Parlamentares criam rede para ação mundial









Parlamentares criam rede para ação mundial
Os organizadores do Fórum Social Mundial encontraram uma alternativa para fazer com que as conclusões a que cheguem durante o evento não se limitem aos auditórios e tenham um mínimo de praticidade: foi instituída uma ""rede parlamentar internacional" pela qual se tentará levar aos diversos países representados as idéias surgidas nas conferências e oficinas.

A coordenação do grupo cabe a quatro parlamentares latino-americanos -um cubano, um brasileiro, um mexicano e um uruguaio- e três europeus. Os nomes deverão ser indicados nos próximos meses. O Brasil provavelmente será representado pelo deputado federal Aloizio Mercadante (PT-SP).

A constituição da rede se baseou em resolução aprovada pelos 1.115 parlamentares presentes. A rede terá como missão coordenar atividades sobre os temas discutidos no Fórum Social Mundial. Também tentará ajudar na organização de movimentos sociais e pensar soluções alternativas para problemas nos respectivos países.

Os integrantes do grupo manterão correspondência periodicamente pela internet. Ainda neste ano, a rede deverá estar presente em compromissos internacionais, como a conferência de Monterrey (sobre o financiamento do desenvolvimento), em março.


Réus do Nacional buscam indenização de R$ 32 mi
Pedido prevê ainda pensão vitalícia; dinheiro sairia do Tesouro

Condenados no mês passado em primeira instância por fraudes no Banco Nacional, Nagib Antônio e Clarimundo Sant"Anna cobram, pelos serviços prestados ao banco, indenizações na Justiça do Trabalho de R$ 32 milhões, mais pensão vitalícia de R$ 63 mil e R$ 60 mil por mês, respectivamente.

Se ganharem o que pedem, quem pagará a conta é o Tesouro Nacional. Ou seja, o contribuinte. Os valores pedidos superam em R$ 4,65 milhões as multas aplicadas a 14 ex-dirigentes do banco pelo juiz Marco André Bizzo Moliari, da 1ª Vara Federal do Rio, por conta dos desvios no banco.

Nagib Antônio já venceu em segunda instância. Teve asseguradas pelos juízes da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro praticamente todas as exigências que fez. Ivan Paes Soares, outro ex-dirigente, entrou na Justiça pela mesma razão que Nagib e também ganhou em segunda instância.

As chances de os ex-diretores garantirem os benefícios em última instância parecem, portanto, grandes até agora. Paes Soares pede R$ 4,789 milhões, mais pensão vitalícia de R$ 17 mil por mês.

A gestão de Nagib e Sant"Anna, compartilhada com os outros ex-dirigentes, deixou prejuízo de R$ 15,460 bilhões (em valores atualizados) -o maior rombo de uma instituição financeira na história recente do país. Quando o Banco Central interveio na instituição, dividiu-a em duas. Assumiu a parte podre, pondo-a em liquidação extrajudicial. O Unibanco comprou a parte boa. A gestão do passivo (o prejuízo) é responsabilidade do BC. Assim, todas as despesas da massa em liquidação, como as indenizações trabalhistas, são pagas pelo Tesouro.

Benefício trabalhista
Nagib e Sant"Anna reivindicam o pagamento de 13º salário, férias, horas extras, atualização do saldo do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e complementação de aposentadoria relativos ao período em que ocuparam cargo de diretor estatutário.

De acordo com o diretor de Finanças Públicas do BC, Carlos Eduardo de Freitas, a Lei das Sociedades Anônimas estabelece que os benefícios regidos pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) -o que pedem Nagib e Sant"Anna- ficam suspensos para dirigentes estatutários. Segundo Freitas, eles ganham como se fossem sócios da empresa, recebem pró-labore (remuneração por serviços prestados) e bônus.

Nagib Antônio perdeu em primeira instância, mas recorreu e obteve decisão favorável. O processo de Sant"Anna ainda não foi julgado. Soares ganhou em primeira e segunda instâncias. O BC recorreu das decisões.

O caso de Nagib deve ser julgado pelo TST (Tribunal Superior do Trabalho) neste mês. A indenização pedida por ele é a maior das três: R$ 18,181 milhões. Sant"Anna cobra R$ 13,859 milhões. Nos três casos, os valores estão corrigidos.

Comando
Nagib e Sant"Anna eram vice-presidentes do Nacional. Nagib comandou a área de recuperação de crédito. Entrou no banco em 62 e saiu em 95, quando a instituição estava sob intervenção do BC. Ocupou cargo de direção entre 89 e 95. Foi condenado a 21 anos e quatro meses de prisão. A multa aplicada a ele foi de R$ 197,28 mil.

Sant"Anna foi executor confesso das maquiagens nos balanços da instituição, que serviram para acobertar 652 contas fictícias que resultaram em um rombo de R$ 9,2 bilhões em 95. Era o braço direito de Marcos Magalhães Pinto. Trabalhou 39 anos no banco, dos quais 20 como diretor. Foi condenado a 25 anos e quatro meses de prisão, mais multa de R$ 203 mil.

Ivan Paes Soares, apesar de ter ocupado o cargo de diretor do Departamento Jurídico do banco na mesma época em que Nagib e Sant"Anna eram vice-presidentes da instituição, não foi indiciado.


Lula diz que Serra deve debater com Enéas
Petista ironiza desafio de tucano, que lamenta a "arrogância" de "alguém que disputa a Presidência pela quarta vez"

O pré-candidato do PT Luiz Inácio Lula da Silva respondeu com ironia à proposta do tucano José Serra de iniciar já a realização de debates eleitorais entre os presidenciáveis. "Quem sabe o Serra poderia desafiar o Enéas para um debate", disse Lula -30% das intenções de voto na pesquisa Datafolha de janeiro.
Foi uma referência ao percentual do pré-candidato do PSDB (7%), próximo ao do folclórico presidenciável do Prona (2%).

O petista respondeu à questão da Folha, apesar de sua assessoria informar que ele não trataria de temas políticos nacionais durante o Fórum Social Mundial (FSM).

"Não acho que o José Serra queira fazer debate agora, porque o Fernando Henrique Cardoso fez duas campanhas (1994 e 1998) sem participar de debates. Nunca vi o Serra dizer que era importante o Fernando Henrique Cardoso fazer debate", declarou o petista.

Serra rebateu às críticas de Lula, afirmando que a declaração foi "grosseira e arrogante".
Por meio de sua assessoria de imprensa, o ministro da Saúde disse que "é uma pena que [a declaração" venha de quem está disputando pela quarta vez uma eleição presidencial". O tucano insistiu na importância de um "confronto de idéias e propostas dos candidatos sem intermediários".

Lula deixou clara sua forma de ação. "O debate vai acontecer, da nossa parte, quando o PT entender que deva fazer debate. O debate será pensado estrategicamente e programado de acordo com os interesses para que o PT tire vantagem dele".

A razão para a recusa é que o petista avalia que hoje o único beneficiário seria Serra, que precisa crescer nas pesquisas eleitorais para viabilizar sua candidatura ou até mesmo uma aliança única com o PMDB e o PFL.
"Fazer debate para ajudar os adversários não é uma boa política nem inteligente. Não sei por que eles querem debate, já que não queriam debater nada até agora", afirmou Lula.

Para o petista, a situação vai ter uma candidatura única neste ano, seja Serra ou a governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL). "Estou convencido de que o PT vai para o segundo turno e a direita vem com um candidato só. Acho que dificilmente a direita terá dois candidatos, porque sabe que a divisão dela facilita muito a nossa atuação."

FHC em Paris
Lula rebateu também a afirmação de Serra de que o país vive a "ameaça do populismo esquerdista". "Ele deve ter falado isso porque leu o discurso do Fernando Henrique Cardoso em Paris", afirmou o petista, numa alusão ao pronunciamento do presidente na Assembléia Na cional Francesa, com um conteúdo marcadamente social e desenvolvimentista.

O petista também respondeu ao presidenciável do PPS, Ciro Gomes, que acusou um "excesso de partidarização" do FSM. "O PT tem muita gente aqui não como petista, mas como gente ligada ao movimento social. Quem sabe é melhor o Ciro Gomes, em vez de falar bobagem, se preparar para o ano que vem, participar dos seminários e ter propostas concretas."

Lula disse esperar que o tempo mostre ao presidente nacional do PDT, Leonel Brizola, seu ex-aliado em 1994 e 1998 e que está acertando o apoio ao PPS, qual o melhor caminho a seguir.

"Ciro Gomes nunca fez questão de dizer que era de esquerda. Nós é que forçamos a barra e achamos que é", afirmou Lula.


FMI deveria ser mais flexível, diz tucano
O ministro da Saúde e pré-candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, afirmou ontem que seria bom se o FMI tivesse posições "mais flexíveis e economicamente mais corretas".

A afirmação do ministro foi feita em alusão à admissão do diretor-gerente do FMI, Horst Koehler, no Fórum Econômico Mundial, em Nova York, de que o fundo cometeu erros durante a crise asiática de 1997 e 1998.
Segundo o diretor-gerente do fundo, o erro principal foi a ênfase excessiva na consolidação fiscal. A declaração de Koehler soou como um mea culpa da instituição aos países que precisaram recorrer ao fundo durante períodos de crise econômica.

"Seria melhor antecipar o mea culpa, porque fazer depois não resolve", afirmou Serra.

Ainda assim, em relação à admissão de Koehler, o presidenciável do PSDB disse que "é melhor reconhecer posteriormente do que não reconhecer".

Segundo o ministro, o FMI errou no caso da Argentina. "A receita deu errado", afirmou, referindo-se à crise política e econômica na qual o país se encontra hoje. "Eu falei que estava errado", completou Serra.

Para o presidenciável, no entanto, a atuação do FMI durante a crise brasileira, que culminou na desvalorização do real em 1999, não foi problemática.

Catarata
O ministro participou ontem pela manhã em São Paulo de um mutirão contra a catarata e o diabetes ocular, realizado no Hospital São Paulo. Era esperada a participação de 4 mil pessoas.

Num auditório lotado com cerca de 200 pacientes, a maioria idosos que esperavam para ser atendidos, Serra discursou sobre a importância da prevenção da catarata e participou da distribuição de 300 óculos para os doentes.

"Hoje o ministro é candidato a presidente, mas ele está aqui como ministro da Saúde. E essas coisas não podem se confundir. Isso aqui [o mutirão" não acontece por causa da disputa eleitoral. É a nova política da saúde", afirmou para a platéia o presidente da Assembléia Legislativa de São Paulo, o deputado estadual Walter Feldman (PSDB).


PT e socialistas franceses acertam apoio
Acordo com partido de Lionel Jospin afasta Lula de Chevènement, também candidato à Presidência da França

O PT e o Partido Socialista francês acertaram a troca de apoios mútuos entre o pré-candidato petista Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro-ministro Lionel Jospin, que disputa a Presidência da França.
O PS convidou e Lula aceitou participar dos eventos finais da campanha de Jospin no primeiro turno, na segunda quinzena de abril. Lula deve ir a Paris para participar provavelmente do comício de encerramento de Jospin.

O acerto foi feito em almoço anteontem em Porto Alegre. O petista manteve uma série de contatos internacionais durante o Fórum Social Mundial, que incluíram italianos, canadenses e até chineses -sejam membros de governos ou de movimentos sociais.

A aproximação entre Lula e Jospin foi feita por François Hollande, primeiro-secretário do Partido Socialista, que participou do FSM. Hollande, 45, é um nome cotado para tornar-se primeiro-ministro, em uma eventual vitória de Lionel Jospin.

O assessor internacional do PT Luis Favre foi um dos principais articuladores do almoço entre Lula e o PS francês, mas negou qualquer vinculação formal com o partido do país do qual tem cidadania. "Essa é uma das muitas mentiras que a imprensa publica sobre mim", disse Favre.

François Hollande afirmou que considera Lula como o único no Brasil que pode garantir um "pacto social" por suas boas relações com os sindicatos. "Só ele pode garantir que a reforma agrária será feita corretamente, sem violência. É o único que pode convencer os empresários a produzir mais e pagar a dívida brasileira", disse.

O acerto com Hollande e Jospin afasta o PT de Jean-Pierre Chevènement, também candidato à Presidência da França e uma das estrelas do FSM. Chevènement tem o apoio da organização não-governamental Attac, presidida por Bernard Cassen, um dos primeiros e principais apoiadores internacionais do fórum.
Os petistas avaliam que o programa de governo do PS é menos protecionista do que o do MDC (Movimento dos Cidadãos) de Chevènement.

Em debate na quarta-feira passada, o presidente do PT, José Dirceu, já havia exposto a Chevènement suas divergências em relação ao tema. O francês havia afirmado ser contra a simples liberalização das trocas agrícolas.

"É aceitar o empobrecimento da nação em benefício de uma elite exportadora globalizada. Na França, só resistiriam as grandes propriedades. Há, no mundo, 1,3 bilhão de camponeses, mas só 500 milhões são mecanizados. Seria a estimulação de centenas de milhares ao êxodo rural."

Nos comentários à fala de Chevènement, o petista José Dirceu criticou essa argumentação. "É um ponto fraco do discurso porque não há como não questionar o protecionismo agrícola francês", observou olhando para o companheiro de mesa.

No ano passado, Lula havia dito que os franceses estavam certos, na ótica deles, ao defender o protecionismo agrícola. Lula hoje declara ter sido mal-interpretado em sua frase.

EUA
Ontem, em entrevista à imprensa brasileira e estrangeira, Lula comentou sobre como pretende enfrentar eventuais pressões dos Estados Unidos, se eleito. "Estaremos muito mais preocupados em ouvir o povo brasileiro e em nome dele realizar as políticas públicas que têm de ser feitas do que com possíveis adversários externos que vão fazer pressão", afirmou.

Lula defendeu acordos internacionais, sem distinção. "Nós queremos os americanos, os alemães, os japoneses, os chineses como parceiros. Não queremos ninguém como chefe, dando ordem sobre o que deveremos fazer", afirmou o presidenciável.

O petista disse ainda que o Brasil é a "menina dos olhos" do projeto da Alca (Área de Livre Comércio das América) dos EUA.

Lula deixaria Porto Alegre, onde participou do FSM, ontem à noite.


"Fórum Social é fraco ao propor idéias"
Em Porto Alegre, Michael Hardt, co-autor de "Império", critica uso eleitoral do evento pelo PT

"É como morder a mão que me alimenta, mas preciso dizer que seria melhor que o Fórum Social Mundial não servisse tanto aos objetivos eleitorais do PT", afirma Michael Hardt, 41, professor de literatura e romance da Universidade Duke (EUA) e co-autor de "Império" (2000, com o filósofo italiano Toni Negri).

Hardt veio a Porto Alegre para tomar parte no fórum social e participa hoje da conferência que discute "Soberania, Nação, Estado". Leia abaixo trechos da entrevista que o pensador dos EUA concedeu à Folha, ontem, na capital gaúcha.


Folha - O fórum tem levantado os pontos negativos da chamada globalização neoliberal. O que há para ser feito pelos que se opõem a ela?
Michael Hardt - Numa perspectiva do norte (EUA e Europa), acho que os protestos, de Seattle a Gênova, foram as melhores coisas que aconteceram desde 1968. É a primeira politização séria de uma geração completamente nova. Uma maneira de pensar e uma militâ ncia totalmente originais.

Folha - O que está faltando, então?
Hardt - Vejo duas dificuldades principais. A grande limitação do movimento hoje é geográfica. Ainda que se reconheça em várias partes do mundo, ele é geograficamente limitado. O que Porto Alegre faz é oferecer uma oportunidade de conexões. Outra dificuldade do movimento é o fato de ter sido até aqui apenas de protesto. Ele ainda é fraco ao propor alternativas. Mas também não acho que seja necessário simplesmente listar as dez coisas que o Banco Mundial deveria fazer.
Há dois tipos de discurso que confrontam a globalização, um diz que a resposta é reforçar a soberania nacional, como na França. Isso não é bom, pois a soberania nacional traz em si uma forma de hierarquia que não é positiva. O outro discurso é o que defende uma rede globalizante alternativa. Parece mais apropriado.

Folha - Você acha que a discussão tende a ser mais conclusiva?
Hardt - Eu não quero declarações ou um programa de ação, acho que o que seria mais necessário agora é que surgisse um confronto, que se realçassem divisões, e isso ainda não está acontecendo, eu espero que possa suceder. No caso de Porto Alegre, acho que não acontece por causa do caráter dispersivo do evento.
Mas acho o fórum essencial. Para quem vem dos EUA, em que tudo está tão pesado desde os atentados, é refrescante encontrar tanta gente e discutir abertamente os problemas do mundo.

Folha - O que você acha da relação do PT com o fórum?
Hardt - A natureza dupla da razão pela qual Porto Alegre sedia o fórum, oferecendo um espaço oficial para o PT conduzir uma operação eleitoral, obviamente estabelece uma relação ambígua entre este e os movimentos sociais que vêm até aqui. Não quero falar mal do partido, mas por mais bonito e positivo que seu programa possa ser no contexto para o Brasil, creio que o fórum deveria ser uma coisa separada de sua imagem.

Folha - "Império" foi lançado pouco antes da Guerra do Kosovo, em 1999. O que aconteceu no mundo depois disso confirma suas "previsões"?
Hardt - Sim, no que diz respeito às duas idéias centrais do livro. A primeira delas dizia que uma nova forma de poder tomava força e que ela não seria liderada por nenhum país -daí o "império" não ter nada que ver com "imperialismo". Isso se confirma mesmo que os EUA estejam num processo de militarização depois de 11 de setembro. Se por um lado isso acontece, os mesmos EUA também tentam compreender o mundo de maneira abrangente. Daí as organizações e órgãos transnacionais que alimentam (FMI, Banco Mundial e outros). A outra idéia é a de que a luta, a resistência também tinham a tendência de se globalizar. E isso também está acontecendo.

Folha - A crise argentina pode ser vista mais como exemplo das falhas do neoliberalismo como sistema ou como resultado das falhas de seus governantes?
Hardt - Acho mais eficiente pensar em termos sistemáticos. Vejo a crise argentina como a crise no sudeste asiático há alguns anos. No caso da Argentina, o problema econômico resultou numa crise política e, -que bom para eles-, o governo foi derrubado.
Concordo que sejam casos diferentes, mas pode-se ver como uma mesma causa teve diferentes efeitos em diferentes locações. Pode-se dizer que a causa veio do sistema, mas o modelo que tomou forma lá foi o modelo argentino. Os erros do governo contribuem para a crise, mas apenas na maneira como a modelam.

Folha - Crises como essas ameaçam o "império"?
Hardt - Não. Não me parece que as crises sociais e econômicas por si mesmas sejam uma ameaça ao poder global. Em geral as políticas do poder global funcionam através dessas crises e não irá entrar em colapso por causa delas.

Folha - Como as crises, as guerras do mundo contemporâneo reforçam o poder global?
Hardt - Sem dúvida. A história das formas de poder que funcionam apoiadas no capitalismo vêm tradicionalmente usando crises e conflitos para se legitimar economicamente. É também um mecanismo de controle social.

Folha - Portanto, você considera mais eficiente analisar crises pontuais a partir de uma visão mais ampla e não do contexto específico de cada uma?
Hardt - Provavelmente seria mais eficiente neste momento ver o caso Enron no mesmo contexto da Argentina. Muitas coisas são diferentes, mas em ambos há uma crise econômica gerada pela forma contemporânea de controle do capitalismo que não necessariamente ameaça sua estrutura.
É preciso atentar para a natureza sistemática desses acontecimentos, porque isso indica que não basta encontrar uma solução nacional. É preciso haver um movimento muito mais amplo para resolver problemas amplos. O que podemos fazer por meio de políticas nacionais é ganhar posição na hierarquia dos subordinados no mundo. O Brasil pode agora estar numa situação menos ruim do que a Argentina, mas isso não é uma vitória, pois não aponta para o que está errado no sistema a que ambos fazem parte.

Folha - Qual sua opinião sobre as guerras contemporâneas?
Hardt - Minha visão mais ampla sobre a guerra confirma que no mundo de hoje as guerras são de uma outra natureza. Não veremos mais grandes potências em combate. Tampouco teremos guerras que ameacem o sistema como um todo. No passado, as guerras civis eram transformadoras, revolucionárias, como a chinesa ou a francesa. A guerra dos EUA contra a Al Qaeda, a de Israel contra a Palestina ou mesmo a do Paquistão contra a Índia não representam ameaças ao novo poder global, pelo contrário, reforçam o sistema como um todo. Temos hoje uma forma de poder mundial que é reforçada pelas guerras e pelas crises das nações.


Artigos

Um slogan para a geléia eleitoral
Vinicius Torres Freire

SÃO PAULO - Segurança, economia, quem será o candidato governista a presidente etc, muito do que pode influenciar a eleição permanecerá indefinido até pouco antes da votação.

Debates nacionais importantes permanecerão ininteligíveis para a maioria do povo. Um debate importante, rotulado como o da "política industrial": como fazer a transição de um país quebrado pelo binômio dívida/déficit externo de Malan-Cardoso para um país que possa crescer além do "stop-and-go" dos últimos sete anos em que a renda nacional cresceu uma ninharia.

Como a elite que toma conta do dinheiro, da mídia e do poder está dividida a respeito dos debates importantes, nenhuma candidatura oficial terá oposição ferrenha ou será estrangulada de modo a ficar sem meios (dinheiro, imagens e máquina) para disputar a eleição. Mesmo que fosse estrangulada, eleição direta tem muito de imponderável, ainda mais em país analfabeto. Debates não entrarão na urna.

A violência ficará mais ou menos na mesma, o assunto deve se desgastar um pouco a não ser que a bandidagem volte a sortear vítimas de fama nas proximidades da eleição. Planos e ações antiviolência etc, tudo é cascata, por ora, e mesmo que não fosse não haveria tempo de que isso chacoalhasse as urnas.
Apesar da torcida, não se sabe que fim vai levar a economia dos EUA e a do Brasil. Enfim, a economia que vai bater nas urnas é essa aí, essa mediocridade chã, sem perspectiva clara de catástrofe ou melhoria estimulante.

Não há movimento social de monta para bater no governo com barulho. Não há à vista mudança social, política ou econômica que possa angariar corações, mentes e votos para um candidato que delas fosse um emblema ou propositor.

Há só insatisfação difusa, um anseio qualquer de novidade, por ora manipulado pela mídia da governadora Sarney. Manipular será o verbo da eleição: como extrair da geléia política, social e ideológica um slogan que pegue. Não há nenhum na praça.


Colunistas

PAINEL

Relação em crise
A cúpula do PT orientou seus diretó rios estaduais a congelar as negociações com o PSB nos Estados. É uma resposta ao crescimento da candidatura de Anthony Garotinho nas pesquisas e à tentativa do PSB de atrair o PL para sua campanha.

Exemplos na prática
A orientação do PT já teve quatro resultados. No ES, no AP e no CE, os petistas cessaram as negociações com candidatos do PSB ao governo: respectivamente, Paulo Hartung, João Paulo e Wellington Landim. No RS, os petistas descartaram o apoio do PSB à reeleição de Olívio Dutra.

Régua e compasso
O PSB encomendou pesquisa para definir seu candidato ao governo da Bahia. Concorrem à vaga Lídice da Mata, deputada e ex-prefeita de Salvador, e Beto Lellis, prefeito de Irecê.

Marcar presença
A pesquisa do PSB mostra que, mesmo sem chance de vencer o grupo de ACM, Garotinho quer um palanque na Bahia.

Imagem protegida
O Planalto deverá enviar tropas do Exército para auxiliar no patrulhamento de Fortaleza (CE) durante a reunião do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), que ocorrerá em março com a presença de dezenas de líderes mundiais.

Tal pai, tal papito
Suplicy disse a aliados que gostou do adiamento das prévias do PT, de 3 para 17 de março. Assim, o senador petista terá mais tempo para divulgar o seu livro "A Saída é Pela Porta", que trata da proposta da renda mínima.

Em nome do partido
Brizola deverá ser candidato a deputado pelo PDT-RJ. O ex-governador quer puxar votos e garantir a eleição de uma boa bancada. É para evitar que o PDT seja incluído na cláusula que restringirá, a partir de 2003, o acesso dos pequenos partidos ao horário eleitoral gratuito.

Atração das urnas
Em abril, Paulo Costa Leite, presidente do Superior Tribunal de Justiça, decide se deixa a toga e entra na política partidária. Almir Pazzianotto, presidente do Tribunal Superior do Trabalho, antecipa a aposentadoria neste mês. Retorna a São Paulo, e decide a qual partido vai se filiar.

Togas sondadas
O PSB convidou Costa Leite, do STJ, para sair candidato a deputado federal. Ele não comenta. Almir Pazzianotto já foi procurado por Anthony Garotinho e Ciro Gomes. Campos Machado (PTB-SP) imaginara Pazzianotto disputando o Bandeirantes numa coligação PTB-PSDB.

Nossos comerciais
Marta Suplicy (PT) quer colocar no ar, no segundo semestre, as oito horas diárias a que a prefeitura paulistana tem direito no canal 16 (TV fechada). Por lei, o canal pode ser usado pela União, Estados e prefeituras em regime de condomínio. Só a União usa suas 10 horas diárias.

Pé na roça
Mesmo depois de deixar o ministério, José Serra continuará priorizando as viagens a cidades pequenas do interior, onde há mais obras do Ministério da Saúde. A cúpula tucana prefere os grandes centros. Serra acha que sua campanha terá penetração natural nas grandes cidades.

Ociosidade ostensiva
O coronel José Vicente da Silva Filho teme que, em ano eleitoral, Geraldo Alckmin distribua os novos veículos da Polícia Militar atendendo a interesses políticos. Cita Analândia, estância climática de 3.000 habitantes, onde a PM mantém uma blazer nova num local de poucos crimes.

Apelo legal
Inocêncio Oliveira (PE), líder do PFL na Câmara, fará uma consulta ao Supremo Tribunal Federal sobre a legalidade da medida provisória que reajusta a tabela do Imposto de Renda. O deputado pefelista considera ilegal aumentar a CSLL para compensar o reajuste do IR.

TIROTEIO

Do deputado Alberto Goldman (PSDB-SP), sobre o crescimento de Roseana Sarney e Anthony Garotinho registrado nas pesquisas:
- Essas candidaturas são apenas nuvens carregadas que irão se esvanecer porque não conseguirão criar conteúdo.

CONTRAPONTO

Antecedentes duvidosos
Há duas semanas, os líderes e candidatos do PSB reuniram-se no Rio de Janeiro para discutir a candidatura do governador Anthony Garotinho (PSB-RJ) e os palanques regionais.
Miguel Arraes, de 84 anos, presidente nacional do partido e três vezes governador de Pernambuco, fez um discurso em defesa da candidatura Garotinho. Empolgado, aproveitou para lembrar o passado. Cearense de Araripe, foi eleito governador em 1962, com apoio do PCB (Partido Comunista Brasileiro). Alvo dos militares em março de 1964, Arraes foi deposto e preso. Exilado com a família na Argélia, voltou em 79, com a anistia.
Ele explicou à platéia o motivo da perseguição:
- Fui tachado de marxista-leninista guatemalteco...
E completou, arrancando risos:
- E é claro que eu não sei o que é isso!


Editorial

MERCADOS MARGINAIS

A radiografia do comércio exterior brasileiro no ano passado é desalentadora, para dizer o menos. No marco já deprimente de um saldo comercial criado com base no arrocho do consumo e do investimento no país, a dinâmica das exportações dá vários motivos adicionais para preocupação.

Em dezembro, a crise mundial obviamente ainda colocava limites às exportações para os principais países consumidores de produtos brasileiros. Para os que se fiam na ficção do "descolamento" entre Brasil e Argentina, no entanto, a realidade é preocupante: para o Mercosul a queda nas exportações foi de 49,2%.
Para a União Européia e para os EUA, as vendas brasileiras caíram 3,2% e 0,5%. No acumulado de 2001, as vendas brasileiras só caíram para os países do Mercosul (17,7%). Para fugir à retração nos países ricos, as empresas brasileiras buscam mercados alternativos. No ano passado, as exportações brasileiras para a China somaram US$ 900 milhões. A queda somente no Mercosul foi de US$ 1,2 bilhão. Registrou-se uma penetração brasileira mais intensa no Oriente Médio, na África e na Europa Oriental. O dinamismo exportador beneficiou-se da desvalorização cambial.

Esse crescimento das exportações com base na penetração de mercados marginais tem limitações. Para analistas, o potencial de crescimento das exportações entre os países depende do seu padrão de distribuição de renda. É mais fácil exportar produtos que atendem a mercados maiores. Se dois países mostram níveis de renda e padrões de distribuição semelhantes, há espaço para vendas mútuas em grande escala.
Assim, a busca de mercados pobres, de países em desenvolvimento, como "alternativa" a uma expansão sustentada sobretudo em produtos com acesso aos mercados mais ricos, pode trazer algum alívio de curto prazo. Resta saber se essa estratégia terá força para auxiliar o país na construção de uma alavanca para o crescimento econômico sustentável.


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02/04/2002


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