Direção do PT condena ação dos sem-terra









Direção do PT condena ação dos sem-terra
SÃO PAULO. Temendo que seus adversários utilizem a invasão da casa da fazenda dos filhos do presidente Fernando Henrique Cardoso contra sua candidatura à Presidência, o petista Luiz Inácio Lula da Silva condenou ontem com mais veemência a ação do MST. Lula afirmou que a ocupação da Fazenda Córrego da Ponte não ajuda a luta pela reforma agrária, apoiada pelo PT. Segundo o petista, a ação do MST precisa ser condenada:

— Esse gesto do MST não ajuda em nada a luta pela reforma agrária. Sou contra a invasão da casa do presidente como sou contra a invasão da casa de qualquer brasileiro.

Lula disse que o ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, foi irresponsável, por ligar a invasão ao PT. O candidato do PT estranhou o fato de a Polícia Federal e a Agência Nacional de Informações (Abin) desconhecerem a possibilidade de invasão da propriedade, ocorrida no mesmo momento em que o PT lançava oficialmente, em São Paulo, sua candidatura a presidente.

— É estranho que as mesmas forças que, usando grampos ou não, descobriram aquele monte de dinheiro no escritório da governadora Roseana, não soubessem que os sem-terra poderiam invadir a fazenda e a casa do presidente.

Lula diz que MST não é corrente transmissora do PT
O candidato do PT disse, no entanto, não ter elementos para afirmar que houve incitação ou negligência de agentes do governo na invasão, com o objetivo de prejudicar o PT. O MST, segundo Lula, não é corrente transmissora do PT e tem autonomia, assim como a CUT.

— Apoio a luta pela reforma agrária e desejo ser presidente para implantar a reforma agrária em paz, com todo mundo sentado numa mesa de negociação — afirmou

Lula e o diretório nacional do PT, que passaram o fim de semana reunidos, estavam preocupados com os reflexos negativos da invasão promovida pelo MST sobre a candidatura petista.

Suplicy: “Invasão foi umato de desrespeito e abuso”
O líder do PT no Senado, Eduardo Suplicy, percebendo que os adversários de Lula poderiam usar a invasão da fazenda contra o PT, interrompeu a reunião do diretório para dizer que o partido precisava repudiar o ato, por mais que todos quisessem a reforma agrária.

—Temos que usar de franqueza para dizer ao MST que a invasão da casa do presidente foi um ato de desrespeito e de abuso. Quando aconteceu o massacre de Eldorado de Carajás, eu e o Lula estivemos lá para dar solidariedade aos sem-terra, mas desta vez temos que dizer que eles exageraram. Somos solidários quando usam métodos pacíficos — discursou Suplicy, na reunião do diretório.

A preocupação era tanta, que o presidente nacional do PT, deputado José Dirceu, apressou-se em divulgar uma nota oficial condenando a invasão do MST ainda no sábado, ao mesmo tempo em que repudiou a politização do caso por parte do ministro da Justiça.

— Para o PT, esse assunto está encerrado. O MST desocupou a fazenda e o PT não teve nada com isso. O PT condena esse tipo de ação. Também criticamos o MST quando os sem-terra invadiram prédios públicos. Condenamos qualquer ato de violência. Mas não podemos concordar com o ministro Aloysio que, de forma irresponsável e inadequada, tentou envolver o PT numa ação totalmente executada pelo MST. Ficou tão evidente que o ministro errou, que até o presidente desautorizou Aloysio a responsabilizar o PT — disse Dirceu.


Fernando Henrique fica perplexo com a exposição de sua intimidade
BRASÍLIA. Perplexidade e irritação. Muita irritação ao ver sua intimidade exposta e violada. Com esse sentimento o presidente Fernando Henrique Cardoso participou das decisões tomadas para a desocupação da Fazenda Córrego da Ponte, na madrugada de ontem, em Buritis, Minas. Ele foi informado durante toda a noite de sábado do desenrolar das negociações e ficou sabendo imediatamente quando a invasão acabou. Ontem no fim do dia, o sentimento era de alívio pelo desfecho do caso. Fernando Henrique ficou magoado com a invasão de sua privacidade.

— O presidente ficou perplexo com a ousadia do MST, magoadíssimo com o que fizeram. Mas hoje ele já parecia mais aliviado com o fim de tudo — disse ontem um aliado do presidente.

QG de emergência manteve o presidente informado
O Palácio do Planalto montou um QG de emergência, com os ministros Aloysio Nunes Ferreira (Justiça) e Alberto Cardoso (Gabinete de Segurança Institucional) , além do advogado-geral da União, Gilmar Mendes, em reunião permanente desde as 20h30m de sábado até pelo menos às 2h da madrugada.

Na porteira da fazenda, momentos antes da desocupação, agentes da Polícia Federal descreviam aos jornalistas cenas constrangedoras, que teriam sido protagonizadas pelos sem-terra, na cama do presidente e da primeira-dama.

O presidente, segundo assessores, teria ficado chocado com as imagens mostradas na televisão sobre a invasão da fazenda, que é usada por ele para descansar nos fins de semana. A própria primeira-dama, Ruth Cardoso, se encarregou de decorar o local.

— É desnecessário descrever as cenas que todos viram pelas televisões, de situações constrangedoras, no domicílio do presidente e de sua família, inclusive em dependências íntimas do casal, como o quarto de dormir — afirmou o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Alberto Cardoso.

FH considerou a ação de desocupação competente
O secretário-geral da Presidência, ministro Arthur Virgílio, conversou ontem à noite com o presidente Fernando Henrique e disse que ele considerou competente a ação de desocupação da fazenda. Segundo o ministro, Fernando Henrique ficou indignado com a invasão, principalmente com a atitude pouco respeitosa dos sem-terra com relação aos seus objetos pessoais.

— O presidente ficou surpreso com o fato de os sem-terra nem quererem conhecer a fazenda, ocupando direto a sede numa tentativa de desmoralização da autoridade do presidente da República. O presidente ficou perplexo com a falta de limites do MST na ação, mas agora já estava mais tranqüilo — disse o ministro.

A família do presidente agora estuda processar o MST pelos danos à propriedade.


Convenção nacional do PPS, no Rio, veta coligação com os pefelistas
O PPS encerrou ontem sua convenção nacional, em Niterói, afastando a possibilidade de o PFL integrar a aliança que sustenta a candidatura à Presidência de Ciro Gomes. Por unanimidade, o senador Roberto Freire (PE), que já se manifestara contrário à união com os pefelistas, foi reeleito presidente nacional do PPS. Os convencionais também aprovaram um documento no qual afirmam sua posição “intransigente no combate ao autoritarismo, ao fisiologismo, ao paternalismo, ao corporativismo, ao cartorialismo, à dema$e à corrupção”.

— O PFL é um desses representantes. Se não está citado nominalmente, está citado quando você quer superar esse estado. O PFL representa o atraso — disse Freire.

Para fortalecer a coligação de centro-esquerda, formada por PPS, PTB e PDT, os três partidos deverão formalizar no próximo mês um bloco parlamentar, informou o presidente regional do PPS, Sérgio Arouca. Em abril, também deverá ser realizada uma convenção que reunirá os diretórios nacionais dos três partidos. Nesse encontro será elaborada a estra$égia de campanha.

— Vamos tentar funcionar como um único partido. Qualquer fato novo terá que surgir desse comando — afirmou Arouca, que classificou de factóide a possibilidade de uma coligação com o PFL, defendida pelo presidente do PTB fluminense, Roberto Jefferson.

Com a formação do comando de campanha, que inclui a direção dos três partidos, a cúpula do PPS acredita que será inviabilizada qualquer tentativa isolada de aproximação com os pefelistas. A decisão de criar o comando único foi tomada na última sexta-feira, $Itaipava, na Região Serrana, durante reunião da qual participaram Freire, Arouca, Jefferson, e os presidentes nacionais do PDT, Leonel Brizola, e do PTB, José Carlos Martinez, entre outros dirigentes.

Diante da decisão do TSE de impor a verticalização das coligações, outra preocupação do PPS é investir em candidaturas regionais fortes.

— Temos que repetir a frente trabalhista em todos os estados, como no Rio, onde nosso candidato ao governo é Jorge Roberto Silveira (prefeito de Niterói, do PDT) — disse Arouca.


PT, dividido, aprova negociação com PL
SÃO PAULO. A direção nacional do PT, dominada por Luiz Inácio Lula da Silva e seus aliados, conseguiu uma vitória apertada ontem no diretório nacional do partido. Por 38 a 29 (além de uma abstenção), a direção aprovou que as negociações com o PL e dissidentes do PMDB devem continuar para a formação de alianças para a disputa da Presidência da República.

A esquerda petista se uniu e tentou sustar as negociações com o PL e o PMDB.

Para convencer o partido a votar pela continuidade dos entendimentos com o PL e os dissidentes do PMDB, Lula disse que a proibição da formação de aliança com o PL e o PMDB representaria uma enfraquecimento de sua candidatura lançada anteontem já que isso desautorizaria a sua palavra empenhada com o PL. Mas, na entrevista coletiva ao fim do encontro ontem, Lula negou que exista racha no partido.

— Não tem racha algum. O PT tem uma coisa sagrada, que é a democracia interna. Cada um tem sua opinião. Eu já ganhei e já perdi dentro do partido, mas sempre que há uma decisão de maioria, essa decisão é seguida por todos. E a decisão do diretório nacional foi um referendo para o José Dirceu (presidente nacional do partido) continuar as conversações com o PL e dissidentes do PMDB — afirmou.

Dirceu ficou furioso quando soube que a imprensa ficara sabendo do resultado do encontro, já que havia um acordo na reunião de que o placar não seria divulgado para impedir que ele fosse usado para se dizer, depois, que a manutenção da aliança com o PL rachou o partido.

— Houve um acordo unânime de que todos aceitariam o resultado. Tanto que a resolução final do diretório foi aprovada por 59 votos, dos 68 integrantes do diretório presentes (dos 84 membros, 16 não compareceram à reunião ontem) — disse Dirceu.

Ele admitiu, porém, que essa decisão sobre alianças pode ser revista.

— Precisamos esperar a decisão do TSE sobre verticalizações das alianças. Esta semana, também o Supremo irá se pronunciar se a decisão do TSE é constitucional ou não. Se a verticalização passar, é possível que o próprio PL desista da aliança com o PT. Além de tudo isso, até junho, quando acontecem as convenções finais, muita coisa poderá acontecer. Antes disso, não vamos resolver nada — disse.

Suplicy diz que bases são contra a aliança com liberais
O PT ainda espera que uma aliança mais ampla, envolvendo PPS, PSB e PDT.

— Ainda sonho com a união de todos os partidos de esquerda — disse Lula, para quem a vaga de vice em sua chapa está reservada para alguém de um dos partidos com os quais o PT vier a se coligar.

Mesmo votando a favor da continuidade das negociações, o senador Eduardo Suplicy (SP) fez um discurso, lembrando que em suas viagens pelo Brasil constatou que a base do partido não quer aliança com o PL. Ele acha que o senador José Alencar deveria ser convidado pelo partido para expor suas idéias e ver se elas convergem com as posições do PT. Suplicy nega que esteja em campanha para ser o vice de Lula.


Advogado de Roseana rebate tese de procurador
SÃO LUÍS. O advogado da governadora Roseana Sarney (PFL), Antonio Carlos Almeida Castro, rebateu ontem as declarações do procurador da República Mário Lúcio de Avelar, responsável pelas investigações das fraudes na extinta Sudam, publicadas pelo GLOBO ontem. Em entrevista, o procurador disse que Roseana sabia da tramitação apressada para a aprovação do projeto da fábrica de autopeças Usimar, que recebeu R$ 44 milhões da Sudam, e das irregularidades do projeto. Avelar disse ainda que Roseana e seu marido, Jorge Murad, então gerente de Planejamento do Maranhão, se empenharam pela aprovação dos recursos para a Usimar.

— Não há uma frase na entrevista que mereça fé. Ele (Avelar) está partindo de suspeitas. No caso da Usimar, a governadora não fez injunções nem um segundo além daquela que qualquer chefe de Executivo faria. E ela não participou de liberação de dinheiro público — disse.

Almeida Castro disse ainda que Murad não sabia que seu então subordinado direto na gerência de Planejamento do governo do estado, Alexandre Falcão, recebeu fiscais da Sudam que iriam vistoriar a implantação da Usimar:

— Murad disse que só ficou sabendo depois e Falcão afirmou que era praxe fazer isso.

Segundo o advogado, também é falsa a tese levantada pelo Ministério Público de que Murad é dono da Fazenda Nova Holanda, outro projeto da Sudam sob investigação.


Fim de linha para invasores

Depois de 22 horas da invasão que mobilizou todo o governo na madrugada de sábado, a fazenda dos filhos do presidente Fernando Henrique Cardoso foi desocupada no início da manhã de ontem, com a prisão pela Polícia Federal de 16 líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Um acordo para desocupação pacífica foi fechado por negociadores do Incra, o que evitou o confronto. Os soldados do Exército só entraram na fazenda depois da saída de cerca de 300 invasores, mas os líderes foram detidos, algemados pelos agentes federais e levados para Brasília. O ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, negou que o acordo garantisse que ninguém seria preso, e avisou que os 16 líderes responderão pela prática de vários crimes, inclusive furto, violação de domicílio, cárcere privado e descumprimento de mandado judicial

Planalto determinou cumprimento da lei
Comemorando o êxito da operação, Aloysio afirmou que, ao contrário do que disseram os funcionários do Incra encarregados da negociação, não houve acordo para que ninguém fosse preso.

A determinação de que a lei fosse cumprida à risca partiu do Palácio do Planalto. Aloysio, o advogado-geral da União, Gilmar Mendes, e o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Alberto Cardoso, ficaram reunidos até a madrugada de ontem no Planalto, monitorando a operação na fazenda, usada como residência de campo pelo presidente.

— Em nenhum momento foi negociado o não cumprimento da lei. Quando se comete crime, a polícia é obrigada a agir, a prender. Isso é inegociável. Senão, a polícia estaria cometendo um crime de prevaricação. Essa questão jamais foi posta na mesa de negociação — disse Aloysio.

A afirmação de Aloysio contraria as declarações do ouvidor-geral, Gercino José da Silva, e da assessora especial, Maria de Oliveira. O ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann, que estava em Buritis enquanto os demais ministros estavam no Palácio do Planalto, também disse que não orientou seus assessores a negociarem esse tipo de proposta. Para Jungmann e Aloysio, houve um mal-entendido por parte dos dois funcionários, que em protesto pediram demissão, dizendo-se traídos.

— Não houve traição. Houve o cumprimento da função específica $polícia. Tal seria se aquela invasão fosse considerada como um mero passeio — disse Aloysio, ao lado do general Cardoso e de Jungmann.

Aloysio ressaltou que os sem-terra foram presos em flagrante por terem cometido os crimes de resistência ao cumprimento de ordem judicial, prática de cárcere privado contra funcionários da faze nda, furto, invasão de estabelecimento agrícola e violação de domicílio. Aloysio não esclareceu que objetos foram furtados, acrescentando que a PF ainda está fazendo um levantamento. O ministro contou que os sem-terra foram revistados e que a fazenda foi isolada para que a Polícia Federal pudesse fazer a perícia.

— Os peritos encontraram objetos pessoais esparramados pelo chão, facas enterradas perto de árvores e um barril de gasolina. Também consumiram alimentos e bebidas — disse Aloysio, para quem é preciso investigar se a gasolina não seria usada para fabricação de coquetéis molotov.

Segundo Aloysio, os invasores do MST se recusaram a cumprir o mandado de manutenção de posse e receberam com agressividade e coquetéis molotov o oficial de Justiça e os policiais.

— Diante da magnitude da violência da ação do MST, creio que esse processo foi exitoso — disse.

Jungmann também comemorou:

— Foi uma operação coroada de êxito. Estamos aqui sem ter nenhum arranhão, nenhum morto. Poderíamos estar diante de um desastre.

Efetivo militar será reduzido aos poucos
O general Cardoso explicou que o Exército vai reduzir gradativamente o efetivo no local: um terço dos 220 homens já foi retirado, por determinação do presidente. Os agentes federais já foram embora.

Os três ministros disseram que as negociações foram feitas apenas para que os sem-terra saíssem de forma pacífica da fazenda. Jungmann afirmou que a Polícia Federal tinha autonomia para prender os invasores. Ele elogiou os funcionários exonerados e afirmou que deve ter havido alguma falha de comunicação durante a negociação.

Ao chegarem em Brasília, os sem-terra presos prestaram depoimento na Polícia Federal e, no início da noite, foram levados ao IML para o exame de corpo de delito. A advogada do MST Josefina Serra dos Santos disse que pedirá hoje, na Justiça de Buritis, o relaxamento da prisão dos 16 sem-terra. Segundo a advogada, constam no auto de prisão em flagrante as acusações de prática de cárcere privado, invasão de domicílio e violação de propriedade agrícola, mas não a de furto, ao contrário do que disse Aloysio.


Artigos

Nova Previdência
João Hermann

Uma das prioridades do próximo governo será a reforma da Previdência, fundamental para o equilíbrio das contas públicas e a formação de poupança doméstica de longo prazo. Com relação às contas públicas, os regimes de previdência (INSS e do serviço público) respondem por um déficit de cerca de 6% do PIB. Quanto à previdência do setor privado, vale lembrar que em 1940 havia 31 contribuintes para cada aposentado e pensionista; hoje, a relação caiu para 1,7. O déficit do INSS passou de R$ 9 bilhões em 2000 para R$ 12 bilhões em 2001, e este ano deverá alcançar R$ 16 bilhões. Com relação aos servidores públicos, em 87 a despesa com inativos e pensionistas da União representava 24% da folha de pagamentos. Hoje, 50%. Se nada for feito, por volta de 2030 o déficit total da Previdência atingirá 15% do PIB! Portanto, não se pode falar em equilíbrio fiscal sustentado sem resolver a questão da Previdência.

Por outro lado, a Previdência Social precisa ser transformada na principal ferramenta de poupança, base para o investimento produtivo. Para tanto, deve deixar de ser um mero sistema de repartição e transformar-se num sistema de capitalização, com correspondência direta entre contribuições e benefícios. Como se fosse uma aplicação financeira: você terá o que poupou. O valor final do benefício dependerá diretamente de quanto e por quanto tempo a conta vinculada do trabalhador recebeu depósitos ao longo de sua vida produtiva.

É claro que haverá um valor mínimo de benefício, a ser garantido pelo poder público. O sistema será fiscalizado pelo próprio trabalhador, pois o dinheiro será dele! Cada contribuinte terá um cartão magnético e uma senha que lhe permitirão retirar, a qualquer momento, um extrato de sua conta.

Adicionalmente, o ideal é que, em vez da atual exclusividade de incidência sobre a folha de pagamentos, o cálculo da contribuição tenha como base o faturamento líquido das empresas, desonerando a folha e estimulando a formalização do mercado de trabalho, apoiando os setores produtivos que mais intensivamente utilizam mão-de-obra.

O governo é tradicionalmente corrupto e ineficiente no manejo deste imenso ativo financeiro. Proponho que a gestão final da Previdência Social se dê por um coletivo de aposentados, trabalhadores, empresários e representação governamental, obrigada por lei à gestão profissional, e também ao investimento produtivo. O sistema ganhará assim credibilidade, previsibilidade e transparência, condições básicas para o bom funcionamento. Aliado à retomada do crescimento sustentável, com a ampliação do mercado formal de trabalho, e aos demais sistemas de previdência (privado e das estatais), estarão lançadas as bases para a ampliação da poupança doméstica.


Colunistas

PANORAMA POLÍTICO – Diana Fernades

História condenada
O MST que invadiu a fazenda dos filhos do presidente da República no sábado está a milhas de distância daquele MST que no início de sua luta pela reforma agrária, nos anos 80, obteve conquistas importantes, como a Fazenda Anoni, no Rio Grande do Sul. Ser recebido com festa nas ruas, como na marcha de quatro anos atrás em Brasília, também já faz parte do passado do MST.

Nem discursos beirando a irresponsabilidade, como o que o ministro Aloysio Nunes Ferreira fez logo após a invasão tentando incriminar o PT, ou informações esquisitas como a do general Alberto Cardoso — “a Abin sabia que eles estavam lá há 20 dias” — reduzem a gravidade do ato protagonizado pelo Movimento dos Sem Terra na Fazenda Córrego da Ponte.

No sábado, os líderes do MST — são tantos e tão desconhecidos da maioria dos trabalhadores sem-terra — ainda tentavam justificar a invasão da sala de visita do presidente como um ato justo pela reforma agrária. Ontem à noite, outros líderes, estes mais conhecidos do público que acompanha o assunto, dizia que o MST suspenderá as invasões e passará a buscar a simpatia da sociedade.

Pode ser muito tarde. Goste ou não do presidente Fernando Henrique, da primeira-dama ou de seus filhos, o brasileiro viu pela televisão na noite de sábado um ato de abuso e irresponsabilidade. Hoje poderão ler relatos detalhados sobre a noite dos sem-terra na casa presidencial, como o do repórter fotográfico do GLOBO Roberto Stuckert Filho. Foi uma farra só, com bebida, comida e música, sem qualquer sinal de vigília ou concentração.

O MST perdeu a razão, o PT sofrerá conseqüências, e o PSDB, apesar do tom mais ameno de ontem do ministro Aloysio Nunes Ferreira, não deixará barato para o principal adversário de José Serra. Lula condenou ontem com mais veemência a violação ao direito privado do cidadão, mas não deixou de estranhar que um governo com serviço de inteligência novinho em folha e uma Polícia Federal tão ágil — lembrou a busca na empresa do casal Roseana-Murad — não tenha tido condições de conter a chegada de centenas de pessoas à casa da família do presidente.

Em busca de gás novo
A governadora Roseana Sarney desembarca hoje em Salvador como pré-candidata do PFL à Presidência da República. Não recuou um milímetro, garante. E só não sairá da capital baiana como candidata oficial e formal porque não é ainda tempo de convenção.

A disposição da governadora no discurso que fará na festa pefelista é informar que não arreda pé de ir até o fim. Uma tentativa de acabar com as dúvidas sobre sua candidatura.

Falará no ato de lançamento do Prêmio de Monografias Luís Eduardo Magalhães para toda a cúpula do PFL. Além dos dirigentes e dos líderes pefelistas que estão em todos os eventos, e do anfitrião Antonio Carlos Magalhães, estará lá o vice-presidente Marco Maciel.

A pefelândia conta com novos esclarecimentos nos próximos dias sobre o escândalo do R$ 1,3 milhão que abalou o partido. Mais que isso, conta com pesquisas que confirmam as quedas sucessivas da governadora, mas que mostram também, como diz um pefelista, que do outro lado a vida não está tão bela como vendem os tucanos.

Arapongagem
Está na Comissão Especial do Congresso sobre violência e segurança um projeto que tenta ampliar o cerco aos arapongas de plantão no serviço público. A proposta, de autoria do senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE) e que altera o Código Penal, prevê maior rigor na aplicação de penas para o agente que, no abuso da função pública, devassar, divulgar, transmitir por imagens ou sons informações de qualquer natureza ou utilizar indevidamente o conteúdo de correspondência fechada. A pena proposta é multa mais reclusão de dois a quatro anos.

Seria mais uma forma de coibir grampos ilegais, fitas manipuladas e arapongagens de todo tipo.

Sem restrições
Substituto na Câmara de Hildebrando Pascoal, aquele que usou uma motosserra para eliminar um inimigo, o deputado José Aleksandro (PSL-AC) é o personagem de estréia do novíssimo Conselho de Ética da Casa. Nos próximos dias, será julgado por quebra de decoro. Acusação: ajudou o irmão a fugir da cadeia e faz apologia da violência ao defender criminosos como Hildebrando e outros nomes do crime organizado no Acre.

Enquanto aguarda o julgamento, Aleksandro continua faceiro e com prestígio na Câmara. Há poucos dias foi eleito pelos colegas vice-presidente da Comissão de Amazônia e Desenvolvimento Regional.

O BANCO CENTRAL divulga na quarta-feira o relatório sobre o comportamento da inflação no primeiro trimestre do ano. Ela começou assustando em janeiro, mas recuou e as autoridades econômicas já contam com grandes possibilidades de cumprir a meta acertada com o FMI, ao contrário do ano passado. Que nenhuma tempestade atrapalhe os planos.


Editorial

OUTRA REFORMA

A Previdência Social certamente terá que passar por uma outra reforma no próximo governo. Embora inconclusa (o Congresso precisa ainda aprovar leis complementares), a primeira reforma possibilitou alguns avanços, entre os quais a redução do número de aposentadorias precoces tanto no sistema do INSS como no setor público. Entretanto, as novas regras não foram suficientes para evitar que o déficit previdenciário continuasse a aumentar, tanto em valores absolutos como em proporção do Produto Interno Bruto (PIB).

A folha de pagamentos mensal da previdência em 80% das localidades brasileiras (até mesmo nos estados mais ricos do país) é maior do que os repasses federais do Fundo de Participação dos Estados e Municípios às prefeituras. Trata-se assim do mais poderoso programa social do Brasil, seja em termos de impacto nas economias do interior como na assistência aos mais velhos. Desse modo, o sistema previdenciário tem que ser cuidadosamente preservado. Se o rombo for crescente, o sistema como um todo ficará inviável financeiramente.

A primeira reforma baseou-se no princípio que rege o regime de repartição (os que têm capacidade de trabalhar financiam o sustento daqueles que perderam a capacidade laboral, por idade ou doença). No caso específico dos servidores públicos, para pôr em prática essa filosofia a contribuição dos funcionários na ativa teria que aumentar muito, o que é impraticável. Por isso, os inativos que se aposentaram mais cedo e ganham mais também terão de dar alguma contribuição. Este é um dos nós da questão.


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03/25/2002


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