Governo vai cortar mais verba de parlamentares









Governo vai cortar mais verba de parlamentares
Despesas de R$ 7,2 bi, incluídas por emendas coletivas serão retiradas do Orçamento

BRASÍLIA - O governo está preparando o corte de todas as despesas incluídas no Orçamento de 2002 por meio das emendas coletivas dos parlamentares, o equivalente a cerca de R$ 7,2 bilhões. A medida, que será anunciada até segunda-feira, compensará a perda de várias receitas - entre elas a ocasionada pela correção da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) - e o aumento de - como o provocado pelo reajuste do salário mínimo para R$ 200 a partir de abril, o que amplia o déficit da Previdência Social. As emendas coletivas são aquelas apresentadas pelas bancadas estaduais e regionais ou pelas comissões da Câmara e do Senado.

A atitude do governo aumentará a insatisfação do Congresso, já descontente com as mudanças feitas pelo Executivo no projeto de lei do IRPF e ansioso por verbas em época de eleições. Havia até mesmo uma orientação do presidente Fernando Henrique Cardoso para que houvesse o máximo de cautela no ajuste do Orçamento para não comprar brigas desnecessárias com os parlamentares.

Entretanto, de acordo com uma fonte do Planalto, o corte das emendas coletivas será necessário para assegurar o cumprimento da meta de superávit primário (receitas menos despesas, exceto juros da dívida pública) de R$ 29,654 bilhões, fixado no acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). É o equivalente a 2,24% do Produto Interno Bruto (PIB).

O anúncio será feito com a divulgação do decreto de programação orçamentária deste ano, elaborada pelos ministros do Planejamento, Martus Tavares, e da Fazenda, Pedro Malan, com base em recente revisão completa das previsões de arrecadação e despesas. O cronograma conterá o limite de despesas para cada ministério até dezembro. Na prática, os tetos dos gastos serão compatíveis com a proposta original do Executivo.

Cenário - Como nos anos anteriores, o Executivo eliminará as despesas ampliadas pelo Legislativo e manterá os desembolsos planejados. Até pouco tempo, havia a expectativa na área econômica de um corte mais moderado, com base na melhoria do cenário econômico.

Apesar de concordar com os R$ 3,5 bilhões de receitas adicionais incorporadas pelo Congresso em decorrência do acordo entre a Receita Federal e os fundos de pensão para as entidades de previdência complementar voltarem a recolher tributos, as equipes da Fazenda e Planejamento foram surpreendidas com um quadro bastante diferente daquele desenhado em agosto, quando a proposta orçamentária foi elaborada. O dinheiro extra foi usado para cobrir os novos rombos.

A frustração de receitas foi calculada em mais de R$ 6 bilhões. As principais perdas virão da correção da tabela do IRPF (R$ 1,8 bilhão), do protelamento dos leilões das bandas C e D da telefonia celular (R$ 3 bilhões), isenção da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) para aplicações em bolsas (R$ 300 milhões) e rejeição, pelo Congresso, da criação da contribuição previdenciária dos servidores inativos da União (R$ 1,4 bilhão).

Do lado das despesas, a ampliação foi decorrente de gastos que não estavam contabilizados no Orçamento. É o caso do aumento do déficit da Previdência Social em R$ 4 bilhões; pagamento antecipado neste ano da segunda parcela do reajuste dos salários dos militares, anteriormente previsto para 2003; e da ampliação da folha de pessoal em R$ 800 milhões, em conseqência do acordo que pôs fim à greve das universidades e da Previdência Social.

Revisão - A redução das despesas incorporadas pelos parlamentares na proposta orçamentária original durante a tramitação do projeto no Congresso ficará pouco acima dos R$ 6 bilhões diminuídos do Orçamento de 2001 - valor que também correspondia às emendas coletivas. A praxe do governo nos últimos anos tem sido desconsiderar as emendas coletivas e preservar as emendas individuais dos parlamentares.

As emendas individuais, que totalizam R$ 1,2 bilhão para obras de interesse dos deputados e senadores em seus redutos eleitorais, são as únicas que possuem receitas correspondentes consideradas factíveis pelo Executivo.

Já as coletivas foram cobertas com receitas adicionais encontradas pelos congressistas e em grande parte não reconhecidas pela equipe econômica. Esses cortes poderão ser revistos ao longo deste ano, como costuma acontecer, à medida que houver excesso de arrecadação.


Debate sobre compensação de IR vira “jogo de empurra”
Idéia de elevar CPMF é rejeitada e aliados deixam busca de solução para o governo

BRASÍLIA - Virou jogo de empurra a negociação entre o governo e os aliados sobre a medida provisória que corrige a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física. A hipótese de elevação da alíquota da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) para compensar a perda de arrecadação, estimada em R$ 1,8 bilhão este ano, teve péssima repercussão no Congresso.

"Isto provocaria uma reação muito negativa, porque a carga tributária já está excessivamente pesada", disse o presidente do PMDB, deputado Michel Temer (SP). "Eu acho que a CPMF não sobe", apostou o vice-líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PPB-PR). "Primeiro, precisaria algum partido propor isso, e não sei quem o faria." Nenhum partido da base do governo o fará.

Os aliados já haviam sido surpreendidos com a elevação da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) das empresas prestadoras de serviços, incluída na MP do IR. Na terça-feira, os presidentes dos partidos da base reuniram-se com o presidente Fernando Henrique Cardoso para pedir que a MP fosse reeditada sem o artigo que aumenta a CSLL. A idéia de elevar a CPMF foi aventada nessa reunião, mas os aliados a rejeitam e recusam-se a apontar uma alternativa e atender o governo.

Técnica - "A questão é muito técnica", argumenta o líder do PSDB na Câmara, Jutahy Júnior (BA), ao defender a tese de que cabe aos técnicos do governo, e não aos políticos, propor uma solução. Jutahy diz que dará seu voto para aprovar qualquer solução que o governo apresente, até o aumento da CSLL, se não houver alternativa melhor. Mas os líderes do governo já alertaram a equipe econômica de que nem mesmo o PSDB está disposto a acompanhar Jutahy.

Com relação à hipótese de alterar a MP, os próprios aliados lembram que entre as restrições aprovadas pelo Congresso no ano passado está a proibição de reedições. "Entendo que a bola está no campo dos partidos, no Congresso", disse Fernando Henrique ontem, por intermédio de seu porta-voz, Georges Lamazière. Segundo ele, o que ficou acordado na reunião é que até a abertura dos trabalhos do Congresso, dia 15, os presidentes dos partidos presentes à reunião de terça-feira lhe levarão "uma fórmula melhor para solucionar a questão".

Indefinição - Lamazière afirmou que a elevação da CPMF não foi discutida na reunião de terça-feira. Temer dissera a mesma coisa mais cedo: "O que nós discutimos sobre a CPMF foi a prorrogação da cobrança", garantiu o deputado. Ele contou que alertou o presidente para o risco de contestação jurídica da elevação da CSLL.

A indefinição sobre as formas de compensação deve se arrastar até que o Congresso volte do recesso. Já está acertado que o ministro da Fazenda, Pedro Malan, e o secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, irão ao Congresso para dar explicações sobre a MP. Até o momento, a Receita não recebeu nenhuma orientação do Planalto para rever a medida ou estudar alternativas.

Na avaliação dos técnicos, o aumento da CPMF é possível, mas não é a melhor solução. Eles acham que a melhor alternativa é mesmo o au mento da CSLL para empresas as prestadoras de serviços que declaram o IR com base no sistema de lucro presumido.

Há duas semanas, quando a MP foi editada, Everardo disse que essa era a solução menos prejudicial, especialmente porque não é obrigatória. Segundo ele, nada impede que essas prestadoras de serviços passem a calcular o imposto com base no lucro real.


Roseana conversa com Serra e janta com FHC
Movimentos da pefelista em Brasília coincidem com aproximação entre PSDB e peemedebistas

BRASÍLIA – O ministro da Saúde e candidato do PSDB à Presidência, José Serra, e a governadora do Maranhão e presidenciável do PFL, Roseana Sarney, mantiveram longa conversa por telefone ontem em Brasília. Segundo o ministro, a ligação foi iniciativa da pefelista e a conversa foi “amena e simpática”. “Eu tenho ótimas relações com Roseana”, disse. Mas não quis revelar o conteúdo da conversa. À noite, Roseana foi recebida pelo presidente Fernando Henrique Cardoso no Palácio da Alvorada.

Os dois movimentos da pré-candidata pefelista coincidem com a notícia de que o PMDB caminha para enterrar a idéia de candidatura própria e aceitar a vaga de vice na chapa de Serra. Fontes do PFL, contudo, dizem que partiu de Serra o telefonema. As assessorias de Serra e Roseana confirmam a intenção de ambos de se encontrarem na próxima semana.

Segundo esses pefelistas, pesquisas de intenção de voto concluídas ontem por mais de um instituto indicam novo crescimento de Roseana, no segundo. Essas mesmas pesquisas mostrariam também discreto avanço do nome de Serra e pequena queda de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ainda líder nas intenções de voto.

Na saída do encontro com Fernando Henrique, Roseana garantiu que está determinada a manter sua candidatura e voltou a garantir não haver hipótese de aceitar o posto de vice na chapa de Serra. Ressaltou, contudo, que os partidos aliados não devem se atropelar nem perder de vista que o adversário real é Lula.

Sarney – O encontro da governadora do Maranhão com o presidente Fernando Henrique ocorre quase duas semanas depois que o presidente procurou seu pai, o senador José Sarney (PMDB-AP), para deixar claro que não concordava com os ataques que integrantes do PSDB estavam fazendo à sua filha. Na avaliação de estrategistas tucanos, aliás, a posição ostensiva de Sarney em defesa da candidatura de Roseana é o principal obstáculo nas negociações entre os dois partidos.

A governadora do Maranhão desembarca logo pela manhã em São Paulo, para novas gravações nos programas do PFL. À tarde, quem chega a São Paulo é Serra, que no dia seguinte participa de inauguração da sede da Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas (APCD) com Fernando Henrique.

Projetos – O presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), disse ontem, no Rio, que, mesmo com uma possível aliança de PMDB e PSDB, mantém a tese de que cada legenda leve seus projetos individuais até o fim de maio, quando deverão se unir em torno do candidato com melhor desempenho nas pesquisas.

Segundo Bornhausen, os presidentes dos quatro partidos aliados reafirmaram essa intenção no encontro com Fernando Henrique, anteontem. “Se não puder ocorrer, teremos mais de um candidato”, disse.


Cúpula do PMDB ensaia para desmontar prévia
BRASÍLIA – Setores expressivos da cúpula nacional do PMDB trabalham para apressar um acordo com o PSDB do ministro da Saúde, José Serra, na corrida presidencial. Mas até os mais apressados, como o líder na Câmara, Geddel Vieira Lima (BA), sabem que têm etapas a cumprir antes de formalizar a parceria. Como o objetivo é compor uma chapa, não apenas aderir aos tucanos, o primeiro desafio é desmontar, na cúpula e nas bases, as prévias marcadas para 17 de março.

Segundo um dirigente nacional do PMDB, a luta agora é para convencer os pré-candidatos e as bases partidárias – defensores da candidatura própria – de que a aliança com Serra é o melhor caminho para ajudar os candidatos a governador e garantir a eleição de grandes bancadas na Câmara e no Senado. Há pelo menos dois interesses em jogo: Serra está de olho nos dez minutos diários que o PMDB deverá ter no horário eleitoral gratuito de rádio e televisão, enquanto os peemedebistas querem a Vice-Presidência.

Os partidos só saberão o tempo de propaganda em junho, quando todos os partidos tiverem definido seus candidatos e parceiros. O PSDB também deverá dispor de dez minutos diários e planeja dobrar esse tempo firmando aliança com o PMDB – isso equivaleria a um terço do tempo total do horário gratuito. Já o PFL não chegará, sozinho, aos 14 minutos.

“Para ter êxito, o governo precisa ser de coalizão. Já temos composições importantes com o PMDB em alguns Estados”, comenta o presidente do PSDB, deputado José Aníbal (SP).

Depois de conversar com Serra nesta semana, Geddel tornou públicas as articulações de bastidor: “Constato que fica cada vez mais difícil conseguir candidato próprio competitivo e defendo que as negociações comecem já.”

Quatro nomes de vice já foram cogitados, além do governador de Minas, Itamar Franco. Se o vice for nordestino, os mais cotados são os governadores do Rio Grande do Norte, Garibaldi Alves, e de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos. No Sul, são lembrados o senador Pedro Simon (RS) e o prefeito de Joinville, Luiz Henrique.

Críticas – “Esta movimentação do Geddel é fogo de palha”, criticou o ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann, um dos pré-candidatos do partido. As manobras para inviabilizar as prévias irritaram também aliados de Itamar. O presidente do PMDB em Minas, Saraiva Felipe, disse que “o líder na Câmara está agindo como um coveiro, tentando enterrar o PMDB antes da hora”.

Itamar só deve comentar o assunto depois de viagem a São Paulo, que começa hoje. Na agenda, terá encontros com presidente do PMDB paulista, Orestes Quércia, e com o presidente do PT, deputado José Dirceu (SP). Quércia não descarta a chance de se unir a Itamar para criar um fato político no partido – apoiarem, ainda que informalmente, a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).


Alckmin define novo secretário de Justiça
O promotor Alexandre Moraes assume a pasta, depois da desistência de Cláudio Lembo

Em meio à forte crise que atinge o setor da segurança pública, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) definiu ontem o nome do novo secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania: Alexandre de Moraes. Com 33 anos de idade, Moraes é promotor de Justiça há dez anos. Ele se notabilizou na carreira em 1997, quando investigou o polêmico contrato do ex-prefeito Paulo Maluf (PPB) para compra de frangos supostamente superfaturados. Na época, Moraes abriu ação civil acusando Maluf e a mulher, Sylvia, de improbidade administrativa.

Moraes toma posse hoje, discretamente. Não haverá solenidade. O próprio Alckmin vai estar fora, em viagem à região de Marília. Para assumir o cargo, Moraes decidiu deixar o Ministério Público Estadual, onde ingressou em dezembro de 1991. Os promotores que chegaram à instituição após a Constituição (outubro de 1988) não podem ocupar funções no Executivo.

A Secretaria da Justiça trabalha com importantes questões de âmbito social, incluindo o programa de reforma fundiária, pacificação de conflitos agrários e reparação a ex-presos políticos. O promotor foi convidado depois que o presidente do PFL em São Paulo, Cláudio Lembo, disse a Alckmin que não queria assumir a Justiça. A possível escolha de Lembo havia sofrido rejeição de entidades ligadas ao Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana

Anistia - As entidades enviaram manifesto ao governador alertando-o sobre "o risco de retrocesso" - atribuindo ao pefelista supostas ligações com Maluf. "Estão perdendo tempo fazendo lobby no vazio", ironizou Lembo, lembrando que foi o primeiro a conceder entrevista, em fevereiro de 1979 ao Estado, defendendo a anistia. "Meu passado é aberto, arejado."

Depois de atuar na Promotoria da Cidadania, Moraes assumiu o Grupo de Atuação Especial e Atendimento à Saúde, órgão do Ministério Público que investiga irregularidades em hospitais. Há um ano, virou assessor do procurador-geral, Brito Filomeno. Ele substitui Edson Vismona, que pediu para sair da Secretaria.


PT teme ligação com violência
Hipóteses para tentar encontrar alguma explicação lógica para o seqüestro e o assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel, não faltam dentro do PT. A menos considerada, no entanto, é a de crime político operado por adversários eleitorais. Não haveria organização suficiente nem na extrema direita nem na extrema esquerda para uma ação planejada e operada dessa natureza.

Apesar disso, há um temor geral de que haja conseqüências políticas graves, pois a série de episódios – a morte de outro prefeito, de Campinas, as ameaças a deputados federais e atentados em cidades de administração petista – envolvendo o partido, mesmo na condição de vítima, estabelecem uma difusa e perigosa conexão do PT com a violência.

E, considerando que hoje esse é o tema que mais assusta as pessoas – principalmente as residentes em grandes cidades –, poderia se estabelecer um sentimento no eleitorado de que o melhor a fazer é manter-se afastado do PT. E é isso, na opinião do deputado federal Jacques Wagner, candidato ao governo da Bahia, que precisa ser evitado “com uma ofensiva ampla em defesa da paz”, de modo a que a imagem do partido não seja associada ao medo. Essa foi a sugestão dele à direção do partido, feita ainda durante o velório de Celso Daniel, no auge da confusão de possibilidades que tomou conta das mentes de cada um dos dirigentes petistas.

Há quem considere que Celso Daniel foi vítima de um engano, outros acham que possa ter sido seqüestrado ao acaso, apenas pelo fato de ocupar um carro importado e assassinado quando os bandidos se deram conta da repercussão do ato; não falta quem – como o presidente do PT, José Dirceu – aposte na hipótese do crime encomendado por gente cujos interesses possam ter sido contrariados por Celso Daniel.

Há até uma tese mais elaborada, pela qual o crime organizado tenha aproveitado o episódio para dar uma demonstração de domínio da situação e afronta às autoridades. Como um recado a respeito do poderio das quadrilhas.

Qual a razão dessas ações atingirem de uma forma aparentemente coordenada políticos do PT é que permanece sendo uma incógnita, na qual não se descarta nem mesmo a hipótese de coincidência, dada a disseminação indiscriminada da violência urbana. No caso do prefeito de Campinas sabe-se, por exemplo, que ele estava em conflito com o tráfico local pelo trabalho que vinha fazendo de inserção do poder público nas favelas da cidade.

Em relação a Celso Daniel, não há ainda notícias de que interesses ele poderia ter contrariado, mas a brutalidade do crime e detalhes misteriosos, como a troca de roupas do prefeito, perturbam ainda mais o estabelecimento de alguma lógica no que aconteceu.

Fato é que, com lógica ou sem ela, o governo de São Paulo e a Polícia Federal têm prazo curto para esclarecer não apenas a morte dos dois prefeitos, mas também a origem dos atentados e das ameaças a deputados federais do partido.

Sob pena de se tornarem, definitiva e irremediavelmente, reféns do crime organizado e assumirem de vez a condição de Estado desorganizado para fazer frente a criminosos que, em tese, deveriam estar em desvantagem ante o aparelho oficial.

Embora não seja desprovida de sentido a idéia de que se estabeleça uma conexão do PT com atos violentos – sentimento que já se manifesta, segundo relato de deputados, na recusa de muita gente a andar com propaganda do PT nos carros, com medo de ataques –, evidentemente que do ponto de vista político não ficará isolado no prejuízo.

No encontro de Luiz Inácio Lula da Silva com o presidente Fernando Henrique Cardoso, na terça-feira, ambos procuraram dar uma conotação suprapartidária ao problema. O PT jamais poderia se recusar ao convite, mas é evidente que nessa altura não é justo que a oposição – embora possa colaborar com sugestões – venha a ser convidada perante a sociedade a dividir responsabilidades com os detentores do poder.

Segurança Pública é dever do Estado, que, embora se componha de todas as forças da sociedade, e não apenas do governo, este é quem precisa assumir a condição de condutor de um processo de, senão solução a curto prazo, pelo menos no restabelecimento de um mínimo de tranqüilidade para uma população aterrorizada.

Nesse sentido, a cobrança do eleitorado será – como não poderia deixar de ser – sobre os personagens que há dois mandatos governam o País, perfeitamente conscientes das dimensões do problema e que, em outras ocasiões, tentaram a implantação de planos absolutamente inócuos e conduzidos de uma forma tíbia. Convenhamos que essa conta não pode ser dividida com a oposição.

Se é verdade que ela perde por simbolicamente estar ligada à ambiência da confusão, é verdade também que perde a situação – pois, se não fornece um mínimo de segurança a autoridades, quem dirá ao cidadão comum. Que, ao fim e ao cabo, é, entre todos, o maior perdedor.


Artigos

Sopa de letras e impostos
Roberto Macedo

Líderes dos vários partidos que apóiam o governo federal estiveram reunidos com o presidente, na terça-feira, para discutir nova hipótese de aumento de impostos para compensar a perda de receita decorrente da correção, em 17,5%, da tabela do IRPF. No que se segue, não vou esclarecer o significado desta e de outras siglas tributárias. São tantas e conhecidas que já figuram assim nas manchetes dos jornais. Ademais, é bom que o leitor domine por si mesmo a suculenta sopa de letras e tributos que o povo paga para engordar os cofres do governo. Faça um teste. Se não conhecer o significado das siglas, é sinal de que não sabe o que está pagando de impostos.

O tema e a ocasião do encontro em Brasília não chegam ser novidades. Todo início de ano é assim: no final do anterior, na discussão do Orçamento, aprovam-se benesses como essa da correção tabela do IRPF - no caso, corrigindo-se parcialmente uma antiga injustiça - ou o aumento do salário mínimo. Disso decorre uma conta que sobra para o início do ano seguinte, às vezes ainda com nebulosidades como essa, ligada ao tributo que vai ser utilizado para tapar o buraco, resultante de soluções mal discutidas no momento em que foram inicialmente tomadas.

O resultado usual tem sido um contínuo aumento da carga tributária, que hoje já alcança um terço do produto interno bruto (PIB), ainda sem maiores e efetivos protestos. É curioso, pois o Brasil começou pagando um quinto, na época colonial, e se rebelava contra isso. É coisa para analistas, tanto os tributários como os que usam os divãs.

A prática de aumentar impostos não é apenas federal. Para cidadãos paulistanos, já há a certeza de um forte aumento do IPTU, na sua versão petista, o iPTu. Muitos receberão uma demagógica isenção, mas todos pagarão via aumentos de preços das atividades comerciais que utilizam os imóveis com ônus tributário ampliado. Também pagarão pobres coitados que nem carnês recebem, por não terem imóveis, mas receberão a conta juntamente com o aluguel.

Voltando a Brasília, o noticiário da reunião, que os jornais publicaram ontem, deixava ainda em dúvida se a nova hipótese seria um aumento da CPMF ou do IOF. No jornal que vi na televisão, a apresentadora começou fa lando da CPMF, mas depois se corrigiu dizendo que seria IOF. A confusão é justificável. Há impostos e siglas demais, e até esse caso em que soam como rima. De minha parte, gostaria de saber mais das razões por que o governo está deixando de lado o aumento da CSLL das empresas prestadoras de serviços que pagam IRPJ pelo sistema de lucro presumido.

Muitas dessas empresas são constituídas por profissionais liberais - médicos, advogados, engenheiros e economistas, entre outros -, para escapar da tabela das pessoas físicas, pela qual poderiam pagar até 27,5%, na margem, sobre rendimentos auferidos. Montando empresas desse tipo, acabam pagando um total em torno de 10%, numa conta que inclui o IR da pessoa jurídica, CSLL, PIS-Cofins e ISS. O que sobra de lucro entra na declaração da pessoa física como rendimento não-tributável.

Antigamente, os profissionais que mantinham essas empresas pagavam mais e em duas vezes, na empresa e como pessoa física. Pagavam em tese, pois muitos sonegavam. Com o sistema que veio em seguida, muitos mais passaram a pagar e o efeito na arrecadação foi positivo.

Quando o governo anunciou o aumento da CSLL, vários grupos afetados reclamaram, em particular os advogados e suas associações, mas também na condição de tributaristas. Assim, vi manifestações afirmando, entre outros aspectos, que o aumento padeceria de várias impropriedades jurídicas, entre elas por ter sido adotado por medida provisória, por envolver uma contribuição social para compensar uma redução na arrecadação de impostos - desvirtuando, assim, a finalidade da primeira - e por onerar discriminadamente uma atividade econômica, sem que o aumento fosse estendido a outras. Não sei se esses argumentos pesaram nessa mudança do governo com relação ao tributo a ser escolhido, mas se espera que não seja apenas o "lobby" dos interesses afetados.

As alternativas contempladas, seja o IOF ou a CPMF, pulverizam com mais intensidade o ônus tributário - em particular, a segunda -, com o que a reação em contrário seria de mais difícil articulação. Mas que não se perca de vista que, com o IOF ou a CPMF, o que está sendo feito é jogar a conta de uma redução de um imposto direto, o IRPF, para impostos indiretos embutidos nos preços e, assim, de ônus disseminado por toda a sociedade, inclusive os mais pobres. Muito da CSLL sobre serviços recairia sobre os referidos profissionais e seria, assim, um mal menor.

De qualquer forma, em todo esse jogo há uma distorção maior, típica da classe política brasileira: a de aprovar medidas populares ou populistas, que implicam gastos ou menor ônus tributário, e depois sair à cata de uma camuflagem para passar a conta que sobra.

De progresso, fica a constatação de que, com o fim da inflação e o empenho do governo em evitar maiores déficits fiscais, pelo menos agora a conta se torna explícita, e a camuflagem não alcança a obscenidade de assumir a forma de inflação ou aumento da dívida pública.

Progresso mesmo, entretanto, só teremos no dia em que líderes políticos se reunirem, efetivamente, para reduzir despesas e o terço de impostos, sem caminhar, como vêm fazendo, na direção de dois quintos do PIB, agravando ainda mais a já infernal carga tributária brasileira.


Colunistas

RACHEL DE QUEIROZ

Esse estranho animal
Ah, o animal urbano humano é mesmo essencialmente gregário, como os carneiros e as andorinhas. Só esse instinto ancestral, que se traz enrustido nos ossos e na carne (ou nos nervos e na pele?), é que explicará nossa absurda paixão por morar amontoados em edifícios de mais de 20 andares, ou formigando pelas ruas numa massa fechada de carros que se entrechocam, se amassam, se batem com fúria, matando e ferindo não apenas quem está dentro deles, mas o infeliz pedestre que não pertence à aristocracia rodante, e se arrisca pelo asfalto, território privativo das feras de rodas.

Você já estudou, do alto de um edifício, um engarrafamento, lá embaixo? Não dá para entender porque eles se obstinam naquela fúria impaciente, em se concentrar todos na mesma pista, como se no mundo só existisse aquele caminho, como se fugissem de um perigo invisível que por trás os açoitasse; a cada rua transversal entrem mais carros - em vez de saírem, fugirem, por aquele caminho aberto!

Mas não, e você vê com espanto que eles desdenham as possibilidades de fuga, fazem questão de ficar no sufoco sem sentido, numa velocidade de cem metros por hora. Outra comparação que nos lembram são aqueles enxames de abelhas africanas que atacam uma árvore, uma cerca, até um telhado, em vôo cego, e ficam tentando se mover para diante ou para os lados, num zumbido que já parece um rugido; e do local onde se concentram caem muitas mortas, mas parece que isso lhes é indiferente, são tantas que nem podem olhar para as vítimas. Igualzinho aos engarrafamentos.

Numa cidade grande qualquer, pequeno embaraço é uma tragédia. Se falta água, se há uma pane na eletricidade, se os ônibus se declaram em greve, tudo pára e entra em crise. Com as torneiras secas, mesmo só por algumas horas, os restaurantes não podem servir comida, nas residências o pânico se instala, desde as crianças gritando que não podem ir para a escola sem escovar os dentes! E os hospitais que não têm como acudir os doentes - sem água?

Pois embora a gente não seja peixe, a água é, depois do ar, o elemento mais indispensável à nossa sobrevivência. E faltando luz? Já experimentou subir, sem elevador, ao seu apartamento no quinto, décimo, vigésimo andar? E os que se arriscam, se arriscam mesmo a um enfarte, a uma crise respiratória, a todos os males que ameaçam o citadino sedentário, que só sabe "andar" sentado no carro, no ônibus, na moto.

Agora, em todas as cidades, anda o povo exigindo que lhe abram os metrôs, subterrâneos, onde poderão continuar se engarrafando, descarrilando, debaixo da terra, como se não lhes bastasse o que fazem lá em cima...

E como cai a qualidade de vida na cidade grande. Desde o ar que se respira, poluído, envenenado, à água que vem (ou não vem!) pelos canos, o pequeno espaço dentro dos apartamentos, o leite engarrafado, a carne congelada.

O pior de tudo é que esse frenesi "civilizatório" já está até perturbando a condição de vida nas cidades de pequeno porte. As ruas se enchem de carros e a maior glória dos prefeitos é instalar sinal luminoso nos cruzamentos. Já não se pode comprar leite mungido nas vacarias; os supermercados já invadiram tudo, passaram até a se chamar de "shopping" e só vendem leite de caixa.

Creio que a psicologia do homem urbano pode se traduzir com especial fidelidade numa frase de Pedro Nava, num baile carnavalesco no salão de cima do velho "High Life" (ah, saudosas décadas passadas!), vestido num macacão cáqui, Nava suava e sufocava empurrado e empurrando num cordão; a gente lhe propôs sair dali, ir para o jardim, lá embaixo: "Aqui está muito quente, muito apertado!" E o Nava o suor em bicas, enxugando a cara na manga, parou um instante para recusar: "Mas eu gosto é do quente e do apertado!" E seguiu no cordão.


Editorial

SEGURANÇA PARA EXPORTAR

Nenhum país pode exportar bens e serviços de grande valor, como aviões, tratores, equipamentos industriais e trabalhos de engenharia, sem um bom sistema de crédito à exportação. Um bom sistema de crédito só pode funcionar quando há cobertura de risco - e nesse ponto é clara a deficiência do Brasil. Por isso, é especialmente importante o convênio que vem sendo negociado com o Banco Mundial (Bird), pelo governo brasileiro, para reforço do seguro de crédito à exportação. Se der tudo certo, o acordo poderá ser formalizado em fevereiro, segundo se informa em Brasília.

A garantia é mais necessária quando se identificam ris cos políticos.

Atualmente, o País dispõe de uma empresa dedicada a cobrir esse tipo de risco, a Seguradora Brasileira de Crédito a Exportações (SBCE). Na retaguarda, opera o Fundo de Garantia de Exportações (FGE), com recursos do Tesouro Nacional. As limitações desse fundo são evidentes. Como toda entidade envolvida em seguros, deve conduzir suas operações de acordo com a estimativa do risco, em cada caso, e sem ultrapassar certos níveis de exposição. Além disso, o Tesouro é sujeito a restrições especialmente severas, num país empenhado em buscar o equilíbrio fiscal.

O Grupo do Banco Mundial inclui uma entidade especializada em seguros, a Miga, Multilateral Investment Guarantee Agency (Agência Multilateral de Garantia de Investimentos). Pelo acordo em negociação, a Miga poderá assumir parte dos riscos normalmente cobertos pelo FGE. Nesse caso, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) poderá ampliar os financiamentos do BNDES-Exim. Isso permitirá multiplicar tanto as vendas externas de máquinas e equipamentos quanto as exportações de serviços, especialmente se o convênio resultar em participação de entidades privadas.

Há boas oportunidades de negócios em mercados de países em desenvolvimento, mas é preciso, para concretizá-los, cobrir o custo do risco político. Fazem parte desse grupo de mercados vários países latino-americanos e do Caribe. O Brasil tem experiência internacional na venda de serviços de engenharia, notadamente no setor de eletricidade. Com maior volume de financiamentos e de garantias, essa atividade poderá expandir-se de forma considerável.

Um sistema eficiente de comércio exterior inclui numerosos mecanismos de apoio às empresas. Financiamento e seguro estão entre os componentes mais importantes. Mas há muito mais que fazer, em vários campos, como pesquisa, adaptação e difusão de tecnologias, criação de normas técnicas, promoção comercial, articulação de cadeias produtivas, formação de consórcios, identificação de oportunidades e medidas de apoio a quem se dispõe a conquistar novos mercados. A construção desses mecanismos é uma tarefa complexa, com minúcias que vão muito além de uma boa política macroeconômica. O governo federal tem-se empenhado em construir sólidos fundamentos para a economia, com a reforma fiscal e com uma severa política monetária. Tudo isso é indispensável para um crescimento duradouro, mas insuficiente para garantir a prosperidade nacional, especialmente numa economia aberta.

A integração no mercado internacional depende também de eficiência microeconômica. Essa eficiência depende apenas parcialmente das empresas.

Para que possam atuar de forma competitiva, é preciso que disponham de condições que são definidas fora das fábricas, dos escritórios e das fazendas.

O poder público, nas economias com maior peso no mercado internacional, é em grande parte responsável pela criação dessas condições. Isto não é uma tese sujeita a polêmicas, mas um dado visível para quem quer que se disponha a ver como funciona o comércio mundial. O governo brasileiro apenas começou a se envolver nesse conjunto altamente especializado de tarefas. A negociação do acordo com o Bird é mais um sinal de que esse esforço está deslanchando.


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01/24/2002


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Alvaro Dias: governo Lula gastou com juros 80 vezes mais que verba do Fome Zero

Roberto Cavalcanti cobra do governo mais verba para educação, ciência e tecnologia

Governo economiza sem cortar investimento