Ferramenta torna planejamento cirúrgico mais seguro
Pesquisa mostra que prototipagem rápida pode ser usada em procedimentos médicos
Pesquisas desenvolvidas para fundamentar tese de doutorado defendida na Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) da Unicamp geraram uma nova técnica de auxílio ao planejamento cirúrgico. O método aplicado é a inspeção por digitalização em uma metodologia conhecida como prototipagem rápida, ou seja, a impressão de peças em três dimensões que reproduzem modelos reais em diversos tipos de materiais.
Cristiane Ulbrich, pesquisadora responsável pela tese, explica que a prototipagem rápida é usada amplamente em vários setores, como o automobilístico, design, embalagens, equipamentos e bens de consumo. Segundo ela, a idéia é reproduzir fisicamente o projeto virtual de maneira que a equipe tenha na mão um modelo pronto antes de começar a produzir em escala. “Há a possibilidade de se verificar se as peças encaixam-se, ou se há a necessidade de se fazer alterações no projeto”, afirma a pesquisadora, que foi orientada pelo professor Helder Anibal Hermini. O protótipo pode ser produzido em diversos tipos de material, tamanhos e até mesmo cores, dependendo da aplicação desejada.
Na área médica, a técnica pode ter várias aplicações, como na confecção de próteses personalizadas, de implantes, e de biomodelos utilizados em simulações de planejamento cirúrgico. “Com a peça na mão, o médico tem mais possibilidades para o planejamento da cirurgia”, avalia.
De acordo com a pesquisadora, embora o uso médico corresponda atualmente a apenas 9% do mercado de prototipagem rápida, há espaço para crescimento, uma vez que a técnica pode gerar muitos benefícios para médicos, pacientes e hospitais. Segundo Cristiane, no Centro de Pesquisas Renato Archer (Cenpra), em Campinas, nos últimos quatro anos foram feitos pelo menos 700 estudos com o uso da prototipagem rápida, com resultados positivos. “Com este tipo de planejamento, o tempo da operação pode diminuir, o que é bom para o médico e para o paciente. Além disso, pode haver queda nos custos gerais do procedimento”, explica.
A pergunta levantada pela pesquisadora em sua tese foi se as técnicas de prototipagem rápida reproduzem com precisão as dimensões e os detalhes anatômicos do corpo humano a ponto de serem uma referência confiável para o médico no momento do planejamento cirúrgico. “Um dos principais questionamentos do uso de prototipagem rápida era o quanto havia de variação entre a peça e o modelo e se essa variação poderia interferir no planejamento de uma cirurgia”, explica Cristiane, que também é sócia de uma empresa especializada no desenvolvimento de equipamento médico hospitalar.
Para a análise desta questão, Cristiane desmembrou todas as informações sobre o processo. Ela explica que o processo de prototipagem rápida é feito em três etapas. Na primeira etapa, o paciente passa por uma tomografia computadorizada, por meio da qual são obtidos os dados. Depois, há a segmentação da imagem – o médico pode determinar a área a ser reproduzida, se é o tecido, ou o osso, por exemplo. Nesta etapa é gerado um modelo virtual conhecido por CAD (Computer Aided Design), que vai ser a referência para a impressão da peça. Na terceira etapa é feita a confecção de um modelo por prototipagem rápida.
Em cada etapa do processo foram testados três tipos diferentes de técnicas, para efeitos comparativos. A intenção foi verificar se não haveria diferenças de resultados entre softwares e equipamentos diferentes.
Cristiane verificou a existência de 28 tipos de prototipagem rápida, mas optou pela Impressão Tridimensional da Z Corporation por apresentar o menor custo (equipamento e máquina). Ademais, a pesquisadora afirma que o equipamento oferece a possibilidade de se atuar com materiais diferentes, gera pouco ou nenhum lixo tóxico e várias instituições de pesquisa no país já têm a máquina, que dispõe de assistência técnica nacional. “Escolhi a impressora tridimensional porque a idéia é tornar este tipo de serviço mais acessível”, afirma. Hoje, cada peça reproduzida custa entre R$ 300 e R$ 600, de acordo com a área a ser reproduzida e o tamanho do modelo.
Cristiane também adicionou mais uma etapa a este processo: a inspeção por digitalização. Nesta etapa a peça final é digitalizada para que seja feita a verificação de suas dimensões. Este é um dos diferenciais do trabalho, porque ela substituiu a medição linear pela medição tridimensional.
Usando esta metodologia ela fez três estudos de caso, usando protótipos de crânio como referência. Seu primeiro estudo de caso foi a reprodução do rosto de uma múmia conhecida por “A Bela de Tebas”, que está no Museu Nacional no Rio de Janeiro. Cristiane lembra que a mesma técnica foi utilizada na reconstituição do rosto de um dos faraós mais conhecidos do Egito – Tutankamon – realizada em 2005.
Resultados – Outros dois modelos apresentaram resultados semelhantes e positivos para a técnica. Segundo Cristiane, os modelos virtuais são bastante similares entre si. “O erro médio na dimensão dos protótipos avaliados na pesquisa ficou em torno de 0,6%”. Contudo, Cristiane é cautelosa quando afirma que os resultados obtidos dependem dos recursos de software utilizados e do treinamento técnico do operador. “É recomendável que o processo de segmentação de imagens seja acompanhado por um profissional especializado e de preferência supervisionado e aprovado pela equipe médica que utilizará o biomodelo”.
Outro resultado de seu trabalho é o desenvolvimento de uma peça colorida, que demonstra a partir das cores as variações entre o tamanho da peça e o modelo real. Cristiane descreve que no modelo gerado em seu trabalho as partes vermelhas sinalizam as áreas onde a variação no tamanho é maior, enquanto nas partes azuis a variação é menor e as partes verdes correspondem ao tamanho exato. “As partes amarelas estão bem no limite”, afirma.
A pesquisadora acredita que, se adotadas como parte do procedimento de planejamento cirúrgico, as peças coloridas podem ser um diferencial. “A partir das cores, médicos podem mensurar e visualizar melhor possíveis diferenças dimensionais, prevenindo que as mesmas interfiram no processo”, afirma.
Do Jornal da Unicamp