, nas ruas — não seriam muito mais eficazes para a sensibilização da sociedade e até como pressão sobre o governo e o poder legislativo.
O grave, no entanto, é que no vácuo destas greves prolongadas dominam a cena assembléias centralizadas, reunindo algumas dezenas de professores que passam a falar e a decidir pela comunidade acadêmica. Em reuniões que se estendem por horas a fio, não precedidas por nenhum tipo de instância de base (departamentos e institutos), sem nenhum controle, as assembléias só dividem o seu reinado com uma outra instituição, ainda mais singular — os “comandos”.
Franqueados a professores não eleitos por quem quer que seja, freqüentemente nem mesmo pelas assembléias, os comandos substituem-se aos órgãos legítimos e legais da universidade (do conselho universitário às chefias departamentais) que, de forma mais ou menos automática, lamentavelmente se curvam frente a estas entidades que passam a comandar a vi da acadêmica, autorizando ou interditando qualquer tipo de atividade.
O maravilhoso é que sem o certificado de atividade de greve, que só o comando pode emitir, nada se pode fazer nas universidades, a não ser à custa de acusações, que podem ir das mais gentis (capitulacionista e neoliberal) até agressões verbais (traidor, covarde e fura-greve).
Frente a esses estranhos fenômenos, a comunidade acadêmica precisa insurgir-se. Recuperando, pelas suas bases reais — os departamentos e os institutos — o controle da situação. Limitando o poder das assembléias centralizadas. Não reconhecendo e não se submetendo a esses comandos autonomeados, mais próprios para casernas do que para universidades, e elegendo, democraticamente, conselhos ou coordenações para conduzir suas lutas sindicais e políticas.
Colunistas
PANORAMA POLÍTICO – Tereza Cruvinel
Presentes de Natal
O foco em Roseana Sarney, que confirmou a consistência de seus índices chegando a alcançar até 22%, ofuscou o desempenho do governador Anthony Garotinho na pesquisa Datafolha divulgada ontem. Ele cresceu de 9% para 11%, assumindo o terceiro lugar, que já foi de Ciro Gomes. Examinou detidamente as planilhas como quem desembrulha um presente de Natal, encontrando outros motivos para festejar.
Por exemplo, seu desempenho em São Paulo, um estado historicamente refratário aos políticos do Rio. Lá também ele ficou em terceiro lugar, atrás de Lula e de Roseana, obtendo 11% de preferência. Bateu José Serra, que teve 10% em seu próprio terreiro. Outra novidade que ele aponta, numa candidatura sempre tida como regional, é a distribuição mais homogênea de seus índices. No Rio ele continua tendo 40% de preferência, mas já consegue 10% no Paraná, 8% no Rio Grande do Sul, onde o PT é forte, 7% em Minas, onde o candidato da terra, Itamar Franco, tem 20%, e 7% na Bahia, por exemplo. No Rio, para que a informação fique completa, Lula fica em segundo lugar com 22%, e Roseana com 12%.
— Em todos os aspectos nossa candidatura melhorou significativamente e sem que o efeito do programa de televisão tivesse sido captado. Os pesquisadores foram a campo nos dias 12, 13 e 14 passado. O programa foi veiculado na noite do dia 13.
Logo, diz Garotinho, no máximo houve repercussão sobre os eleitores entrevistados no último dia. Ele chama ainda a atenção para outro corte da pesquisa não divulgado na “Folha de S.Paulo”: a intenção espontânea de voto. Lula teve 16%, Roseana 6% e Garotinho, mantendo o terceiro lugar, 4%. Fernando Henrique alcançou 3%, o que o estimulará a prosseguir com as brincadeiras sobre a hipótese de o PSDB ter que recorrer a seu nome.
Roseana salta de 6% na espontânea para 19% na pesquisa induzida, analisa o governador, concluindo que os índices dela ainda não são muito sólidos, guardando muita distância entre o voto espontâneo e o induzido. Ele, por exemplo, salta de 4% na primeira modalidade para 11% na segunda.
Assim como chá e pretensão cada qual toma o quanto quer, em campanha eleitoral cada um é livre para ler e interpretar pesquisas como quiser. E com seus números se animar ou não. Animadíssimo, Garotinho até contesta a interpretação corrente de que a ascensão de Roseana atropelou e barrou o crescimento de candidaturas da segunda divisão, como a dele, a de Ciro Gomes e a de Itamar Franco.
— A mim ela não atingiu, pois até passei para a casa dos dois dígitos, num sinal de que minha candidatura corre em outra faixa. Não está sendo buscada por governistas desiludidos como os que aderem a Roseana, mas por um eleitorado de oposição em busca de mudança com projeto e responsabilidade — diz ele.
Espera Garotinho que ninguém pergunte mais se ele será candidato para valer. Enquanto faz o melhor que pode nos meses finais do governo, seguirá articulando os candidatos do PSB a governador em 14 estados, tratando de colar-se a seus palanques, planeja o governador, feliz como um menino.
Melhor não pensar nas dificuldades para quebrar a polarização Lula-Roseana, desafio que será também enfrentado pelo candidato tucano que agora tem nome. Champanhe eleitoral, quem pode tomar mesmo é a governadora.Até agora nenhum partido provocou o TSE sobre o abuso eleitoral do PFL com seus programas, evitando o show de janeiro. Para não confessar o desconforto com o crescimento dela.Asas crescidas, tesoura nelas
O governo levou mais uma surra no Senado na noite de anteontem. Viu rejeitada a emenda que cria a Taxa de Iluminação Pública (TIP), um presente que queria dar aos prefeitos no ano eleitoral para reforçarem as finanças, já que reforma tributária nem pensar.
Culpa de quem? Da independência crescente da base na pré-estação eleitoral. Mas o governo prefere um bode expiatório e foi encontrá-lo na pessoa do presidente da Casa, o peemedebista Ramez Tebet. Pelos lados do Planalto já se fala em “cortar suas asinhas”, que teriam crescido na aprovação do projeto que corrige a tabela do Imposto de Renda. A bem da verdade, quem articulou toda a votação de segunda-feira foi o autor original da proposta, senador Paulo Hartung (PSB-ES). Tebet, até ontem, era um benquisto ministro de FH. Mas não voava.O PRÓPRIO FH tratou de esvaziar o jantar de ontem à noite com governadores no Alvorada. Serra e Aécio Neves não foram, reduzindo a importância que este jantar nunca teve. Ainda mais depois da desistência de Tasso Jereissati.
PODE SER paranóia mas os tucanos acham que Jereissati não é maquiavélico a ponto de sair como saiu da disputa, aplicando saia justa no adversário Serra, dando-lhe prazo para crescer. Acham que ele foi bem assessorado por um amigo muito astuto que reside atualmente em Salvador.
Editorial
Caixa-preta
Aqualidade da água e o controle da poluição tendem a aumentar de importância entre as reivindicações da população. Não sem motivo, o item saneamento básico ocupou o segundo lugar numa pesquisa do Vox Populi feita nas regiões Centro-Oeste e em Minas Gerais sob encomenda do projeto “O Brasil Que Nós Queremos”, para alinhar prioridades ao futuro presidente da República.
O pano de fundo dessa tendência é a dificuldade crescente das antigas empresas de saneamento em conseguir investir o necessário para alcançar a tão almejada universalização no tratamento do esgoto e abastecimento de água. Ou ao menos acompanhar o crescimento da população urbana.
Estatísticas do último Censo divulgadas ontem pelo IBGE mostram uma redução na parcela da população do Estado do Rio que é abastecida de água tratada pela Cedae: entre 1990 e 2000, o índice caiu de 83,4% para 83,2%.
Por isso é acompanhada com atenção a tramitação do projeto de lei 4.147, na Câmara dos Deputados.
Esse projeto, entre outras disposições, determina alguma forma de participação dos municípios na gestão dessas empresas públicas, as maiores delas estaduais. Combatido com vigor pelas companhias de saneamento do Rio e de São Paulo (Cedae e Sabesp), o projeto de lei, articulado com a Agência Nacional de Águas (ANA), ajudará a dar alguma transparência a um dos ainda opacos segmentos da administração pública direta — e, assim, aumentar sua eficiência.
Depois das mudanças de filosofia administrativa e de legislação que tiraram da Petrobras o estigma de “caixa-preta”, essa qualificação tornou-se bastante adequada para muitas companhias estatais de água e esgoto. Os cariocas e os fluminenses atendidos pela Cedae sabem no cotidiano o que isso significa.
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12/20/2001
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