Conselho decide investigar Jader
Conselho decide investigar Jader
Senador afirmou três vezes não ter-se beneficiado de recursos do Banpará, o que poderia caracterizar quebra de decoro
BRASÍLIA - O presidente licenciado do Congresso, Jader Barbalho (PMDB-PA), será investigado pelo conselho de ética por quebra de decoro parlamentar e pode ter seu mandato cassado. A negação taxativa de ter recebido recursos ilegais do Banpará, repetida ontem três vezes pelo senador na frente de dez colegas, será um dos argumentos para abertura da investigação. O senador paraense deve ser enquadrado por ter mentido. Integrante da comissão de três senadores que analisa o caso, Jefferson Péres (PDT-AM), adiantou que independente da conclusão da sindicância vai pedir investigação contra Jader no conselho por obstrução a um requerimento do senador José Eduardo Dutra (PT-SE), de março, que exigia a entrega dos relatórios do Banco Central sobre o Banpará ao Senado.
A idéia do senador Romeu Tuma é não fazer um relatório conclusivo sobre a culpa de Jader. Apenas pedirá que o caso seja analisado pelo conselho de Ética. Como terá apoio de Jefferson Péres em uma decisão contra Jader, fica vencido o voto do terceiro integrante da comissão, senador João Alberto (PMDB-MA), que considerou o depoimento de Jader Barbalho perfeito. Por causa de todos os procedimentos pendentes, Romeu Tuma avisou que irá adiar o relatório sobre o caso Jader, marcado inicialmente para a próxima segunda feira.
''A tese de abrir a investigação é a que está na frente nesse momento'', afirmou o senador Romeu Tuma (PFL-PA), coordenador da comissão que investiga o caso. A convicção é a de que Jader mentiu ao falar do Banpará, mas o senador Romeu Tuma quer ouvir mais especialistas e outros beneficiados. Oficialmente, Tuma diz que o depoimento de Jader ''não foi conclusivo''. Ontem, entretanto, após ouvir Jader, o senador do PFL se reuniu com dois técnicos do Banco Central que analisam o relatório Banpará. Os técnicos lhe adiantaram que Jader pode ser desmentido com um estudo das chamadas fitas de caixa, que registraram todas as operações ocorridas em uma conta do Banco Itaú, agência Jardim Botânico, Rio de Janeiro.
''A fita de caixa funciona como o mapa genético da aplicação, contendo todos passos dados do início ao término da operação entre cliente e banco'', afirma a nota técnica do Ministério Público, que analisou a fraude no Banpará. De acordo com Romeu Tuma, os argumentos de Jader de que as fitas de caixa são inválidos na formação das provas não podem ser levados em conta. ''Isso não adianta o Jader dizer''.
No depoimento, Jader considerou uma ''ilação'' a conexão entre três cheques em seu nome e as aplicações feitas com os cheques administrativos do Banpará. Esses cheques, utilizados para complementar os investimentos, são apontados pelo auditor do Banco Central, Abrahão Patruni Júnior, como as digitais de Jader na operação ilegal. Ele também procurou demonstrar possíveis erros em relatórios do Banco Central e diferenças entre valores desviados do Banpará e recursos suspeitos de entrar em sua conta.
Jader, por outro lado, teve dificuldade em explicar a existência de um resgate de uma operação, feita com um cheque do Banpará, que parou em uma das contas do Diário do Pará, de propriedade de sua família. Entre os documentos entregues pelo senador à comissão estavam decisões do Tribunal de Contas do Pará aprovando as contas do Banpará entre 1983 e 1986, época em que ocorreram o desvio. Jader também levou os balanços do Banpará entre 1982 e 1985, com aprovação do BC.
Protelação - Péres e Romeu Tuma enviaram ontem um ofício à mesa diretora do Senado pedindo explicações sobre a demora de Jader em colocar na pauta o pedido de entrega do relatório Banpará. ''Retenção por mais de três meses do relatório feito pelo BC configura abuso de prerrogativa e quebra de decoro. Se for voto vencido apresento um relatório em separado'', avisou Péres. De acordo com o secretário-geral da mesa, Raimundo Carrero, a resposta deve ficar pronta hoje.
Jader diz que voltará à presidência
Senador procura demonstrar confiança e tranqüilidade no dia do depoimento e ameaçou ressuscitar a CPI da Corrupção
BRASÍLIA - O presidente licenciado do Senador, Jader Barbalho (PMDB-PA) , encenou todo o script montado para o dia ontem com o objetivo de demonstrar tranqüilidade e confiança no retorno ao cargo.''Vou reassumir, não vou me curvar à mentiragem. Quem quiser se acovardar à falta de ética que se acovarde'', afirmou, dedo em riste, contrariando o consenso formado no Senado de que seu retorno é inviável.
Frio e meticuloso, Jader não se desviou um centímetro do roteiro. Foi ao plenário votar - a favor - a indicação do procurador José Coelho Pereira para ministro do Supremo Tribunal Militar (STM), mas não quis revelar o voto secreto. Cumprimentou, descontraído, quem lhe atravessou o caminho. Também não escapou de nenhuma das inúmeras perguntas feitas pelos senadores e pelo batalhão de jornalistas que o perseguiu todo o tempo. Ao contrário. Pouco depois do depoimento de três horas, prestado longe dos flashes dos fotógrafos, ele abriu as portas do gabinete e, sem titubear, garantiu que recupera o gabinete da Presidência no dia 17 de setembro, prazo final de sua licença. ''Voltar é questão de bom senso'', disse.
Jader aposta que o calhamaço de documentos que distribuiu aos senadores será capaz de convencer a todos de sua inocência. Disciplinado, aproveitou um resfriado na terça-feira para ler e reler os textos que se transformariam em sua defesa. Perambulou com eles embaixo do braço pelos corredores do Senado e, ao menor sinal de questionamento, seus assessores imediatamente sacavam de um envelope documento com sua defesa.
A argumentação do senador não se limitou, porém, a pareceres técnicos e escorregou para a ameaça velada. Em entrevista, ele sugeriu que pode assinar a CPI da Corrupção. A CPI, arma que pode colocar o governo federal contra a parede, depende de apenas uma assinatura para existir. ''Quem sabe eu tenho vontade'', disse com ironia. Até ontem, Jader rejeitava a hipótese de assinar o pedido. Negou que a atitude seja uma ameaça ao presidente Fernando Henrique Cardoso. ''Não estou ameaçando ninguém, mas não descarto a possibilidade de apurar.''
O bom humor que dominou Jader em boa parte do dia só desapareceu ao se queixar da ''campanha orquestrada'' feita contra ele pela imprensa. Raivoso, ele alterou o tom de voz para reclamar do noticiário do dia anterior. Citou de cor números de relatórios do Banco Central para completar: ''É mentira.'' Ele rebateu a notícia de que o gerente do Banpará, Marcílio Guerreiro, confirmou seu envolvimento no desvio da montanha de dinheiro do banco do estado. ''Ele confirma o óbvio, noticiado de forma distorcida e improcedente'', atacou. ''São escândalos fabricados, factóides, especulação, mentirada.''
A notícia já havia sido a responsável por tirar Jader do sério desde o início da manhã quando leu o resumo dos jornais em sua casa no Lago Sul, bairro nobre de Brasília. Nem o depoimento de ontem, considerado decisivo por analistas, foi capaz de alterar o sono do peemedebista. Ele acordou no horário de sempre, às 6h30, e até dispensou a presença do advogado Antônio Mariz para o embate com os senadores da subcomissão do Conselho de Ética. Chegou às 9h10 no Congresso, mais cedo que o habitual, e não saiu no intervalo. No almoço com os funcionários do gabinete, até riu das piadas e da ameaça de ser cassado por ter guardado na gaveta requerimento da oposição.
MP faz desafio a Maluf para mostrar telefonema
SÃO PAULO - Responsável pelo inquérito que apura a conexão entre as suspeitas de enriquecimento ilícito de Paulo Maluf e um fundo de investimentos conhecido por Trust na Ilha de Jersey - paraíso fiscal do Reino Unido, no Canal da Mancha -, o promotor Silvio Marques fez ontem um desafio aos advogados do ex-prefeito. ''Se eles (os advogados) abrirem mão do sigilo decretado no inquérito, mostro todos os telefonemas já encontrados'', afirmou Marques, ao tomar conhecimento que Maluf, através de sua assessoria de imprensa, divulgou, ontem à tarde pedido de esclarecimentos sobre a descoberta de uma ligação telefônica para a agência do Citibank de Genebra, na Suíça, atribuída por fontes do Ministério Público ao filho do ex-prefeito, Flávio Maluf, presidente da Eucatex.
''Que ligações são essas de que eles (os promotores) falam? Para que número foram feitas? Quando? Quanto tempo duraram?'', diz um dos trechos da nota, assinada pelo jornalista Adilson Laranjeira, assessor de imprensa de Paulo Maluf e Flávio Maluf. O filho do ex-prefeito não quis falar sobre o assunto, mas a nota nega qualquer telefonema de alguém da família Maluf para a Suíça ou outro paraíso fiscal. ''Membros do Ministério Público que estão deixando vazar falsas informações para a imprensa sobre esse assunto, querem implantar no Brasil o estado de terror no lugar de estado de direito (...) Não tendo como provar a calúnia que inventaram, estão na verdade usando a imprensa através do vazamento de informações acusatórias, sem detalhes que depois nunca se confirmam'', diz a nota.
Ligações - Silvio Marques, que está rastreando cerca de três mil ligações internacionais feitas pela família Maluf para o exterior de 1993 até agora, disse que as investigações continuarão no mesmo tom. ''Apesar da nota, não vou dar informações, exceto se os advogados autorizarem através de uma liberação formal'', afirma. Segundo o promotor, os advogados podem apresentar um documento à justiça, abrindo mão do sigilo previsto em lei. Ele detalharia, então, as informações que já estão com o MP. A agência do Citibank de Genebra - para onde teria sido dado o telefonema, de um aparelho de Flávio - é parte importante no caso. Segundo documento das autoridades de Jersey, era na agência que estava o fundo de investimento da Blue Diamond Ltda (Dimante Azul), transferido, em 1997, para a empresa Red Buby Ltda (Rubi Vermelho) em Jersey.
As investigações sobre a suposta existência de US$ 200 milhões serão feitas por uma força-tarefa formada por promotores paulistas e procuradores da República que atuam em São Paulo no rastreamento de casos de corrupção e remessa de dinheiro ilícito para fora do país. ''São duas frentes de investigações. Pedi apoio do MP Federal e me coloquei à disposição dos procuradores para ajudar no trabalho que eles estão fazendo'', disse o promotor Silvio Marques.
Investigações da PF e da CPI da Dívida Pública da Câmara de Vereadores paulistana aponta que dos R$ 1,68 bilhão (valores de 1996) emitidos em títulos, menos de um terço foi usado para resgatar dívidas com precatórios. O restante do dinheiro teria sido misturado no caixa único da Prefeitura e utilizado para pagar as empreiteiras que realizaram grandes obras na gestão de Paulo Maluf (1993 a 1997), entre elas o Túnel Ayrton Senna e a Avenida Águas Espraiadas, ambas na Zona Sul da capital paulista.
Promotores e procuradores suspeitam da existência de um vínculo cronológico entre os precatórios, o pagamento das obras e supostas remessas de dinheiro para o exterior abastecendo o fundo de investimentos conhecidos por Trust numa agência do Citibank apontado, em documento enviado ao Brasil, por autoridades da Ilha de Jersey - onde os recursos teriam chegado em 1997, depois de passar pela Suíça. O juiz Maurício Porto Alves, da Corregedoria da Polícia Judiciária de São Paulo, já quebrou, em decisão inédita, os sigilos bancário, fiscal e telefônico do prefeito Paulo Maluf e de seus parentes.
Justiça Federal - O Superior Tribunal de Justiça (STJ) recebeu, ontem, o parecer do Ministério Público Federal (MPF) opinando que é a 8ª Vara Federal Criminal de São Paulo, e não a Justiça estadual, que tem competência para julgar o pedido de quebra dos sigilos bancários do ex-prefeito Paulo Maluf e seus familiares, por supostas contas ilegais mantidas na Ilha de Jersey - ''paraíso fiscal'' britânico, no Canal da Mancha.
O conflito de competência foi levantado pela própria juíza da vara federal, Adriana Soveral, e vai ser decidido pela 2ª Seção do STJ, no próximo dia 12, conforme informou, no início da noite de ontem, o ministro-relator, Gilson Dipp.
O principal argumento do MPF para que a Justiça Federal julgue o pedido de quebra dos sigilos bancários é o de que as informações financeiras solicitadas às autoridades estrangeiras poderão mostrar ligações com os fatos contidos na ação penal em curso na 8ª Vara Federal Criminal, em que Paulo Maluf e Celso Pitta são acusados de falsidade ideológica.
Temer reage a ataques de Maguito
BRASÍLIA - O deputado Michel Temer (SP), candidato à presidência do PMDB, botou mais lenha nos embates internos do partido. Ele escreveu uma nota furiosa em reação às declarações do senador Maguito Vilela, presidente em exercício do PMDB, que anteontem acusou ministros de seu próprio partido de desembolsar dinheiro para convencer parlamentares a não votar nele. Maguito é candidato, como Temer, à presidência do PMDB. A decisão será na convenção do dia 9 de setembro. Seu discurso mirou, além de Eliseu Padilha, Ramez Tebet e Ovídio de Angelis, ministros do no governo, o próprio Temer.
O deputado revidou na nota com um texto igualmente aguerrido: ''Maguito está demonstrando sua fragilidade eleitoral. Sabe que vai perder. Não tem nenhuma chance de vitória no próximo dia 9'', atirou Temer. ''Ele está pregando e incentivando a desarmonia e a desunião do partido em vez de tratar de assuntos de relevância partidária em seu âmbito adequado.'' Sua nota circulou ontem entre os parlamentares e chamou atenção pela agressividade.
O senador Pedro Simon (PMDB-RS), que chegou a apoiar abertamente a candidatura de Maguito à presidência do PMDB, manifestou-se com mau humor. Em seu aparte ao discurso feroz do atual presidente da legenda, disse que era contrário àquelas manifestações de ''desunião''. ''É estranho que ele, ocupando agora a presidência do partido, fale aquelas coisas. Não aceito isso'', vociferou. A zanga não fez com que Simon revelasse seu voto na convenção do próximo sábado. ''Não sei com quem estou, só sei que estou contrário a esse tipo de manifestação'', disse.
Estevão é detido por desacato
BRASÍLIA - O ex-senador Luiz Estevão, que teve o mandato cassado no ano passado por corrupção, foi acusado ontem à noite por oficiais de justiça de ''desacato a autoridade'' quando tentavam apreender documentos contábeis nas empresas do empresário. Estevão corre risco de ter sua prisão decretada nas próximas horas pela Justiça. Depois de muita confusão, os representantes do Ministério Público conseguiram, no final da noite de ontem, apreender na sede do grupo OK, 48 caixas com documentos contábeis e computadores. Os procuradores estavam atrás de documentos que pudessem comprovar o esquema de desvio de dinheiro liberado para a construção do Fórum Trabalhista, em São Paulo.
Tudo começou quando os oficiais de justiça, cumprindo determinação do Ministério Público Federal, fizeram a apreensão dos livros-caixa de duas empresas do ex-senador: A OK Empreeendimentos e a OK Construtora. Segundo pessoas que presenciaram a apreensão, Estevão teve uma forte discussão com os oficiais de justiça, impedindo o livre acesso dos mesmos às dependências de sua empresas. A partir daí, os ânimos se exaltaram.
Por volta das 22 horas, Estevão, que se encontrava em sua residência, foi detido por agentes da Polícia Federal e levado, numa viatura policial, à Superintendência da PF, onde prestou depoimento, acompanhado de seus advogados, a dois delegados. Ao mesmo tempo, um grupo de técnicos deo Ministério Público, tendo à frente o procurador Luiz Francisco de Souza, deslocou-se até o edifício OK, no setor de autarquias Sul da capital federal, onde funcionam os escritórios do grupo OK, fazendo a apreensão de documentos contábeis.
Foram dois mandados de busca e apreensão de documentos emitidos por juízes federais. No primeiro, expedido pelo pelo juiz Rogério Navarro, foi pedida a apreensão de documentos contábeis do Grupo OK referentes aos exercícios financeiros dos anos 2000 e 2001. O segundo, expedido à noite pelo juiz de plantão, Carlos Eduardo Matias, determinava a apreensão da documentação contábil referente aos anos de 1994 a 1999. Representantes do Ministério Público suspeitam que Luiz Estevão tenha apresentado documentos falsos durante as investigações da CPI do Judiciário que resultou na sua cassação.
Toda a confusão teve origem em novos desdobramentos das investigações do MP sobre as ações irregulares das empresas onde o ex-senador é o principal acionista, tendo ainda como pano de fundo o desvio de recursos financeiros durante a construção do Fórum Trabalhista de São Paulo, obra inacabada, A obra do Tribunal Regional do Trabalho (TRT), comandada pelo ex-juiz Nicolau dos Santos, hoje respondendo a processo por currupção ativa, serviu de fachada para um esquema de corrupção pouco visto, onde desvios de recursos públicos aconteceram por período estimado de cinco anos.
A ação do MP aconateceu depois que a ex-contadora do grupo OK, em depoimento na semana passada ao procurador Luiz Francisco, abriu todo o esquema contábil envolvendo a corrupção e o desvio de recursos financeiros do Fórum Trabalhista da capital paulista. A ex-contadora teria aberto a ''caixa-preta'' dessa contabilidade que resultou no desvio de R$ 165 milhões do dinheiro público liberado para a construção do Fórum.
Malan será investigado por festa de Catarina
Comemoração em casa de banqueiro pode ter sido antiética
BRASÍLIA - A Comissão de Ética Pública vai examinar se o ministro da Fazenda, Pedro Malan, desobedeceu o Código de Conduta da Alta Administração Federal, criado em 21 de agosto do ano passado, ao comemorar o aniversário de sua esposa, Catarina Malan, em uma festa na residência do banqueiro Pedro Salles, dono do Unibanco.
O pedido para que a comissão examine o caso foi feito ontem em pronunciamento da tribuna do Senado por Pedro Simon (PMDB-RS). Ele acusa o ministro da Fazenda de infringir os artigos 1° e 9° do Código, determinando regras sobre conflitos de interesse públicos e privados e a preservação da imagem e reputação do administrador. No artigo 9° é vedada à autoridade pública a aceitação de presentes que ultrapassem ao valor de R$ 100. ''A festa de aniversário que foi oferecida pelo ilustre banqueiro atinge ou não esse item? Não me passa pela cabeça que o ministro da Fazenda tenha pensado nisso'', reclamou Simon.
No ministério da Fazenda, Malan aguarda a notificação para falar sobre o assunto. Segundo informações, a celebração do aniversário teria sido apenas um pretexto para reunir os convidados, entre eles o presidente da República que compareceu à festa em São Paulo, no sábado à noite.
Para o senador, o relacionamento promíscuo entre banqueiros e autoridades pode permitir a troca de informações confidenciais e também favores. O senador lembrou que a sonegação dos bancos em 1999 foi de R$ 29.6 bilhões. Também o lucro dos bancos foi o maior no primeiro semestre deste ano, segundo estudo indicando que a rentabilidade média de 20 bancos atingiu 22,8% contra a média histórica de 15%. ''As instituições são responsáveis por quase um terço dos impostos sonegados'', disse Simon.
Para o senador, Malan deveria ter determinado providências para investigar se esses bancos foram ou não beneficiados. ''Se fez qual foi o resultado? É bem fácil entender que o banqueiro tenha oferecido a festa. Até acho que o meu amigo Pedro Malan não tenha tido condições de se furtar da festa'', mas agora com seu nome cotado como provável candidato à presidência da República, deveria adotar mais cautela em seu comportamento.
Artigos
Circo ambulante
Newton Carlos
Está de novo com o pé na estrada o que Tony Blair chama, com desdém, de ''circo anarquista ambulante''. Para manifestantes de prontidão, palhaços e baderneiros, segundo Blair, é o Mobilization for Global Justice, organizador de protestos, ao largo do mundo, que coloquem em debate o quanto o modelo vigente de globalização ''aprofunda desigualdades e concentra poderes''. O alvo agora é Washington, local das reuniões anuais do FMI e Banco Mundial.
O prefeito de Washington, preocupado com ''sombras de Gênova'' a caminho de seu burgo, mandou carta ao presidente Bush avisando que ''os protestos terão intensidade e gravidade poucas vezes vistas na cidade''. Pediu ajuda federal para enrijecer os cordões de segurança. Argumenta que a capital americana tem 3 mil policiais, contingente que poderá dobrar com contribuições de Nova Iorque, Baltimore e Filadélfia, mesmo assim insuficiente para proteger 7 mil delegados da sanha de anarquistas violentos.
Desembarque de marines? O custo da operação policial foi orçado em 50 milhões de dólares e o prefeito conta com a compreensão da Casa Branca. Bush deu sinais de que colocou o problema em sua agenda. Por que Washington? A Organização Mundial do Comércio (OMC) se manda para os Emiratos Árabes, onde o menor gesto de desobediência civil pode significar mãos ou cabeças cortadas. Protestar no deserto não deve estar nos cálculos do Mobilization for Global Justice. A Cúpula das Américas escalará as Montanhas Rochosas.
O Grupo dos Sete antes de Gênova tentou esconder-se na ilha de Okinawa, sem resultados, apesar de cercado de água por todos os lados. Depois de Gênova decidiu que as próximos encontros terão dimensões e importância reduzidas. Onde, é questão em aberto. Vamos ver se funcionam as escapadas da OMC para o deserto e da Cúpula das Américas para montanhas geladas. Diante da sucessão de fugas, fica difícil entender por que o FMI e o Banco Mundial optaram por não arredar-se de Washington. Não ceder às ruas?
Foi amarga a experiência de Praga. Também a de Washington no ano passado. Dois mil manifestantes, 600 prisões etc. Havia o recurso da Sibéria. Na reprise de Washington é esperado um circo com 50 mil. No mall da capital americana pisarão de modo compacto talvez mais pessoas do que as agrupadas pelos protestos contra a guerra do Vietnam e em defesa dos direitos civis, nos anos 60 e 70, embalados pelo radicalismo perfumado de Jane Fonda e os dreams de Luther King. O prefeito de Washington está seguro disso, contou a Bush e os dois fizeram circular suas preocupações.
O FMI e o Banco Mundial tomaram providências. As reuniões foram reduzidas de cinco para dois dias, um fim de semana, 29 e 30 de setembro. A informação já está na internet. Devem ser cancelados em parte ou todos os 35 seminários programados. Discursos e debates não mais na sede do FMI, mas no Hotel Marriot, o que pode facilitar o trabalho da polícia. Nada de deslocamentos nas ruas. Os delegados dormirão, comerão e se digladiarão encerrados numa fortaleza improvisada.
O porta-voz do Banco Mundial garante que será feito em dois dias ''todo o trabalho necessário e essencial''. Por que os cinco anteriores? Os do Mobilization for Justice dizem que dois dias também bastam para eles e que dois ou cinco dias não alteram a questão. O que produz riscos de violência é não encarar problemas reais, por cima de interesses das corporações. Mas as reações aos protestos continuam aferradas à lei e à ordem. Foi proposta a criação de uma polícia européia antimotim.
Se aprovada, será multilíngue, coordenará serviços de inteligência, controlará fronteiras, embora seja livre a circulação de pessoas na União Européia, e interceptará lideranças do circo. ''Reabrirá'' as grandes cidades a reuniões internacionais. Numa varredura pode dar de cara com Oskar Lafontaine, ex-ministro das Finanças da Alemanha e ex-candidato a chefe do governo, a mais nova aquisição do Mobilization for Global Justice.
O circo ganha status, mas o poder permanece com as corporações.
Remexendo ruínas
Manolo Florentino
Sob a guarda do Arquivo Nacional se encontra um daqueles legados que mais podem revelar do que esconder. Trata-se de autorização emitida pela Polícia da Corte, em janeiro de 1832, para que três africanas viajassem para Benguela. Remetia-as Maria Carneiro, ''preta livre'' da qual Luiza, Vitória e Joana eram escravas de antiga propriedade. É provável que meses depois algum navio negreiro despejasse as três ladinas no litoral de Angola, junto a tonéis de cachaça, tabaco barato e infinitas sedas indianas de escambo. Fariam travessia oposta à de 10 milhões de africanos desembarcados nas Américas entre 1500 e 1870 - quase metade no Brasil -, sempre à razão de dois ou três homens para cada mulher.
Aguardava-as em Benguela a tradicional escravidão africana, sustentada por guerras cujos prisioneiros igualmente nutriam de braços e úteros outros recantos - estima-se que 15 milhões de africanos cruzaram o Saara, o Mar Vermelho e o Índico em direção ao cativeiro islâmico. Com um pouco de sorte, Luiza, Vitória e Joana talvez conseguissem escapar (há milhares de registros de fugas de escravos nos arquivos angolanos). Poderiam até reencontrar os seus em aldeias perdidas no coração da floresta. Fosse esse o roteiro, e não o outro, e o acaso teria sido bem mais generoso com elas do que com a maioria dos africanos no Brasil.
Sorte mesmo teve Maria Carneiro. Pois se é certo que algum dia ela foi simultaneamente coisa e pessoa, conseguiu superar a estranha condição por meio de carta de alforria. Muito trabalho e artimanha devem ter rolado. E como as escravas eram bem mais aquinhoadas por libertações do que os homens, ser mulher, nesse caso, a beneficiou. Mas o que a ajudou mesmo foi ter sido escrava numa sociedade que alforriava em quantidades nunca vistas em outras partes das Américas (desde 1723 a Virgínia proibiu toda manumissão, e mulher branca que ali se juntasse a escravo, cativa permanecia por cinco anos, os filhos por 30).
A liberdade de Maria Carneiro trouxe para a civitas o que de melhor e de pior o cativeiro gestara. Também por isso nos tece hoje uma sensibilidade refinadamente afro, bem como a crença frouxa na cidadania e na representação efetivas. Personagens como ela afiançavam a mestiçagem racial, nossa mais preciosa fortaleza. Mas da mesma forma reiteravam o status quo (Maria virou proprietária de escravos), tornando-nos a todos mestiços políticos. Vem de longe o consenso em torno do melting pot racial e, simultaneamente, da exclusão.
Maria, Luiza, Vitória e Joana talvez ajudem a matizar consignas atuais. De suas trajetórias alguns extrairiam exemplos do quão fugidia é a noção de ''reparação histórica'' quando se trata de justificar ações políticas. Se enfrentassem nossas escandalosas desigualdades raciais postulando tão-somente a afirmação da cidadania plena, não estariam equivocados. Mas os percursos plausíveis dessas mulheres ensinam bem mais.
O que digo é que é necessário prudência na importação de pautas explicitamente americanas, como a das cotas raciais. O tiro sairá pela culatra se, por incúria ou êxtase pré-eleitoral, com elas deixarmos também gestar entre nós o ódio racial, a mais perversa expressão do multiculturalismo nos Estados Unidos.
Colunistas
COISAS DA POLÍTICA – DORA KRAMER
Autofagia em praça pública
Disputa de facções fazem parte da convivência interna nos partidos. Petistas brigam desde que se entendem por gente, tucanos vieram ao mundo falando mal uns dos outros e pefelistas quase arrumam uma úlcera partidária tentando esconder inutilmente a divisão durante anos. Nem por isso, PSDB, PFL ou o PT correm o risco da extinção.
O mesmo, no entanto, não se pode dizer do PMDB, que ainda acaba se dissolvendo pela prática continuada da autofagia. Não é de hoje que o partido vem se aplicando na própria desconstrução, mas agora passou a fazê-lo em praça pública. E com chancela oficial.
Pois na terça-feira foi o presidente do partido em pessoa, o senador Maguito Vilela, quem ocupou a tribuna do Senado para informar ao respeitável público que o PMDB é uma federação de vendidos. Disse, com todas as letras, que o grupo partidário da candidatura Michel Temer à presidência da legenda estava comprando votos à convenção nacional, sob o gentil patrocínio do governo federal.
E a mercadoria referida pelo senador são simplesmente os delegados do partido que preside.
A situação configurou-se de tal forma inusitada que até o senador Pedro Simon, partidário do rompimento com o governo federal, protestou contra aquela demonstração de que, de fato, o PMDB não precisa de inimigos externos.
Pode-se dizer - com pouca chance de errar - muita coisa a respeito da ala dita governista do partido. Menos que ela peca pela incoerência. Apoiou Fernando Henrique duas vezes, hoje adoraria ter um candidato forte o suficiente para encabeçar uma chapa com o apoio de tucanos e pefelistas, mas, se não der, ficará sem problemas exatamente onde está. Aí pelo menos sabe-se qual é o nome do jogo.
Já a ala dita de oposição não prima pela observância de critérios de convergência entre passado e presente, discurso e atitude. Primeiro, temos o peculiar conceito de independência defendido pelo senador Maguito: prega a entrega dos cargos alheios na capital, mas mantém os seus intactos na província.
Depois, fala-se ali de ingerência externa, mas o pemedebista mais bem posicionado nas pesquisas, o governador Itamar Franco, conversa mais com Lula, Ciro e Brizola do que com qualquer integrante de seu partido que esteja a mais de 300km de Minas Gerais.
Quanto a questões de passado e presente, é lógico que tudo na vida muda. Mas algo de muito mais profundo deve ter alterado convicções em algumas almas, para permitir parcerias como as de Orestes Quércia e Roberto Requião, e do próprio Maguito com Itamar, este, vítima de barulhenta desmoralização na convenção de 8 de março de 1998 provocada pela tropa de choque do então deputado Sandro Mabel, fiel correligionário de Maguito Vilela no combativo PMDB de Goiás.
Que não se pretenda, pela contestação da coerência de um grupo conferir salvaguarda com certidão passada em cartório do céu à outra ala. No PMDB não há querubins, como de resto as ingênuas criaturas não transitam em partido algum. Apenas em nome da preservação do discernimento geral convém que se dê às coisas seus nomes certos e que sejam postas cada qual nos lugares a que verdadeiramente pertencem.
Até porque o eleitorado tem cada vez menos vocação para massa de manobra.
Foi-se o tempo
O ex-prefeito Paulo Maluf tem passado ultimamente meses a fio em viagens ao exterior. Talvez por isso sofra certa falta de sintonia com o que se passa por aqui.
Ao manifestar a certeza de que ainda sairá ''glorificado'' das investigações sobre contas da família em paraísos fiscais, Maluf mostra que não está entendendo direito o espírito da coisa.
Não percebeu que é parte integrante do mesmo processo que abriu alas e deu passagem ao fim das carreiras de Antonio Carlos Magalhães e Jader Barbalho como lideranças políticas nacionais.
Processo, aliás, bastante igualitário. No caso específico dos três, atingiu sem distinção Jader, que odeia ACM, que sempre detestou Maluf, que desta vez errou no prognóstico.
Editorial
Dança de Posições
Nas muitas leituras a serem feitas da última pesquisa CNT/Census, pede mais atenção do que mereceu no primeiro momento o índice de 61% por trás do qual estão de sobreaviso os eleitores insatisfeitos com os nomes lembrados até agora. Os candidatos que se revezam nas oscilações da preferência atestam o vazio pré-eleitoral. O tédio esvaziou o interesse de eleitores chamados mensalmente a opinar sobre os mesmos nomes movidos pelo voluntarismo. Candidatos só passam a existir depois de aprovados em convenção nacional. Com raras exceções, não há candidatos que se sustentem com tanta antecedência, sem dizer a serviço de que idéias ou programas pisaram o palco.
É natural, portanto, a dança de posições nesse minueto com gesticulação de amável simpatia. Campanha eleitoral pressupõe disputa, divergência, alternativa. Uma candidatura se repete desde a primeira eleição direta depois de 1960 no Brasil: Luís Inácio Lula da Silva reapresenta-se com o alto índice que o credenciou em todas as sucessões presidenciais.
Sobem a 61% os que esperam o aparecimento de outros nomes para se definir. O dado significa que apenas 39% se contentam com o naipe de pretendentes em cena. Portanto, o mais bem servido de intenções de voto - o candidato do PT - dispõe de 32,9% (praticamente um terço) dos 39% que aceitam escolher entre os nomes já oferecidos. É pouco para um juízo de valor com peso eleitoral.
De alguma forma, o elevado número dos que esperam maior variedade de oferta política, para manifestar preferência eleitoral, reflete insatisfação que começa a falar. A sociedade está cansada do estéril denuncismo que não sai do lugar por falta de conclusão. Ninguém paga pelos crimes cometidos. O formalismo que protege os personagens da corrupção administrativa e política tornou-se fonte permanente de desgaste da democracia. Os cidadãos não gostam da excessiva consideração com que são tratados os que traficam em proveito próprio a vida pública, quando deveriam ser submetidos a rito sumário, de caráter exemplar, na apuração de responsabilidades.
O último episódio da série que arrasou o Senado, o caso Jader Barbalho, fez transbordar a impaciência dos cidadãos no primeiro semestre do primeiro ano do século 21, consumido na apuração da quebra do sigilo em votação secreta do Senado. O lamentável episódio culminou com a renúncia de dois senadores que, evitando a cassação do mandato, tentarão no próximo ano voltar por via eleitoral. O resto do ano vai se consumir na desconversa que o brasileiro não suporta mais.
Questões pessoais em lugar do interesse público não sustentam debates. Enquanto os problemas nacionais se acumulam, por falta de aplicação dos representantes políticos ao mandato, o Congresso não preenche o vazio político e transmite a impressão de impotência da democracia para resolver problemas que ela pode equacionar e que, sem ela, deixam de ser conhecidos. Não basta trazer a corrupção à luz do dia, mas punir os beneficiários e confiná-la aos níveis desestimulantes. Democracia é liberdade mas também lei e rigor na sua aplicação.
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08/30/2001
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