Propina da Vale foi paga
Propina da Vale foi paga
Revistas Época e Veja asseguram em suas edições que o empresário Benjamin Steinbruch pagou pelo menos R$ 6 milhões ao ex-diretor do Banco do Brasil Ricardo Sérgio de Oliveira por ajuda recebida dos fundos estatais na privatização
As ações do economista Ricardo Sérgio de Oliveira, ex-diretor da Área Internacional do Banco do Brasil, na privatização da Companhia Vale do Rio Doce continuarão comprometendo o desempenho eleitoral do senador José Serra (PSDB-SP) na disputa pela presidência da República.
Responsável por arrecadar recursos para Serra nas campanhas eleitorais de 1990 (para deputado federal) e 1994 (para senador), Ricardo Sérgio voltou a brilhar nas páginas das revistas Veja e Época desta semana, que chegam às bancas hoje informando que o economista recebeu parte da propina de R$ 15 milhões cobrada por ele durante o processo de privatização da Vale, em 1997.
Segundo as revistas, Ricardo Sérgio achacou o empresário Benjamin Steinbruch, líder do consórcio que arrematou a companhia mineradora estatal por R$ 3,3 bilhões. A propina foi o preço cobrado para levar para o consórcio o fundo de pensão do Banco do Brasil, a Previ. Também participaram do consórcio os fundos de pensão da Petrobras (Petros) e da Caixa Econômica Federal (Funcef). Juntos, os fundos gastaram R$ 834 milhões na privatização da Vale.
As denúncias contra Ricardo Sérgio, que continua negando qualquer irregularidade na sua gestão como diretor do BB, vieram à tona no início da semana passada. Elas foram verbalizadas pelo ministro Paulo Renato (Educação) e pelo ex-ministro Luís Carlos Mendonça de Barros (Comunicações). Ambos disseram que o pedido de propina foi relatado a eles pelo próprio Steinbruch, que havia dito não ter pago nenhum centavo. Ricardo Sérgio, segundo Paulo Renato, cobrava a propina em nome de ‘‘tucanos’’, como são conhecidos os militantes do PSDB.
As denúncias abriram uma nova crise no governo e na sucessão presidencial, uma vez que o presidente Fernando Henrique Cardoso, avisado do pedido de propina por Mendonça de Barros, não afastou Ricardo Sérgio do Banco do Brasil. Além disso, Paulo Renato não se interessou em perguntar a Steinbruch quais seriam os tucanos favorecidos pela cobrança do então diretor do BB. Ricardo Sérgio ficaria no cargo até o final de 1998, depois de atuar na privatização da Telebrás, em que também foi acusado de cobrar comissão.
Agora, a crise alimentada pelas ações de Ricardo Sérgio tende a recrudescer, caso o pagamento de parte da propina seja realmente confirmada. Nas revistas, todas as informações neste sentido foram feitas sob anonimato.
A Veja falou com dois integrantes do conselho de administração da Vale entre 1997 e 1998, época em que o pedido de propina teria sido feito, e com três empresários próximos a Steinbruch. Todos disseram que eram comuns os comentários de pagamento de parte da propina — algo em torno de R$ 6 milhões. Época, por sua vez, baseia sua reportagem no depoimento de um executivo envolvido diretamente na privatização da Vale do Rio Doce, que também afirma que parte do achaque foi pago. Segundo a revista, Steinbruch queria ter usado dinheiro da própria Vale para pagar a propina, mas foi impedido pela diretoria financeira da empresa.
Desde os anos 80
Ambas as publicações afirmam ainda que a intermediação entre Ricardo Sérgio e o empresário Benjamin Steinbruch era feita por dois empresários: José Brafman e Miguel Ethel. Os dois, assim como o próprio Ricardo Sérgio, já estão sendo investigados pela Receita Federal, que quebrará seus sigilos fiscal e bancário por determinação do Ministério Público Federal.
Ethel e Brafman têm em comum muito mais do que uma eventual participação na propina cobrada durante o processo de privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Conforme apurou o Correio, eles se conheceram em posições opostas durante o governo de José Sarney (1985-1990).
Brafman trabalhava para o empresário Sérgio Dourado, um dos maiores empreendedores imobiliários do Rio de Janeiro nos anos 80. Endividado, Sérgio Dourado designou Brafman como negociador de suas dívidas perante a Caixa Econômica Federal. Brafman encontrou Ethel na diretoria de habitação da Caixa, indicado para o cargo por Jorge Murada, marido da ex-governadora do Maranhão Roseana Sarney e na época secretário particular do presidente Sarney. A construtora Sérgio Dourado acabou falida, mas Ethel e Brafman permaneceram amigos.
Mais uma operação suspeita
Ricardo Sérgio é acusado de envolvimento num esquema que, em 1992, repatriou US$ 3 milhões investidos nas Ilhas Cayman. Ministério Público Federal investiga suposta lavagem de dinheiro a partir de sobras de campanhas eleitorais
A figura do economista Ricardo Sérgio de Oliveira é repetida numa outra operação para lá de suspeita: a do Banespa. A revista IstoÉ desta semana publica reportagem sobre um esquema que, em 1992, trouxe de volta ao país US$ 3 milhões sem procedência investidos nas Ilhas Cayman, paraíso fiscal do Caribe. Quem estava no comando da ação era Ricardo Sérgio, que naquela época tinha uma carreira bem-sucedida no mercado financeiro.
Ricardo Sérgio, segundo a revista, conseguiu vender ao mercado internacional títulos de uma empresa falida, a Calfat. A transação foi feita por meio do chamado ‘‘Contrato Particular de Emissão e Colocação de Pagamento e Títulos no Exterior’’, firmado entre o Banespa, na época um banco estatal, e a Calfat. O avalista foi próprio Ricardo Sérgio, membro do conselho administrativo da Calfat. A operação era de lançamentos de títulos no exterior, que, a princípio, apenas grandes empresas podem fazer. O contrato assinado é de 14 de fevereiro de 1992.
O estranho é que a Calfat firmou o contrato no momento em que enfrentava processos de execução e não tinha nome no exterior. Mesmo assim, segundo a revista, conseguiu compradores internacionais. O dinheiro, depositado na agência do Banespa nas Ilhas Cayman, caiu na conta da Calfat em banco de São Paulo. A operação pode não ter passado de uma simulação. A Calfat, segundo investiga o Ministério Público, poderia ter emitido títulos podres no mercado externo, que depois foram resgatados a valores superfaturados pela própria empresa ou por companhias amigas. Tudo isso permitiu o retorno do dinheiro, sem procedência, para o Brasil.
Método comum
Um esquema de lavagem de dinheiro segue um método comum. Para conferir legalidade à operação, o empréstimo simulado no contrato cumpre exigência como a penhora de bens e fiadores. O banco chega a entrar com um processo contra a empresa pela não quitação do empréstimo. A cobrança se arrasta até o arquivamento e os advogados do banco dão um jeito para que os fiadores e donos das empresas executadas não fiquem inadiplentes. Segundo a IstoÉ, foi isso que ocorreu na operação Banespa. Em São Paulo, tramitam, desde 1994, dois processos movidos pelo Banespa contra Ricardo Sérgio e a Calfat pelo não pagamento dos US$ 3 milhões.
A garantia é uma hipoteca de uma fábrica em Leopoldina (MG), insuficiente para quitar a dívida. Mesmo assim, o banco jamais tentou penhorar os bens do economista. Outro processo revela que o Banespa trouxe dinheiro de fora para a Calfat em outras operações suspeitas. Mas os autos foram retirados por advogados do banco, em 1995, e nunca retornaram. Na época da operação Banespa, Ricardo Sérgio havia recolhido recursos para a campanha a deputado federal de José Serra, em 1990. Quatro anos depois, foi tesoureiro das campanhas de Serra ao Senado e de Fernando Henrique Cardoso para a Presidência da República.
Procuradores do Ministério Público Federal pretendem descobrir agora se o dinheiro da operação Banespa foi sobra de cam panha. Um outro esquema envolvendo Ricardo Sergio também veio a público na semana passada. Reportagem do jornal Estado de Minas aponta que ele é procurador integral da Antares Participações Ltda, registrada na Junta Comercial de São Paulo em nome do empresário Ronaldo de Souza, seu amigo de longa data. Com essa empresa, que é subsidiária da Antar Venture Investments, sediada em Road Town, nas Ilhas Virgens, ele participa como sócio da construção de um prédio no bairro Morumbi, em São Paulo. São 52 casas de padrão médio e alto, com quatro quartos e duas suítes. Custarão R$ 600 mil a R$ 700 mil cada, dependendo do modelo. O empreendimento total é de R$ 50 milhões.
Garotinho pede rigor em operação sobre suborno
Candidato do PSB defende CPI para investigar ação de ex-diretor do banco do Brasil na venda de estatais. PSDB diz que denúncias não atingem José Serra
Salvador — O pré-candidato a Presidência pelo PSB, Anthony Garotinho, defendeu ontem, no município de Una (BA), a ‘‘apuração rigorosa’’ das recentes denúncias envolvendo o ex-diretor do Banco do Brasil, o economista Ricardo Sérgio de Oliveira, que foi tesoureiro de campanhas anteriores do tucano José Serra.
Para Garotinho, é preciso esclarecer o suposto esquema de recebimento de propina e beneficiamento de empresas na renegociação de dívidas com o banco, conforme reportagem publicada sexta-feira pela Folha de S.Paulo. Depois das acusações de ter cobrado propina de R$ 15 milhões ao empresário Benjamin Steinbruch durante o processo de privatização da estatal Vale do Rio Doce, Ricardo Sérgio foi denunciado por favorecer empresas de um dos doadores da campanha do candidato tucano, o empresário Gregório Preciado. Ricardo Sérgio também é acusado de ter achacado os empresários que compraram a Tele Norte Leste (Telemar) na privatização da Telebrás.
O candidato desafiou o PSDB a trabalhar para verificar se as acusações são procedentes ou não. ‘‘Estas denúncias recentes reforçam minha posição de apoiar a CPI das privatizações e estimular a realização de uma investigação profunda’’, disse Garotinho.
Em São Paulo, o presidente nacional do PSDB, deputado federal José Aníbal (SP), afirmou que as denúncias de corrupção envolvendo o processo de privatização da Companhia Vale do Rio Doce não atingem o senador José Serra, pré-candidato do PSDB à Presidência, nem o próprio partido. ‘‘As denúncias que estão aí são, parte delas, matérias repetidas, algumas baseadas em suposições que já foram desmistificadas’’, disse ele, se referindo às novas denúncias publicadas na última edição da revista Época, na qual o empresário Benjamin Steinbruch teria pago propina na privatização da Vale para Ricardo Sérgio de Oliveira.
‘‘Mas o que for preciso esclarecer, não teremos complacência, vamos esclarecer’’, disse o deputado, após a solenidade de reinauguração do Itaú Cultural na capital paulista, que teve a participação do presidente Fernando Henrique Cardoso e do governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB). Para ele, as denúncias são apenas tentativas de prejudicar a campanha de Serra. ‘‘Estão tentando, de algum modo, atingir o senador, mas não vão conseguir. Serra é um homem honrado, 40 anos de vida pública limpa e um compromisso democrático bem claro’’, afirmou. Fernando Henrique não falou de política.
Pesquisa
Aníbal interpretou os resultados da pesquisa eleitoral realizada pela Toledo & Associados, publicada hoje pela revista IstoÉ, como um ‘‘cala boca’’ para os boatos que atingiram o mercado financeiro na semana passada, sugerindo que José Serra cairia para quarto lugar na disputa presidencia. A pesquisa aponta Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT, em primeiro lugar, com 39% dos votos, seguido por Serra, com 22,8% dos votos, bem à frente de Ciro Gomes (PPS), com 13,8%, e de Anthony Garotinho (12,6%).
Segundo Aníbal, a pesquisa mostra um crescimento contínuo da candidatura Serra. ‘‘Com dois meses e meio de campanha, Serra tem uma posição que é o triplo da posição que tinha no início da campanha’’, comparou. Questionado sobre a possibilidade de uma substituição de Serra como candidato do partido à presidência, Aníbal reagiu: ‘‘O candidato do PSDB, do presidente Fernando Henrique Cardoso, do governo e do PMDB é José Serra’’.
Nem mesmo o fato de a pesquisa apontar uma vitória de Lula no segundo turno, independentemente do candidato com quem concorrerá, desanimou Aníbal. ‘‘O Lula é candidato há 12 anos e o Serra, há dois meses e meio’’, comparou.
Um índio no Planalto
Durante anos, ele cuidou do serviço sujo no Congresso. Ex-caminhoneiro, Francisco Pereira da Silva, o Índio, entrou para o Senado em 1964, como auxiliar de limpeza. Forte e entroncado, com fama de bom de briga, passou logo para a área de segurança. Virou chefe. Lá, usou o cargo e o treinamento de jiu-jitsu para intimidar - e até espancar - quem ameaçava os senadores.
A truculência lhe renderia outra inesperada promoção. Foi cedido ao Palácio do Planalto, onde trabalhou como ‘‘um cão fiel’’ do presidente, o general João Figueiredo. Aos 63 anos, aposentado, Índio conta em livro histórias de corrupção, chantagem e sexo em torno do poder. E defende os métodos que o fizeram temido: ‘‘Cabra safado tem de levar um couro e sumir’’.
Escrito pelo jornalista Carlos Chagas, o livro ‘‘Um Índio e Muitas Flechas’’ mostra os subterrâneos de Brasília. Índio revela ter usado as próprias mãos para surrar desafetos de políticos. Ele se gaba de ter agredido ‘‘o namorado boiola’’ da filha de um governador do Acre. Tudo com a ‘‘cobertura’’ de agentes da Polícia Federal. O rapaz tinha ‘‘péssima reputação’’ e estaria envolvido em ‘‘tráfico de influência’’, justifica..
Sopapos
Índio conta ter sido chamado para investigar suposta extorsão à família do senador Roberto Saturnino. Deu ‘‘uns tabefes’’ no acusado. Um desafeto do ex-senador Nilo Coelho recebeu o mesmo tratamento. ‘‘Não há nada que uma correção bem aplicada não resolva’’, diz ele no livro. O ex-presidente do Senado Humberto Lucena, conta Índio, mandou-o apurar chantagem contra o médium Chico Xavier, em Uberaba. Nos tempos de Planalto, lembra o ex-segurança, muitas vezes a ordem para resolver problemas à força vinha do próprio presidente Figueiredo. A senha era seca: ‘‘TV’’. Significava ‘‘te vira’’.
Índio diz ter perdido a conta das vezes em que ‘‘se virou’’, no governo e no Congresso. Um rapaz denunciado por estupro em um gabinete do Senado ‘‘levou um cacete danado e sumiu’’, conta. Como chefe da Segurança da Casa, ele relata que levava os suspeitos para ‘‘dar uma volta’’ por Brasília. Ao ser perguntado sobre os detalhes dessas surras, Índio se esquiva. Diz que em alguns casos aplicava ‘‘surras de palavras’’.
O livro também inclui casos de corrupção. Índio garante ter flagrado o filho do ex-ministro César Cals recebendo um pacote de dólares de um empresário. E acusa um ex-senador, já falecido, por envolvimento com contrabando de relógios importados.
O depoimento traz curiosidades sobre o Figueiredo. Segundo Índio, o ex-presidente telefonou pessoalmente para os ministros do Supremo Tribunal Federal para viabilizar a candidatura de Joaquim Roriz ao governo do Distrito Federal, e a de José Sarney no Senado, pelo Amapá, em 1990.
Pesquisa terá registro na Web
O Tribunal Superior Eleitoral decidiu incluir no seu site da Internet os registros de pesquisas sobre a intenção de voto dos eleitores para a eleição presidencial do dia 6 de outubro. Para o tribunal, esse procedimento tornará mais transparentes as informações sobre as pesquisas eleitorais. Até então, os registros eram afixados apenas nas dependências do TSE. Toda e qualquer pesquisa eleitoral relacionada com as eleições presidenciais precisam ser registradas no TSE num prazo de até cinco dias antes da sua divulgação. O PDT queria que os partidos fossem informados por fax de todos os pedidos de registro de pesquisa. O TSE preferiu adotar a Internet, por entender que o fax poderia ocasionar dúvidas em relação à contagem do prazo de eventual impugnação da medição, que é de 30 dias, contados da afixação do aviso de registro pela secretaria Judiciária. O site do Tribunal Superior Eleitoral é www.tse.gov.br
Competição feroz
Número de operadoras da área fixa deve cair de 34 para cinco em todo o Brasil assim que fusões e compras forem liberadas. Empresas brigam por clientes, mas sobram linhas por falta de consumidores com poder aquisitivo
As operadoras de telefonia passam hoje por uma crise inimaginável há apenas três anos, quando faziam planos de expansão e sonhavam com lucros cada vez maiores. Atualmente faltam clientes e sobram linhas telefônicas! Há 10,6 milhões de telefones fixos ociosos, o equivalente a 22,1% do total instalado. Em 1998, antes da privatização do sistema Telebrás, o déficit de linhas estava próximo de 20 milhões. O principal motivo para essa crise de excesso foi o esforço que as grandes operadoras, especialmente Telemar e Telefônica, fizeram para antecipar metas negociadas com o governo, o que lhes permitiria oferecer novos serviços. Na prática, as operadoras anteciparam para o final de 2001 a oferta que só estava prevista para 2003.
Sem conseguir vender serviços e convivendo com calote total de R$ 2,5 bilhões por ano (geralmente dado por clientes de baixa renda) as empresas amargam prejuízos ou têm lucros muito baixos, incompatíveis com os investimentos feitos (leia quadro abaixo sobre a situação do setor). Analistas dizem que, se as fusões e aquisições no setor estivessem liberadas, haveria uma redução enorme no número de operadoras do setor de telefonia.
‘‘Não vejo mercado para mais de cinco empresas’’, analisa o consultor Ronaldo Sá, que ajudou o ex-ministro das Comunicações Sérgio Motta a definir o modelo de privatização das telefônicas estatais. ‘‘O sistema está em fase de ajuste. É inevitável que muitos competidores sejam comprados por outros’’, avalia. Para se ter uma idéia, há 34 operadoras fixas, duas de longa distância e 20 de telefones celulares.
Outro motivo da crise é o elevado número de empresas que disputam os poucos clientes brasileiros com bom poder de consumo. A briga começou com as privatizações em 1998 e está longe de terminar, mas alguns lutadores se mostram dispostos a jogar a toalha. Um deles é a Embratel, concessionária do serviço de longa distância que enfrenta uma crise interna e ainda tem em seu encalço a Telefônica, operadora de telefonia fixa que conquistou o direito de efetuar ligações nacionais e internacionais. Até agora, a Embratel está vencendo uma batalha judicial para impedir a telefônica de atuar no mercado nacional de longa distância.
Mercado restrito
Na telefonia celular, a BCP amarga dívida de R$ 1 bilhão e poderá se retirar do país, onde atua em seis estados nordestinos e em São Paulo. Outro lutador de porte disposto a deixar o ringue é a Intelig, operadora de longa distância, que poderá passar o negócio à Brasil Telecom, concessionária de telefonia fixa.
O mercado brasileiro ficou menos promissor com a grande desvalorização do real em 1999 e tornou-se ainda mais desestimulante com o processo de retração da economia mundial iniciado em 2001. Endividadas em dólar, pressionadas pelos acionistas ávidos por lucros e sem crédito fácil nos bancos internacionais, grandes empresas de telefonia querem que o governo mude a Lei Geral de Telecomunicações e permita fusões e aquisições agora. Pela lei, essa autorização só poderá ser dada a partir de julho do ano que vem.
Na opinião do consultor Carlos Camacho, sócio da GAP Asset Management, ‘‘todas as empresas apostaram e algumas perderam com as mudanças conjunturais, mas é inegável que o sistema privado brasileiro será muito melhor que o antigo modelo estatal’’, diz. ‘‘É natural que numa corrida, muitas empresas fiquem sem condições de se manter, mas pelo menos os telefones estão aí’’, diz Camacho.
Em três anos e meio, o número de telefones saltou de 22,5 milhões para 76,5 milhões — um crescimento de 240%, alimentado por dinheiro privado e por arrecadação de tarifas. De 1998 para cá, os investimentos em telecomunicações chegaram a R$ 74,7 bilhões. ‘‘Estamos no final de um ciclo de investimentos pesados, em que empresas erraram e acertaram. Aquelas que exageraram no endividamento perderam a chance de continuar no jogo’’, diz o consultor Eduardo Ramirez.
O problema é que muitos competidores querem antecipar sua saída da arena porque estão perdendo muito dinheiro no Brasil. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) percebeu o desespero de algumas operadoras e estuda a hipótese de antecipar a permissão para fusões e aquisições. Os obstáculos legislativos podem ser removidos facilmente. A Lei Geral de Telecomunicações poderia ser modificada por medida provisória. O problema é outro. De acordo com um técnico da Anatel, o maior risco de liberar os negócios entre as teles agora é facilitar a concentração dos serviços nas mãos de poucos. ‘‘Saímos de um monopólio estatal e não podemos correr o risco de um monopólio privado’’, pondera.
Medo de ação tardia
Especialista em telecomunicações, o advogado Luiz Eugênio Müller teme que o governo só atue depois de uma empresa quebrar. ‘‘Não se trata de salvar as operadoras com favores, mas de ser sensível ao pedido dos empresários de liberar as fusões e aquisições mais cedo. Algumas empresas podem não agüentar até o ano que vem’’, alerta. A pressão maior pelos negócios no Brasil vem do exterior, onde estão as cúpulas das principais concessionárias que atuam no país. Após a recessão que atingiu os Estados Unidos no ano passado, essas empresas recebem pressão de acionistas para suspender investimentos pesados (necessários para a atualização tecnológica) e adotar posturas mais conservadoras (como a liquidação de dívidas e distribuição de lucros).
O presidente da Anatel, Luiz Guilherme Schymura de Oliveira, demonstra estar aberto às propostas das teles ao reconhecer que todas as empresas de telefonia do Brasil estão operando com rentabilidade muito baixa. Pelas suas contas, o retorno dos investimentos feitos pelas operadoras está em 4% ao ano, ganho muito inferior ao que teriam se deixassem o dinheiro aplicado em títulos públicos, que rendem 18,5% ao ano. Para Schymura, dois caminhos podem ser seguidos pela Anatel para ajudar as empresas e melhorar a rentabilidade de seus negócios: um processo de fusão ou incorporação de ativos e o acesso a novos mercados.‘‘Algumas operadoras pagaram valores além do que podiam pelas concessões. Assumiram o risco e, se erraram, precisam arcar com os custos. Temos, porém, que garantir a rentabilidade dos novos investimentos. E isso deve ser discutido pela Anatel junto com as empresas’’, destacou.
O consultor José Costa Gonçalves do banco Multistock, diz que as teles estão enroladas no resto do mundo porque foram ousadas demais no passado. ‘‘Em 1998, o mundo vivia a expectativa dos negócios via Internet, que exigem investimentos pesados em telecomunicação. Como as expectativas não se confirmaram, o cenário ficou mais cauteloso. O acionista é cruel: ele quer lucro ou dinheiro de volta’’, diz Costa.
Os analistas acreditam que as grandes companhias de telefonia fixa vão sobreviver e engolir as celulares e as operadoras de longa distância. Telemar, Brasil Telecom, Telecom Itália e Telefônica apresentam lucro, um universo de clientes enorme e potencial pa ra concorrerem de igual para igual. Fortalecidas pelo enxugamento de mercado, teriam condições de oferecer ao consumidor tarifas mais competitivas.
Empresas brigam pelo DDD
Embratel e Intelig reclamam do pedágio caro que são obrigadas a pagar pela utilização das linhas das operadoras locais no serviço de longa distância. Recursos ao Cade e à Justiça dirão quem está certo
Depois que a Justiça confirmou na sexta-feira a liminar que impediu a Telefônica de entrar no mercado de Discagem Direta a Distância (DDD) nacional , a Embratel passou a acreditar numa decisão favorável do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão do Ministério da Justiça encarregado de defender a concorrência entre as empresas.
Segundo Purificación Carpinteyro, vice-presidente de Serviços Locais da Embratel, a tarifa de interconexão paga pela empresa à Telefônica é a mais cara do mundo e põe em risco a competição na telefonia. Tarifa de interconexão é o pedágio pago pelas operadoras de longa distância às empresas locais pelo uso da linha telefônica destas últimas. Como a Telefônica cobra o preço máximo permitido por lei, deixa de prevalecer a regra universal que manda dar desconto a quem compra no atacado, como a Embratel.
‘‘É como se uma empresa de turismo comprasse três mil passagens de avião de uma companhia aérea e esta insistisse em cobrar o mesmo preço que cobra de um só cliente’’, argumenta a vice-presidente da Embratel. A executiva explica que quando atua no mercado de longa distância, a Telefônica paga muito menos pelo mesmo pedágio, permitindo assim um autêntico subsídio aos seus serviços. Uma vez que ela já é dona de 70% do mercado de longa distância dentro da sua área de concessão, sua vantagem competitiva quando explorar a longa distância para todo o país e o exterior será muito grande, reclama a concorrência.
Purificación Carpinteyro diz que, preocupada com a meta de universalização do serviço telefônico, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) fez muito pouco pelos demais itens, como o respeito à questão regulatória. Esse comportamento se chocaria com o padrão de desempenho de agências do primeiro mundo, que procuram focar sua atuação na vigilância às empresas dominantes, como as operadoras locais. Fazem isso porque as demais companhias não podem, por exemplo, responder a uma prática predatória instalando a sua própria linha, o que implicaria enorme investimento.
Em 1994, houve problemas no Chile e mais recentemente nos Estados Unidos e na própria Espanha, origem da Telefônica. ‘‘A Anatel se omitiu’’, afirma a alta funcionária da Embratel. ‘‘Em todo o mundo já se discute até mesmo se o dono da rede de infra-estrutura também pode prestar o serviço’’, adverte. ‘‘Se as atuais regras prevalecerem, companhias que operam na longa distância terão muitas dificuldades e talvez só lhes reste o mercado corporativo {das empresas}.’’
Um estudo técnico elaborado por consultoria internacional demonstra que na progressão atual das tarifas DDD a receita cairá à metade, minando as margens de lucro. Na situação atual, de cada real recebido por uma operadora de longa distância, 70 centavos têm que ser transferidos para a operadora local.
Artigos
Por uma escola pública de qualidade
Só uma escola pública de qualidade pode nos fazer, como país, dar o salto qualitativo que tanto aspiramos, por meio da qualificação de nossos jovens
Jaime Pinsky
Foi uma festa da cultura: centenas de milhares de pessoas saíram de casa entre 25 de abril e 5 de maio para visitar a Bienal do Livro de São Paulo. Mais: quase metade dos visitantes não morava em São Paulo, o que demonstra que o evento ocupa, efetivamente, um importante papel entre as atrações culturais da cidade. Culturais, sim, pois além de dezenas de milhares de títulos, praticamente toda a produção editorial brasileira, exposta em quase vinte mil metros quadrados de estandes, a Bienal do Livro promoveu dezenas de palestras, debates, mesas-redondas e seminários, incluindo o Salão de Idéias, para o público em geral, e o Projeto Universidade, destinado a aprofundar temas e promover o encontro entre professores e universitários. Todos os eventos muito concorridos e com troca de idéias e experiências que resultaram numa aproximação entre o saber acadêmico e os responsáveis pelas políticas públicas.
Um dos debates mais interessantes foi aquele em que se discutiu a possibilidade de haver uma escola pública de qualidade. A simples formulação da questão indica sua existência, ou melhor, inexistência, uma vez que é lugar-comum dizer-se que a escola pública de hoje não tem qualidade, se comparada ao que já foi. É verdade que nem toda escola particular é boa, muitas não passam de caça-níqueis mais ou menos sofisticados, em que a vontade de inserir os filhos num ambiente social ‘‘selecionado’’ leva muitas famílias a fazerem longos e inócuos sacrifícios sem resultados apreciáveis. Mas, ao contrário do que acontecia há algumas décadas, no rol das grandes escolas de ensino fundamental e médio não pontificam mais os antigos colégios estaduais, mas sim os particulares, sempre muito caros e, portanto, economicamente seletivos.
A questão, portanto, se impõe: é possível uma escola pública de qualidade? Antes de mais nada, tem que ser possível, pois é lei e está na própria Constituição. Tem que ser possível, ainda, porque é uma forma de permitir igualdade de oportunidades (ou quase isso) entre os que podem pagar uma escola particular e os que não podem. O oposto seria (ou é) reproduzir a desigualdade. Tem que ser possível também por ser uma imposição ética. E, afinal, somos ou não seres éticos?
Talvez alguém não tenha se deixado impressionar com as razões de princípio acima elencadas e solicite argumentos mais práticos, motivos mais concretos. Lá vão eles: só uma escola pública de qualidade pode nos fazer, como país, dar o salto qualitativo que tanto aspiramos, por meio da qualificação de nossos jovens. Um país cuja população não sabe ler. Que, quando sabe, lê pouco, e quando, finalmente, lê, pouco entende (segundo a constatação insuspeita de um órgão da própria ONU) e não tem muitas chances num mundo competitivo e exigente em termos de qualificação de sua força de trabalho. Há mais: a era de comunicação e serviços em que estamos prestes a viver tende a substituir a força física pela sutileza e pela educação formal. Os países que não agirem a favor da história ficarão fadados a se distanciar cada vez mais daqueles outros, ricos ou não, que colocam a educação como prioridade real.
O fato é que ainda não temos uma escola pública de qualidade, mas, ao contrário dos pessimistas, creio que ela ainda é possível, além de desejável e que, de alguma forma demos alguns passos, embora tímidos, em sua direção. Tivemos, há tempos, aquela escola pública que nossa geração freqüentou, prezado leitor, nós da classe média e uns poucos e excepcionais alunos oriundos de famílias pobres. Mais tarde deu-se o sucateamento dessa escola pública: quando ela se tornou acessível a todos, os detentores do poder decidiram que pobre não precisa de escola boa. Felizmente, nesses últimos anos a qualidade média de nossos governantes, em geral, melhorou, assim como melhorou o nível de seus assessores na área da educação. Tanto em âmbito federal, como em vários estados e muitos municípios, geridos por diferentes partidos políticos, implantou-se a consciência de que a educação de qualidade é, de fato, um direito do cidadão e um dever do Estado. Sei que em vários municípios procura-se escamotear a legislação e inclui-se como despesa de educação as viagens da primeira-dama ao shopping da cidade grande mais próxima ou a pescaria do senhor alcaide c om sua curriola no Pantanal, mas esta não é mais a regra: já existe a consciência, pelo menos.
O que falta, então? Ao meu ver, além da óbvia remuneração decente aos professores — condição necessária, mas não suficiente — falta uma grande mobilização nacional a favor da educação, envolvendo as universidades federais e demais universidades públicas e até várias particulares, com a finalidade de qualificar, requalificar e atualizar todos os professores da rede pública brasileira. Algo grandioso mesmo, algo que mexesse com o país todo, fazendo com que o saber, por vezes estéril, da universidade brasileira, circulasse pelos confins do país, frutificando e reproduzindo-se. É um programa de governo factível, desde que se tenha vontade política para tanto, uma vez que o Brasil entra no século XXI depurado de estruturas oligárquicas regionais que pareciam invencíveis e atento contra a apropriação do público pelo privado, traços que marcaram nossos primeiros 500 anos de existência.
Editorial
DESAFIO MAIOR
O Censo 2000 comprovou fato alvissareiro. No início do milênio, 95% das crianças estão onde devem estar — na escola. A universalização do ensino impõe novo e gigantesco desafio. É inadiável encarar com firmeza o problema da excelência. Sem um salto qualitativo, o Brasil corre o risco de perder definitivamente o trem da história.
O mundo globalizado não conhece fronteiras. A competição torna-se cada dia mais acirrada. No comércio internacional, exigem-se qualidade e preço. Ambos os fatores estão relacionados à mão-de-obra. O trabalhador deve ter condições de responder às exigências do mercado. Nenhuma empresa admitirá em seus quadros profissional incapaz de entender um manual de instruções ou de manejar máquinas sofisticadas.
Mais: a qualificação constitui item importante na atração de empreendimentos. O trabalhador brasileiro tem entre 4 e 7 anos de escolaridade. Não raro, abandona os livros sem ter adquirido a aptidão da leitura e da escrita. Como concorrer com o coreano, por exemplo, que soma, no mínimo, doze anos de estudos?
A deficiência se traduz em duplo prejuízo. De um lado, implica perda de produtividade para a economia. De outro, baixos salários para os empregados. Mais da metade dos brasileiros recebe até dois salários mínimos por mês. O fato aprofunda as desigualdades regionais e alimenta a atividade produtiva marginal. Constitui, sem dúvida, uma das grandes dívidas sociais do país.
Hoje, não basta freqüentar por mais tempo as salas de aula. É importante ir além. O ensino deve aliar qualidade a quantidade. A tarefa não é fácil. Nem rápida. Exigirá o esforço de, pelo menos, uma geração. O primeiro passo é investir no professor. Só mestres preparados, com a auto-estima em alta, podem formar brasileiros capazes de enfrentar os desafios crescentes de uma sociedade em rápido processo de transformação.
As estatísticas provam que os cursos que preparam docentes têm a nota de corte mais baixa entre os demais. Isso significa que procuram o magistério os candidatos menos competitivos. São, em grande parte, estudantes que não conseguiram boa base nos ensinos fundamental e médio.
Criou-se, com isso, um círculo vicioso. Professores despreparados formam alunos despreparados, que, por sua vez, serão profissionais despreparados. O mal não se restringe à escola pública. A particular recruta a mão-de-obra no mercado. A sociedade fica sem alternativa.
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05/12/2002
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CPI confronta policial e bicheiro sobre propina