Excesso de tributos prejudica a reciclagem, dizem debatedores
Cícero Lucena: “O custo para implantar a logística reversa incide sobre a reciclagem”
Representantes dos principais segmentos industriais do país explicaram, em audiência pública nesta quarta-feira (9), o andamento do processo de implantação do serviço da logística reversa — ações e procedimentos necessários para viabilizar a coleta e a restituição de material reciclável ao setor empresarial, para reaproveitamento — e os pontos controversos dessa política.
Apesar de considerarem a Lei de Resíduos Sólidos um grande avanço para o país, eles apontaram a carga tributária brasileira — que não privilegia e muitas vezes penaliza quem utiliza o material reciclado — como um dos entraves para o funcionamento dessa diretriz prevista na Política Nacional de Resíduos Sólidos. .
— Nessa audiência ficou claro uma preocupação: o custo para implantar a logística reversa, que hoje incide sobre, por exemplo, a política de reciclagem dos produtos. Há casos em que matéria reciclada, por conta dos impostos em cascata, acaba saindo mais cara que a matéria prima virgem. Isso nos leva a fazer uma audiência pública exclusiva sobre custos e incidência de impostos — observou o presidente da Subcomissão de Resíduos Sólidos, Cícero Lucena (PSDB-PE), em entrevista após a audiência.
Sem vantagem
De acordo com Ana Paula Bernardes, da Associação Técnica Brasileira das Indústrias Automáticas de Vidro (Abividro), há fabricas que trabalham com 80% de cacos de vidro no forno para produzir novas embalagens. Ou seja, 80% da produção é feita sem extração de matéria prima nova, mas o Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI) é o mesmo da indústria que utilizou matéria prima virgem.
— Uma garrafa retornável tem 85% de vidro reciclável e eu não tenho vantagem, minha garrafa vai pro mercado com a mesma competitividade que uma garrafa de plástico, que vai ser descartada e não cumpre o artigo 9 da Lei — explicou.
Outro ponto polêmico diz respeito aos eletroeletrônicos, já que a indústria nacional, segundo André Luis Saraiva, diretor da Área de Responsabilidade Socioambiental da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), deverá ser penalizada ao precisar dar um destino às carcaças que não produziram, fruto de contrabando ou até mesmo importadas legalmente. Conforme afirmou, de cada 10 notebooks vendidos no país, 7 não foram feitos aqui.
Na opinião de Saraiva, o acordo setorial para os eletroeletrônicos — a ser firmado com o Ministério do Meio Ambiente e que regula a retomada dos produtos obsoletos para a indústria em questão dar um destino ecologicamente sustentável — deve prever a responsabilização de todos que comercializam produtos eletrônicos no país, não somente a indústria brasileira.
Também deve ficar claro quem arcará com os custos de transporte, e armazenamento dos produtos até que a indústria dê a destinação correta, pois isso não está explícito na Lei, lembrou Saraiva. Ele chegou a sugerir a criação de uma agência reguladora, como a de Águas ou a de Telecomunicações, para centralizar as ações e gerir o assunto.
Grandes geradores
De acordo com Zilda Veloso, diretora do Departamento de Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente (MMA), 25% dos municípios brasileiros são responsáveis por 80% do lixo urbano. Para ela, se o ataque for feito aos grandes centros geradores, o maior problema da destinação dos resíduos estará mais próximo de ser solucionado.
Com base em dados como esse, Ana Paula Bernardes apontou a dificuldade de instalar parques recicladores em mercados longínquos. Segundo afirmou, não há viabilidade econômica em trazer caco de vidro de Manaus (AM) para reciclagem, por exemplo, pois o uso do material reciclável não paga o custo de obtê-lo e transportá-lo. Na opinião dela, pelo menos para o setor de embalagens e vidros, seria mais fácil iniciar o processo de coleta nas grandes cidades e por bares, hotéis, restaurantes e similares, onde os resíduos estão concentrados, em boas condições e próximo ao mercado de consumo.
Ela e André Luis Saraiva defenderam a implantação paulatina da logística reversa, com um cronograma natural de implantação iniciado pelos maiores centros geradores, o que já eliminaria grande parte dos resíduos.
— Se fizermos uma força integrada na região Sudeste, atacaríamos 56% do problema. Depois a região Sul, com 16%, o Nordeste com 13%, o Centro-Oeste com 9,2% e por fim o Nordeste, com 5,1% — disse Saraiva.
Consumidores
Para Lauro Moretto, vice-presidente Executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos de São Paulo, é preciso deixar clara a participação dos consumidores, dos agentes do comércio, dos distribuidores e as responsabilidades dos agentes públicos em todo o processo. São necessárias campanhas educativas para mostrar à população que a logística reversa existe e como deve ser feita. Como mencionou Zilda Veloso, há o risco de o governo e as indústrias se prepararem logisticamente e o consumidor simplesmente não levar os produtos aos pontos de coleta.
Moretto mencionou iniciativa bem sucedida que ocorre nos Estados Unidos, onde duas vezes por ano as indústrias farmacêuticas fazem uma grande campanha de recolhimento de medicamentos vencidos ou que não podem mais ser utilizados e dão o destino correto, como a utilização como fonte energética para o processamento de cimento. No Brasil, explicou ainda, essa utilização não é possível, faz-se necessária a mudança na legislação.
Nesse sentido, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) pediu que as entidades participantes da audiência enviem à comissão as sugestões de aprimoramento legislativo que devem ser feitas para a efetivação da logística reversa.
Logística Reversa
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) define a logística reversa como instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos ou outra destinação. Acordo setorial é um ato contratual, firmado entre o poder público e fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes, tendo em vista a implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto.
De acordo com Zilda Veloso, já existem acordos para o tratamento de embalagens de óleos lubrificantes; até junho será firmado o de lâmpadas e embalagens em geral (as que vão para as casas dos consumidores com alimento, bebida, papel e plástico); em julho dever ser fechado o de eletroeletrônicos; e está próximo o início da vigência do acordo para a destinação de medicamentos. Depois de todos esses já firmados, serão revistos os já existentes para embalagens de agrotóxicos, pneus, pilhas e baterias e óleos lubrificantes.
09/04/2014
Agência Senado
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