FHC lança ofensiva para recompor com o PFL









FHC lança ofensiva para recompor com o PFL
Presidente aciona canal alternativo no partido e reúne comando do PSDB para definir estratégias

BRASÍLIA – A crise com o PFL e a dificuldade em aprovar a emenda que prorroga a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) forçaram o presidente Fernando Henrique Cardoso a dar expediente no domingo. Ele reuniu o comando do PSDB e o candidato José Serra (PSDB-SP) no Palácio da Alvorada, para avaliar o cenário e definir as estratégias do governo e do partido. Antes disso, investiu na criação de um canal alternativo de interlocução com o PFL: recebeu, para uma conversa particular e sem testemunhas, o ministro do Tribunal de Contas da União Guilherme Palmeira, ex-senador pefelista, amigo da confiança do presidente do partido, senador licenciado Jorge Bornhausen (SC).

A avaliação dos tucanos é que a CPMF passará na Câmara esta semana, mas restará o desafio de apressá-la no Senado, onde o PFL mantém a disposição de criar dificuldades para a aprovação da proposta, aumentando o rombo no caixa do governo. Caso a novela se arraste no Senado, estará configurada uma situação de crise, com possibilidade de alta do dólar e até mesmo de rebaixamento do Brasil pelas agências de avaliação de risco. Por isso, a principal preocupação do PSDB e do presidente hoje é fazer com que o PFL encontre o caminho de volta.

“O PFL está numa situação muito difícil, mas precisamos ajudar o partido a encontrar uma solução”, resumiu um dos presentes, durante a conversa no Alvorada, que além do anfitrião e do candidato reuniu o ministro das Comunicações e futuro coordenador da campanha de Serra, Pimenta da Veiga, o líder do governo na Câmara, Arnaldo Madeira, e o presidente do PSDB, deputado José Aníbal (SP).

Foi pensando em facilitar a vida do PFL que Fernando Henrique recebeu Palmeira e ganhou um aliado para costurar a reaproximação. Como a crise acabou fechando os canais de interlocução com o comando do PFL, o governo apelou para Palmeira, insistindo em avisar que não haverá retaliações a pefelistas ainda em cargos federais.

A avaliação geral é que será difícil sustentar a candidatura presidencial da governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL). O problema, agora, é evitar que se chegue ao desfecho da renúncia sem que antes governo, tucanos e pefelistas acertem uma saída negociada, que não comprometa ainda mais a imagem do PFL. E a parceria com o PMDB na corrida sucessória está adiantada, deixando claro ao PFL que os tucanos já escolheram o parceiro preferencial para dividir o próximo governo, em caso de vitória.

Votação – Além da análise da situação de cada partido na disputa presidencial e das estratégias para a campanha de Serra, os tucanos trataram da tática a ser adotada a partir desta semana para garantir a prorrogação da CPMF. “O PFL compreende a importância da CPMF para o País e sabe que não é uma questão de governo”, disse Pimenta da Veiga ao fim do encontro. A idéia é envolver a opinião pública na batalha da aprovação, como uma forma de forçar os pefelistas a votarem “a favor do Brasil”.

Com viagem oficial para o Chile marcada para esta tarde, o presidente teve pressa em conversar com Palmeira para não embarcar sem antes dar um sinal concreto de boa vontade com o PFL. Um dirigente pefelista diz que o clima na cúpula do partido é de irritação com o presidente. “Não há a menor hipótese de vir uma boa notícia do Alvorada”, resumiu. Ele salienta que Bornhausen se sente traído pelo presidente.

Como as duas tentativas de aproximação do PFL, feitas na semana passada por Fernando Henrique e Pimenta, fracassaram, a ordem agora é cautela. O discurso do senador José Sarney (PMDB-AP) e o depoimento do superintendente da Polícia Federal, Agílio Monteiro, esta semana, provocam temores.

Não é sem razão. Circula nos bastidores a informação de que Sarney será muito duro contra o presidente, na tentativa de arrastá-lo para crise. Mas os líderes tucanos e governistas já acertaram que nem Fernando Henrique nem o candidato Serra devem se envolver diretamente nas polêmicas em torno de “espionagem e arapongagem”.


Tucanos temem que Sarney escolha Serra como alvo
Senador deve subir à tribuna amanhã para defender a filha Roseana e atacar governo

BRASÍLIA – O candidato do PSDB à Presidência, senador José Serra (SP), corre o risco ficar sob artilharia pesada do senador José Sarney (PMDB-AP), pai da governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), sua adversária na corrida sucessória. Pela terceira semana consecutiva, Sarney ameaça subir amanhã à tribuna para um discurso contra o governo e seu candidato.

A diferença, desta vez, é que o presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), não fará apelo algum para que Sarney desista da ofensiva – marcada para o dia do aniversário de Serra.

Diante das turbulências da semana, a cúpula tucana ainda não decidiu se esconde ou expõe seu candidato com uma festa para comemorar seus 60 anos. Mesmo decididos a assumir a dianteira da defesa do presidente e do candidato no plenário do Senado, dirigentes do PSDB estão avaliando que o melhor é mantê-lo longe da “baixaria”.

A avaliação é que a convocação do superintendente da Polícia Federal, Agílio Monteiro, para dar explicações aos senadores, na quarta-feira, sobre a operação na Lunus, empresa de Roseana e seu marido Jorge Murad, acabará beneficiando Serra e o PSDB. “Ficará provado que tudo foi feito de forma legal e com a discrição da polícia”, aposta o líder do PSDB na Câmara, Jutahy Júnior (BA).

Polêmica – A ordem é tocar a campanha sem entrar na polêmica das denúncias de espionagem. Foi assim na semana passada, quando Serra participou de um jantar com a comunidade israelita de São Paulo e fechou a sexta-feira em um almoço com 20 empresários de grandes companhias italianas no Brasil.

As viagens do candidato aos Estados serão retomadas em um novo modelo, com roteiros temáticos pelo interior do País. Em vez de mobilizar um público grande para um comício, a estratégia é promover reuniões setoriais, nas quais o candidato será convidado a fazer exposições de projetos específicos. A próxima viagem a Pernambuco, por exemplo, deverá ficar restrita a um encontro com fabricantes de gesso, um setor em expansão no Estado. Pelo menos, é esta a sugestão do presidente do PSDB pernambucano, deputado Sérgio Guerra. Na Bahia, três compromissos temáticos já estão previstos, com visitas à região produtora de cacau, um encontro com os plantadores de algodão e uma viagem para conhecer a expansão da fronteira agrícola de soja.


Ex-auxiliar de Roseana é acusado de destruir provas
Procuradores atribuem a Falcão sumiço de fitas que registraram reunião que aprovou projeto Usimar

SÃO LUÍS – Um ex-gerente do governo do Maranhão que atuava como lobista da Usimar está por trás do desaparecimento e inutilização de duas fitas com gravações da reunião do Conselho Deliberativo (Condel) da Sudam na qual foi aprovado o projeto, em 14 de dezembro de 1999. A conclusão é de procuradores do Ministério Público Federal (MPF) que investigam o caso. As fitas continham o teor das restrições ao financiamento de R$ 690 milhões feitas pelo representante do Ministério da Fazenda, José Barroso Tostes Neto, único dos 20 membros do conselho a se opor ao projeto – que causou um rombo de R$ 44 milhões nos cofres públicos.

De acordo com as investigações, Alexandre Rizzoto Falcão – então gerente-adjunto de Indústria e Comércio do Maranhão – foi designado pelo gerente Jorge Murad, marido da governadora Roseana Sarney (PFL), anfitriã e presidente do encontro, para coordenar o cerimonial d o governo, responsável pelas gravações das sessões. Durante mais de uma hora, Tostes avaliou que os controladores da Usimar não tinham capacidade financeira para assumir o empreendimento – para cada real emprestado pela União, os empresários investiriam outro real.

O alerta não foi considerado pelos demais conselheiros e também não pôde ser transcrito pela Secretaria do Condel. Uma das fitas desapareceu “misteriosamente”, segundo os procuradores, e a outra foi entregue inaudível por Falcão. O cerimonial alegou “problemas técnicos”.

A relação obscura de Falcão com a Usimar tem antecedentes. Foi ele quem avaliou em R$ 0,12 por metro quadrado o preço do terreno desapropriado e vendido pelo Estado à empresa. Também foi ele quem recebeu em novembro de 1999, no lugar dos representantes da Usimar, uma equipe de fiscalização da Sudam que foi a São Luís e não encontrou, no canteiro de obras, o maquinário declarado pela empresa, no valor de R$ 102 milhões. Na ocasião, ele alegou que o equipamento estaria no Porto de Paranaguá (PR), o que não se confirmou.

“Sua atuação foi tão decisiva que parecia agir mais como sócio da Usimar do que como agente do Estado”, concluíram os procuradores na ação por improbidade contra 40 agentes públicos envolvidos no caso, inclusive Roseana e Murad. Em depoimentos ao MPF, empreiteiros da Usimar confirmaram o envolvimento de Falcão.

No ano passado, a Polícia Federal (PF) também apreendeu no escritório de Aldenor Cunha Rebouças, que prestou consultoria para a Usimar e outros projetos da Sudam, canhotos de talão de cheques que registrariam pagamentos a Falcão e ao atual gerente-adjunto de Indústria e Comércio do Maranhão, Clineu César Filho. No processo, Clineu declarou nunca ter tido nenhum negócio com Rebouças. Procurado desde quinta-feira, Falcão não foi localizado pela reportagem.

Operação Merlin – Nesta semana, a PF deve desencadear a “Operação Merlin 2” para investigar novas fraudes em projetos financiados pela Sudam em cinco Estados, onde já foram abertos 194 inquéritos relacionados às irregularidades.A partir de hoje, oito delegados da Divisão de Repressão ao Crime Organizado e Inquéritos Especiais (Decoie) serão deslocados para diversas regiões.

Fontes da PF afirmaram que a operação será para identificar outras possíveis fraudes nos projetos da Sudam, o que pode aumentar o valor final do rombo praticado contra os cofres públicos, hoje avaliado em R$ 1,7 bilhão. A operação será realizada no Tocantins, onde o delegado Hélbio Dias Leite continuará as investigações em 81 inquéritos instaurados. As investigações serão centralizadas no Maranhão e no Tocantins, onde, segundo os procuradores da República, estão as fraudes mais escandalosas.


Pefelista decide desengavetar Lei da Mordaça
Acuado pela operação policial que revelou o R$ 1,34 milhão de origem desconhecida e abalou a candidatura à Presidência de Roseana Sarney, o PFL tirou às pressas da gaveta do Senado duas armas que atormentam os procuradores da República – responsáveis pelas investigações sobre improbidade administrativa e atos lesivos ao Tesouro.

Na quarta-feira, o senador Belo Parga (PFL-MA) pôs na pauta de votação da Comissão de Constituição e Justiça da Casa o dois projetos que, segundo os procuradores, buscam esvaziar suas atribuições constitucionais e neutralizar o Ministério Público Federal. Os projetos foram arquivados há dois anos. De volta à cena, podem ser votados ainda nesta semana.

Um dos projetos, a Lei da Mordaça, prevê alterações na Lei 4898/65 (Lei do Abuso de Autoridade), impondo censura aos promotores de Justiça, procuradores, delegados de polícia, juízes e conselheiros dos tribunais de contas. Eles ficam proibidos de se manifestar ou divulgar fatos de que tenham ciência “em razão do cargo”.

A outra proposta estabelece foro privilegiado para autoridades processadas em caráter civil, com base na Lei da Improbidade e do Enriquecimento Ilícito, e limita em seis meses o prazo para conclusão do inquérito civil.


Lula vai ao ataque e elege Serra como alvo
Petista, que deve ter candidatura oficializada na quarta, prevê a mais difícil campanha de todas

O PT vai declarar guerra ao concorrente do PSDB, José Serra, a partir de quarta-feira, quando Luiz Inácio Lula da Silva for anunciado oficialmente como candidato petista à Presidência. Na tarde de ontem, logo depois de disputar a prévia com o senador Eduardo Suplicy (SP), Lula mudou o tom do discurso e partiu para o ataque, elegendo Serra como alvo. “Eu estarei nas ruas e vamos fazer o enfrentamento de projetos com o governo federal”, afirmou.

Lula acusou o Ministério da Saúde, que foi comandado por Serra até o mês passado, de estar “institucionalizando o grampo” e disse estar assustado. “É muito grave que, depois de acabarmos com o regime autoritário, uma ministério contrate empresas de espionagem”, comentou ele, numa referência às denúncias feitas pelo PFL de que Serra teria mandado grampear os telefones da Lunus, empresa da governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), única mulher no time dos presidenciáveis.

Aliviados com o desfecho da prévia – que, antes mesmo do fechamento das urnas já atingira o quórum de 100 mil dos 861.953 filiados –, tanto Lula como Suplicy admitiram que esta será a eleição mais difícil para o PT. “O PSDB e o PFL teriam chegado a um melhor entendimento se fizessem uma prévia, como nós, sem precisar lançar um míssil da potência que lançaram contra Roseana”, ironizou Suplicy. “Se estão fazendo isso com os amigos, o que não farão conosco?”

Em tom de brincadeira, Lula lembrou ter afirmado, há três meses, que o crescimento de Roseana nas pesquisas não era problema dele, e sim de Serra. E provocou: “Parece que o Serra levou a coisa a sério e decidiu tomar providências para se livrar do problema.” Depois, ao anunciar que o PT partirá para a ofensiva, ele ressalvou que o partido não fará uma campanha de “baixo nível”. “Apresentaremos propostas”, garantiu. “Vamos enfrentar o rolo compressor do governo com nossos projetos”, completou Suplicy.

O presidente do PT, deputado José Dirceu (SP), disse que a campanha petista não poupará o governo e Serra das denúncias de irregularidades contra a extinta Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). “Se pensam que o PT ficará na defensiva, estão enganados”, garantiu. Para ele, a disputa presidencial será polarizada entre Lula e Serra. Na mesma linha, o deputado José Genoíno (SP), candidato do PT ao governo paulista, afirmou estar “estarrecido” com o que chamou de “táticas terroristas” dos tucanos. “O jogo está muito pesado, está sufocante”, resumiu.

Votação – Na tentativa de demonstrar unidade, Lula e Suplicy votaram juntos ontem, na sede nacional do PT, em São Paulo, faltando 20 minutos para o fechamento das urnas. “Vote em você que é justo, Lula!”, gritou o senador no momento em que o presidente de honra do PT preenchia a cédula. Lula ficou vermelho.

Resultados parciais da prévia serão divulgados apenas hoje, mas ninguém tem dúvida de que Lula venceu. De qualquer forma, embora a vitória seja dada como favas contadas, está em jogo o tamanho da aceitação de Lula dentro do partido, que completou 22 anos em fevereiro. Se Suplicy fizer mais do que 15% dos votos, o desgaste do líder petista estará evidente, principalmente depois de suas últimas tentativas de casar o PT com o PL.

O senador não escondeu que gostaria de ser vice na chapa petista, embora a cúpula da legenda não veja essa idéia com bons olhos. Tudo depende do seu cacife na prévia de ontem. “A partir do resultado das urnas, quem poderá pleitear isso são os filiados”, admitiu o senador. “Isso agora não depende mais de mim.”

A prévia foi realizada sem incidentes, em todo o País, mas não empolgou os militantes. No Distrito Federal, a falta de interesse foi tanta que não houve quórum. Dos 26 mil filiados, apenas 2.707 compareceram à votação, quando a participação mínima teria de ser de 3.900. Mesmo assim, o presidente regional do PT, Wilmar Lacerda, informou que os votos (90% para Lula, 9% para Suplicy e 1% em branco ou nulo) serão computados na totalização geral. Também houve prévias ontem para a escolha dos candidatos do PT aos governos do Paraná, Ceará, Piauí e Goiás.


Suplicy desabafa e diz que gostaria de ter feito debate
Senador lembra a Lula que, na idade dele, “não estava pronto para assumir a Presidência”

O senador Eduardo Suplicy (SP) aproveitou ontem a presença ao vivo e em cores de Luiz Inácio Lula da Silva, na sede do PT, para travar com ele o debate que gostaria de ter feito antes da prévia. Fez desabafos e abriu o coração, como se estivesse em um divã. A cena provocou um misto de gargalhada e constrangimento.

Sentado bem perto de Lula para uma entrevista, Suplicy não deixou por menos. “Quando eu tinha sua idade, Lula, não estava completamente pronto para assumir a Presidência como estou hoje, aos 60 anos”, disse o senador, lembrando que o companheiro tem 56 anos, quatro a menos do que ele. Depois, emendou: “Eu gostaria de ter feito o debate com você, claro, mas fica para uma próxima vez.”

Sem graça, Lula sorriu amarelo. “Debate e disputa política devem existir quando duas pessoas pensam diferente e eu não entendi assim, Eduardo”, justificou o presidente de honra do PT.

Sempre repetindo que, mesmo assim, estava “muito contente”, o senador voltou a provocar o “rival” na prévia. “Sabe, Lula, vou fazer aqui uma revelação: eu votei em mim mesmo”. À mesa, a prefeita Marta Suplicy, ex-mulher do senador, estava séria enquanto o presidente do PT, deputado José Dirceu (SP), ria sem parar.

Suplicy fez a “revelação” ao recordar que, pouco antes, Lula mostrara seu voto para um amigo, ali mesmo. “Quando você fez aquilo, pensei: será que faço um gesto de amizade, voto em Lula e mostro para todos?”, contou, confessando ter mudado de idéia rapidamente. “Só que aí eu pensei também: ora, eu acredito em mim; então, vou votar em mim, porque estou no meu melhor momento.”

Não contente, o senador foi além. “E olhem que passei por períodos difíceis no ano passado, mas tudo o que tive de dificuldade transformei em energia!”, argumentou. Suplicy não citou os problemas, mas todos entenderam que ele se referia à separação de Marta, com quem esteve casado durante 36 anos.

Ainda na linha divã, o senador disse que não gostou quando viu Lula viajando em companhia do senador José Alencar (PL-MG) para Minas.

“Tive a impressão, Lula, de que não só você estava movendo o palheiro inteiro por sua candidatura como escolhendo o seu vice”, comentou. “Duvido, Eduardo, que você tenha visto eu pedir um voto nessa viagem que fiz com Alencar”, respondeu o líder petista.

Para uma platéia estupefata com a sinceridade em público, Suplicy também notou que considerava mais difícil vencer a prévia do PT que ganhar a eleição para a Presidência. “Pois é, se você ganhar, tem reeleição”, lembrou Lula. “Eu não sou favorável a isso”, rebateu o senador, que ontem fez boca-de-urna em três diretórios de São Paulo. Suplicy também disse que foi bom para Lula ter disputado a prévia. “Eu falava que seria melhor para você esperar uma próxima ocasião para concorrer à Presidência, mas agora, se vencer a prévia, os filiados estarão dizendo: ‘Sim, Lula, queremos você presidente’”, concluiu.


Artigos

Eficiência na educação superior? Que pecado!
Roberto Leal Lobo e Maria Beatriz de C. M. Lobo


A matéria publicada em 10/3, domingo, no Estado, foi das mais completas e corajosas que a imprensa diária brasileira produziu nos últimos anos sobre o ensino superior público brasileiro.

É preciso esclarecer, entretanto, que um grande problema que o Brasil enfrenta, e que pode ser mascarado pelo teor da reportagem, é imaginar, ingenuamente, que o aluno do setor particular vai assegurar, por meio de suas mensalidades, a integração do bom ensino, da boa pesquisa e da boa extensão, enquanto o Estado vai continuar, sozinho, a cobrir, em todos os sistemas públicos, o inchaço de pessoal, a universalização do tempo integral, recursos de pesquisa para todos, independentemente de resultados.

Nos EUA, as universidades de pesquisa são mais caras que as demais e, ainda assim, têm turmas maiores, como compensação para poder liberar os professores para a pesquisa. Lá, existe uma realidade orçamentária, é preciso fazer opções e a discussão não se restringe a exigir a famosa "vontade política das autoridades".

Por isso, se o setor particular não conseguir captar recursos de outras fontes que não a das mensalidades escolares, sangradas pela inadimplência, se não aprenderem a planejar para realizar uma pesquisa minimamente qualificada, continuará sendo um sonho, ou um engodo, a convivência do ensino, da pesquisa e da extensão nestas instituições.

Por outro lado, as universidades públicas acomodaram-se em conviver com orçamentos oficiais extremamente rígidos, que quase só pagam pessoal, principalmente no setor federal, suplementados muitas vezes pelas fundações de apoio geridas autonomamente - beneficiando mais os professores do que as instituições, mas que asseguram um mínimo de custeio, investimento e complementação salarial aos docentes nas áreas mais competitivas - mesmo premidas pelas exigências descabidas de atendimento de massa, de pesquisa e de alta qualidade, contrariando qualquer possibilidade de realização de uma missão focalizada e exeqüível (ninguém é e pode ser bom, em tudo e para todos).

No entanto, esta mesma realidade, que era comum na Europa de décadas atrás, está sendo substituída, lá, pelas universidades empreendedoras que, para o cumprimento de suas funções acadêmicas e em nome de suas autonomias, não somente políticas e acadêmicas, mas também estas, resolveram organizar-se para buscar fontes alternativas de recursos, que em sua maioria já eram canalizados para as instituições mais tradicionais, ampliando atividades e adicionando um outro tanto aos recursos estatais.

Nestas universidades, nem os alunos nem o Estado são responsáveis exclusivos pelo financiamento. Por isso, elas podem realizar pesquisas de qualidade em escala, admitir professores em tempo integral, em suma, realizar-se em sua missão universitária integral.

O pano de fundo da matéria foi o sucesso de uma instituição particular, a Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), ao implantar uma área de pesquisa capaz de participar do projeto Genoma e adquirir notoriedade nacional, mesmo com poucos recursos institucionais oriundos de mensalidades.

Como reitor e vice-reitora, na época em que se planejou a implantação da pesquisa na UMC e em que foram tomadas as decisões estratégicas necessárias para assegurar a viabilidade deste projeto, numa universidade que nunca antes havia captado recursos de agências de fomento para a pesquisa científica, e que, depois de três anos de gestão, passou a ser o segundo captador privado na Fapesp, gostaríamos de testemunhar, primeiramente, que, sem um planejamento estratégico muito cuidadoso, a pesquisa, provavelmente, não teria tido sucesso na UMC.

Em segundo lugar, que a área escolhida, não por acaso, teve um crescimento e uma repercussão até acima do esperado. E, em terceiro lugar, que a instituição teve muito critério, e sorte, na escolha de seus pesquisadores, porque, sem sua competência, dedicação e seriedade, nenhum planejamento, por melhor que fosse, teria sucesso.

No entanto, ess a experiência, provavelmente, não poderá ser repetida, pois o setor particular, dentro da atual política de ensino superior no Brasil, terá enormes dificuldades para adotar modelo parecido, uma vez que as fontes de recursos são escassas e saturadas, as instituições particulares, de modo geral, não sabem o que é criar um ambiente de pesquisa científica e, por fim, os investimentos em pesquisa, que incluem professores competentes em tempo integral, estímulos à produção intelectual relevante numa carreira docente e investimentos de infra-estrutura, não podem ser gerados a partir de mensalidades médias de R$ 500,00.

Acertar, com pouco investimento e pouca diversidade, no problema certo, na hora certa é, no mínimo, reservado para poucos, e uma política nacional de pesquisa, que deve incluir as instituições privadas, não pode depender disso. Nos países mais avançados, a pesquisa é coberta por fontes adicionais às mensalidades. Assim é na Europa, onde os recursos de ensino e pesquisa são diferentes e somados no apoio às IES às pequenas mensalidades. Nos EUA, as instituições públicas recebem recursos dos Estados e das agências de fomento e o setor particular sem fins lucrativos não conta com mais de um terço de suas receitas vindo das anuidades, muito maiores que as brasileiras.

Enquanto falar em eficiência, eficácia, produtividade, recursos, usuários, demanda ou gestão for considerado uma rendição ao neoliberalismo e enquanto as universidades forem mais dos professores do que dos alunos e da sociedade, será difícil reverter o quadro perverso que se instalou no sistema público de ensino superior.

Financiar os alunos (para que eles possam estudar, captar novas receitas sem se mercantilizar), aperfeiçoar a gestão para aumentar a eficiência, saber afastar os incompetentes e pouco dedicados (mas que continuam a receber por décadas), avaliar e planejar sempre são os desafios que o sistema universitário brasileiro, como um todo, vai ter de enfrentar, para poder contribuir para o desenvolvimento nacional - e sobreviver. Tudo isso precisará ser apoiado por um projeto nacional explícito e corajoso para o ensino superior, muito além do Provão.


Colunistas

RACHEL DE QUEIROZ

Estamos quase ultrapassando a linha divisória
Apesar da banalização atual das cirurgias para transplante do coração, a gente ainda não deixa de se perguntar: será que a natureza previa a transplantação de órgãos? Se a não previa, por que teria imposto ao organismo animal tantas e tão intolerantes defesas, essa quase espécie de xenofobia, essa cortina de anticorpos a fechar as fronteiras da carne, tentando proibir qualquer promiscuidade orgânica com outro indivíduo, seja embora o doador da mesma espécie, da mesma raça, do mesmo tipo de sangue do receptor? Promiscuidade, diz a natureza, só mesmo para os fins de reprodução - e pelos canais competentes. Fora disso, nada.

O que é evidente é que Deus Nosso Senhor considera o animal a sua obra-prima por excelência. Cada indivíduo, cada série, tudo ótimo, não são suscetíveis de alteração. Chega-se mesmo a duvidar da teoria da evolução, na qual se acredita mais por uma questão de fé, pois ver de verdade nunca vimos; nunca fomos, que eu saiba, testemunhas de nenhum processo de evolução em marcha num organismo vivo. Tanto quanto me deixa saber a minha ignorância, tudo ainda são teorias. As alegadas provas que se apresentam a respeito, são fósseis. E depois do bicho virado pedra, passados milhões de anos - trata-se pelo menos de um testemunho por demais longínquo, não?

No reino vegetal não há tanto rigor. Milhares de vegetais pegam de galho e recebem enxertos de variedades diferentes. A glória da jardinagem, da horticultura e da floricultura está mesmo na criação desses híbridos por enxertia. E há organismos animais, como a ameba, que se dividem; e há lagartixas que conseguem fazer crescer outra vez a cauda decepada. E os jornais sensacionalistas tentaram fazer crer que em laboratórios já se criam cães de duas cabeças, mas cadê esses cães?

Por ora, a regra velha ainda vinga: Deus considera perfeitos os homens e os bichos, tais como os criou, e não admite alterações na sua morfologia. E até mesmo os híbridos por cruzamento, a natureza permite mas não gosta deles, tanto que os faz estéreis.

Realmente, se e quando o homem puder interferir na morfologia das espécies, mal se pode pensar a que fantasias loucas se entregará a humanidade desvairada. Aliás, o processo já anda muito adiantado com clonagem. Desde que apareceram na mídia as comoventes fotos da ovelha Dolly e sua breve peregrinação por este mundo, o caminho ficou aberto e até a novela de televisão já trouxe o clone humano - aquele patético Leo - para um simulacro da vida real.

Freguesia é que não vai faltar. Os patrões gananciosos que pagassem a criação de operários com quatro braços, para que pudessem trabalhar a quatro mãos? E a cantora riquíssima que pretendesse obter uma garganta tipo Maria Callas? Ou, pior de tudo, o ditador megalomaníaco que exigisse dos clonadores uma espécie de supersoldados, para os seus exércitos, homens com couraça de jacaré, estômago jejuador de camelo, força de cavalo; e, além disso, miolos de burro para que obedeçam cegamente ao seu senhor?

E não se diga que o homem não faria isso, porque tem amor ao seu corpo tal como ele é; o homem não tem amor a nada, o homem é doido. Tanto quanto pode, ele já se desfigura com tatuagens, brincos, batoques, cicatrizes - e operações plásticas de efeitos duvidosos. E só achar quem faça.


Editorial

MAIS CRÉDITO PARA OS EMERGENTES

As condições para o Brasil estão melhorando no mercado financeiro internacional. Se não houver nenhum abalo inesperado, o País poderá financiar facilmente suas contas externas, neste e no próximo ano, e em condições bem mais favoráveis que as de 2001. Mantida a tendência, o Banco Central terá maior segurança para reduzir os juros básicos da economia brasileira. Isso tornará menos cara a dívida pública e, ao mesmo tempo, diminuirá os custos de financiamento tanto para empresas quanto para consumidores. Por enquanto, o que se observa é uma série de novidades altamente positivas e surpreendentes até para analistas financeiros.

Desde fevereiro, tem despencado o prêmio de risco dos emergentes - a diferença entre o que paga o Tesouro americano e o que esses países têm de pagar para obter financiamento novo ou para rolar seus papéis. Na quinta-feira, o risco Brasil ficou em 698 pontos, completando um recuo de 19,8% neste ano. O EMBI+, indicador que reflete o risco de 18 emergentes, desceu para 592 pontos, o menor nível desde a crise da Rússia, em 1998. Esse indicador é estimado pelo Banco JP Morgan e reflete a diferença entre o custo do financiamento para o Tesouro americano e aquele pago pelos demais governos.

As condições para a Rússia têm melhorado até mais acentuadamente. No mesmo dia, o EMBI+ calculado para a Rússia chegou a 495 pontos-base.

A percepção de risco dos mercados tem mudado por vários fatores. O mais importante, naturalmente, é a melhora dos fundamentos de várias economias emergentes, incluída a brasileira. As contas públicas estão mais controladas, a inflação é moderada na maior parte das economias e em muitos países prosseguem os programas de reformas. No caso brasileiro, os operadores de mercado levam em conta, de modo especial, o surgimento de um superávit na balança comercial e a redução do déficit em transações correntes. A economia tende a tornar-se bem menos vulnerável a choques, se não houver uma inversão de tendência. Mesmo a turbulência política recente parece ter produzido pouco efeito no mercado financeiro.

O contágio da crise argentina, desde o ano passado, também foi muito restrito. O Brasil venceu com certa facilidade essa e outras perturbações que ocorreram em 2001, como o racionamento de energia, a instabilidade cambial durante mais de um semestre, a insegurança criada pelos atentados de 11 de setembro e a forte desaceleração da economia mundial. O México foi outra das economias latino-americanas que atravessaram sem grave abalo as dificuldades do ano. A Argentina, ainda em busca de uma saída, tem permanecido como um problema quase isolado.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) também aponta o ressurgimento do otimismo no mercado global, em grande parte por causa da recuperação econômica dos Estados Unidos, como uma das causas dessa melhor disposição. A aversão ao risco, de acordo com o relatório do FMI, baixou quase ao nível anterior à crise da Rússia. Isso se reflete nos fluxos de recursos para as economias emergentes.

As agências de classificação de risco têm dado sinais de que poderão atribuir ao Brasil uma posição mais favorável, mas, por enquanto, o País continua sob observação. No dia-a-dia do mercado, a avaliação do Brasil já é melhor do que a sua posição nas classificações das agências. Essa diferença, segundo especialistas, poderá ser em breve corrigida, se nenhum tropeço ocorrer.

O investimento direto, no ano passado, foi maior do que se esperava, mas, ainda assim, o México passou a ocupar a segunda posição entre as economias emergentes, logo abaixo da China. O Brasil caiu para o terceiro lugar. O mais importante é que o País, segundo todas as indicações, deverá continuar atraindo grandes volumes de investimento direto. Segundo a Economist Intelligente Unit, o Brasil deverá receber, em média, US$ 24,2 bilhões por ano entre 2002 e 2006, começando com US$ 22 bilhões neste ano. As multinacionais devem ser atraídas, de acordo com o estudo, pelo tamanho do mercado brasileiro e pela possibilidade de usar o País como plataforma para abastecer a região. Todo o cenário, portanto, parece bastante razoável. Os políticos deveriam ter pelo menos o cuidado de não estragar essas perspectivas.


Topo da página



03/18/2002


Artigos Relacionados


Governo federal lança ofensiva para acabar com pesca ilegal

Educação estadual lança ofensiva contra drogas e cigarro

Educação estadual lança ofensiva contra drogas e cigarro

HSPE precisa de doadoras de leite para recompor seus estoques

Senadores vêem MP como insuficiente para recompor perdas dos estados

Para Alvaro Dias, proposta do governo é insuficiente para recompor o caixa das prefeituras