Nível de escolaridade afeta percepção de mundo do brasileiro, diz sociólogo
Para o sociólogo Alberto Almeida, coordenador da Pesquisa Social Brasileira e autor do livro "A cabeça do brasileiro", o nível de escolaridade da população afeta sua percepção sobre ética, família, cor e raça, economia, política e igualdade.
A pesquisa, que ouviu 2.363 pessoas em 102 municípios, foi inspirada nas idéias do antropólogo Roberto Da Matta, que participou de debate promovido pela Universidade do Legislativo Brasileiro (Unilegis) com o autor do livro na noite desta segunda-feira (3), no auditório do Interlegis. O evento, que contou com a participação do cientista político Lúcio Rennó e da jornalista Dad Squarisi, integrou o Ciclo de Conferências do Unilegis, série de debates que já discutiu, entre outros temas, a reforma política.
Almeida procurou identificar valores básicos que se encontram enraizados na mentalidade do brasileiro e que tendem a sofrer alguma alteração apenas quando uma geração substitui a outra. Ao aliar antropologia e métodos quantitativos de análise, concluiu que, enquanto pessoas de baixa escolaridade cultivam uma visão "mágica" do mundo, grupos mais escolarizados privilegiam a visão "histórica".
O professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) verificou, por exemplo, que quanto mais baixa a escolaridade, maior a tolerância do brasileiro com a corrupção, maior o conservadorismo em relação à sexualidade e maior a tolerância com a utilização da violência como método de promoção da justiça.
- Quem tem baixa escolaridade tende a ser tolerável com o chamado "jeitinho". O que é corrupção muitas vezes é entendido como favor - disse Alberto Almeida.
A pesquisa também aponta uma certa tendência, principalmente entre a população de baixa escolaridade, a valorizar o papel regulatório do Estado, entendido como único responsável pelo cuidado com a coisa pública.
Em relação às questões de raça e cor, a análise do sociólogo traz uma novidade: ao contrário do que se pensa, para o brasileiro, a cor importa mais que a origem ou a posição social. A pesquisa também aponta que as pessoas têm uma visão mais negativa dos pardos que dos negros, e que este primeiro grupo tende a se "misturar" mais que o segundo, ainda que sempre com brancos.
Ao comentar os dados apresentados, o antropólogo Roberto Da Matta, autor, entre outras obras, de "A casa e a rua", ressaltou que a sociedade não é constituída de indivíduos, mas de relações que determinam como os indivíduos agem, em detrimento de como agiriam de acordo com seus próprios valores.
Para Da Matta, o chamado "dilema brasileiro" se expressa de forma clara na relação entre Estado e sociedade:
- As pessoas têm esperança de que o Estado mude a sociedade. Mas quem ocupa o Estado? Nossos representantes atuam exatamente como nós. Não se transformam em outro ser social; carregam as mesmas dívidas, o mesmo capital social - disse ele.
Por uma certa disposição a "escolher não escolher" e de sempre desobedecer regras criadas que eles mesmos criam, os brasileiros repetiriam a prática de "adiar o problema" de tal forma que reformas importantes, como a econômica e a política, só encontrariam espaço para se efetivar diante da corrosão total dos sistemas, na visão do antropólogo.
- É melhor rezar para que o Senado melhore ou escolher melhor em que senador votar? - questionou Da Matta.
O cientista político Lúcio Rennó observou que seria interessante que o método utilizado por Alberto Almeida procurasse englobar outras variáveis, já que as pessoas de escolaridade mais alta, em sua visão, podem ter orientado suas respostas a partir do que consideram ser politicamente correto.
- Seria interessante mensurar a prática diária das pessoas, e não necessariamente o que elas dizem pensar ou fazer - disse.
Já a jornalista Dad Squarisi, do Correio Braziliense, observou que a tendência, verificada na pesquisa, à valorização da hierarquia, principalmente entre os menos escolarizados, se expressa no apego dos brasileiros aos pronomes de tratamento, que, em sua opinião, deveriam ser extintos.
A Pesquisa Social Brasileira foi realizada pela Universidade Federal Fluminense (UFF), com recursos da Fundação Ford. Abriram o debate do Unilegis o diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, a diretora acadêmica do Unilegis, Vânia Maione, a diretora executiva do Instituto Legislativo Brasileiro (ILB), Denise Zogbi, e a diretora da Secretaria de Pesquisa e Opinião Pública do Senado, Elga Mara Teixeira Lopes.
03/12/2007
Agência Senado
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