Mulheres avançam sobre poder político na América Latina
Seja pela militância em movimentos políticos ou sociais, seja pela influência familiar, aos poucos as mulheres vêm conquistando espaço na esfera máxima de poder na América Latina. Nos últimos 40 anos, 11 países do continente já experimentaram o comando feminino nas chefias de seus governos. No próximo dia 1º de janeiro de 2011, a economista Dilma Rousseff será a 12ª mulher a ocupar o cargo de presidente ou primeira-ministra na região.
A Argentina despontou nesse cenário quando, em 1974, Isabelita Perón assumiu o comando do país após a morte do presidente Juan Domingo Perón, com quem era casada e dividia a chapa vencedora das eleições de 1973 na condição de vice-presidente. O eleitorado argentino teve de esperar mais de 30 anos para ver outra mulher na presidência. Em 2007, Cristina Kirchner se tornou a primeira mulher eleita pelo voto direto na Argentina, sucedendo no posto seu marido, Néstor Kirchner.
Vale ressaltar que, das 12 mulheres que integram a lista de chefes de governo latino-americanos, três foram eleitas ou iniciaram seus mandatos em 2010. Além da brasileira Dilma Rousseff, compõem o trio a cientista política Laura Chinchilla, atual presidente da Costa Rica, e Kamla Persad-Bissessar, eleita primeira-ministra de Trinidad e Tobago. Por outro lado, 2010 marcou o fim do governo da chilena Michelle Bachellet, que deixou a presidência com significativo índice de popularidade e grande reconhecimento internacional.
As perspectivas de ampliação do horizonte da política parecem ser promissoras para as mulheres latino-americanas. O caminho trilhado por essas 12 lideranças femininas rumo ao cargo máximo do poder político no continente respalda essa previsão. Abaixo, segue um resumo do contexto vivenciado por cada uma delas.
Dilma Rousseff (Brasil)
Estreante na corrida por cargos eletivos, a economista Dilma Rousseff surpreendeu ao arrebatar, em sua primeira eleição, o posto máximo da política nacional: presidente da República. A façanha de conquistar 56% dos votos válidos no segundo turno da disputa eleitoral se deu com as bênçãos do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de quem Dilma foi ministra de Minas e Energia e chefe da Casa Civil.
"Mulher do Lula" e "Mãe do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)" foram denominações que ajudaram a popularizar a imagem de uma candidata com fama de durona junto ao eleitorado. A polêmica em torno da legalização do aborto, denúncias de irregularidades atribuídas a uma assessora e o crescimento na reta final de outra mulher, Marina Silva (PV), inviabilizaram a vitória de Dilma no primeiro turno das eleições, mas não foram suficientes para desestimular os brasileiros a eleger a primeira mulher presidente da história do país.
Natural de Belo Horizonte (MG), Dilma Rousseff chega à Presidência da República aos 63 anos. Em sua juventude, militou em organizações armadas de oposição ao regime militar, participação que a levou a ser presa e torturada. Mais tarde, radicou-se no Rio Grande do Sul, filiando-se ao Partido Democrático Trabalhista (PDT).
Antes de atuar no governo Lula, Dilma ocupou os cargos de secretária da Fazenda da prefeitura de Porto Alegre (1986-89); presidente da Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul (1991-1993); e secretária de estado de Energia, Minas e Comunicações nos governos de Alceu Collares (PDT) e Olívio Dutra (PT). Sua filiação ao Partido dos Trabalhadores (PT), pelo qual conquistou a Presidência da República, se deu em 2001.
Laura Chinchilla (Costa Rica)
Se a chilena Michelle Bachellet encerrou seu mandato presidencial em 2010, o ano reservou o ingresso de mais outra mulher no seleto - e ainda restrito - grupo de presidentas na América Latina: Laura Chinchilla, da Costa Rica.
Cientista política, Laura Chinchilla vem de família com raízes na política e, antes de ser eleita para um mandato de quatro anos, exerceu o cargo de vice-presidente no governo de Oscar Arias Sánchez entre 2006 e 2008. Tida como "conservadora social", se declara contrária ao casamento homossexual e ao aborto e promete dar continuidade à política de livre mercado do ex-presidente Arias.
Kamla Persad-Bissessar (Trinidad e Tobago)
A única mulher que não é presidente e comanda um país latino-americano é Kamla Persad-Bissessar, eleita primeira-ministra de Trinidad e Tobago em 2010. Ao denunciar o aumento do tráfico de drogas durante o governo de seu antecessor e opositor, o então primeiro-ministro Patrick Manning, Kamla viu aumentar sua popularidade entre o eleitorado.
Kamla liderou o Congresso Nacional Unido, partido que fazia oposição a Manning, em meio a denúncias de corrupção e aumento da violência no país.
Cristina Kirchner (Argentina)
O que aproxima a atual presidente da Argentina Cristina Kirchner de Isabelita Perón? O fato de ambas terem sido casadas com ex-presidentes (Néstor Kirchner e Juan Domingo Perón, já falecidos) e conquistado o comando do país. A influência política dos respectivos maridos também pode ter orientado a escolha do eleitorado. Mas, ao contrário de Isabelita, alçada ao poder por ser vice-presidente de Juan Perón, Cristina já acumulava mais de 20 anos de mobilização política pelos direitos humanos e das mulheres - e alguns cargos públicos - ao se eleger presidente.
Cristina Kirchner foi a primeira mulher eleita por voto direto na Argentina e sucedeu seu marido na presidência. Venceu as eleições para o cargo em 2007, ainda no primeiro turno, com 45% dos votos.
Michelle Bachellet (Chile)
A militância no combate a ditadura militar é um ponto de convergência nas trajetórias políticas da presidente eleita Dilma Rousseff e da médica Michelle Bachellet, que presidiu o Chile de 2006 a 2010. Para ambas, a vivência dessa época guarda recordações não só da luta por liberdade, mas passagens duras, como a prisão e a tortura.
Bachellet começou a deslanchar na política chilena ao comandar, em 2000, o Ministério da Saúde. Durante sua gestão, contrariou o eleitorado católico ao liberar a distribuição da pílula do dia seguinte para vítimas de violência sexual. Dois anos depois, assumia o Ministério da Defesa, cargo até então nunca ocupado por uma mulher na América Latina. Como presidente, Bachellet destacou-se por medidas sociais, como a gratuidade da saúde para idosos acima de 60 anos.
Mireya Moscoso (Panamá)
A exemplo da nicaraguense Violeta Chamorro, Mireya Moscoso abraçou a política depois da morte de seu marido, Arnulfo Arias, que presidiu três vezes o Panamá. Eleita em 1999, Mireya estava à frente do poder quando os Estados Unidos devolveram o Canal do Panamá a seu país e prosseguiu governando até 2004.
Apesar de sua chegada à presidência - ela foi primeira mulher a exercer o cargo no Panamá - criar uma expectativa de renovação política, Mireya Moscoso amargou a eclosão de escândalos de corrupção durante seu mandato. Uma situação curiosa foi o fato de ter presenteado, logo após sua eleição, os 72 membros do Poder Legislativo com jóias de grife. O episódio se deu pouco antes da votação do orçamento.
Janet Jagan (Guiana)
A história política da norte-americana Janet Jagan, que presidiu a Guiana entre 1997 e 1999, coincide com a da argentina Isabelita Perón. Ambas foram eleita s vice-presidente na chapa dos respectivos maridos e o sucederam na presidência após a sua morte.
O marido de Janet, Cheddi Jagan, governou a Guiana de 1992 a 1997. Com a sua morte, a então primeira-dama e vice-presidente assumiu o cargo e comandou o país por mais dois anos. Problemas de saúde levaram a sua renúncia.
Violeta Chamorro (Nicarágua)
Governou a Nicarágua entre 1990 e 1997 e foi a primeira mulher a ser eleita presidente de um país latino-americano. De família rica, foi educada no exterior e entrou na política após o assassinato de seu marido, Pedro Joaquín Chamorro, editor de um jornal oposicionista.
Disputou o cargo pela União Nacional de Oposição com o apoio dos Estados Unidos, que acabaram apresentando sanções contra seu governo. Sua atuação foi marcada pela promoção da estabilidade e da paz na Nicarágua.
Rosalía Arteaga (Equador)
A presidente latino-americana com mandato mais curto foi Rosalía Arteaga, que governou o Equador por apenas 48 horas. Ela havia sido eleita vice-presidente na chapa de Abdala Bucaram em 1996. Um ano depois, Bucaram foi afastado do governo pelo Congresso e se iniciou uma disputa pelo cargo entre Rosalía e o líder parlamentar Fabián Alarcón.
Apesar de a Constituição não deixar claro quem tinha direito ao posto, Rosalía argumentava que o vice-presidente deveria assumi-lo. E assim o fez para, dois dias depois, ser afastada por Alarcón, que tomou posse com o apoio do Congresso e das Forças armadas.
Ertha Pascal-Trouillot (Haiti)
O Haiti não havia experimentado uma mulher no comando do país até a chegada de Ertha Pascal-Trouillot, que assumiu o cargo temporariamente em 1990, após golpe de estado capitaneado pelo general Herard Abraham. Ertha presidia a Suprema Corte e ajudou no processo de redemocratização do país com a deposição do então presidente Prosper Avril, acusado de violação dos direitos humanos.
A condução de Ertha à presidência do Haiti ocorreu logo após o golpe, com a entrega do poder por Abraham. Sua missão era convocar eleições, o que ocorreu em 1991, quando ela supervisionou o primeiro pleito realmente livre do país.
Lídia Gueller (Bolívia)
Então presidente da Câmara dos Deputados, Lídia Gueller assumiu a presidência da Bolívia, em 1979, em meio a um clima de instabilidade política no país. Foi o Congresso boliviano quem a indicou para o cargo depois do fracasso do golpe de estado liderado pelo coronel Natush Busch contra o presidente Guevara Arze.
Sua missão era conduzir o país até novas eleições, mas outro golpe impediu a realização desse processo. Uma grave crise econômica e a desvalorização da moeda foram situações adversas que marcaram seu governo.
Isabelita Perón (Argentina)
A primeira mulher a ocupar a presidência de um país da América Latina chegou ao poder pela influência política do marido. María Estela Martínez de Perón assumiu o comando na Argentina em 1974, após a morte do presidente Juan Domingo Perón, de quem era mulher e vice-presidente na chapa vencedora das eleições de 1973. Esse já era o terceiro mandato do general Juan Perón, disputado após retornar do exílio na Espanha, na década de 1960.
Popularmente chamada de "Isabelita", Maria Estela de Perón enfrentou uma sucessão de greves de trabalhadores e de assassinatos de cunho político durante seu governo. Uma junta militar encabeçada por Jorge Rafael Videla a retirou do poder, em 1976, e a condenou a prisão domiciliar. Vive exilada na Espanha desde 1981.
30/12/2010
Agência Senado
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