Privacidade de dados que vão para o Cadastro Positivo é motivo de preocupação



O texto aprovado pela Câmara dos Deputados para instituir no país o chamado Cadastro Positivo ainda necessita de aperfeiçoamentos para que sejam reduzidos os riscos de invasão da privacidade dos consumidores. O ponto de vista foi defendido em seminário técnico no Senado, nesta quinta-feira (21), pelo o presidente do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), Leonardo Bessa.

Para ele, um dos pontos problemáticos envolve a própria definição da finalidade do sistema de bancos de dados, em que serão registrados, além de débitos, como já ocorre atualmente, os pagamentos feitos em dia por pessoas físicas e jurídicas. Depois de esclarecer que o objetivo apontado é "subsidiar o crédito ou outras transações comerciais", Bessa observou que esse segundo ponto, por ser uma expressão muito genérica, pode dar margem a uso inapropriado dos dados.

- Aqui existe uma abertura para a invasão da privacidade das pessoas. Por isso, deve ser retirado ou mais bem definido - argumentou. 

Spreads

O projeto que cria o novo modelo de cadastro, elaborado pelo governo, foi aprovada anteontem pelos deputados. Agora, terá de passar pelo Senado para ir à sanção presidencial. Havendo mudanças no texto, a Câmara precisará antes examinar as alterações. A proposta é parte de um conjunto de reformas microeconômicas com a finalidade de aumentar a oferta de crédito e reduzir os spreads bancários - a diferença entre as taxas que os bancos cobram dos tomadores de empréstimos e as que são pagas aos aplicadores.

Quem paga seus compromissos em dia poderia ter esses dados positivos registrados em seu histórico mês a mês, desde que autorize a inserção nos bancos de dados das instituições financeiras. O governo acredita que, de posse das informações, as instituições financeiras poderão analisar melhor o risco do empréstimo a cada candidato e reduzir as taxas para bons pagadores. Como o consumidor poderá usar seu histórico para negociar com outros bancos, a crença é de que haverá mais concorrência e, como resultado, queda dos spreads - no Brasil, entre os mais altos do mundo.

No debate, o coordenador da Secretaria Extraordinária de Reformas Econômico-Fiscais, Ângelo Duarte, confirmou que a questão dos spreads está entre as que mais preocupam o Ministério da Fazenda. Ele apresentou dados para mostrar que houve crescimento nos níveis de aprovação de crédito, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, após a adoção de cadastros de adimplência, sobretudo em operações de menor valor. Mas nem mesmo ele referendou a expectativa de uma revolução no tocante aos juros no país a partir da adoção desse tipo de mecanismo.

- O cadastro não vai operar milagres nos spreads - assumiu Duarte, assinalando que ainda são necessárias outras mudanças normativas.

Para o consultor Marcos Kotlher, a tendência é de que pessoas manifestem adesão ao cadastro positivo. Do contrário, como disse, correriam o risco de passar a ser um "pária" no mercado, enfrentando dificuldades de acesso ao crédito.Leonardo Bessa esclareceu que a opção feita pelo governo foi por um sistema mais próximo ao modelo norte-americano, sem a existência de um órgão governamental para exercer o controle desses bancos de informações, ao contrário do padrão adotado na Europa. No Brasil, ele disse que, em tese, o controle será exercido de forma descentralizada, pelos Procons de cada localidade, mas assinalando que esse órgãos de defesa do consumidor não estão implantados em todos municípios e, em muitos, operam precariamente.

Luz e água

Motivo de crítica dos expositores, o texto que saiu da Câmara perdeu, de última hora, parte do projeto original que previa a entrada, nos atuais cadastros de informações negativas - entre os quais o Sistema de Proteção ao Crédito (SPC) - dos registros de atrasos de pagamentos de contas de água, luz e telefone. Para que esses consumidores não sejam indiretamente revelados, quem nunca atrasa esse tipo de serviço também não poderá contar com a informação positiva de adimplência em seu cadastro.

O presidente do Brasilcon argumentou que, para os que pagam em dia essas contas e são pessoas de menor renda, a capacidade de demonstrar que quitam regularmente essas serviços equivale ao "único patrimônio" que possuem. Além disso, observou que essas informações são essenciais às análises de concessão de crédito, para concessão ou não dos pedidos, inclusive para proteger as pessoas de menor renda contra o "super endividamento".

- Temos que quebra essa ótica de que crédito é sempre bom. É bom para quem quer e pode pagar. Se a intenção é proteger as pessoas, garantir que sempre tenham luz e água, outro tipo de mecanismo deveria ter sido criado, mas não esconder essa informação [falta de pagamento] do mercado - afirmou.



21/05/2009

Agência Senado


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