Lula corre contra o tempo









Lula corre contra o tempo
Pela primeira vez na disputa presidencial, o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, disse abertamente que aposta na hipótese de vencer as eleições já no primeiro turno. Num comício em Aracaju, Lula descreveu sua sobrecarregada agenda de ontem para hoje: Sergipe, Piauí, Amapá, Pará e Mato Grosso do Sul.

— Tudo em dois dias só. Sabe por quê? Porque, se depender do meu esforço, vou fazer o que puder para ganhar estas eleições o mais rapidamente possível — disse Lula.

Ele deixou evidente que confia na vitória no primeiro turno ao agradecer o apoio do senador Antônio Carlos Valadares, do PSB de Anthony Garotinho. No palanque, ao lado do prefeito Marcelo Déda (PT) e do senador José Eduardo Dutra, candidato do PT ao governo do estado, Valadares declarou voto em Lula. Na saída, Lula abraçou Valadares. E brincou:

— Eu disse a ele que se não votasse em mim agora talvez não tivesse chance de votar depois.

— Peço voto para Garotinho e Lula. Mas meu voto é em Lula para que o PT vença no primeiro turno — disse Valadares.

Dutra também conclamou o eleitorado a eleger Lula já:

— Vamos eleger Lula no primeiro turno. Aí, no segundo, contra o PFL, quem vai fazer campanha para mim é o presidente eleito — discursou.

Numa entrevista no aeroporto de Aracaju, Lula deixou escapar sua confiança. Num ato falho, ao responder qual adversário preferiria enfrentar, usou o condicional:

— Se tiver segundo turno, quem quer que seja o adversário, vou continuar a mostrar para o povo as saídas que entendemos serem melhores para o Brasil — entregou-se Lula, explicando, depois, que trabalha para vencer, não importando quando.

Lula chama Serra de preconceituoso
Lula mandou recado para José Serra (PSDB), a quem chamou de preconceituoso por exibir no horário eleitoral uma cena em que duvida de seu preparo para governar o país.

— É impensável que, no novo milênio, ainda tenha gente da elite que usa o preconceito como arma para se mostrar mais do que outras pessoas — disse.

Falando sobre o programa de Serra em que é simulada uma reunião com chefes de Estado, questionando a capacidade de Lula representar o Brasil no exterior, o petista reagiu. No filme o locutor diz: “Em algum momento o futuro presidente terá que se sentar a esta mesa, sozinho, para defender o seu emprego”. Serra é mostrado como o mais competente e experiente para se sentar à mesa.

— Se Deus quiser, quase todas as atitudes que eu tomar como presidente não serão só minhas. Não quero ser um presidente solitário. Quando eu viajar — e só vou viajar a trabalho — vou levar equipes de especialistas em cada ramo de atividade e vou discutir. Pretendo ensinar a elite brasileira como governar este país — disse Lula, numa sutil referência à fama do presidente Fernando Henrique de viajar muito.

Ainda de forma velada, Lula acusou Fernando Henrique de transformar o governo num “negócio de amigos”.

Ao responder se daria tratamento privilegiado a Sergipe com Dutra no governo, Lula disse que dará a estados e municípios o que eles têm direito. Queixou-se de governadores e prefeitos “serem reféns do ministro da Fazenda” e prometeu reconstruir o pacto federativo:

— Ninguém governa o país transformando-o em negócio de amigos.

Lula percorreu o Centro de Aracaju em carreata. Para que participassem do comício, Déda liberou os funcionários da Prefeitura às 15h.


Serra atacará Lula para tentar garantir 2 turno
BRASÍLIA. Para traçar a estratégia que será adotada na reta final da campanha, o candidato tucano José Serra reúne-se amanhã com os partidos e os líderes políticos que apóiam sua candidatura. O objetivo do encontro é desencadear uma mobilização nacional para tentar garantir a realização do segundo turno e a presença de Serra na disputa com o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva. Publicitários, especialistas em pesquisa e governadores que apóiam o tucano estarão na reunião.

— Queremos ativar ao máximo a ação dos nossos aliados. Vamos nos reunir agora e depois correr para o abraço, no dia 7 de outubro — disse o coordenador da campanha de Serra, deputado Pimenta da Veiga (PSDB-MG).

Os estrategistas tucanos também pretendem que a partir dessa reunião os aliados incorporem um discurso mais agressivo contra Lula. Hoje, no horário de propaganda eleitoral na TV e nas inserções comerciais ao longo da programação, a campanha de Serra adotará um tom mais forte e crítico contra Lula. Os principais assessores do tucano estão convencidos de que o PT decidiu agir para segurar o crescimento de Serra nas pesquisas e que é preciso reagir.

— Vamos discutir propostas e comparar os candidatos. O que queremos saber dos eleitores é: é justo que alguém faça da Presidência da República seu primeiro emprego público? O Lula está preparado para ser presidente? Ou foi ensaiado para dizer algumas coisas? Na administração pública não tem ensaio. Mesmo que um presidente tenha uma equipe de especialistas, ele precisa saber escolher o melhor caminho e isso exige conhecimento e experiência — afirmou Pimenta da Veiga.

Seis governadores confirmaram presença
O encontro, que será realizado num hotel, pretende reunir os principais aliados de Serra. Confirmaram presença os governadores Geraldo Alckmin (SP), Almir Gabriel (PA), Marconi Perillo (GO), Jarbas Vasconcelos (PE), Hugo Napoleão (PI) e Jaime Lerner (PR), o vice-presidente Marco Maciel, o prefeito Cesar Maia, os presidentes da Câmara, Aécio Neves, do PSDB, José Aníbal, e do PMDB, Michel Temer. O cientista político Antônio Lavareda e o publicitário Nizan Guanaes também foram convocados.

Os tucanos não admitem mas estão preocupados com a possibilidade de uma possível vitória de Lula no primeiro turno. A presença de Lavareda e Nizan na reunião tem a finalidade de espantar, com as pesquisas e as análises que orientam o marketing da campanha, qualquer vacilação dos aliados. Ontem, era grande a ansiedade em relação às pesquisas que serão divulgadas esta semana por Ibope, Datafolha e Vox Populi.

— Não acendemos a luz vermelha ainda. Não acredito que a eleição possa ser decidida no primeiro turno — disse Pimenta.


Serra acusa procurador de trabalhar para o PT
RIO E BRASÍLIA. O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, classificou ontem de eleitoreira a iniciativa do procurador da República no Distrito Federal Luiz Francisco de Souza de apresentar denúncia contra o empresário Gregorio Marin Preciado, marido de uma prima do candidato, os ex-diretores do Banco do Brasil Ricardo Sérgio de Oliveira e Edson Soares e o ex-presidente do banco Paulo César Ximenes. O procurador alega que o Banco do Brasil beneficiou Marin, perdoando parte de sua dívida. Serra acusou o procurador de estar a serviço do PT.

— Meu Imposto de Renda foi aprovado, não há problema algum. Isso é apenas jogada eleitoral para beneficiar o candidato do PT. Luiz Francisco é um militante que foi durante quatro anos filiado de carteirinha (do PT). É uma pessoa reconhecidamente parcial no seu trabalho. Admira-me que se dê qualquer credibilidade a isso — reagiu.

Pimenta desconfia de procedimento eleitoreiro
O coordenador político da campanha do tucano, deputado Pimenta da Veiga (PSDB-MG), acusou o procurador de estar fazendo uma ação político-partidária. Pimenta disse que, independentemente do mérito do processo, sua abertura às vésperas das eleições, é um procedimento eleitoreiro.

— Nem o PT nem o procurador conseguirão desfazer o evidente vínculo político-partidário que os une — disse.

O comitê central da campanha de Serra divulgou uma cópia do Diário de Justiça de 26 de janeiro de 1998 em que o procurador figura numa relação de pessoas que eram filiadas ao PT pelo menos até dezembro de 1997.

Luiz Francisco afirmou que só em 1998 o PT oficializou o pedido de desfiliação à Justiça Eleitoral.

Procurador: Serra não está diretamente ligado aos atos
O procurador, que adiou para hoje o pedido de investigação, disse que Serra, embora tenha ligações com outras pessoas citadas no processo, não está diretamente ligado aos atos de improbidade que serão investigados. Negou ainda que a abertura de processo, a 20 dias das eleições, tenha motivação política.

Ele disse que teve dificuldade de obter a documentação no BB, no Banco Central e na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para fazer a denúncia ontem, como anunciara:

— Primeiro, ponderamos que o tempo do Ministério Público não é o mesmo tempo das eleições — afirmou.

Perguntado se as denúncias envolvem diretamente Serra, o procurador disse que “o envolvem de forma oblíqua”, porque ele teria sido beneficiário de alguns atos ligados a Wladimir Antônio Violi, seu ex-sócio numa empresa de consultoria econômica, a ACP, até 1995. O candidato também, segundo Luiz Francisco, teria omitido a participação na ACP em sua declaração de bens enviada à Justiça Eleitoral. Serra afirma que a empresa já foi fechada.

— É verdade que ele teve benefício, mas esse benefício é oblíquo. Não tem nenhum ato do próprio Serra, um ato ilícito, que aponte interferência direta dele em qualquer operação — disse.

Apesar disso, Luiz Francisco disse que o nome do candidato do PSDB aparecerá na ação mais de 40 vezes. Ricardo Sérgio foi tesoureiro da campanha do tucano em 94. Além disso, a filha do candidato, a economista Veronica, também será citada pela compra de imóveis supostamente subfaturados para, segundo o procurador, omitir ganhos junto à Receita Federal.

A assessoria jurídica do candidato divulgou uma nota em que contesta informações e insinuações sobre seus bens e de seus parentes. A nota explica que Serra foi sócio da ACP (Análise de Conjuntura Econômica e Perspectivas Ltda), registrada em 18 de novembro de 93 e encerrada em 6 de dezembro de 2000, sendo que o distrato está registrado no 3 Registro Civil de Pessoas Jurídicas de São Paulo, sob o número 417.363. Por essa razão, sua existência não foi mencionada na declaração de bens apresentada ao Tribunal Superior Eleitoral em 2002. Informa ainda que desde janeiro de 1995 Serra está afastado da administração da empresa, conforme consta de alteração do contrato social.

Lula diz que é chiadeira e falta de argumentos
O candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, reagiu à acusação de Serra de que o PT estaria abastecendo o Ministério Público com informações contra ele. Lula classificou o comportamento de Serra como chiadeira de quem não tem argumentos:

— Quem não tem argumento tenta jogar a culpa em cima dos outros. Não vou julgar comportamento de promotor público nem de meus adversários.


Garotinho afirma que aceita apoio de Brizola
Animado com seu crescimento nas últimas pesquisas de opinião, o candidato do PSB à Presidência, Anthony Garotinho, já faz planos para as possíveis alianças que poderia fazer no caso de conseguir passar para o segundo turno. Embora tenha afirmado que as negociações só seriam feitas depois do primeiro turno, Garotinho antecipou que aceitaria o apoio do candidato da Frente Trabalhista, Ciro Gomes, e alguns de seus aliados como o ex-governador Leonel Brizola, com quem está rompido desde que deixou o PDT.

— Nós vamos disputar o segundo turno com Lula. Se Ciro quiser nos acompanhar, sem as suas más companhias, não há nada de mais. O que estragou a candidatura dele foram as más companhias que ele arrumou no caminho. O PPS, por exemplo, é um partido de oposição. Tem até pessoas na aliança dele que são de oposição, como o PDT — afirmou Garotinho.

Perguntado se estaria disposto a fechar uma nova aliança com Brizola, seu antigo desafeto, o candidato do PSB respondeu:

— Por que não? Não tenho nada de pessoal contra Brizola. Ele é um político que tem se mostrado de oposição ao governo Fernando Henrique.

O ex-governador não perdeu a oportunidade de criticar o líder da disputa presidencial, o petista Luiz Inácio Lula da Silva. Para o candidato do PSB, Lula deixou de ser um candidato de oposição. Ele concordou com as declarações de João Pedro Stédile, um dos dirigentes nacionais do Movimento dos Sem Terra (MST), que afirmou que o discurso de Lula não é mais de esquerda.

— Stédile foi até modesto porque a gente sabe que ele gostaria de falar mais. Claramente Lula deixou de ser oposição — afirmou.

Garotinho: pesquisas do PSB registram empate com Serra

Segundo Garotinho, Lula traiu os princípios da esquerda brasileira. Ele voltou a criticar a aliança do petista com o ex-presidente José Sarney:

— Agora não é mais Lulalá, mas Lulaley, o Lulinha paz e amor do Sarney. Está na cara que não é um candidato que está defendendo seus princípios. Ou seja, ele abriu mão das suas convicções e quer ganhar a eleição a todo custo. Eu vou ganhar, mas mantendo a coerência.

Garotinho voltou a reclamar dos institutos de pesquisa de opinião. Segundo ele, as pesquisas desses institutos não têm os mesmos resultados que as contratadas por seu partido, que já teriam registrado seu empate técnico no segundo lugar com o tucano José Serra.


Ciro: propostas da Agenda Perdida podem ser adotadas
SÃO PAULO e PORTO ALEGRE. O candidato a presidente pela Frente Trabalhista (PPS-PDT-PTB), Ciro Gomes, manifestou-se ontem favorável ao documento de cerca de 50 páginas, elaborado por 17 economistas e cientistas políticos, com propostas de política econômica e social para serem examinados pelos candidatos à Presidência. Segundo Ciro, algumas dessas propostas poderão ser incorporadas ao seu programa de governo.

O documento, chamado Agenda Perdida, foi preparado sob a coordenação de José Alexandre Scheinkman, da Universidade de Princeton, ligado a Ciro, na Fundação Getúlio Vargas. Entre as propostas estão a isenção da contribuição previdenciária para o salário-mínimo e a substituição de impostos indiretos por um Imposto de Valor Agregado (IVA).

— Estou defendendo as melhores idéias, que possam permitir ao país voltar a crescer, distribuir melhor a renda, mas com o pé no chão. Isso nos obriga a ter uma economia capaz de mudar o modelo tributário, formalizando mais a economia, tirando os impostos da produção e dos salários, transferindo parte disso para os ganhos de capital — disse Ciro em entrevista à Rádio CBN.

Ciro também atacou os candidatos do PSDB, José Serra, e do PT, Luiz Inácio Lula da Silva.

— A maioria esmagadora dos brasileiros sabe que votar em Serra é continuar tudo como está e isso o Brasil não agüenta. E votar em Lula significa uma aventura, um salto no escuro, que acho que o Brasil também não quer se arriscar.

Ciro defendeu a necessidade de o Brasil conseguir mais dólares, mas sem precisar “ficar de joelho, obrigado pelo FMI”:

— O projeto atual, que o senhor José Serra continuará, significa que o Brasil fica com o rombo das contas externas e de três em três anos vai ao FMI pedir essa agenda que está desgraçando o povo, os salários e a produção. E a agenda do Lula, francamente, não sei qual é.

Para Ciro, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) devem ser escolhidos de outra forma.

— É preciso que haja influência do Executivo e do Legislativo para a construção do Judiciário. Hoje acho que é um abuso o que a gente está vendo aí. Infelizmente, o presidente nomeia aliados seus ministros do STF.

Patrícia Pillar faz críticas ao publicitário de Serr a
Em Porto Alegre, a atriz Patrícia Pillar, mulher de Ciro, participou ontem de uma caminhada no Centro da cidade, acompanhada por cerca de mil mulheres, simpatizantes da Frente Trabalhista, e de um jantar, numa churrascaria, em que esteve presente o candidato do PPS ao governo estadual, Antônio Britto. Ela acusou o publicitário Nizan Guanaes, que assessora Serra, de tentar criar uma imagem de Ciro que não corresponde à realidade.

— Estão tentando confundir as pessoas. Para que todo mundo fique no mesmo nível. O Ciro não está no mesmo nível não. Ele é um homem preparado, de vida limpa.

A caminhada foi tumultuada e interrompida por populares e adeptos dos candidatos do PPS, que a todo momento interrompiam o trajeto de Patrícia Pillar para abraçar a atriz e manifestar apoio a Ciro. Patrícia disse que estava feliz com a recepção e está disposta a repetir caminhadas, sem a presença de Ciro Gomes:

— Basta que me convidem que eu vou.


Entidades contrárias à corrida nuclear criticam declarações de Lula
BERLIM e GENEBRA. Integrantes da organização Greenpeace estão planejando ações de protesto contra as declarações do candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, que sexta-feira passada, em palestra a militares, criticou a adesão do Brasil ao Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, ratificado pelo Brasil em 1998.

— Se um candidato à Presidência critica o Tratado de Não-Proliferação prejudica a imagem do Brasil. Fico admirado de exatamente um candidato da esquerda ser contra o pacto, que é uma garantia de que o país não planeja construir uma bomba atômica — afirmou Mathias Edler, do Greenpeace.

Também integrantes da Organização Não-Governamental Pugwash, um grupo de cientistas contra a proliferação de armas nucleares, criticaram a posição de Lula.

— É um caminho perigoso começar a criticar uma instituição tão importante quanto o Tratado de Não-Proliferação já antes de assumir o governo — disse um porta-voz da entidade.

Dos 190 países da ONU, 187 ratificaram tratado
A Agência Internacional de Energia Atômica, em Viena, que verifica o cumprimento do tratado, não quis se pronunciar oficialmente sobre as declarações do candidato. Mas uma fonte, que falou na condição de não ser identificado, disse:

— Eu gostaria que o candidato desse o nome de um único tratado que tenha mais adesão do que o Tratado de
Não-Proliferação Nuclear. É possivelmente o tratado mais amplamente assinado em existência hoje: assinado por todos os países do mundo, menos três (Israel, Índia e Paquistão). É , de longe, o tratado mais universal.

O funcionário da agência Cirincione, do Carnegie Endowment for International Peace, e vários outros reconhecem que o tratado tem problemas, e concordam com Lula quando ele questiona o fato de cinco potências nucleares — EUA, Inglaterra, Rússia, França e China — não estarem eliminando seus arsenais, enquanto o resto do mundo renuncia a este tipo de arma e é submetido a um controle rigoroso. Há críticas ao sistema de verificação do tratado, que não impede que signatários, como o Iraque, violem abertamente o acordo.

Mas todos argumentam que o tratado, com todas suas imperfeições, é melhor do que uma corrida nuclear.

— O tratado tem problemas. Não é perfeito, mas funciona. O Brasil estará melhor com esse tratado do que sem ele. A opção ao tratado é o caos, uma corrida armamentista. Não há tensões nucleares na América do Sul, o Brasil assumiu compromissos de não-proliferação na região e não há por que gastar dinheiro com uma arma que nenhuma pessoa sã pretende usar — disse Cirincione.

Dos 190 países que integram a ONU, 187 ratificaram o tratado. Em 2000, as potências nucleares anunciaram que eliminariam suas armas.

O problema, segundo Rebecca Johnson, do Instituto Acronym, de Londres, é que desde então houve um sério retrocesso: os EUA se recusaram a ratificar o tratado que proíbe testes nucleares, saíram do Tratado de Mísseis Anti-Balísticos e não cumpriram a promessa de serem mais transparentes sobre seus arsenais. O Tratado de Moscou, em que EUA e Rússia concordam em tirar seus arsenais nucleares de um sistema de alerta, não vai desarmá-los.

— O Brasil não é o único a levantar preocupações sérias sobre a viabilidade e a credibilidade do regime de não proliferação. Cinco países-membros do tratado ainda estão se comportando como se o tratado os deixasse permanecer com suas armas nucleares indefinidamente. Há entre 23 mil a 30 mil armas nucleares no mundo, muitas em reserva nos EUA e Rússia, mas que podem ser facilmente ativadas — diz Johnson.


Artigos

Petrobras: empresa estatal ou de mercado?
João Pinheiro Nogueira Batista

A campanha eleitoral em curso tem colocado a Petrobras na vitrine, o que só confirma a sua importância para a economia brasileira e regional.

Infelizmente, a dinâmica do processo eleitoral muitas vezes impede que os candidatos e seus assessores prestem ao público informações relevantes sobre a empresa na extensão e profundidade necessárias. A Petrobras tem procurado esclarecer a opinião pública através de anúncios, artigos e declarações. Este é mais um artigo que pretende fornecer aos interessados elementos importantes para julgar as declarações e as críticas que vêm sendo feitas à empresa.

Sempre que alguns dos candidatos se referem à Petrobras, o fazem classificando-a simplesmente como uma empresa estatal, induzindo assim o eleitor a entender que se trata apenas de um órgão ou departamento do governo, responsável pela execução de políticas públicas . Será que isto é correto? Vejamos a questão de outro ponto de vista.

Ao decidir pelo fim do monopólio legal, o Congresso Nacional determinou que a União manteria o controle da Petrobras, para evitar sua desnacionalização e como meio de preservar o direito de interferência em situações de extrema gravidade como, por exemplo, na hipótese de uma séria crise de abastecimento.

A partir deste novo quadro legal estabeleceu-se, entre outros requisitos, que a companhia deveria se estruturar para competir não só no mercado nacional, mas também no internacional, com independência financeira.

Deveria, portanto, garantir sua financiabilidade. Em outras palavras: em nenhuma hipótese recorreria ao Tesouro Nacional para obter recursos fiscais, escassos por natureza.

Para viabilizar a execução de seu ambicioso programa de investimento doméstico e financiar sua expansão internacional, a companhia precisaria mobilizar o equivalente a US$ 31,7 bilhões entre 2001 e 2005. Isso exigia que a empresa desenhasse e executasse uma estratégia que transformasse o mercado de capitais na fonte primária para a obtenção dos recursos. Este, inclusive, é o padrão adotado pela indústria em nível mundial.

Para que essa estratégia fosse bem-sucedida, tornava-se indispensável assegurar acesso continuado ao mercado de emissões primárias de ações. A companhia precisava, antes de tudo, diversificar a base de acionistas. Isto foi alcançado com duas ofertas públicas secundárias de ações, que reduziram a participação da União a 33% do capital econômico total da empresa. Com essas operações, o número de acionistas aumentou para cerca de 450 mil. Desses, cerca de 337 mil foram trabalhadores que utilizaram recursos do FGTS para comprar ações da companhia. Investidores estrangeiros passaram a deter 1/3 das ações da empresa.

Com essa reestruturação, cerca de 2/3 do capital total estão em poder do público em geral, e são negociados nas Bolsas de Valores de São Paulo, Nova York e Madri.

A Petrobras vem imprimindo um grande esforço para aprimorar seus padrões de governança corporativa e melhorar o relacionamento co m os acionistas. Esperamos em breve fazer jus ao selo de Nível II da Bovespa, e já recebemos, entre outros prêmios, o que a classifica como empresa brasileira que melhor se relaciona com investidores, concedido pela Investor Relations Magazine em 14 de maio de 2002.

No mercado de renda fixa, a Petrobras vem construindo curva consistente de rendimentos para títulos. Já promoveu quatro emissões públicas, no total de US$ 2,3 bilhões, nos últimos dois anos no mercado internacional. Mais recentemente, iniciou processo idêntico no mercado doméstico, com emissão pioneira de R$ 750 milhões por dez anos. Em setembro de 2001, a Petrobras obteve classificação três níveis acima do risco soberano, em moeda estrangeira, quebrando paradigma histórico de que o melhor crédito é, necessariamente, o Tesouro Nacional de um país.

Essas conquistas só foram possíveis porque resultam de um pacto muito claro entre o acionista controlador e os minoritários: a empresa deverá estar focada em rentabilidade, com responsabilidade social e ambiental.

Para competir em igualdade de condições, ela precisa ter a liberdade de atuação de uma corporação multinacional.

Nossos competidores, com regras precisas de disciplina de capital, obtêm dos seus acionistas autonomia para execução de políticas de investimento, comercial, financeira e de recursos humanos. A Petrobras já avançou muito, mas ainda está longe do padrão de gerenciamento de seus principais concorrentes.

Voltemos à questão inicial: a Petrobras é uma empresa estatal ou de mercado? Espero que a esta altura tenha conseguido, ao menos, demonstrar que a resposta não é tão simples quanto parece. Ela é uma empresa cujo acionista controlador é a União federal. Mas tem sócios. O controlador deve absoluto respeito às regras do mercado de capitais e ao pacto com os seus sócios. Sócios, frisemos, que juntos detêm os outros dois terços do capital total.

Deixo, para auxiliar a reflexão, as seguintes questões:

1) O acionista da Petrobras deve subsidiar, via política de preços da companhia, os consumidores de combustíveis ?

2) O acionista da Petrobras deve ser responsável , via política de compras da companhia, pelos incentivos à indústria nacional?

Se as respostas forem afirmativas, perguntaria ao leitor se ele se disporia a ser acionista da Petrobras.


Colunistas

PANORAMA POLÍTICO – Tereza Cruvinel

Quintal da capital
Em Brasília, vive-se de frente para o Brasil e de costas para a cidade. Um comportamento típico das capitais.

Mas o que está acontecendo aqui neste momento, tendo como pano de fundo a campanha eleitoral, é um problema de interesse, para não dizer de segurança, nacional. Tal como no Espírito Santo, o crime organizado também mostra sua força e suas conexões com o poder local.

Escândalos que estouram sob o calor das disputas eleitorais têm sua importância minimizada, atribuída à mera luta política. Mas, se não fosse a campanha, não teria vindo à tona o esquema criminoso de grilagem de terras públicas no Distrito Federal, envolvendo figuras importantes do governo local e uma família do ramo imobiliário que resolveu entrar na política, trombando com os próprios aliados. Na cidade que abriga o governo da União, não é exagero dizer que a questão fundiária é de segurança nacional. Tanto que o presidente Fernando Henrique ensaiou instalar um grupo de trabalho para investigar as causas da explosão demográfica que vem cercando Brasília com um cinturão de miséria, crime e violência.

Nos últimos 12 anos surgiu aqui a indústria dos condomínios privados, que da noite para o dia brotam em terras públicas, privadas ou em litígio. Um bom número deles lançados pelos irmãos Passos, amigos do governador Joaquim Roriz, acusados de grilar áreas públicas para lotear e vender terrenos. Foram objeto de muitas reportagens do “Correio Braziliense”. A Terracap é a empresa pública que ainda hoje administra o patrimônio imobiliário, licitando áreas segundo o planejamento da expansão urbana.

Este ano, Pedro Passos, um dos irmãos, saiu candidato a deputado distrital, buscando eleitores nos condomínios, onde devem viver pelo menos 350 mil pessoas. Trombou com o já deputado Odilon Aires, ex-secretário de Assuntos Fundiários, que ali também busca votos em retribuição a seu trabalho pela legalização dos condomínios. Outros candidatos ligados ao governador também passaram a sofrer a concorrência da poderosa máquina dos Passos. Há algumas semanas, outro deles, Márcio, já processado judicialmente, entregou ao “Correio Braziliense” uma das cem fitas que diz ter envolvendo o alto escalão do governo. Nessa, Odilon Aires, o ex-secretário, reclama de ter recebido apenas 50 lotes do Condomínio Alto da Boa Vista para viabilizar sua legalização, enquanto seu aliado Gim Argello, presidente da Câmara Distrital (onde os projetos têm que ser aprovados) teria recebido 300. Em 2001, 127 projetos foram enviados para votação.

As coisas pioraram na semana passada, quando a Terracap derrubou cercas de um novo empreendimento ilegal dos Passos. E, para completar, Pedro teve a prisão preventiva decretada. Está foragido e ameaçando o governador, que disputa a reeleição, de divulgar as outras 99 fitas.

Ontem a Câmara Distrital, em clima de guerra, tentava instalar a CPI proposta pelo PT, acusado pelos rorizistas de fazer uso eleitoral do escândalo. A hora não é mesmo a melhor, mas o próximo morador do Alvorada terá que voltar os olhos para a cidade que o hospeda. O próprio palácio já perdeu sua privacidade com o surgimento de hotéis de onde se pode ver Fernando Henrique praticar sua natação.Lula mostra seu mando no PT. Sarney reclamou com ele. No dia seguinte já não estava mais no ar um programa do PT maranhense atacando a família do ex-presidente.O embate final

Lula e o PT ensaiam a campanha do voto útil para garantir a vitória no primeiro turno. Serra convoca os aliados para uma arrancada que o leve ao segundo turno, impedindo o crescimento de que Lula ainda precisa para ganhar no dia 6. Garotinho e Ciro não estão mortos, o impossível sempre acontece, a exemplo da ultrapassagem de Paulo Maluf por Geraldo Alckmin, mostrada ontem pelo Ibope. Mas o tracking de todas as campanhas está mostrando que Lula e Serra é que estão crescendo na reta final.

Por mais que queira paz e amor, Lula tem pela frente um adversário disposto ao confronto. Terá que responder aos ataques, e perdeu um round ontem no TSE, que não lhe concedeu liminar para impedir que um comercial de Serra continue desmoralizando sua proposta de geração de emprego com uma declaração que os petistas dizem ter sido tirada de contexto: para cada real aplicado, um emprego gerado.

Serra, que Ciro continua apresentando como o dragão da maldade, ontem fez discurso de vítima, acusando o PT de ser o mentor da ação do procurador Luiz Francisco contra o contra-parente do tucano Preciado, que teria sido beneficiado pelo co-réu Ricardo Sérgio na renegociação de uma dívida com o Banco do Brasil, quando era diretor da instituição. Por conta ou não de sua reação, nem Ciro nem Lula cogitavam ontem tratar do caso em seus programas de hoje.

CANDIDATA a deputada federal, a ex-juíza Denise Frossard (PSDB) sofreu duas tentativas de atentado na semana passada. Primeiro tiros contra seu carro. Na volta, fechado por outro carro, seu motorista quase capotou em local perigoso. Agora tem recebido ameaças anônimas por telefone.

DE DOIS, o PT agora espera eleger quatro governadores. Além de Jorge Viana (AC) e José Orcírio (MS), aposta em Tarso Genro (RS) e Wellington Dias (PI). E ainda tem esperança em José Eduardo Dutra (SE).


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09/17/2002


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